— Descobri porque ele voltou — Raíssa se vangloria no dia seguinte enquanto estamos sentadas na mesma mesa do dia anterior.
Sinto a comida parar no meio da minha garganta.
— E? — Lana quer saber, projetando o corpo para frente curiosa.
Rita também aguça os ouvidos. Por mais que ela não seja nem um pouco simpatizante da família Batista, seu lado jornalista fala mais alto.
Dou um gole no suco de limão para tentar acalmar minha respiração descompassada por conta dessa conversa.
— Ele perdeu o controle do carro e destruiu aquela casa incrível — ela conta — Ainda bem que ele não se machucou, seria um crime machucar aquele rosto tão bonito.
O oxigênio volta a encontrar o caminho até meus pulmões. Está tudo sob controle.
— Essa informação é de uma fonte segura? – Rita questiona desconfiada.
— Claro – Raíssa responde como se fosse óbvio – Ele mesmo me disse.
Ele não usou o carro para detonar a casa e também não a destruiu inteira como estavam falando por aí, foi apenas a parte interna. Uma parte bem pequena se formos considerar o tamanho daquela casa.
— Mas parece que a reconstrução já está sendo feita e ele me convidou para passar um final de semana lá — ela continua toda feliz, enquanto Rita anota cada vírgula do que ela diz em seu caderninho.
— Por que você está tão interessada no Santo, assim, do nada? — eu pergunto, a primeira vez que me pronuncio desde que ela começou a tagarelar — Não me lembro de você querer ficar tanto com ele.
Quando Raíssa me olha sua expressão muda completamente. O sorriso sumiu e em seu lugar apareceu uma cara fechada.
— Quero que o Alaric sinta na pele todo o sofrimento que me fez passar nessas férias — ela quase rosna, e então desvia o olhar do meu — E, cá entre nós, Santo Batista é o homem mais lindo da cidade. Todo mundo já sentiu, pelo menos, uma vez vontade de ficar com ele e eu não estou imune a isso! E agora, finalmente, tenho uma oportunidade de desfrutar dele.
Ela joga os braços sobre a mesa de forma teatral e sonhadora e eu me seguro para não rolar os olhos.
Fico aliviada que a conversa tenha tomado outro rumo e paramos de falar sobre o incidente da casa. Apesar de que escutar Raíssa tagarelar o tempo todo sobre Santo, fazia minhas veias borbulharem. O único assunto que ela sabe falar é justamente envolvendo a única pessoa que eu não estou nem um pouco afim de escutar.
— América? — Lana me chama.
— Sim? — olho para ela, deixando meus pensamentos de lado.
— O que houve? Não gostou de saber sobre Santo? — Raíssa questiona, debochada. Ela, assim como toda a cidade, sabe da rixa milenar da minha família com a dele mas mesmo assim não perde uma oportunidade de me perturbar.
Eu me ajeito no banco sob o olhar venenoso de Raíssa aguardando pela minha resposta.
— Para mim, você e ele podem ser felizes para sempre juntos — o sarcasmo transborda na minha voz e eu forço um sorriso para ela.
Eu sei que Raíssa está tentando me punir e me humilhar porque sou uma Machado, mais especificamente, irmã de Alaric Machado: o garoto que terminou o relacionamento e quebrou o coração dela nas férias. E como Raíssa simplesmente não consegue superar e seguir em frente, decidiu me infernizar como punição, mesmo que eu tenha a alertado sobre a personalidade nada romântica e instável do meu irmão.
— Ai meu Deus, olha quem está vindo para cá — Lana sussurra e nós quatro viramos a cabeça na mesma direção.
É Santo.
Ele está encarando nossa mesa e caminhando em nossa direção. É muito castigo eu ter que lidar com ele outra vez.
Quando ele está perto o bastante da nossa mesa, Raíssa abre um sorriso e coloca uma mecha do cabelo loiro atrás da orelha.
— E aí? — ele diz, a voz áspera.
— Oi — Raíssa sorri, batendo os cílios espessos.
— Vai ter uma festa na lago amanhã que o pessoal da Engenharia está organizando — ele diz e então vira os olhos para mim, um brilho desafiador viajando de uma íris para outra e um sorriso de lado estampado no rosto. O preço do seu silêncio é brincar com a minha sanidade. — Vocês deveriam aparecer por lá.
Tenho cada vez mais certeza que ele foi criado como um teste para a minha paciência. Ele sabe dos nossos limites, sabe que não podemos nem mesmo respirar o mesmo ar, mas gosta de quebrar todas as regras só para me ver irritada com a sua presença.
Me ver desconfortável é sua diversão particular.
Raíssa toca seu braço e Santo quebra nossos olhares, voltando sua atenção para ela.
— Nós iremos, com certeza — ela morde o canto dos lábios molhados de gloss.
Santo me encara mais uma vez. Ele tem os mesmos olhos castanhos selvagens do pai e o mesmo sangue Batista correndo pelas veias, sua expressão debochada quando faz uma reverência desnecessária para mim quando sai, só me faz reforçar esse fato.