Memorial 1

Analf@bytismo Digital: reflexos da pandemia


Prof. Fabio Colins


Introdução

Este trabalho tem como objetivo apresentar um memorial descritivo de uma palestra ministrada durante as aulas da disciplina Tecnologias e Práticas Pedagógicas do Mestrado em Ensino de Língua Portuguesa e Literatura (PPGELL) da Universidade do Estado do Pará (UEPA), além de trazer reflexões acerca das ferramentas digitais em tempo de ensino remoto.

A palestra intitulada “Tecnologias digitais e práticas pedagógicas em cenários de transição”, ministrada pela professora doutora Daiani Damm Tonetto Riedner, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), suscitou reflexões sobre o quanto a pandemia de Covid-19 afetou a educação mundial, o quanto nosso sistema de ensino é ineficaz em regime de aulas remotas e o quanto os professores necessitam de formação para as tecnologias digitais aplicadas à educação. Essa ideia é reforçada na fala da professora: [...] as instituições escolares não estavam preparadas para as aulas não presenciais. Essa afirmação gera o seguinte questionamento: O que mudou no sistema escolar após um ano de pandemia? O poder público pouco investiu em tecnologias educacionais, em estrutura dos prédios escolares e em desenvolvimento profissional.


Desenvolvimento

A palestra possibilitou rememorar algumas situações que ocorrem no ambiente escolar no que se refere à coordenação dos laboratórios de informática nas escolas. Por exemplo, é comum ouvir da direção ou coordenação escolar repreensão do tipo: quero ressaltar que se o professor danificar algum computador, ele será responsabilizado pela manutenção. Além disso, a chave da sala de informática sempre fica sob a guarda ou vigilância de um funcionário específico ou a senha do servidor da rede de internet não é compartilhada. Outras barreiras estão nos espaços de funcionamento, salas pequenas e com poucos computadores. Então, em uma turma com 30 alunos, enquanto 10 acessam as máquinas, os demais fazem o quê?

Segundo a professora Daiani Riedner, a UFMS investiu em projetos de ensino, pesquisa e extensão com a finalidade de melhorar a formação digital dos professores. As ações institucionais renderam o terceiro lugar entre as universidades federais brasileiras no que se refere tecnologias no desenvolvimento de aulas remotas. No entanto, outra afirmação suscitou reflexões nos participantes da palestra: [...] o maior desafio foi articular o desenvolvimento das pesquisas com a Educação Básica e com a formação dos professores. Isso mostra que muitas pesquisas acadêmicas não se tornam políticas públicas.

Quando há interesse do governo em investir em tecnologias na educação, ocorre no sentido de impulsionar a chegada de computadores às escolas, mas pouco investe-se em infraestrutura e em mão de obra qualificada. Implantar laboratórios de informática e oferecer minicursos cursos aos professores não são ações suficientes para o enfrentamento de ter que ministrar aulas remotas mediadas por tecnologias digitais. Embora algumas ações conotem interesse do governo em equipar tecnologicamente as escolas, isso é uma realidade ínfima. Além disso, o suprimento técnico, apesar de fundamental, não é garantia de uso dentro dos padrões de realidade esperados. Por isso, muitas salas de informática acabam sendo subutilizadas.

Outro momento provocativo da palestra foi quando a Dra. Daiani Riedner afirmou, a partir de projetos de formação de docentes desenvolvidos na UFMS, que muitos docentes da Educação Superior e da Educação Básica têm [...] facilidade em uso das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC’s) para relações sociais e dificuldade para estabelecer relações educacionais. Isso mostra a falta de investimento na (auto)formação digital de professores para o uso de TDIC’s no processo de ensino e aprendizagem; ao mesmo tempo que se cria um paradoxo, pois, conforme afirmou a palestrante, [...] o professor é o eixo da inovação tecnológica na educação.

Ao citar Pierre Levy, a palestrante estabeleceu uma relação entre a arca de Noé e a arca digital, e nos fez refletir sobre o papel do professor nesse dilúvio de informações. Isso fomentou a ideia do paradoxo, pois ao mesmo tempo em que a internet universalizou as informações, impediu muitos estudantes e professores de entrar na arca. A professora Daiani Riedner explicou que a explosão de informações e o avanço das telecomunicações, sobretudo a internet, são semelhantes ao dilúvio bíblico, visto que muitos professores durante o ensino remoto se sentiram à deriva no mar de informações e tecnologias disponíveis (aplicativos, sites, cursos gratuitos, materiais digitais etc.).

Essas provocações nos fez repensar nosso papel como professor na sociedade da informação e das tecnologias digitais, pois ainda estamos enraizados em um modelo de escola do século XIX e organizando nossas aulas com um currículo do século XX para estudantes do século XXI, ou seja, um movimento pedagógico assíncrono. Sobre isso, a professora Daiani Riedner projetou o vídeo intitulado Escola e Internet: o mundo da aprendizagem dos jovens, do sociólogo hispânico Manoel Castells. A fala de Castells foi provocativa, pois ele afirmou que o mundo da aprendizagem dos jovens, e dos estudantes, se divide cada vez mais em duas partes: na escola, para que te deem um diploma, e na internet, com grupos informais, para aprender de verdade. Uma realidade dicotômica: a escola que somente escolariza e a internet que ensina.

A fala de Manoel Castells nos faz pensar nesse movimento pedagógico assíncrono, em que as escolas ainda funcionam como na Idade Média: sem internet e sem interatividade. Um ambiente em que se encontra um professor que somente explica o conteúdo de maneira analógica para estudantes digitais, expressão utilizada pelo sociólogo. Isso fomenta a ideia de que nosso sistema de ensino necessita urgentemente de uma profunda reforma, ou seja, uma ruptura de paradigmas educacionais centrados em modelos pedagógicos de séculos passados.

A discussão da palestra mostrou, com base no vídeo de Castells, que cerca de 3 a cada 10 alunos do Ensino Médio abandonam a escola por causa do desinteresse provocado pelas aulas totalmente expositivas e pelos conteúdos que não geram interesse, curiosidade e criatividade nos estudantes. Isso mostra um conflito cultural no processo de ensino e aprendizagem: professores e escolas em uma cultura analógica, enquanto os estudantes em uma cultura digital. Portanto, os sujeitos que compõe a escola vivem, em um mesmo espaço, universos diferentes que geram, conforme afirmou Manoel Castells, uma dissonância cognitiva.

Na tentativa de aproximar as instituições de ensino e os professores à cultura digital, a Dra. Daiani Riedner apresentou uma discussão sobre a Aprendizagem Criativa na perspectiva de Mitchel Resnick, professor do Massachusetts Instituto of Technology (MIT). Uma proposta metodológica baseada nos estudos da Psicologia da Educação e em autores como Froebel, Jean Piaget e Seymour Papert, este último criador da linguagem LOGO e da aprendizagem construcionista (aprendizagem por meio de construção).

A Aprendizagem Criativa tem como eixo: foco na aprendizagem; na colaboração; na aprendizagem personalizada; na aprendizagem por meio da experimentação; e na afetividade e empatia. Nessa perspectiva, o estudante assume lugar central no processo de ensino e aprendizagem e ele pode aprender com seus pares. Além disso, o erro não é considerado como não aprendizagem, pois é no processo de experimentar que o estudante constrói conhecimento. Para Riedner o professor precisa despertar a empatia e ser afetivo, sempre na busca de reforçar a potencialidade do estudante, ao invés de reforçar o insucesso. Para isso, foram sugeridas diversas ferramentas digitais on-line e off-line.

Entre os recursos digitais que podem proporcionar a Aprendizagem Criativa estão os seguintes: MindMup (aplicativo gratuito para criação de mapas mentais); Loom (ferramenta digital utilizada para criar vídeos curtos); Google Forms (aplicativo do Google utilizado para construção de formulários on-line); Scratch (ferramenta digital para programar jogos e animações interativas); entre outros. Todas essas tecnologias digitais podem potencializar o trabalho docente e promover uma aprendizagem criativa por meio de ações colaborativas.

Para compreender melhor os pressupostos teóricos-metodológicos da Aprendizagem Criativa, a professora Daiani Riedner sugeriu a leitura dos seguintes livros: A Máquina das Crianças: repensando a escola na era da informática (PAPERT); LOGO: computadores e educação (PAPERT); Jardim de Infância para a Vida Toda: por uma aprendizagem criativa, mão na massa e relevante para todos (RESNICK); entre outros.

Na obra A Máquina das Crianças: repensando a escola na era da informática, de Seymour Papert, o autor apresenta, há quase 30 anos, a ideia do uso de computadores pessoais como ferramenta no processo de ensino e aprendizagem, pois partiu do pressuposto de que as ferramentas tecnológicas digitais poderiam melhorar a autonomia intelectual dos estudantes desde os anos iniciais de escolaridade. Uma ideia renovadora para a época.

No livro Logo: computadores e educação, de Seymour Papert, é apresentada a linguagem LOGO como uma ferramenta pedagógica para o trabalho com crianças. Toda a fundamentação teórica está ancorada nas ideias construtivistas piagetiana. O autor implementa a filosofia construcionista, a aprendizagem por meio da construção. Essa filosofia foi publicada pela primeira vez em 1980, no livro Minds Torms.

Na obra Jardim de Infância para a Vida Toda: por uma aprendizagem criativa, mão na massa e relevante para todos, de Resnick, apresenta ideias de como potencializar o processo de ensino e aprendizagem na Educação Infantil por meio de atividades construtivas. Realiza uma crítica sobre práticas de atividades de lápis e papel com as crianças, e retoma ideias do educador construtivista Froebel.


Conclusão

Portanto, a palestra possibilitou refletir sobre o processo educacional inserido em uma cultura digital; sobre a formação dos professores e o uso de tecnologias digitais aplicadas à educação; sobre possibilidades de práticas pedagógicas em contexto de pandemia; e maneira de inovar a prática pedagógica e promover uma aprendizagem criativa.


Referências

CASTELLS, Manuel. Escola e Internet: o mundo da aprendizagem. 2015 (4min09s). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=J4UUM2E_yFo


LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed 34, 1999.


RIEDNER, Daiani Damm Tonetto. Tecnologias Digitais e Práticas Pedagógicas em Cenários de Transição. Palestra ministrada na disciplina Tecnologias Digitais e Práticas Pedagógicas: PPGELL, 2021.