Jean-Michel Basquiat. Auto-retrato. 1982.
Texto de Mateus Macedo, Fevereiro de 2021.
Jean-Michel Basquiat. Auto-retrato. 1982.
Texto de Mateus Macedo, Fevereiro de 2021.
Não pretendo por meio deste texto fazer qualquer tipo de análise sobre esse quadro. Apenas mergulhar sem saber se estou num lago, rio ou oceano.
Pesquisando sobre a história e suas obras o que me veio nas falas alheias era sua voracidade que consumia a quem via seus trabalhos e me parece ser até uma posição consensual entre as galerias esse pensamento - Basquiat aqui mostra a ira de um homem preto dentro de uma sociedade racista - e observando esse quadro enquanto escrevo com aquele primeiro ver, aquele que vê tudo mas ao mesmo tempo não vê nada, percebo esse mesmo pensamento. A raiva, a angústia de alguém, porém, olhando bem de perto a um palmo do meu rosto me recordo que a essência humana não costuma ser tão reducionista.
Basquiat numa entrevista disse ao repórter: “Meu primeiro instinto é o de desenhar uma cabeça”, esse mesmo repórter pode se dizer que desde o começo da entrevista tentava arrancar do artista uma resposta plausível para todos os símbolos presentes em sua obra e uma linha de raciocínio que pudesse sanar quaisquer questionamentos que alguém pudesse ter sobre o que a constitui, mas Jean passa a entrevista inteira voando sobre as perguntas e a cada resposta me deixando mais intrigado com seu jeito de pensar.
Esses olhos elétricos me encaram? Não consigo deixar de pensar no to be or no to be, ou no tupi ou não tupi.
Vislumbrando essa pintura me passa pela cabeça a palavra reivindicação, e a partir do quê vejo como signo, uma reivindicação em ato constante, afinal de contas, Basquiat em diversas obras explora o jogo de poder e vulnerabilidade de corpos marginalizados, não só em seu período de vida mas dentro da história da humanidade. Então, a reivindicação será minha imagem, uma imagem constante dentro das grandes capitais do mundo. O urbano caótico é uma captura natural do ambiente das cidades que Basquiat constantemente leva em seus materiais.
E o que são as cidades? Cidades? Esses ambientes de tamanha aglomeração, transtornos e no meio de tudo isso vidas? Me recordo de um trecho de um livro que li hoje de manhã “... É nas cidades que todos mentem e como as cidades ficam cada vez maiores e mais populosas, aumenta o número de pessoas que mentem e mentem cada vez mais. A civilização foi corrompida quando as cidades se afastaram das florestas. Já notou que é difícil mentir na presença de uma árvore?" (Minha vida de amor e crime com Martin Heidegger. Messadié, Gerald). Não é minha intenção aqui assentir uma fala que diz, “bom mesmo eram os tempos antigos”. Reflito apenas na distância e apatia, e caos, e dor, e alegria e tudo de uma forma extremamente conflituosa e calorosa que discursos e vidas ocorrem e são discutidas nas cidades com maior frequência e maior fervor.
E você?
Que aqui chegou nesse texto, o que você consegue experienciar nessa obra?
Não se deixe levar apenas pelos meus devaneios, nem peço que acredite com veemência no que deposito aqui.
Porém dito tudo isso, vendo essa auto representação, penso na pessoa que o fez, uma transmutação de sentimentos que vivem todos dentro do mesmo ser. O conflito. O tentar aprender a viver nessa sociedade. Não sabendo como acabar esse texto até o presente momento, porque estou mergulhado nos meus pensamentos, o “terminarei” com uma citação do próprio Basquiat:
“Acredite ou não, eu sei desenhar mas quase sempre luto contra isso”
- Jean-Michel Basquiat (1982)
Um abraço a você e até breve.
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