Ísis Cunha - Paredes. 2021.
Ísis Cunha - Paredes. 2021.
Paredes
paredes me cercam, dia após dia,
fechada na fachada de concreto
pergunto - me no afã da distopia:
— Quem me escuta?
quem escuta meus gritos
rasgando a madrugada?
quem escuta meu choro
tremendo o chão em torpor?
quem escuta meus silêncios
disfarçados de controle?
quem escuta meu canto
como quem uiva de dor?
paredes me cercam, já é mais um dia,
mais um dia, no transe de um ritual
fez-se ano de pandemia,
onde o novo nada tem de normal.
quem me escuta
se trancada estou?
quem me escuta,
realmente me escuta?
através de um satélite longínquo,
através de um LED brilhante
através de uma tela,
presa a um fio paralisante?
as paredes me cercam,
mas quem me escuta na verdade
está dentro,
dentro da barricada—parede,
está nas paredes de carne, de osso,
está nas paredes de um ar vital,
quem me escuta habita minha mente,
minha jornada
habita meu destino ancestral.
se ouço o dentro, ele me ouve de volta,
como troca pela entrega concedida,
aquele que habita me escolta,
e me relembra — não estou desprotegida.
as paredes me cercam,
mas as paredes do eu — do ele,
seguem se expandindo em oposto,
aquele que habita minha pele
sabe segredos e dores,
mas faz deles minha força
transformando o caos em gosto.
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