Por Laila Elen e Jessy Koumba
Em 2025, o curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) completa 50 anos de existência. Criado em 1975 com foco inicial em jornalismo, o curso cresceu e se diversificou. Ao longo de meio século, formou gerações de profissionais capazes de atuar em áreas como publicidade, comunicação organizacional, produção midiática e assessoria em comunicação. E consolidou sua atuação por meio do ensino, da pesquisa e, especialmente, da extensão universitária, espaço onde teoria e prática se encontram.
Projetos como o Bandejão, a ECOS Jr. e o Janela são exemplos de extensão universitária em Comunicação, atividades que colocam os alunos em contato direto com a prática profissional e com a comunidade externa. Por meio da extensão, os estudantes desenvolvem tanto habilidades técnicas (como roteiro, produção, edição, atendimento, gestão) quanto habilidades sociais, como trabalho em equipe, comunicação interpessoal e visão crítica da realidade. Ao celebrar 50 anos de história, os projetos de extensão cumprem um papel importante na formação de comunicadores mais humanos, criativos e conectados com a realidade.
A história do Bandejão começou no fim de 2003, quando um horário livre surgiu na programação da Rádio Universitária da UFES. O então diretor da emissora, Saul Josias, propôs à então estagiária Betânia Cordeiro a criação de um novo programa, com participação estudantil. Betânia reuniu cinco colegas do curso de Jornalismo — Ana Cláudia Mielke, Camila Torres, Fran Bernardes, Luciano Coelho e Márcio Scheppa — e, juntos, eles criaram o programa Bandejão, que estreou ao vivo em 2 de fevereiro de 2004, indo ao ar de segunda a sexta-feira, do meio-dia às 14h.
“Foi o melhor estágio do mundo”, relembra o jornalista e um dos fundadores, Márcio Scheppa. “O convívio foi muito rico. A gente colocava em prática o que aprendia em sala de aula: entrevistas, apuração, roteiro, operação da mesa de som, escolha da trilha. Aprendemos na prática e com liberdade. Rapidamente, nosso horário virou o
mais movimentado da rádio. Recebíamos ligações, pedidos de música, visitas no estúdio. O público era principalmente de estudantes da Grande Vitória.” Desde o início, o Bandejão adotou uma estrutura colaborativa e experimental. Cada integrante assumia múltiplas funções e os processos seletivos, disputados, garantiam a renovação do time. Com o tempo, os participantes passaram a ser chamados de “bandejetes” — e até hoje, o projeto funciona com essa mesma lógica de construção coletiva e rotativa.
Mais de 20 anos depois, o Bandejão segue ativo, mesmo com os desafios. A estrutura da Rádio Universitária enfrenta limitações, pois atualmente só transmite via web (https://universitariafm.ufes.br/ouca). O estúdio está fechado e a antena de transmissão apresenta falhas, o que impede a transmissão ao vivo. “Se a rádio estivesse funcionando plenamente, o programa teria um alcance ainda maior. Contornamos isso com gravações no Laboratório de Áudio dos cursos de Comunicação (LabÁudio), mas seria muito melhor se a rádio estivesse funcionando plenamente”, afirma o atual coordenador do projeto, o professor Pedro Marra. Ele também destaca o papel cultural do projeto: “O Bandejão é uma plataforma de circulação cultural. Já revelou artistas e promoveu encontros importantes na cena capixaba.”
Essa dimensão cultural é reforçada por projetos como o Festival Prato da Casa, desenvolvido pela equipe do Bandejão, que deu visibilidade a músicos como André Prando, e por quadros como o Na Chapa, focado em arte e cultura periférica, idealizado pelo estudante e líder do Bandejão, Pereira Silvares. “Eu entrei no projeto logo no primeiro período. Fazia de tudo: edição, roteiro, coordenação. Eu estava lá todos os dias, mesmo sem ser obrigatório. Acabei liderando o Na Chapa, que virou um dos quadros fixos”, conta.
Pereira vê o Bandejão como um espaço raro dentro da universidade. “É um lugar onde o aluno pode criar o que quiser, experimentar de verdade. Nem as matérias práticas dão essa liberdade. No Bandejão, a gente sai do roteiro pronto e inventa o nosso.” Ele também aponta os desafios: “A gente tem muita rotatividade. O aluno entra, aprende, produz, e logo se forma ou sai. Aí a gente precisa começar tudo de novo. Isso cansa, principalmente sem bolsas.”
Mesmo com essas dificuldades, a produção continua: são programas semanais, gravações, edições. A programação do Bandejão inclui quadros diversos, como música capixaba, cultura periférica, entrevistas e experimentações sonoras. Recentemente, o grupo passou a produzir também conteúdos para um site próprio e começou a investir na linguagem audiovisual. Além de atingir o público universitário, o projeto se conecta com a cena cultural de Vitória ao convidar artistas locais para participar dos programas.
Com sua trajetória marcada pela autonomia estudantil e pelo engajamento com a cultura local, o Bandejão segue sendo referência dentro e fora da UFES. “Ele representa a memória e a resistência do curso, além de ser uma das pontes reais entre a universidade e a sociedade”, afirma Pedro Marra. Já Márcio Scheppa, que sonha em lançar um e-book reunindo depoimentos de ex-integrantes, conclui com orgulho: “O mundo mudou, a tecnologia mudou, mas o espírito do Bandejão segue firme: feito por estudantes, para estudantes, e para quem quiser ouvir.”
Fundada em 1997, a Empresa de Comunicação Social Júnior da Ufes (Ecos Jr.) é uma das pioneiras no Espírito Santo como empresa júnior de comunicação, e uma das mais antigas do Brasil em sua área. Nascida da iniciativa de estudantes e professores que buscavam uma ponte concreta entre teoria e mercado, a Ecos Jr conta, em 2025, 28 anos de história. Ela se consolidou como um dos mais importantes projetos de extensão do curso, funcionando como uma conexão entre a formação universitária e mercado de trabalho. Gerida exclusivamente por estudantes e orientada por professores, a empresa tem como foco oferecer serviços profissionais de comunicação a preços acessíveis, ao mesmo tempo em que proporciona uma vivência empresarial transformadora para seus membros.
Organizada como uma empresa real, com CNPJ, estatuto, departamentos e organograma, a Ecos Jr. funciona como laboratório de formação profissional. Seus membros, todos estudantes de graduação, atuam em áreas como planejamento, conteúdo, audiovisual, atendimento, eventos, gestão de pessoas e direção de arte. Cada equipe é responsável por atender clientes reais – geralmente pequenos e médios empreendedores – oferecendo serviços como identidade visual, planejamento de mídias, produção audiovisual, gerenciamento de redes sociais e organização de eventos.
“A Ecos é feita por alunos e para a sociedade. A gente prospecta clientes, negocia contratos, desenvolve as entregas com preços reduzidos, entre 10% e 40% abaixo”, explica a aluna de Publicidade e atual diretora de Gestão de Pessoas da empresa, Isabel Rodrigues Thom.
O diferencial está na natureza da empresa: ela não tem fins lucrativos. Os valores recebidos pelos serviços são reinvestidos em cursos, formações internas e iniciativas abertas ao público, como o evento. O principal é o Ecos Mostra, um concurso criativo aberto a universitários de todo o estado, com desafios práticos, avaliação por jurados de agências e professores da UFES, e uma cerimônia de premiação que, em 2023, lotou o Cine Metrópolis. Além disso, a Ecos Jr. atua com base em valores como criatividade, transformação, diversidade e conexão, o que reflete tanto na composição da equipe quanto no ambiente colaborativo que promove.
Hoje, a Ecos Jr. reúne 35 integrantes, vindos dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda, Cinema e Design. “A gente trabalha para criar um ambiente seguro, criativo e colaborativo, onde todos se sintam à vontade para contribuir. Isso é um grande diferencial nosso em relação ao mercado tradicional”, afirma a coordenadora do projeto, professora Lívia Souza. Ela destaca que a empresa júnior é um espaço onde os alunos desenvolvem, além das hard skills (como domínio de softwares, gestão de projetos e redação publicitária), competências fundamentais para o mercado atual, como liderança, trabalho em equipe, resolução de problemas e empatia.
Entre os desafios enfrentados pelo projeto estão a prospecção de clientes – ainda dificultada pelo preconceito do mercado em relação a serviços prestados por estudantes – e a defasagem tecnológica de alguns equipamentos. Mesmo assim, o envolvimento dos alunos e o compromisso com a excelência têm mantido a Ecos Jr. ativa e inovadora. “A gente entrega trabalhos com qualidade, por preços acessíveis, mas com muito profissionalismo. Isso nos diferencia”, diz Isabel Rodrigues Thom. A professora Lívia complementa que a infraestrutura tecnológica também precisa avançar: “Temos uma sede boa na Ufes, mas com os softwares em constante atualização, nem sempre conseguimos acompanhar tudo. Ainda assim, o
engajamento dos estudantes tem sido incrível, especialmente após a pandemia, o que compensa bastante.”
Isabel, que ingressou como trainee e hoje ocupa um cargo de liderança, acredita que o projeto foi decisivo para o seu crescimento. “Aprendi a macro gerenciar uma equipe, planejar ações estratégicas, lidar com conflitos e ainda ganhei ferramentas técnicas. Mas, mais que isso, a Ecos me deu propósito. A gente fica pelo vínculo, pela cultura, pela transformação que vivencia aqui dentro”, resume.
Com quase três décadas de história, a Ecos Jr. segue como espaço de experimentação, inovação e cidadania, onde jovens comunicadores aprendem na prática os desafios — e as responsabilidades — de atuar no mercado com ética, propósito e impacto social.
Criado pelo professor de Publicidade e Propaganda José Soares Júnior, o projeto de extensão Núcleo de Produção Audiovisual – mais conhecido pelo nome fantasia “Janela” – surgiu com o objetivo de aproximar estudantes da prática audiovisual dentro da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
“Quando cheguei à Ufes, em 2010, eu já vinha de outra faculdade, onde participei da TV universitária por 11 anos. Percebi que aqui não havia um espaço de aglomeração de interessados pela produção audiovisual. O curso de Cinema estava apenas começando. Então, criei o projeto como forma de reunir quem se interessava por esse campo”, explica o professor.
Para ele, a importância do projeto está na ponte entre teoria e prática. “Ter um espaço para aplicar os conceitos aprendidos em sala de aula funciona como um solidificador dessa teoria. Percebo que quem participa de projetos assim leva essa experiência para a sala de aula. Isso cria conexões, fortalece o aprendizado e gera crescimento. A prática e a teoria se complementam e se reforçam mutuamente.”
As decisões sobre o formato dos trabalhos são feitas em conjunto com os alunos. Ao longo dos anos foram produzidos documentários, ficções, séries e programas de TV. A cada turma, o formato muda.
A falta de recursos também tem impactado a continuidade do Janela. Apesar de contar com equipamentos e estrutura básica da Ufes, a ausência de um bolsista compromete a organização. “Já tivemos bolsistas, e funcionava muito bem para agregar e organizar a produção. Há alguns anos não temos, o que desagrega o grupo. Esse apoio faz falta.”
Quando questionado sobre o impacto do projeto, José Soares reconhece a dificuldade em medir o alcance externo, mas acredita que o maior retorno está na formação dos alunos. “Os nossos produtos estão disponíveis, alguns com mais alcance que outros, mas é difícil mensurar. O impacto mais forte é nos participantes, que têm ali um espaço de experimentação e aprendizado prático.” O Janela marcou gerações de estudantes apaixonados pela produção audiovisual e consolidou a extensão como parte viva da experiência universitária.
Comemorando meio século de existência, a Comunicação Social da Ufes reafirma sua trajetória de excelência e inovação na formação de profissionais preparados para os desafios do século XXI. Os projetos de extensão, como o Bandejão e a Ecos Jr. são pilares fundamentais dessa construção, pois conectam teoria e prática, aproximam estudantes do mercado e da sociedade, e fomentam o desenvolvimento de habilidades essenciais para a comunicação contemporânea.
Essas iniciativas mostram que a extensão não é apenas um complemento curricular, mas um espaço vital de experimentação, aprendizado e transformação social. Ao celebrar 50 anos, o curso reforça seu compromisso com uma comunicação crítica, ética e plural, capaz de formar comunicadores humanos, criativos e engajados com a realidade que os cerca.
Assim, o futuro da Comunicação Social na UFES se desenha promissor, alimentado por uma história sólida e por projetos que, mais do que nunca, revelam o poder da universidade para transformar vidas e impactar a sociedade.