16ª Jornada

16ª Jornada - Salamanca a El Cubo de la Tierra del Vino – 36 quilômetros: “Um dia complicado”!

Para alguns peregrinos, Salamanca é a meta de seu Caminho, pois, encerram sua aventura nessa magnifica e emblemática cidade. 

Para outros, no entanto, é o ponto de partida rumo à Santiago. 

Já, no meu caso, eu havia percorrido exatos 518 quilômetros até aquela localidade, restava continuar, porquanto, minha meta final era mesmo Compostela.

A saída da cidade foi fácil, senti que não era tão extensa quanto as outras cidades maiores e, praticamente, tudo em linha reta. 

Basta partir da Plaza Mayor, depois, seguir pela Calle de Zamora, Avenida de Mirat, Paseo del Dr. Torres Villanoel, Avenida de Portugal e Plaza de la Glorieta, passando à esquerda da Plaza de Toros. 

A sinalização está no solo, contudo, quase impossível de se ver, mormente, quando ofuscada pela iluminação urbana.

Levantei às 6 h e às 7 h, iniciei minha jornada. 

Fazia muito frio, com a temperatura na casa dos 5 graus, ótima para caminhar desde que bem agasalhado. 

Apesar do horário, muitas pessoas já circulavam pelas ruas, dessa forma, se eu ficasse em dúvida, confirmaria meu rumo indagando aos passantes.

Depois de deixar a parte urbana, uma grande avenida, reta e plana, com calçadão lateral, me levou, após 1 hora de caminhada, até Aldeaseca de Armuña. 

Ali cheguei quando o dia já clareava e num movimentado bar situado à beira da “N-630”, tomei meu desjejum.

Em seqüência, seguindo as flechas e os mapas que portava, entrei à esquerda por estrada rural, em meio a imensas plantações de trigo. 

Mais à frente, passei sob um grande túnel, pois ali existem canteiros de obras que servem de suporte para a construção de uma nova rodovia.

Dois quilômetros adiante, o Caminho se achava obstruído, pois, a cancela que deveria acessar uma “finca” se encontrava fechada com cadeado. 

Cuidei de escalar o obstáculo, porém, não consegui atravessar o “Arroyo de la Encina”, logo adiante, porque a ponte que antes ali existia, fora destruída. 

Tal infortúnio acabou por obstar meus passos, vez que o rio naquele ponto é bastante largo e profundo.

Sem alternativa, precisei retornar até Aldeaseca e seguir pelo acostamento da “carretera” até uma rotatória, 2 quilômetros adiante. 

Ali, flechas indicavam que deveria seguir à esquerda, numa estrada vicinal asfaltada, por  mais 1.500 m, até a cidadezinha de Castellanos de Villiquera.

Assim, essa manobra infeliz me fez caminhar 5 quilômetros “de graça”, atrasando em uma hora meu percurso. 

Após Castellanos, o roteiro segue entre grandes plantações de sorgo e cevada, por uma estrada larga e plana, de terra batida. 

Um percurso bucólico, monótono, contudo, extremamente silencioso e agradável.

Mais 5 quilômetros percorridos e cheguei à Calzada de Valdunciel, cidade que não oferece nenhum tipo de serviços ao peregrino, no entanto, dentro do possível, é preciso aprovisionar água, pois, serão mais 20 quilômetros a vencer até El Cubo del Vino, sem local para se abastecer do precioso líquido. 

Pude ver e admirar nesta pequena povoação, a igreja de Santa Elena, construída no século XII.

Após uma pausa para recompor as energias, prossegui em frente e, um quilômetro adiante, cheguei novamente à beira da “famosa” N-630. 

Desde Salamanca, essa rodovia está sendo duplicada, de maneira que, nesse local, as obras confluíram com o caminho de terra por onde seguia o roteiro antigo, qual seja, beirando a rodovia pelo lado esquerdo.

Tentei seguir sobre o leito da estrada em construção, porém, 1 quilômetro à frente tive meus passos obstruídos por uma enorme vala. 

Pior, uma grande edificação cimentada, além de uma cerca metalizada impediam minha passagem para a “carretera”, que distava uns 100 metros dali.

O correto seria seguir pelo asfalto, logo de chofre, quando o encontrei. 

Entretanto, não detinha tal informação. 

Por conta de mais este lapso, precisei, retroceder uns 500 metros até acessar a “N-630”, quando, então, prossegui pelo acostamento da “carretera” por uns 5 quilômetros, até a “Báscula”.

Nesse local, tem origem um excelente caminho em terra, bastante arborizado, que me conduziu depois de 5 quilômetros até o Presídio de “Cárcel de Topas”, a maior penitenciária da Espanha.

Depois de passar em frente ao enorme complexo, o caminho volta a coincidir com o asfalto, e por ele segui até El Cubo de la Tierra del Vino, a primeira povoação da Província de Zamora, onde cheguei às 16 h, exausto e desgastado, em razão dos infortúnios sofridos nessa longa jornada.

Na cidade existe um novo e moderno Albergue Municipal, porém, encontrei dificuldades para localizar a pessoa responsável pelas chaves. 

Como me encontrava extremamente fatigado, optei por me hospedar próximo dali, na Pensão de Dona Carmen (10 Euros), onde também fiz minhas refeições (8 Euros).

Mais tarde, após banho e almoço, fui dar um giro pela cidadezinha. 

Aproveitei para conhecer a santa igreja, cujo padroeiro é  Santo Domingo de Guzmán e fazer compras numa “tienda”. Ao retornar à Pensão, encontrei numa rua paralela meus amigos alemães, Karl e Walfrid, que chegavam naquele instante.

Acompanhei-os até o albergue que já se encontrava aberto. 

Enquanto os dois se instalavam pude visitar calmamente o interior do prédio, observar sua construção recente que contém 3 quartos, cada um com 2 beliches.

Além disso, possui agradável sala de estar e ampla cozinha. 

No lado exterior há uma grande área cercada onde existe tanque e grandes varais para secar as roupas. 

Tudo muito limpo e bem conservado.

Na saída, vi uma placa explicativa ali instalada pela Fundação Ramos Castro. 

Nela, um pensamento me chamou a atenção:    

“Neste lugar, em que todos trabalham, dia após dia, havia uma pequena cidade. 

Por aqui passou Aníbal, o cartaginês, com seus elefantes, no ano 220 a. C e, depois, se radicou em Sanabria. 

Deixaram pegadas e trouxeram pessoas. 

Que também você, caminhante, qualquer que sejam seus passos pela vida, esforce-se em viver decentemente, cultivando as virtudes humanas todo santo dia.”

Mais tarde, quando retornei ao local de pernoite, senti-me solitário e sinceramente arrependido por não ter aguardado a hospitaleira, isto porque, certamente teria ficado muito bem acomodado, além de ter companhia para conversar.

Pensão de Dona Carmen

Resumo: Tempo gasto: 9 h - Sinalização: Boa, no entanto, é importante lembrar que o trecho entre Aldeaseca de Armuña e  Castellanos de Villiquera, deve ser feito obrigatoriamente pelo asfalto (N-630), como forma a se evitar surpresas desagradáveis como as ocorridas comigo - Clima: Ensolarado, com temperatura variando entre 4 e 17 graus.

 

Impressão pessoal: Um percurso difícil, primeiramente, pelo erro a que fui induzido a cometer logo depois da cidade de Aldeaseca de Armuña. Depois, as obras de duplicação da N-630, após a cidade de Calzada de Valdunciel, obriga o peregrino caminhar pelo acostamento da rodovia, dividindo espaço com intenso tráfego de veículos por quase 20 quilômetros, o que nos deixa inquietos e preocupados, em face o barulho e do latente perigo.