Trecho de tavessia da BR 319, em 2025
Acervo Pessoal
No decorrer das gravações dos episódios da primeira temporada do Podcast Vozes do Interior, uma das histórias que mais nos tocou está no Episódio 05, Marias da BR 319. Nele, Maria Izabel nos relata uma perda que marcou sua vida: Sua filha Francimara, que faleceu em decorrência de uma meningite. Quando ela nos contou essa história, o choro foi inevitável, das entrevistadoras e das entrevistadas. Dava pra sentir a emoção na fala dessa mulher, da dor ao dizer que ela tem certeza que um socorro mais imediato teria salvado a vida da sua princesa, da sua menininha perfeita.
Dona Maria, assim como todas as mulheres que participaram dessa temporada do Vozes do Interior, falam de como suas vidas foram moldadas, alteradas e pautadas por essa rodovia. Algumas construíram suas vidas em torno delas, outras se afastaram, umas falam com amor, outras com o luto das perdas que a presença ou a ausência desse caminho trouxeram para suas realidades.
Nesse mês de junho, algumas imagens marcantes circularam nas redes sociais: Na beira do Rio Curuçá, novamente um corpo, depois das cinco pessoas que morreram no desabamento da ponte em setembro de 2022, só que em um cenário diferente. Dessa vez, um caixão,no chão, coberto de flores, um corpo sendo levado pelo Serviço Fúnebre da Prefeitura de Careiro, aguardando para atravessar de canoa, devido à interdição da área, já que o aterro que vem sendo usado desde que a ponte caiu cedeu mais uma vez, devido à cheia do rio.
Ao mesmo tempo, Marina Silva, ministra de estado, é desrespeitada dentro do Senado Brasileiro, colocada como bode expiatório de um processo de pavimentação que não aconteceu em qualquer um dos governos anteriores, durante ou depois de Marina (ela passou 15 anos fora de qualquer governo). É muito fácil apontar uma mulher como a culpada de tudo de ruim que acontece nessa rodovia, em vez de avaliar a responsabilidade de cada autoridade no avanço ou não da obra.
Está na hora de falarmos sério sobre a situação de quem vive de fato aqui nesse território, sem pensar só na construção do corte perfeito para as redes sociais, bradando pela BR.
Falar de governança é necessidade, é pensar no povo. É se preocupar e se indignar com a humilhação que os povos do território da BR 319 sofrem, pois é inevitável pensar que se as pontes caídas fossem na região sudeste, não estaríamos desde 2022 correndo perigo de vida, passando por um aterro que pode cair a qualquer momento, passando horas em filas para a travessia.
Vamos precisar perder várias Francimaras para que nosso povo seja ouvido, e para que seja principalmente respeitado? O luto da BR-319 não é só nosso. É um retrato do descaso. Chegou o momento de transformar a dor em denúncia, e a denúncia em ação, para que as vozes do interior sejam ouvidas onde as decisões são tomadas. Antes que mais vidas sejam silenciadas.
Fernanda Souza