Passados um ano e oito meses da declaração de Pandemia de Covid-19 pela Organização Mundial de Saúde (OMS), nossos corpos e mentes tentam sobreviver ao ataque de um organismo invisível, capaz de redefinir condutas sociais, programas de governo e economias de estados. Os limites foram agudizados, mas também pulverizados.
QUEBRAQUINA traz para o centro do debate, para mesa de criação, elementos, memórias, ethos, olhares, até então silenciados e deixados de lado na grande aventura da Modernidade, centrada na concepção europeia colonizadora da existência de uma única humanidade regida por marcos e temporalidades, também únicos.
A Quina é uma mudança brusca de geometria tal qual uma dobra que acumula tensão. Quando uma coisa se quebra, ela costuma ser ou estar num ponto de dobra, ou seja, um campo de concentração de tensão. São nas quinas que geralmente encontramos as rachaduras.
Vislumbramos na Quebra, na Quebrada e nos mosaicos que estas engendram, possibilidades reais para desconstruir, reerguer e inspirar novas propostas. Propostas, estas, que transbordam as Quinas de nossas casas-corpos, fictícias ou reais, e permitam cartografar um agir-devir criativo inspirado na diversidade, na pluralidade das formas de vida, de existências e de hábitos.
No transbordamento das Quinas chegam as filosofias e modos de fazer de todes que, mesmo rotulados pela face perversa da Modernidade como sub-humanos ou inumanos, meio esquecidos pelas bordas do planeta, mantiveram-se atentos a outros valores, em consonância com o ritmo da natureza, são, a exemplo do que define Ailton Krenak, os residentes das margens dos rios, das beiras dos oceanos: caiçaras, indígenas, quilombolas, aborígenes, etc. Todes que habitam as beiras, que vivem nas frestas, abrem caminhos e quebram as visões e possibilidades hegemônicas de mundo e de ser.
EIXOS TEMÁTICOS
Com o intuito de agregar diferentes pensares que possam explicitar estas insurgências, em diferentes linguagens e em compasso com as ferramentas que nos cercam, elencamos nossas provocações em formato de hashtags; pensadas sempre para acionar sentimentos, principiar ações.
#TRANSBORDAR
#CONJUGAR
#RE-VISAR
# +1
Hashtag 1: Transbordar (sentidos, percepções, leituras)
Um convite a mergulhar nas inquietações que nos afligem, nas disputas latentes, nos flancos abertos de debate para, a partir do tensionamento, retirar-lhes as potências necessárias para a transformação. Sugerimos como trabalhos deste eixo, temas que tratam de reflexões da atualidade, mas também de períodos de contratempos da humanidade (guerras, conflitos, pandemias) traduzidas na arte.
Hashtag 2: Conjugar (saberes, lutas, trajetórias)
Um desafio de traduzir em arte trajetórias silenciadas ou subalternizadas que hoje, por consciência política, necessidade econômica ou mesmo ambiental, sejam capazes de propor novas formas de existência entre as pessoas, os ecossistemas que nos rodeiam. Sugerimos que trabalhos deste eixo podem visitar e performar momentos, ritmos e velocidades que reflitam sobre métodos decoloniais, hegemonia cronológica, sobre o tempo-relógio, tempo-fábrica, sobre os seres-engrenagens.
Hashtag 3: Revisar (visar de novo, reconstruções, reconfigurações)
Diante da constatação de que uma parte da humanidade produz mais de 2 bilhões de toneladas de lixo por ano (ONU, 2018), é um dever, mas também um desafio, aprender a re-utilizar, re-tratar. O QUEBRAQUINA propõe um sobrevoo sobre nossas filosofias, nossos saberes, nossas histórias; um olhar sobre o que não foi visto que agora possa ser quebrado e utilizado no grande mosaico que sustentará nosso porvir. Sugerimos temas que dialoguem com cosmovisões que se opõem à colonialidade cosmogônica, que engendrou a realidade de um mundo aquecido, apocalíptico.
Hashtag +1: Experimentar (deslocamentos, alteridade, utopias)
O último encaminhamento visita o que não nos toca de maneira imediata; o que não cabe no binarismo (em suas múltiplas facetas); o que quebrou-se demais para traduzir-se em formas (J. Mombaça, 2021). Todes que não cabem, que não se percebem e não se enfileiram em #hashtags pré-definidas, mas que diante das urgências, querem participar, trazer propostas que, por não terem sido catalogadas, seguem guardadas no não-lugar. Sugerimos temas que rompam com visões de mundo duais que nos formatam, excluindo os devires, fluindo o que está nas intersecções de gênero, raciais, políticas, filosóficas, artísticas.