Vocês devem ler esses versos e tentar reconhecer padrões neles, classificá-los, agrupá-los segundo características comuns.
A ideia é que você possa ensinar uma pessoa a fazer um verso de um determinado grupo.
Seguem alguns conceitos que podem ser importantes quando tentando classificar os versos:
quantidade de versos
quantidade de estrofes
composição das estrofes (rimas e quantidade de versos)
sequência de rimas em estrofes
posição de sílabas tônicas nos versos
número de sílabas poéticas
"Criei-me na terra do homem vaqueiro
com leite de vaca, com queijo e com nata
com feijão macaça, pipoca e batata
Com carne de peba e tatu verdadeiro
tangendo jumento e cortando cardeiro
caçando graveto pra mãe cozinhar
fui pouco a escola não pude estudar
meu pai era pobre não tinha fortuna
formei-me com Cristo na sua tribuna
cantando galope na beira do mar"
---
Deixe o batuque do axé
pro carnaval da Bahia
e a insana pornografia
não troque no arrasta-pé.
Rapariga e cabaré?
Em nenhuma ocasião.
E o forró da ostentação
Reinando o falso interesse?
Não faça um negócio desse,
Deixe junho pro São João.
Pelo menos uma vez
Esqueça Michel Teló
E deixe eu dançar forró
Os trinta dias do mês.
Um disco de Marinês,
O gogó de Assisão
E o nosso Rei do Baião,
Cantando Zé Marcolino,
Só esse mês é junino,
Deixe junho pro São João.
Com seu povo tenha zelo,
Respeite nossa raiz,
Não ouça o cantor que diz
Que o melhor é o desmantelo.
Deixe a escova do cabelo
De Wesley Safadão
Pro Programa do Faustão
Que aqui é outra lisura,
Não mate nossa cultura,
Deixe junho pro São João.
Deixe a tal da muriçoca
Se enganchar no mosqueteiro,
Contrate Alcimar Monteiro
Que nossa música toca.
Deixe o funk carioca
Tremendo seu paredão
Pra quando uma guarnição
Passar baixando o volume,
Perca esse fútil costume,
Deixe junho pro São João.
Nós precisamos parar
A superficialidade,
Pois cultura de verdade,
Jamais pode se apagar.
É triste se constatar
Essa covarde inversão,
E o povo sem ter noção
Do próprio valor que tem:
Faça a você esse bem:
DEIXE JUNHO PRO SÃO JOÃO!
----
Vivi oceanos de grandes amores
Banhei-me em riachos de águas fluídas
Do centro das matas que descem das vidas
Pintando seus quadros em tons de mil cores
Sem mais fantasias, sou filho das dores
Canoa encalhada, não posso pescar
Num barco à deriva me vi naufragar
Por não encontrar o caminho dos ventos
Daqui, sem veleiro, derramo lamentos
De amores perdidos na beira do mar
- versos de Greg Marinho
----
"Nas vezes que estou bebendo
Alguma coisa aproveito
Se for cerveja, eu não quero
Se for cachaça, eu aceito
Que é pra ver se apago o incêndio
Que a mágoa fez no meu peito"
----
"A dor maior que eu senti
Foi a dor da orfandade
Mamãe partiu, eu fiquei
Com doze anos de idade
Não fui no caixão com ela
Mas juro que deu vontade"
----
"O pecado pra mim é testemunha
Pois ladeia o meu peito o tempo inteiro
Do primeiro ao último parceiro
Dou um nome diferente, faço alcunha
O vermelho é perene em minha unha
Meu trabalho é melhor sendo as escuras
Sou alguém que procura umas procuras
Que navegam no rio do gemido
E o silêncio da noite é que tem sido
Testemunha das minhas amarguras"
----
"Eu moro lá no sertão
Num lugar bem esquisito
A geladeira é um pote
O guarda-roupa, um cambito
O transporte é um jumento
E o telefone é um grito"
----
"Por que existem uns felizes
E outros que sofrem tanto?
Nascidos do mesmo jeito
Criados no mesmo canto
Quem foi temperar o choro
E acabou salgando o pranto?"
-----
"Eu nunca tive expressão
Pra dizer quem foi meu pai
Porém do meu coração
Sua lembrança não sai
Se teve falhas na terra
Como todo mundo erra
Peço que Deus o perdoe
Partiu, me deixou partido
Antes eu tivesse ido
No lugar dele que foi"
-----
"Vou te deixar... partirei
Sem saudade e sem temer
Por um motivo eu te amei
Por muitos te esquecerei"
---
Numa cantoria em 1973, João Furiba cantava em São José do Egito com Lourival Batista. Já era tarde e Furiba, que estava acompanhado de uma de suas conquistas amorosas, fez um verso dizendo que ia embora, ao que Louro respondeu:
"Furiba não vá agora
Com essa garota sua
Eu conheço alguns malandros
Que bolem até com a lua
Carregam ela e lhe deixam
Vagando só pela rua"
Furiba retrucou:
"Mais perigoso é a sua
Ficar em casa sozinha
Você entra pela sala
Sai outro pela cozinha
Eu, pra evitar um chifre
Pra onde vou, levo a minha"
---
"Sou poeta e me sujeito
A viver esta emoção
Cantando as dores da alma
Eu vejo com gratidão
Que o meu cantar é tão simples
Como a poeira do chão"
---
Fiz farofa de pão de mucunã,
Me inspirei no velhinho do roçado,
O sertão é o palco esverdeado
Que eu ensaio as canções do amanhã...
Minha artista da seca é acauã,
No inverno, o carão é meu cantor,
Um imbu espremido é meu licor
E um juá eu não dou por um confeito,
Obrigado meu Deus por ter me feito
Nordestino, poeta e cantador!
---
Eu não sei onde é o seu lugar
Se ele prega a justiça ou prega a paz
Mas visita pra mim ele não faz
E isso aí só faz é me revoltar
Se um dia na vida eu lhe encontrar
Eu lhe chamo de louco e de chacal
Lhe ameaço na ponta do punhal
Nunca mais ele canta Jingle Bell
Eu não sei onde está Papai Noel
Que não traz meu presente de Natal
---
"Dos meus prazeres de outrora
Que passaram de momento
Tenho como pagamento
As consequências d'agora
De minha vida uma hora
É hoje um fardo pesado
Sem tempo sentenciado
Quem me prendeu não datou
E a natureza tomou
Tudo quanto tinha dado"
---
Tive toda carcaça de bacana
Aprendi dar calote, puxar saco
Mostrar cara de forte sendo fraco
Mostrar pose de rico sem ter grana
E na listagem da feira da semana
Quando a nota do bolso estava escassa
Poderia faltar feijão e massa
Mas um litro de rum tinha que ter
Por incrível que possa parecer
Já fiz muita besteira com cachaça
----
Nessa época meu gosto social
Era mais um motivo de galhofa
Meu almoço era um resto de farofa
Minha cama um pedaço de jornal
O boteco meu clube social
A meota de cana minha taça
Os colegas de copo minha raça
O enterro de um bêbado meu lazer
Por incrível que possa parecer
Já fiz muita besteira com cachaça
----
"Um dia no paraíso
Jesus fez grande sermão
Na velha casa de Adão
Foi um dia de Juízo
São Pedro que tava liso
Ali vendeu um jumento
Por 24 e 'quinhento'
Pra comprar 'cumidoria'
Foi muito pão nesse dia
Diz o Novo Testamento"
---
"Jesus nasceu em Belém
Conseguiu sair dali
Passou por Tamataí
Por Guarabira também
Nessa 'viage' de trem
Foi 'pará' no entroncamento
Não encontrando aposento
Dormiu na casa do cabo
Jantou cuscuz com quiabo
Diz o Novo Testamento"
---
"Quando Dom Pedro Segundo
Governava a Palestina
E Dona Leopoldina
Devia a Deus e ao mundo
O poeta Zé Raimundo
Começou castrar jumento
Teve um dia um pensamento
Tudo aquilo era boato
Oito noves fora quatro
Diz o Novo Testamento"
---
Os carinhos da mãe estremecida
Os brinquedos do tempo de criança
O sorriso fugaz de uma esperança
A primeira ilusão da nossa vida
O adeus que se dá por despedida
O desprezo que a gente não merece
O delírio da lágrima que desce
Nos momentos de angústia e de desgraça
Passa tudo na vida, tudo passa
Mas nem tudo que passa a gente esquece
---
"Alguém já me perguntou
O que são mesmo os poetas?
Eu respondi: são crianças
Dessas rebeldes, inquietas
Que juntam as dores do mundo
Às suas dores secretas"
(Dimas Batista)
---
Percorro os quadrantes do sul e do norte
Buscando a verdade jamais atingida
Percebo que a morte precisa da vida
Assim como a vida precisa da morte
No campo da luta só vence o mais forte
No entanto o vencido não pode parar
Prossegue na vida dos filhos, no lar
Produz outras formas de vida na cova
Conforme o processo que a tudo renova
Assim como as ondas na beira do mar
----
Já não tenho meus dentes naturais
Que mordi rapadura e biscoito
Cadê minha pressão doze por oito
Que no peito não tá batendo mais
Dou um passo pra frente dois pra trás
Assim mesmo com pouca agilidade
Que as feridas abertas pela idade
Ninguém seca com pano de compressa
Vi o tempo passando tão de pressa
Que nem lembro que tive mocidade
João Paraibano
---
Louro Branco, improvisador ímpar que viveu um passado de extravagâncias, converteu-se ao protestantismo após uma cachaçada. Cantando com o grande poeta Valdir Teles em SP, após sua conversão, terminou uma estrofe dizendo:
"Palavrão não dá certo para mim
Que sou crente em Jesus de Nazaré"
Valdir, conhecendo o passado de Louro, assim respondeu:
"Você diz que é crente mas não é
Assumiu com Jesus um grande débito
Pois você sempre foi um grande adepto
De umbanda, xangô e candomblé
Viveu sempre cantando em cabaré
Engolindo aguardente até cair
Vem agora querendo me iludir
Doido branco da cara sem-vergonha
Vá fumar seu cigarro de maconha
Encha o rabo de cana e vá dormir"
Este episódio é relatado no livro "O Ídolo Que Não Morreu", de Diniz Vitorino, que termina o relato com um merecidíssmo elogio:
"Um Valdir Teles desse faz a viola agradecer-lhe"
----
A filhinha de um mendigo
Sentada aos seus pés, num beco
Comendo um pão doce e seco
Diz: "Papai, coma comigo"
E o velho pensa consigo:
"Meu Deus, mudai sua sina
Pra que a minha pequenina
Não sofra o que eu sofro agora"
Ri a filha, o velho chora
Depois que a feira termina
---
Se o pranto é irmão do riso
Nascidos do mesmo amor
Tanto me faz estar rindo
Como sentindo uma dor
Que o sofrimento é da vida
Como o perfume é da flor
---
Pra dividir minha herança
Ma faltava um candidato
Aí fui num orfanato
Da cidade de Esperança
Adotei uma criança
Morena, da minha cor
Só não vai ser cantador
Porque é uma menina
Quem adota um filho assina
Um atestado de amor
(Adauto Ferreira)
---
Meu filho nunca faças o que eu fiz
E o que eu fiz não procures nem saber
Fite bem meu semblante que lhe diz
O que eu tenho vergonha de dizer
Não roubei, não matei, porque não quis
Ceifar vidas humanas pra viver
O meu mau foi cantar pra ser feliz
Tendo dor pra chorar até morrer
Como é triste, meu filho, ser poeta
E fingir que é filósofo, que é profeta
Não reunia multidões, pregar à esmo
E aos céus enviar cantos fingidos
E tentar consolar os oprimidos
Quando o mais oprimido sou eu mesmo
---
"Paraíba, minha terra
Tudo quanto em mim se encerra
De pureza e de Verdade
Vai nesses versos que são
A voz do meu coração
O grito de uma saudade"
(Zé da Luz)
---
No fim de sua vida (viveu mais de 90 anos), Pinto do Monteiro já não enxergava nem andava. Seu grande amigo e poeta João Furiba, com quem fez cantorias históricas, foi visitá-lo nesta época. Entrou sem que Pinto percebesse (pulou a janela) e surpreendeu-o com esses versos:
Há muito tempo eu não vinha
A esta santa moradia
Encontrar o velho Pinto
Me traz muita alegria
Que é mesmo que eu ganhar
No bolão da loteria
Pinto, que estava deitado como que dormisse, virou-se rapidamente e respondeu:
Jamais imaginaria
Que você chegasse agora
Com essa tua presença
Tive até uma melhora
Quer ver eu ficar bom mesmo
É quando você for embora
---
Louro Branco e Jorge Macedo em desafio (trecho):
[JM]
Você já foi na favela
Onde a polícia socorre
Foi a baixo meretrício
Bebeu, amou, tomou porre
E agora falando em briga
É o primeiro que corre
[LB]
Eu até bebendo porre
Fiz menino feio e belo
Hoje eu não faço mais nada
Nem brugela e nem bruguelo
Que ninguém bate no prego
Sem levantar o martelo
[JM]
Sei que você já foi belo
Mas perdeu a condição
Que o tempo te transformou
E com essa transformação
Eu já vi que sua arma
Esgotou a munição
[LB]
Meu já nasceu Bastião
Lula, Pedro e Juarez
Nasceu Tereza Joaquina
Nasceu Maria Inês
Hoje se nascer mais um
Foi Zé Pilintra que fez
---
Duas estrofes, de dois grandes poetas. Lourival Batista, cantando em desafio sobre conquistas amorosas, disse:
"Isso foi antigamente
Quando você era macho
Mas um sujeito perverso
Passou-lhe a faca por baixo
O sangue desceu na perna
E o gato aparou o cacho"
Seu oponente, entretanto, era Pinto do Monteiro, célebre cantador (por muitos considerado o maior de todos) que não levava desaforo pra casa e não tinha papas na língua. Pinto responde prontamente:
"Enfraquecido me acho
Por um cabra mau e bruto
Quando correu a notícia
Que perdi esse produto
Tua mãe chorou três dias
E ainda hoje tá de luto"
---
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
---
Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar me, e novas esquivanças;
que não pode tirar me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.
Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.
Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.
Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.
Luís de Camões
-----
Eu cantarei de amor tão docemente,
Por uns termos em si tão concertados,
Que dois mil acidentes namorados
Faça sentir ao peito que não sente.
Farei que amor a todos avivente,
Pintando mil segredos delicados,
Brandas iras, suspiros magoados,
Temerosa ousadia e pena ausente.
Também, Senhora, do desprezo honesto
De vossa vista branda e rigorosa,
Contentar-me-ei dizendo a menor parte.
Porém, pera cantar de vosso gesto
A composição alta e milagrosa
Aqui falta saber, engenho e arte.
Luís de Camões
---
Responderam-me a chorar,
Com voz de quem muito amou:
Sabeis que dor os desfez,
Ou que traição os gelou?
---
Desabafa no meu peito
Essa amargura tão louca,
Que é tortura nos teus olhos
E riso na tua boca!
---
Com tanta contradição,
O que é que a tua alma sente?
És alegre como a aurora,
E triste como um poente...
---
Enquanto teus lábios cantam
Canções feitas de luar,
Soluça cheio de mágua
O teu misterioso olhar...
---
A mulher tem na face dois brilhantes
Condutores fiéis do seu destino
Quem não ama o sorriso feminino
Desconhece a poesia de Cervantes
A bravura dos grandes navegantes
Enfrentando a procela em seu furor
Se não fosse a mulher mimosa flor
A história seria mentirosa
Mulher nova, bonita e carinhosa
Faz o homem gemer sem sentir dor
---