"A Igreja nunca considerou um estilo como próprio seu, mas aceitou os estilos de todas as épocas, segundo a índole e condição dos povos e as exigências dos vários ritos, criando deste modo no decorrer dos séculos um tesouro artístico que deve ser conservado cuidadosamente. "
Constituição Conciliar - Sacrosanctum Concilium
A arquitetura sacra, em suas diversas manifestações, revela-se como reflexo das transformações estéticas e culturais da humanidade. Cada época imprimiu nesses espaços marcas de seus valores, linguagens artísticas e modos de compreender o sagrado, traduzindo em formas arquitetônicas o espírito de seu tempo. Dessa maneira, a arquitetura sacra não apenas materializa a fé, mas também acompanha e expressa as mudanças da própria sociedade.
Arquitetura Sacra pós concílio Vaticano II
Os concílios realizados pelo Vaticano têm como objetivo atualizar práticas e doutrinas católicas, por meio de uma assembleia de bispos do mundo inteiro e teólogos e representantes de várias partes da igreja.
O último concilio vaticano, foi realizado entre 1962 e 1965, no vaticano, convocado pelo Papa João XXII e concluído por Paulo VI. Apesar de não mencionar diretamente diretrizes para a arquitetura sacra, sua nova concepção que buscava maior participação dos fieis permitiu um novo olhar para a estrutura da igreja.
As adaptações que ressoavam na arquitetura ocorrem por conta do novo olhar da relação entre o espaço sagrado e a experiência e participação do fiel. O principal texto que fala diretamente disso é a Constituição Sacrosanctum Concilium (1963), sobre a sagrada liturgia. Nos capítulo VII é abordado brevemente quanto a questão da arte sacra e seus estilos.
O decreto traz alguns pontos importantes, que são agentes da mudança da disposição do espaço religioso no mundo moderno:
A participação ativa dos fiéis
O que impactou a disposição da nave e do fluxo dos fiéis, além disso a participação dos fiéis foi fundamental para abraçar a cultura dos diversos povos católticos no mundo.
Nobre simplicidade
A Igreja valoriza a presença de obras belas no espaço sagrado, mas acredita que a beleza seja marcada pela nobre simplicidade, sem ostentação, sempre a serviço da liturgia e da comunidade.
Altar e disposição do espaço
Foi reforçada a centralidade do altar e a importância de que sua posição facilite a participação da assembleia. Isso inspirou a prática comum, depois do Concílio, de ter altares voltados para o povo.
Valor do patrimônio histórico e artístico
O Concílio destacou a responsabilidade da Igreja em conservar o patrimônio artístico, mas também em abrir espaço para que novas obras expressem a fé do tempo presente.
esquema de Luiz Cunha, 1955 (Captivo, 2017)
A arquitetura sacra, em suas diversas manifestações, revela-se como reflexo das transformações estéticas e culturais da humanidade. Cada época trouxe nesses espaços marcas de seus valores, linguagens artísticas e modos de compreender o sagrado, traduzindo em formas arquitetônicas o espírito e pensamento de seu tempo.
A arquitetura de Brasília é muito característica de seu período inventivo e as grandes mudanças que cometeram o país, devido à mudança da capital federal. No texto de Luciane Scotta (2010), a autora traz um compilado de nove edifícios religiosos de Oscar Niemeyer e ressalta a importância da sua produção religiosa, notando que ele se dedicou de maneira especial a este tipo de projeto e que a maioria de suas igrejas e capelas se encontram na Capital.
Em Brasília, a arte religiosa compõe a paisagem da capital, revelando o diálogo entre modernidade, espiritualidade e identidade nacional. Inserida no contexto do projeto urbanístico de Lucio Costa e das criações arquitetônicas de Oscar Niemeyer, ela desempenha papel fundamental na construção da paisagem simbólica da cidade.
A relevância da arquitetura sacra em Brasília vai além do culto litúrgico. De acordo com Nóbrega (2017), configura-se como símbolos culturais e identitários, representando a utopia modernista de uma capital que deveria ser, ao mesmo tempo, expressão da modernidade com o sagrado. Ao inovar na forma, na espacialidade e na simbologia, a arquitetura sacra brasiliense reafirma o papel da cidade como ícone do modernismo e como espaço onde o espiritual encontra materialidade na arte e na arquitetura.
Entre os principais exemplos, destacam-se a Catedral Metropolitana de Brasília (1970), símbolo da capital e obra-prima da arquitetura religiosa moderna, com sua estrutura hiperbolóide em concreto armado e vitrais que criam uma atmosfera de transcendência; a Igrejinha Nossa Senhora de Fátima (1958), primeira capela construída em Brasília, marcada pela simplicidade formal, e os famosos azulejos de Athos Bulcão. Esses templos não apenas revelam a inovação plástica de Niemeyer, mas também reforçam a centralidade da fé na concepção da nova capital.
Apesar de o objeto deste trabalho não se concentrar na concepção de uma igreja ou catedral , espaços tradicionalmente voltados ao culto comunitário e ao público em geral, o estudo das edificações religiosas de grande porte mostra-se fundamental para compreender a evolução da arquitetura sacra no contexto em que o projeto está inserido.
1957
Ermida Dom Bosco
1958 - 1970
Igrejinha de Nossa senhora de Fátima
1958 - 1970
Catedral metropolitana de Brasília
1963
Santuário Dom Bosco
1991 - 1994
Catedral militar Rainha da Paz
2022
Paroquia Sagrada Família - Park way
Croquis: elaborados pelo autor
A arquitetura monástica e conventual compõe uma parte singular da arquitetura sacra, cuja processo reflete a adaptação do espaço físico às necessidades espirituais e sociais da comunidade religiosas. Inicialmente, é valido diferenciar os principais espaços de clausura, já que os conventos são designados às comunidades religiosas cujo membros às ordens medicantes, e normalmente estão integrado a malha urbana, contudo os mosteiros são pertencentes às outras ordens religiosas, particularmente a de Cister. Normalmente estão fora do perímetro da cidade (Caldeira, 2011).
A ordem mendicante surgiu no final da Idade Média, em um contexto pós-feudal de crescente urbanização, onde as classes mais pobres se tornavam mais visíveis nos espaços públicos. A ordem foi uma resposta à necessidade de o clero participar ativamente na sociedade, por meio da caridade e de um serviço apostólico focado nos pobres. Entre as ordens mendicantes mais famosas estão os franciscanos, dominicanos, mercedários e carmelitas (séc. XIII), cuja vida unia o ideal contemplativo ao ativo, abraçando a vida em comunidade.
A Ordem de Cister, por sua vez, fundada na Borgonha há mais de mil anos, é conhecida por centrar seus ideais na simplicidade monástica, na pobreza evangélica, na contemplação e no silêncio. Entre a ordem Cisterciense uma das mais famosas está a beneditina. O primeiro mosteiro feminino dessa ordem surgiu em 1125, composto por freiras da abadia de Jully.
Nos mosteiros cistercienses, a arquitetura era marcada pela rigidez e monumentalidade. Inspirados em modelos masculinos, esses conjuntos priorizavam a separação dos espaços internos por meio de grades, muros de clausura e claustros bem definidos, já que existia uma clausura mais rígida. As igrejas, de grandes dimensões, reforçavam o caráter austero e a centralidade da vida espiritual, estabelecendo uma clara distinção entre o espaço das monjas e o mundo exterior.
Nos conventos das ordens mendicantes, como franciscanos e dominicanos, se adotavam uma arquitetura mais simples e funcional. Suas construções apresentavam menor densidade de materiais e formas mais modestas, privilegiando a integração entre o espaço religioso e a cidade. Essa característica refletia não apenas a simplicidade formal, mas também o ideal de maior proximidade com a comunidade pelo seu viés social.
A circulação também se distinguia nas duas ordens, entre os cistercienses. Havia um controle rígido da circulação, com barreiras físicas que delimitavam de forma clara os espaços acessíveis às monjas. Nos conventos mendicantes, embora o isolamento fosse mantido, as regras eram um pouco mais flexíveis, permitindo maior contato com o exterior e facilitando a relação o povo.
Durante o século XVI, a igreja propôs orientações para as construções, que eram simplesmente um conjunto de habitação e oração. Além disso outro elemento citado nos documentos do concilio do vaticano, que era caracterizado por um galeria coberta e geralmente arqueada, que forma os quatro lados de um pátio interior (CARVALHO, 2022 ). Os dormitórios seriam espaços simples próximos a igreja para ofícios noturnos e diurnos.
Fonte: Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura. (Carvalho,2022 )
Mosteiro de Santo Antão
O primeiro mosteiro registrado se localiza no Egito, datado do século IV.
Mosteiro localizado na Grécia, contruído por São Simão no início do séc XIV
Mosteiro Simons Petras
Foto: Travis Dove
Foto: Celestino Manuel
Convento de São Bento de Castris
Convento feminino de Cister, com fundação mais antiga no sul do país de Portugal, é datado de séc XII
O mosteiro de Batalha está situada em Portugal, e foi construído a mando de João I, após a vitória na Batalha de Aljubarrota.
Mosteiro da Batalha
Foto: Thiago de Andrade
Foto: Sanctuaire de Lisieux
Mosteiro das Carmelitas Descalças
Situado em Lisieux, na França, é conhecido por ser onde Santa Teresinha do Menino Jesus passou grande parte de sua vida.
Fundado em 1585, é considerado o convento mais antigo do Brasil, e está situada em Olinda -PE, Brasil.
Convento de São Franscisco
Foto: IPHAN
Na análise do estado da arte analisado na elaboração do trabalho foram analisados os arranjos de congregações que oferecem o regime de pensionato ou retiro dentro de suas congregações, como o caso das irmãs oblatas do menino Jesus, congregação de São Pedro Canísio, aberta em Brasília desde 1963.
Imagens: google maps
Situada na SGAN 906, o espaço da congregação é um espaço de formação e acolhimento de mulheres
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A congregração situada na SGAS 908, acolhe mulheres, além do espaço destinado as irmãs
Imagens: google maps
O lar é um centro social que oferece pensionato na SGAN 906 Norte
Imagens: google maps
Além de oferecer espaço destinado aos sacerdotes também oferece serviços de hospedagem para retiro espiritual tanto individual, como em comunidade
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BAZIN, Germain. A arquitetura religiosa barroca no Brasil. Tradução de Glória L. Nunes. Rio de Janeiro: Record, 1956. 2 v.
CALDEIRA, Manuel Arlindo. O mosteiro ideal: o espaço conventual. In: CALDEIRA, Manuel Arlindo. Mulheres enclausuradas: as ordens religiosas femininas em Portugal nos séculos XVI a XVIII. Lisboa: Grupo LeYa, 2021.
CAPTIVO, Maria Teresa Manso. Arquitetura de espaços religiosos contemporâneos: análise morfológica. 2016. Dissertação (Mestrado em Arquitetura) — Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2016.
CARVALHO, Roberta Maria de Oliveira; SOUZA, Milena Andreola de. Arquitetura sacra: um estudo sobre a composição de conventos.
CONCÍLIO VATICANO II. Constituição sobre a sagrada liturgia: Sacrosanctum Concilium. Roma: Vaticano, 1963. Disponível em: https://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/index_po.htm. Acesso em: 3 set. 2025.
CUBAS, Caroline Jaques. A vida religiosa feminina no Brasil durante a segunda metade do século XX: olhar historiográfico. Revista Expedições: Teoria da História & Historiografia, v. 5, n. 2, jul./dez. 2014. Disponível em:
IPHAN. Lista de bens culturais inscritos nos Livros do Tombo (1938-2012). Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=3263. Acesso em: set. 2025
NÓBREGA, Mariana de Sousa. Igrejas católicas: estudo sobre o desenvolvimento da arquitetura sacra e sua concepção nos dias de hoje. 2017. Monografia (Graduação em Arquitetura) — [Instituição], São Luís, 2017.
NUNES, Lígia. Sistemas de mediação, elementos construtivos e espaciais: o exemplo da arquitetura das casas monásticas femininas de clausura. 2011. Artigo — Universidade Lusófona do Porto, Porto, 2011.
ROGERS, Rebecca. Congregações femininas e difusão de um modelo escolar: uma história transnacional. Pro-Posições, v. 25, n. 2, maio/ago. 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pp/a/YrfNKfpJ96cghcWKt86yqfJ/?lang=pt. Acesso em: 26 set. 2025.