Solstícios e Afélios são coincidentes?

No dia 20 de junho (sábado) às 18:43 (horário de Brasília) e 21:43 (UTC) registramos a chegada do Solstício de inverno. Da mesma forma, conforme o Anuário Astronômico Catarinense 2020 (página 39), estamos nos aproximando do afélio da Terra. Já adiantamos que não são de mesma data..., mas a dúvida é, são eventos com datas coincidentes? Um evento depende do outro? Antes de responder a essas perguntas, vamos explicar o que é cada evento deste e mostrar que a observação pode nos ajudar a identificar os mesmos.

O Solstício é o período do ano que indica uma posição do Sol na sua eclíptica, ou seja, a sua trajetória no nosso referencial da esfera celeste. E isto se dá pela inclinação da Terra com relação ao seu eixo que é de 23°27’ em referencial ao equador celeste. É justamente esta inclinação em relação ao equador celeste que proporciona as estações do ano. Neste vai e vem dos astros, em conformidade com nossa posição em relação ao Sol, podemos ter a definição das quatros estações.


Neste sentido, nós temos o Solstício de inverno e Solstício de verão. É muito importante ressaltar que também há os chamados Equinócios, que são os marcos divisores de primavera e outono, mas esse papo ficará para outra postagem.

Quando o Sol está no Solstício de inverno indica que está na máxima declinação norte, e, portanto, a luz solar incide diretamente na região do trópico de Câncer. Isto significa que no Hemisfério Norte temos dias claros mais prolongados, enquanto no Hemisfério Sul ficamos com dias claros menores. Inclusive, isto explica o fenômeno conhecido como Sol da meia noite no polo Norte.



Figura 1: Estações do ano por conta da inclinação do eixo da Terra em 23,5° entre o equador da Terra e a eclíptica. Extraído da obra de Oliveira e Saraiva (página 47, 2013).

Figura 2: Círculos diurnos do Sol em conformidade com a inclinação do eixo terrestre. Extraído da obra de Oliveira e Saraiva (página 26, 2013).

O termo afélio vem do latim, "aphelium", é um termo com derivação que significaria longínquo, ou seja, que está mais distante. Dentro do significado astronômico, e para o nosso referencial, seria aquele ponto em que a Terra está mais distante do Sol. Quando a Terra está no seu ponto de afélio, indica que tem a sua menor velocidade de translação da órbita em torno do Sol.

Um dado importante é que no afélio estamos aproximadamente 152,1 km de distância do Sol, enquanto no chamado periélio (quando está mais próximo) estamos a uma distância de 147,1 km. Portanto, não há uma diferença considerável entre afélio e periélio em termos astronômicos. Neste sentido, devemos ficar alertas com relação a algumas imagens que mostram a órbita da Terra em torno do Sol de forma de elipse que apresenta uma exagerada proporção de afélio e periélio. Reproduzimos um pouco esta explicação na imagem a seguir (fora de escala) e com a representação da elipse da órbita. É sempre bom ressaltar que a nossa elipse é quase circular, sendo que a nossa excentricidade orbital tende a valores próximos a 0 até 0,06.

Figura 3: Representação de afélio e periélio com as indicações de distâncias. Extraído do site time and date (adaptado).

A informação do Anuário Astronômico Catarinense 2020 indica para o afélio da Terra é para o dia 4 de julho. Perceba que a primeira pergunta desta postagem está respondida: os eventos não são coincidentes. Mas isso só para 2020? Não, para todos os anos. Inclusive, no site da astro da UFRGS há um link de estações do ano que indica uma tabela de Equinócios, Solstícios, Periélio e Afélio para o período de 1992 até 2025. Percebemos que nesta tabela, o periélio sempre ocorre em janeiro, enquanto o afélio ocorre em julho. Apesar das proximidades das Estações do Ano, não são eventos com datas coincidentes e não dependem um do outro para acontecer. Visto a parte teórica, será que a observação pode nos ajudar a identificar estes eventos? A resposta é sim!

Vamos começar com o Solstício. O que define as Estações do ano é o movimento do Sol na nossa eclíptica e este movimento pode ser evidenciado utilizando um instrumento simples chamado gnômon. Um gnômon caracteriza-se como uma haste vertical que é fixada ao solo com o objetivo de identificar a sombra formada pelo Sol em determinados horários e períodos do ano e pode servir para construir um relógio solar.

O gnômon portanto é um instrumento simples que pode descrever a trajetória que o Sol aparentemente faz devido a rotação da Terra em torno de seu eixo e, experimentalmente, podemos identificar pela sombra produzida pelo Sol as características ou informações que evidenciam determinadas Estações do ano.

Um experimento prático de montagem de um gnômon podemos ver no livro de Oliveira e Saraiva (2013), onde temos, além de obviamente o gnômon montado, cordas que ligam a ponta superior deste instrumento até ao ponto que a sombra foi formada no chão. Pode-se fazer este experimento para diversos horários e vamos perceber um padrão da linha da sombra.


Figura 5: Montagem de gnômon na cidade de Porto Alegre no solstício de inverno. Extraído da obra de Oliveira e Saraiva (página 44, 2013).


Com relação ao afélio, podemos usar de uma trigonometria básica para identificar o afélio, um pouco como fez Aristarco de Samos (310 a.C – 230 a.C.) na Grécia Antiga. Com a medição do diâmetro aparente do Sol, conseguimos ter uma ideia de afélio e de periélio. Inclusive, fizemos uma postagem indicando como poderíamos medir o diâmetro aparente do Sol. O diâmetro aparente nos indica, do nosso referencial, a aproximação ou afastamento de determinado astro. Se temos as informações de diâmetro aparente do Sol, podemos calcular usando uma trigonometria básica a distância Terra-Sol e com ajuda da Lua! Este diâmetro aparente nos dá uma informação angular do disco do Sol em relação ao observador da Terra, da mesma forma que o Sol dá uma inclinação angular para um eventual observador da Lua. Sabendo a distância da Terra até a Lua, conseguimos, por uma trigonometria básica, chegar na distância Terra-Sol, usando das fases de quarto crescente e quarto minguante da Lua como vemos na imagem a seguir:

Figura 6: Montagem similar feita por Aristarco de Samos na Grécia Antiga.

Agora, fica a dica para os nossos admiradores do Sol, podemos fazer o experimento utilizando o gnômon e medir o diâmetro aparente do Sol no dia 04 de julho. Bora?



Referências


[1] RIDPATH, Ian. Guia Ilustrado Zahar de Astronomia. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. 2.ed., Rio de Janeiro: Zahar, 2008.


[2] OLIVEIRA FILHO, Kepler de Souza. OLIVEIRA, Maria de Fátima. Astronomia e Astrofísica. 3d., São Paulo: Livraria da Física, 2013.


[3] AMORIM, Alexandre. Anuário Astronômico Catarinense 2020. 1.ed., Florianópolis: Edição do autor, 2019.


[4] Tabela de Equinócios, Solstícios, Periélio e Afélio. Disponível em: http://astro.if.ufrgs.br/estacoes.html

Publicação original do próprio autor desta página disponível em: https://uba-solar.blogspot.com/