Opinião dos leitores

Texto da orelha, de José Francisco Botelho:

O Brasil é um enigma. Isso, talvez de forma instintiva, sabem todos aqueles que vêm a conhecer o mundo no perímetro dessa charada: porém nem todos chegamos a elaborar plenamente tal compreensão. Por isso, se algo nos une — a nós, filhos do enigma — é menos o amor do que o espanto (como escreveu Borges a respeito de Buenos Aires). Elaborar, representar, pronunciar o labirinto do Brasil é o que Marcel Novaes realiza com surpreendente maestria em seu romance de estreia. Os automóveis ardem em chamas é uma narrativa que se lê na beira da poltrona e que, ao mesmo tempo, ressoa de maneira profunda, clara e misteriosa, na consciência de quem experimentou o caos, a palpitação e o eterno retorno da História brasileira nos últimos cinquenta anos.

Paulo é um fotógrafo experiente, acostumado a perseguir os fios da verdade na confusão do dia-a-dia e no burburinho das redações. Seu grande desafio, contudo, será decifrar a saga de sua própria família. Desde menino, acreditava que seu pai, Mauro, a quem nunca conheceu, falecera num acidente. Quando sua mãe está prestes a morrer de câncer, ele escuta a revelação que tirará dos trilhos sua trajetória pessoal e porá em questão seu lugar na História do país: o pai morreu na cadeia, aprisionado pela ditadura.

O caminho de Paulo acaba convergindo com o do detetive Alex, que investiga o assassinato de um ancião solitário, obcecado por livros sobre o regime militar e que guardava uma velha farda no armário. À medida que essa busca pela verdade avança, a narrativa de Novaes salta entre o passado e o presente, contando a história de Mauro e criando um relato múltiplo que envereda pelos anos de chumbo e se espraia pelo conturbado Brasil de 2019 — onde o eco dos coturnos volta a ressoar, lembrando-nos que algumas feridas e alguns porões não se fecham jamais.

Avaliação de Alcino Leite Neto:

O livro tem um bom ritmo, a gente lê com prazer, curioso sobre o que virá depois. Os personagens são interessantes e cativantes, e sua busca emociona o leitor, pois demonstra como o período da ditadura ainda está tão perto, ainda nos afeta. Os capítulos da ditadura e da militância, difíceis de fazer, me pareceram convincentes e fortes. É um romance ambicioso do ponto de vista da inserção histórica, embora despretensioso no plano da escrita, pois imagino que tenha preferido criar uma ficção que seja mais acessível e palatável a um grande número de leitores. E foi bem-sucedido nisso. 

Avaliação de Jessé de Almeida Primo:


Um misto de romance histórico e com certa dose de roman à clef, Os automóveis ardem em chamas, de Marcel Novaes, é o romance certo na hora certa. Afinal, capta com precisão o espírito de nossa época, quando a classe política, à destra e à sinistra, torna-se sucedânea dos deuses, algo de resto muito velho na América Latina e que se intensificou com a vitória medusificante de Jair Bolsonaro e o imediato desejo da parte da esquerda, com sentimento neossebastianista, de retomar o trono a fim de impedir a destruição das utopias. 


Vemos de um lado, no ano de 2019, a personagem de Paulo buscando respostas acerca do pai, morto nos anos 70, e que, para isso, conta com o auxílio insólito de um membro da polícia nada simpático às ideologias contraculturais, que vive, por sua vez, entre os dramas da sua profissão, o ressentimento causado por um divórcio e a convivência agridoce com sua filha adolescente, num espelho narrativo de nossa época, com todas as tensões políticas que hoje se traduzem, entre outros, no microcosmo das tensões familiares. De outro, o final dos anos 60, o debut de Mauro, o pai de Paulo, um jovem estudante de engenharia da USP que se vê iniciado numa relação amorosa intensa, na contracultura da época e na associação com uma célula militante, culminando num assalto a banco, que muda o rumo de sua vida de maneira incontornável.


Com esse preâmbulo, surgem na cabeça do leitor hipnotizado pelo atual clima nacional perguntas sobre a posição política do romance e consequentemente do autor. A resposta é que o desenvolvimento da trama não abre espaço para esse questionamento, mostra a sua mais completa irrelevância e não assume simpatias políticas, mas por pessoas, de modo que nem a figura das personagens que se envolvem com a luta armada têm ares incontornavelmente heróicos nem as das que foram simpáticas ao regime militar são reduzidas a monstros, carregadas de más intenções, de modo que o livro se torna, seguramente, um dos mais sinceros a respeito desse assunto.


O brilho da narrativa não se mostra somente no aspecto geral, dos acontecimentos de grande impacto histórico, mas também, e principalmente, nos momentos mais íntimos, que apenas poucas pessoas podem testemunhar, no aspecto marginal das histórias que lhes confere grande força: com destaque, a passagem em que Mauro corta o pernil na casa do pais e a namorada, que o via por vezes como alguém que deveria ser iniciado na realidade, se surpreende com sua desenvoltura. Essa passagem mostra, com sutileza, a recuperação da integridade de um homem quando retorna, ainda que por um breve momento, ao seio da sua família. E se articula com o momento num dos parágrafos finais desse capítulo em que a namorada experimenta certa fragilidade emocional quando se vê longe dos pais, no primeiro Natal sem a presença deles, não pensando mais nas diferenças ideológicas que os punham em campos opostos. Ou ainda quando o grupo arma uma emboscada numa padaria contra o delegado Sérgio Fleury, resultando numa cena de graciosa comicidade, com algo de picaresco.

Avaliação de Dionisius Amendola:


Os Automóveis Ardem em Chamas é um dos melhores livros que li neste 2022 que se finda.


Marcel usa da tradição do noir para construir uma trama envolvente da primeira à última página. Como nas melhores histórias do gênero, seus personagens tentam escapar de seus destinos inutilmente, enquanto o autor tece a teia dos dramas pessoais juntamente com os acontecimentos culturais, sociais, políticos, que marcaram o país nos últimos cinquenta anos.


O livro nos conta a história de Paulo, de seus pais, militantes de esquerda nos anos 60/70, e de Alex, policial que se envolve na investigação que irá revelar um passado que poucos querem relembrar e encarar.


A maestria de Marcel está em não deixar a trama sufocar com análises sociológicas ou ideológicas. Seu cuidado em deixar o drama dos personagens fluir, nos cativar, de fazer seu texto servir aos personagens e à narrativa, é exemplar.


Os Automóveis Ardem em Chamas é um livro que resgata aquilo que a literatura nacional mais necessita: boas e cativantes tramas, escritas com maestria e sem jamais duvidar da inteligência do leitor.

Avaliação de Luis Villaverde:

Os Automóveis Ardem em Chamas foi uma das melhores surpresas literárias — quiçá culturais — que tive nesse ano de 2022. Trata-se de um romance policial, mas se torna algo muito maior e mais complexo do que um mero exercício de gênero. Digo sem exagero que esse é um livro fundamental para compreendermos as últimas décadas da história política, social e cultural do Brasil.

O romance conta duas tramas paralelas, que ocorrem em períodos distintos: o drama de um grupo de estudantes envolvidos na luta armada durante a ditadura militar, nos anos 70, e a história de um fotojornalista e um investigador, em 2019. E vou dizer somente isso, porque a história criada por Novaes possui inúmeras voltas e reviravoltas, muitas delas inusitadas, outras tocantes, que não desejo estragar para o leitor. Mas é na articulação dessas duas tramas que que o autor faz uma análise sobre o que é o Brasil dos últimos quarenta, cinquenta anos.

 

Leia o resto da cuidadosa resenha do Luis na substack dele, No Escuro

Avaliação de Décio Machado:


Ficamos conhecendo Paulo, seus pais e os pais de seus pais. Conhecemos Alex, sua ex-esposa e sua filha. Conhecemos a turma de estudantes que pretendem virar assaltantes. Acompanhamos seus dramas, que são dramas humanos. Esses dramas estão emaranhados com a cultura e a política de cada época, sim, mas isso é mostrado sem didatismo.

O livro é muito bem escrito. A narrativa é ágil, faz a gente querer virar as páginas. Tem um ritmo de livro policial, mas uma certa profundidade em sua reflexão sobre o Brasil. Alex e sua filha entram em conflito no tema do racismo (ele é descrito como mulato; ela, como negra). A mãe de Paulo entra em conflito com seus pais por causa do ativismo. Alex e Paulo entram em conflito a respeito do legado da ditadura. O grupo de jovens tem seus conflitos internos. O passado não é simples, o presente não é simples, nada é simples, ninguém é simples.

(...) Há uma onda literária atualmente de obras que abordam o fenômeno do bolsonarismo, com alusões à ditadura. Provavelmente ainda vai durar um pouco. É um tema interessante. E dos livros que eu li até agora que tangenciam esse assunto, este é o melhor. 

Leia o resto da resenha do Décio na substack dele, Descendo o Machado

Avaliação de Gabriel Feltran:

Há muito mais mistérios entre a política e a subjetividade, entre o que nos faz como nação e como indivíduos, do que sonha nossa vã sociologia. As chagas da ditadura militar, as lutas da esquerda, a institucionalização de uma democracia que redunda em um governo autoritário, civil-militar. Nossa história política recente é narrada pelo prisma dos personagens de Marcel Novaes, homens e mulheres comuns. Pelo que têm de comum, em comum justamente conosco, é que nos identificamos e sofremos com eles. Esse livro é sobre a política que nos faz pessoas. Ele explora a nossa história densa de contradições. Tentamos fingir que ela não existe, a recalcamos, enquanto assistimos ao seu eterno retorno. Comecei a ler e nao parei até acabar.

Avaliação de Anita de Moraes:

 Escrevo para dizer que amei seu romance! Acabo de terminar, li em poucos dias, é muito envolvente, a gente não consegue largar o livro. É mesmo genial, meus parabéns!!! Fiquei impressionada com a construção minuciosa das situações, das falas, com a reconstrução do passado, com a representação do nosso tempo… Você é um escritor capaz de presentificar as coisas para o leitor, com uma nitidez espantosa. E a escolha do enredo, dos dois tempos… Fiquei pensando muita coisa… É um livro que dá o que pensar…

Avaliação de Diogo Rosas:

Os Automóveis Ardem em Chamas é um thriller histórico e político de primeira, raro no Brasil. Leio devagar, e é muito difícil que comece e termine um livro no mesmo dia, mas não consegui parar esse romance de Marcel Novaes. Fortemente recomendado.

Avaliação de Marcus Aguiar:


O livro é muito bom. Eu comecei meio devagar mas no final realmente a gente quer ler rápido para saber como a coisa toda termina. O curioso é que parte da história já está posta desde o começo: sabemos quem morreu e como morreu. Mesmo assim a trama te pega e os detalhes se tornam importantes. A reconstrução histórica é excelente. A maneira como tudo se desenrola nos últimos capítulos é surpreendente e inesperada. Recomendo!

Avaliação de Susana Sculaccio:

Excelente leitura. Fiquei impressionada com as ligações das historias e da sua capacidade de narrar passado e presente simultaneamente.  Nunca li um livro tão rápido pois fiquei presa à leitura, curiosa para saber o que iria acontecer. Parabéns.

Avaliação de Facundo Burgos:

Achei o livro fascinante. A história vai e volta de 2019 para 1969 de forma muito natural. As cenas de ação são muito bem descritas e as participações especiais de personagens históricos (não vou dar spoilers) são um tempero à parte. Há uma abordagem multifacetada de opiniões e críticas que não poupam esquerda, direita ou centro. Por fim, temos um herói com fraquezas humanas e o mais execrável vilão. Aguardo ansioso a próxima aventura literária do autor. 

Avaliação de Lussandra Gianasi:


Li Os Automóveis Ardem em Chamas, do meu colega Marcel novaes. A narrativa é leve, interessante e os capítulos traçados de 1968 a 2019 são envolventes. Não dá vontade de parar. Super fácil de ler. Ler romance de colega é interessante. Dei risada de partes mais hilárias, que nunca o imaginei falando, pensei em certas alfinetadas-colocações, tanto na ditadura quanto no bolsonarismo. Senti vontade de acabar logo para saber quem tinha “culpa no cartório" depois de tantas culpas tanto pelos anos ditatoriais quanto atuais. Há trechos pincelados a "dedo" no texto que me coloquei a pesquisar ao ler, para verificar as datas eram mesmo as do ocorrido! Caem como luva nos momentos do livro e são retratos verdadeiros desses tempos. Dá para rir, pensar e sentir tristeza como uma boa obra de arte literária. Parabéns Marcel, você é um ser que se desdobra em vários na escrita.

Avaliação de Josi Arraut:


Os Automóveis Ardem em Chamas é muito bom! Depois que a gente aprende quem são os personagens começa a acompanhar bem as idas e vindas do tempo, fica muito legal a dinâmica. É uma narrativa que prende o leitor!

Avaliação do meu filho (15 anos):

Putz, pior que é bom mesmo!