Nosso problema é a deriva dos herbicidas hormonais.
E somente dos herbicidas hormonais. Outros agrotóxicos podem causar danos? Sim, mas nenhum viaja tão longe e causa prejuízos a distâncias tão grandes da propriedade onde foi aplicado. Além disso, esse grupo de herbicidas provoca danos mesmo em quantidades muito, muito pequenas.
Por isso, quando se trata de herbicidas hormonais, a tolerância à deriva precisa ser zero, falar em “deriva mínima” não resolve os danos que enfrentamos hoje.
Somando-se à alta toxicidade dessas substâncias, ainda há a questão das condições climáticas. O produtor que aplica herbicidas hormonais deve, obrigatoriamente, observar os seguintes parâmetros ao mesmo tempo (conforme determina a legislação vigente no Rio Grande do Sul, pela Instrução Normativa nº 5/2019):
umidade relativa do ar acima de 55%
velocidade do vento entre 3 e 10 km/h
temperatura do ar abaixo de 30 °C
ausência de inversão térmica nas horas seguintes à aplicação
Quem conhece a realidade do campo sabe que a janela com essas condições é extremamente curta, especialmente na primavera e no verão. E como o uso de herbicidas hormonais aumenta a cada ano, segundo dados oficiais, é evidente que muitos produtores estão aplicando fora das condições adequadas.
Nesses casos, a lei prevê autuação do produtor, mas como fiscalizar milhares de propriedades ao mesmo tempo? Como identificar quem aplicou de forma incorreta, quando todos são vizinhos? A deriva não deixa rastros que permitam comprovar sua origem com exatidão.
Fala-se muito sobre o custo dos herbicidas hormonais como uma vantagem. Mas essa conta precisa ser refeita. O produto em si pode ter um custo baixo, mas:
a janela de aplicação é curta;
as condições climáticas desfavoráveis geram perda de tempo e ineficiência;
e se o clima não permitir a aplicação, o produtor perde o período ideal de plantio?
Além disso, há um custo operacional com os bicos de pulverização, que são um ponto-chave para minimizar, e não eliminar, a deriva. Para funcionar corretamente, esses bicos devem:
produzir gotas grossas (que muitos produtores consideram menos eficazes, mesmo tendo participado dos treinamentos!);
ser do tipo com indução de ar, mais caros que os convencionais;
estar em perfeito estado de conservação, exigindo manutenção e troca periódica;
ser usados exclusivamente para aplicações com herbicidas hormonais.
Diante disso, defendemos uma agricultura sustentável, baseada em estratégias de controle mais amplas e seguras, como:
rotação de culturas
dessecação antecipada e sequencial (com herbicidas não hormonais)
integração entre práticas químicas, mecânicas e culturais → dentro do Manejo Integrado de Plantas Daninhas (MIPD)
O verdadeiro problema é a dependência total de alguns produtores de soja em relação aos herbicidas hormonais, usados como única ferramenta de manejo.
Portanto, a pergunta que precisamos fazer não é se é possível abrir mão dos hormonais, mas sim:
Por que esses produtos continuam sendo usados de forma recorrente, mesmo quando o problema poderia ser evitado com práticas mais sustentáveis?
Por que controlar a buva apenas quando já está em estágio avançado, e não no inverno, com menor custo e risco?
A realidade do campo mostra que é possível alcançar altos patamares de produtividade com menor impacto ambiental, desde que o manejo seja tecnicamente planejado.