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A classificação da arbitragem serve para ordenar um conjunto de conceitos de acordo com certas relações que se pretende evidenciar. Ela pode ser utilizada como uma ação classificadora, formadora de grupos de coisas da mesma espécie (DINIZ, 1999).
Inicialmente, estudaremos a arbitragem facultativa e a obrigatória, diferenciando essas duas formas. José de Albuquerque Rocha (2008, p. 24) faz a seguinte classificação diante da arbitragem: "1º - ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA E ARBITRAGEM OBRIGATÓRIA. 2º - Arbitragem formal e informal. 3º - Arbitragem de direito e de equidade. 4º - Arbitragem AD HOC e institucional. 5º - Arbitragem interna e internacional".
Para o autor anteriormente citado, bem como para Rocha (2008), a arbitragem voluntária se dá quando há o consentimento entre as partes de procurarem, em comum acordo, resolver o litígio apresentado por meio da designação de árbitro ou árbitros, utilizando, assim, a arbitragem. É o contrário da arbitragem obrigatória, que é inquisitiva às partes, porém, como podemos estudar por meio dos mecanismos, a disposição à arbitragem é totalmente voluntária e facultativa, tendo como princípio a Constituição Federal (BRASIL, 1988), que descreve que todo cidadão tem direito ao acesso livre à justiça.
O desenvolvimento do Processo Civil Romano contribuiu historicamente para o fenômeno da arbitragem em três fases. Na primeira, a chamada arbitragem facultativa, as próprias partes escolhiam o juiz ou o árbitro para sua causa. Na segunda fase, com o fortalecimento do Estado, os árbitros passaram a ser nomeados por ele, tornando a arbitragem obrigatória. Na terceira, a última fase, denominada processo extraordinário, caracteriza a passagem da justiça privada para a justiça pública, em que o pretor passa a conhecer o mérito dos conflitos e a proferir sentenças. Assim, o Estado começa a impor suas decisões, fortalecendo a noção de jurisdição como monopólio do Estado (CINTRA, 1993 apud SOUZAS; TORRES, 2008).
No Brasil, o instituto da arbitragem é sempre voluntário ou facultativo, ou seja, o ordenamento jurídico só admite que haja arbitragem quando for escolhida livremente pelas partes. No caso da arbitragem obrigatória, ela viola vários preceitos fundamentais da Constituição Federal, principalmente, no que diz respeito à garantia do acesso ao Poder Judiciário, como se vê no art. 5º, XXXV, da Constituição: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (BRASIL, 1988, on-line).
O nosso ordenamento jurídico abriga um importante princípio que é o Princípio da Autonomia da Vontade, que se encontra consagrado na Lei de Arbitragem, em que as partes que podem exercer esse princípio, diante de direitos patrimoniais disponíveis, podem fazer a opção de solucionar os conflitos por meio do Poder Judiciário ou mediante a Lei de Arbitragem (VILAS-BÔAS, 2008).
Assim, se quiserem submeter a solução de seu litígio à arbitragem, as partes devem criar uma convenção de arbitragem, que terá, inicialmente, uma cláusula compromissória (promessa) e, quando surgido o litígio, um compromisso arbitral (contrato definitivo). Ou, ainda, independentemente de firmarem cláusula compromissória, podem as partes celebrar compromisso arbitral quando surgido um conflito (BARBI FILHO, 199- apud VILAS-BÔAS, 2008).
A arbitragem é uma manifestação de liberdade. Assim, do mesmo modo que se garante a liberdade de sua instituição, deve-se garantir a liberdade de renúncia ao previamente estatuído. Dessa forma, deixando o demandado de alegar, em sua contestação, que havia as partes celebrado uma convenção de arbitragem, é de se entender que optaram pela solução de seu conflito pela via jurisdicional, renunciando ao processo arbitral. Poderá, então, o Judiciário exercer, sem impedimentos, a função jurisdicional (PASSOS, 1991; PIMENTEL, 1979 apud CÂMARA, 2009).
Como afirma Alexandre de Moraes (2002, p. 291-292):
O princípio da legalidade é basilar na existência do Estado de Direito, determinado na Constituição Federal sua garantia, sempre que houver violação do direito, mediante lesão ou ameaça. Dessa forma, será chamado a intervir o Poder Judiciário, que, no exercício da jurisdição, deverá aplicar o direito ao caso concreto.
Portanto, no que diz respeito à arbitragem imposta, esta é expressamente proibida no Brasil por força da Constituição Federal, que estabelece que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito.
A Recomendação 92 da Organização Internacional do Trabalho de 1951 aconselha que sejam estabelecidos organismos de conciliação voluntária para prevenir e solucionar os dissídios coletivos. Caso o conflito seja submetido à arbitragem, as partes devem ser estimuladas para que aceitem o laudo arbitral.
Nas empresas gestoras de mão-de-obra do trabalho portuário avulso (Lei 8.620, de 05/01/1993), a arbitragem está presente no caso de impasse na solução dos litígios da Comissão Paritária, formada exclusivamente para solucionar as pendências decorrentes da aplicação das normas do serviço portuário avulso. Firmado o compromisso arbitral, as partes não poderão desistir, e o laudo arbitral possui força normativa, independentemente da homologação judicial.
Fonte: adaptado de Valle (2012).
Dentro das classificações citadas por José de Albuquerque Rocha (2008) na aula anterior, vimos que ele menciona, em segundo lugar, a arbitragem formal e a informal. Diante desse contexto, ele faz a seguinte conceituação a respeito do tema: a arbitragem formal ou ritual é aquela prevista e regulada pela lei, sendo que ela produz efeitos jurisdicionais. A arbitragem informal, ao contrário da formal, não observa as prescrições impostas pela lei, ou seja, é aquela cuja forma é livre. Nada impede as pessoas de usarem essa modalidade de arbitragem, porém não terão aptidão para desencadear os efeitos legais atribuídos à arbitragem formal, quais sejam a garantia da coisa julgada e o valor de título executivo da sentença condenatória do árbitro (ROCHA, 2008).
No Brasil, o juízo arbitral é bem mais antigo do que se imagina. Ele estava regulamentado desde as Ordenações Manuelinas, Afonsinas e Filipinas, vigentes no período Colonial até 1822. Vê-se, também, desde o Decreto nº 737 de 1850, o qual tornou obrigatória, em determinados casos, a arbitragem para a resolução de litígio entre comerciantes (BRASIL, 1850a). O Código de 1850, instituído pela Lei nº 556, estabeleceu o juízo arbitral para a solução das questões advindas de contrato mercantil (BRASIL, 1850b). Vemos, ainda, esse discutido assunto, arbitragem, na Constituição de 1824, Lei 1.350 de 1866, regulamentada em 1867 — Processo Arbitral — Decreto 3.900, na Constituição Federal de 1891 e outros (MAGALHÃES, 2006).
Segundo Carreira Alvim, é interessante sabermos, antes de tudo, que a arbitragem “é uma instituição pela qual as pessoas capazes de contratar confiam a árbitros, indicados ou não por eles, o julgamento de seus litígios relativos a direitos transigíveis” (ALVIM, 2002 apud SOUZAS; TORRES, 2008, p. 79). Para tanto, o instituto em questão é fundado nos princípios contratuais e, por ter sua natureza jurídica estruturada na teoria contratualista, deve, essencialmente, observar a função social do contrato (GUILHERME, 2012).
Por ser de natureza contratual, percebe-se que a arbitragem utiliza como sustentáculos os princípios norteadores dos contratos, que são, de acordo com Diniz (2013):
a. Princípio da autonomia da vontade: consiste no poder de estipular livremente, como melhor convier, mediante acordo de vontades, a disciplina de seus interesses, suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica, envolvendo, além da liberdade de criação do contrato, a liberdade de contratar ou não, de escolher o outro contratante e de fixar o conteúdo do contrato, limitadas pelas normas de ordem pública, pelos bons costumes e pela revisão judicial dos contratos.
b. Princípio do consensualismo: o simples acordo de duas ou mais vontades basta para gerar contrato válido, visto que a maioria dos negócios jurídicos bilaterais são consensuais.
c. Princípio da obrigatoriedade da convenção: as estipulações feitas no contrato deverão ser fielmente cumpridas, sob pena de execução patrimonial.
d. Princípio da relatividade dos efeitos do contrato: a avença apenas vincula as partes que nela intervêm, não aproveitando nem prejudicando terceiros, salvo raras exceções.
e. Princípio da boa-fé: na interpretação do contrato, é preciso ater-se mais à intenção do que ao sentido literal da linguagem e as partes deverão agir com lealdade e confiança recíprocas, auxiliando-se mutuamente na formação e na execução do contrato.
f. Princípio da confidencialidade: as arbitragens não estão sujeitas ao princípio da publicidade, como os processos em geral que correm na justiça comum.
g. Princípio da competência-competência: havendo convenção de arbitragem, fica esse instituto estabelecido como o competente para dirimir conflitos surgidos naquela relação jurídica, excluindo o Judiciário da apreciação da matéria.
De acordo com o art. 1º da Lei de Arbitragem 9.307/96 (BRASIL, 1996), as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis. Assim, é preciso que essas pessoas materializem essa intenção, e isso ocorre mediante a convenção arbitral (VILAS-BÔAS, 2008).
Segundo Câmara (2009), ao optarem pela arbitragem, que, para ele, é um meio alternativo de solução de litígios, os titulares dos interesses em conflito já demonstram uma predisposição a se conformarem com a decisão do árbitro, já que este foi escolhido pelos contendores, sendo alguém de sua confiança. Assim, é bastante provável, sendo, por isso, razoável admitir, que a decisão proferida pelo árbitro efetivamente componha o conflito, fazendo com que ele desapareça do mundo dos fatos, e não apenas tornando tal conflito juridicamente irrelevante. Por essa razão é que o autor, desde o início, afirma que a arbitragem é instrumento essencial na busca da pacificação social.
A Lei 9.307/96 assim dispõe em seu art. 2º:
Art. 2º [...]
§ 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública.
§ 2º Poderão, também, as partes convencionar que a arbitragem se realize com base nos princípios gerais do direito, nos usos e costumes e nas regras internacionais de comércio (BRASIL, 1996, on-line).
A função social do contrato é o princípio pelo qual o contrato estipula e assegura os direitos e deveres como instrumento do interesse dos contratantes e do interesse social, atendendo às restrições trazidas pelo dirigismo contratual. Este é a intervenção estatal na economia do negócio jurídico contratual, mediante a aplicação e a emissão de norma de ordem pública, o atendimento aos bons costumes relativos à moralidade social, a adoção de revisão judicial dos contratos, alterando-os, estabelecendo-lhes condições de execução ou, mesmo, exonerando a parte lesada de acordo com as circunstâncias, fundando-se na boa-fé e na supremacia do interesse coletivo (GUILHERME, 2012).
Como o princípio da função social é o norteador da arbitragem, tal instituto é formal no sentido de ser disciplinado por algumas regras, como, por exemplo, as regras sobre sua instituição, que deve obedecer à forma escrita; as regras sobre seu objeto, que precisa ser constituído por direitos patrimoniais disponíveis; as regras sobre seu procedimento, o qual deve observar algumas garantias do devido processo legal; entre outras (ROCHA, 1998).
Com isso, pode-se concluir que a arbitragem formal ou ritual é aquela prevista em lei e que atende ao interesse social. Apenas esta produz efeitos jurisdicionais. Já a arbitragem informal é aquela que não observa as prescrições impostas pelas normas. Caso as partes recorram à arbitragem informal ou livre ou não ritual para resolver suas diferenças, deve-se verificar que esse tipo de arbitragem não tem aptidão para desencadear os efeitos legais atribuídos à arbitragem formal, isto é, não há a garantia da coisa julgada e o valor de título executivo da sentença condenatória do árbitro.
Por conta do princípio da confidencialidade, muitas empresas se sentem mais confortáveis em se utilizar do instituto, não mais temendo que problemas que as envolvam em relação a seus acionistas ou sócios ou mesmo a contratos que celebraram possam influenciar negativamente sua imagem no mercado ou o valor de suas ações. Nesse sentido, têm-se alguns regulamentos de arbitragem que tratam diretamente deste, como é o caso do Regulamento de Arbitragem da Câmara de Arbitragem do Mercado, o Regulamento de Arbitragem da American Arbitration Association (AAA) e o Regulamento de Arbitragem da FIESP.
Fonte: adaptado de Guilherme (2012).
Essas duas formas de arbitragem são classificadas quanto ao critério a que os árbitros podem recorrer para decidirem o conflito, ou seja, para que o árbitro tome a decisão correta sobre o caso concreto, ele precisa consultar a legislação existente. Contudo, nem sempre há necessidade de que o árbitro aplique normas de direito positivo. Em alguns casos, ele decidirá de acordo com o seu próprio entendimento de justiça. A arbitragem de direito é aquela em que o árbitro está obrigado a resolver a disputa, aplicando as normas de direito positivo. Já a arbitragem de equidade é aquela em que o árbitro pode decidir segundo seu entendimento de justiça, dadas as circunstâncias de cada caso (ROCHA, 1998).
A equidade é um dos meios supletivos das lacunas no Direito. Ao solucionar o caso, se o árbitro não encontrar normas que sejam aplicáveis ou que estejam assim compactuadas no compromisso arbitral, não podendo subsumir o fato a nenhum preceito, porque há falta de conhecimento sobre o status jurídico de certo comportamento devido a um defeito do sistema, que pode consistir numa ausência de norma, na presença de disposição legal injusta ou em desuso, estamos diante de um problema das lacunas (DINIZ, 2001).
No caso da lacuna, o árbitro deverá constatar, na própria legislação, se há semelhança entre fatos diferentes, fazendo juízo de valor de que essa semelhança se sobrepõe às diferenças. Caso não encontre casos análogos, deverá recorrer ao costume e ao princípio geral de direito; não podendo contar com essas alternativas, sendo permitido, ainda, socorrer-se da equidade (DINIZ, 2001).
O art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro dispõe que: “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito” (BRASIL, 1942, on-line). Nesse caso, o juiz deve ser substituído por árbitro.
A equidade está consagrada como um elemento de adaptação da norma ao caso concreto. Ela se apresenta como uma capacidade que a norma tem de atenuar o seu rigor, adaptando-se ao caso concreto. Ela é elemento de integração, pois permite restituir à norma, que acaso falte por imprecisão do texto ou por imprevisão de certa circunstância fática, a exata avaliação da situação a que esta corresponde, a flexibilidade necessária à sua aplicação, afastando por imposição do fim social da própria norma o risco de convertê-la num instrumento iníquo (GUILHERME, 2012).
Quatro irmãos herdaram "uma fortuna de ativos em Minas Gerais e no Rio de Janeiro" — "direitos minerários de uma região rica em minério de ouro e em minério de ferro em" Mariana-MG — e passaram a brigar incansavelmente desde então. Essa disputa familiar, que dura 24 anos e acabou atrapalhando os negócios, "pode chegar ao fim, numa audiência de conciliação".
O pai faleceu em 1984, deixando para os quatro filhos, dois homens e duas mulheres, além das minas, imóveis na cidade de Mariana-MG e no Rio de Janeiro-RJ. Sob a holding, estão duas companhias de mineração, possuindo dois principais direitos minerários da família. Em 2010, uma das maiores mineradoras do mundo pagou R$ 160 milhões pela compra dos direitos da primeira companhia, todavia, a pedido das irmãs, que alegavam temer não receber a parte que lhes caberia como herdeiras, o dinheiro foi depositado em juízo até que a disputa judicial fosse encerrada.
No ano de 2013, as duas irmãs obtiveram uma liminar que impedia a venda dos direitos minerários da outra companhia de mineração. O alvo era uma mineradora chinesa, que, de acordo com a prefeitura de Mariana, estaria interessada em comprar a mina. Conforme foi especulado na época, a transação envolveria investimentos na região de US$ 5 bilhões.
"No centro da briga, está a partilha dos bens". Embora sejam quatro herdeiros, as duas irmãs acharam por bem resolver na Justiça a divisão do patrimônio. "A briga tornou-se pública em 1987, quando elas entraram com ação pedindo a dissolução da sociedade com os dois". Desde então, existe a disputa em questão.
Segundo o jornal Valor, "o escritório de advocacia que representa as empresas na disputa [com as duas irmãs] disse não ter 'autorização para informações processuais'. [...] O desembargador está animado. 'A partir do momento que as partes aceitaram comparecer, demonstram boa vontade na busca de alguma saída.' Caso não cheguem a um acordo, a disputa vai a julgamento".
Fonte: adaptado de Martins (2011, on-line).
A antiga Lei de Introdução ao Código Civil foi alterada pela Lei nº 12.376, de 30 de dezembro de 2010, chamada de Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).
O árbitro utilizará a lógica do razoável, que também é chamada de lógica material, teoria da argumentação, lógica jurídica concreta, pensamento tópico-retórico, para decidir com a equidade.
Paulo Furtado (1995, p. 77-78) dispõe que:
Tentando demonstrar o quanto é tormentoso o assunto, De Angelis lembra que no Direito Romano são utilizadas nada mais nada menos que oito expressões distintas para aludir à equidade. Assim, no direito francês e no direito inglês onde se usam, como sinônimos, os vocábulos equidade e razão, além do direito espanhol, onde se empregam com idêntico sentido: ‘equidad, buena-fé, mesericordia, perfecta rázon, verdadeira rázon, justícia, principios generalesde las leyes que la natureza y razón enseenãm, conciencia, arbítrio de buon varón, leal saber y entender, buen parecer, etc.’. E o mesmo autor propõe que “a equidade é o conceito que cada pessoa tem de justiça, resultado de sua experiência particular, que se manifesta pelo seu pronunciamento em um caso concreto; objetivamente, vários critérios se segue para determinar a equidade, algo que existe fora do sujeito. Em primeiro lugar, equidade seria sinônimo de justiça, mais precisamente, da ideia pura ou abstrata de justiça, que a lei contém, acidental ou normalmente, não de modo necessário. Sob este ponto de vista pode haver leis contrárias à equidade. Um segundo critério objetivo é o que conceitua a equidade como uma flexão da lei. A norma legal abarca a generalidade dos casos; a equidade tende a evitar sua injustiça em um caso concreto ou, em outro sentido, a suavizar o rigor, a dureza de sua aplicação. Um terceiro critério objetivo propõe que não se dê ao critério de equidade um valor puro e terno, igual a si mesmo em todo tempo e lugar. Apresenta-se como algo influenciado pelas circunstâncias da época e do país, da raça, da sociedade e da geografia.
O juiz decide por intuição, e não por inferência ou silogismo do que se estuda na lógica; decide por convicção, que se forma de modo direto, e não como consequência de um raciocínio. Todavia, o Direito não se restringe ao mundo psicológico. Também, não é ideia pura, nem valor puro, pois se relaciona com a realidade. Até porque o juiz, assim como o árbitro, não está acima da lei, devendo acatar a ordem jurídico-positiva. Já a arbitragem de direito, a qual utiliza uma lógica tradicional, liga-se ao Direito tratado como uma ordem da conduta humana (KELSEN, 1995).
Uma “ordem” é um sistema de regras que será utilizado para resolver o conflito. Para sintetizar, pode-se dizer que essas regras são normas positivas que serão utilizadas para resolver o problema entre as partes. Já a analogia, diferentemente da equidade, consiste em um método de interpretação jurídica utilizado quando se aplica uma disposição legal que regula casos idênticos, semelhantes, ao da controvérsia.
Ela tem fundamentação legal no próprio Código de Processo Civil, em seu art. 126, que dispõe: “o juiz não se exime de sentenciar ou despachar, alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lei caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito” (BRASIL, 1973, on-line).
A arbitragem de direito é compreendida como aquela em que o árbitro está obrigado a resolver a disputa, aplicando as normas de direito positivo e utilizando a lógica tradicional. Já a arbitragem de equidade é aquela em que o árbitro pode decidir segundo seu entendimento de justiça, intuição, emoção, sempre em conjunto com os costumes, princípios gerais do Direito e atendendo aos fins sociais a que a lei se dirige e às exigências do bem comum, utiliza-se, ainda, a lógica do razoável e para englobar todas as regras criadas inconscientemente pelo juiz ou pelo árbitro, neste caso e somente neste, que se utilizou a equidade.
No que diz respeito à validade, a arbitragem pode ser interna ou internacional. A Lei de Arbitragem, em seu art. 34, parágrafo único, prescreve o critério territorial para o fim de classificar as decisões arbitrais internas e internacionais:
Art. 34. [...] Parágrafo único. Considera-se sentença arbitral estrangeira a que tenha sido proferida fora do território nacional (BRASIL, 1996, on-line).
Em princípio, não há diferença entre arbitragem interna e arbitragem internacional, visto que ambas se ocupam da solução de litígios mediante aplicação de regras previamente escolhidas pelas partes. O artigo mencionado anteriormente considera como sentença arbitral estrangeira toda aquela que foi proferida fora do território estrangeiro. Portanto, a arbitragem interna é aquela em que a sentença arbitral foi proferida dentro do território nacional (ROCHA, 1998).
Guido Soares descreve que a arbitragem interna ou nacional é aquela aplicável nas relações entre particulares sem qualquer conexão com sistemas jurídicos estrangeiros. Já a arbitragem internacional seria aquela que utilizaria a lei estrangeira. O autor ainda preleciona que tal arbitragem se realiza num foro não submetido a qualquer legislação estatal, uma lei procedimental e material totalmente despregada de qualquer referencial a um Estado. Portanto, verdadeiramente internacionais são as arbitragens entre Estados reguladas pelo Direito Internacional Público (SOARES, 2001).
Carlos Alberto Carmona (1998, p. 115) nos diz que:
Será, assim, nacional a sentença arbitral se o laudo for proferido no território nacional, ainda que os árbitros devam tratar de questão ligada ao comércio internacional e mesmo que estejam em jogo ordenamentos jurídicos variados; será estrangeiro o laudo arbitral se proferido fora do território nacional, ainda que sejam as partes brasileiras, resolvendo controvérsia decorrente de contrato celebrado no Brasil e que aqui deva ser cumprido.
Nota-se que foram encontradas duas conceituações distintas para arbitragem interna e arbitragem internacional. O ramo que diz ser a arbitragem interna a que se utiliza a legislação nacional e a internacional a que utiliza a legislação internacional parece ser o mais aceito pelos internacionalistas. Já o que diz respeito ao local onde é proferida a decisão arbitral é o mais aceito pelos civilistas e processualistas (GUILHERME, 2012).
A determinação da nacionalidade de uma arbitragem se faz necessária por alguns motivos, sendo eles: a fixação da lei que regulará a arbitragem; a fixação do tribunal estatal que poderá vir a ter jurisdição sobre o processo arbitral; e, por fim, identifica o procedimento a ser seguido na execução do laudo arbitral.
De acordo com a ótica da lei brasileira nº 9.307/96, não há, coloquialmente, arbitragem internacional, mas, sim, uma sentença arbitral estrangeira, conforme os artigos 34 a 40 do respectivo dispositivo legal, vindo a tratar apenas da homologação das sentenças arbitrais proferidas no estrangeiro para fins de execução na justiça brasileira (BRASIL, 1996).
Por essa razão, para caracterizar a arbitragem como interna ou internacional, a legislação brasileira utiliza somente o critério geográfico, ou seja, se o Tribunal Arbitral tiver sede no país, a sentença será nacional, caracterizando-se como arbitragem interna, ainda que estejam envolvidas partes sediadas no exterior.
Conforme Carlos Augusto da Silveira Lobo (2003, p. 10), “teremos de nos contentar em dizer que seria internacional a arbitragem comercial que produz uma sentença conectada a sistemas legais de dois ou mais países: o em que foi proferida e o(s) em que deverá ser executada”. Para Henri Batiffol (apud BAPTISTA, 1994, p. 17), o contrato é internacional “quando, pelos atos concernentes à sua conclusão ou sua execução, ou à situação das partes quanto à sua nacionalidade ou seu domicílio, ou à localização de seu objeto, ele tem liames com mais de um sistema jurídico”. Carlos Alberto Carmona (1998, p. 121) nos ensina que: “o caráter internacional da arbitragem deriva do fato de pertencerem às partes litigantes a Estados diversos (seja como cidadãos, seja como residentes) ou do fato de a relação controvertida desenrolar-se no território de Estados diversos”.
Execução. Sentença Arbitral. Homologação. STJ. A sentença arbitral que se quer executar deriva de procedimento arbitral instaurado mediante requerimento à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, com sede em Paris, França. Contudo, ela foi proferida em língua portuguesa, no Brasil (por escolha consensual das partes), por árbitro brasileiro e com aplicação do Direito brasileiro em seu mérito. Discute-se, ao cabo, a necessidade de prévia homologação pelo STJ desse título, tido pela recorrente como sentença arbitral estrangeira, para que se torne apto a aparelhar a execução. (...) Assim, na hipótese, o simples fato de o procedimento arbitral ser requerido na corte internacional e se ter regido por seu regulamento não tem o condão de desnaturar a nacionalidade brasileira da sentença em questão, título idôneo a lastrear a execução, por si só dotado de eficácia, o qual não necessita de homologação judicial para ser executado. Precedentes citados: SEC 894-UY, DJe 9/10/2008; SEC 611-US, DJ 11/12/2006, e SE 1.305-FR, DJ 7/2/2008. (REsp 1.231.554-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/5/2011). Informativo STJ n. 0474 - Período: 23 a 27 de maio de 2011
Fonte: Brasil (2011, p. 11).
Pode-se concluir, então, que a diferenciação entre esses dois modelos de arbitragem se dará de acordo com o local em que ela foi realizada.
Nesta aula, estudaremos a aplicação da arbitragem no Direito Comercial, bem como no Direito Desportivo. Nessas duas situações, verificaremos como a arbitragem pode funcionar para solucionar um conflito, possibilitando, assim, que ele seja resolvido de forma mais rápida e eficaz.
O Direito Comercial Internacional é o mais beneficiado pela arbitragem por conta da enorme força vinculante dos usos e dos costumes desse ramo. Tal ramo do Direito, por ser muito dinâmico e prático, possui normas que visam proteger a empresa e seu lucro, portanto a arbitragem, por ser um meio muito mais rápido e dinâmico, propicia um maior bem-estar à empresa, principalmente, no Brasil, visto que o Poder Judiciário é lento e congestionado.
A maior alteração ocorrida no Direito Comercial nos últimos anos foi a promulgação da Lei nº 10.303/2001, que reformou a Lei das Sociedades Anônimas. Ela acrescentou que o estatuto da sociedade pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser solucionadas mediante arbitramento, nos termos em que se especificar (CARVALHOSA, 2002).
A cláusula compromissória constante do estatuto social deve ser explícita quanto às partes e às relações societárias entre elas e sobre os limites da competência arbitral. A respeito da cláusula compromissória societária, Modesto Carvalhosa diz que a questão fundamental gira em torno da identificação das pessoas que se vinculam à cláusula compromissória estatutária, ou seja, quais são as partes que a instituem e as submetem aos seus efeitos (CARVALHOSA, 2002).
A cláusula compromissória não adquire caráter associativo, conforme o §2º do art. 4º da Lei nº 9.307/96. Contudo, essa cláusula vincula a sociedade e, individualmente, os acionistas que a instituíram nos atos de constituição da sociedade ou em alteração estatutária, seja para dirimir divergências e litígios entre eles, acionistas compromissados, e a sociedade, seja nas pendências que entre eles, acionistas compromissados, surgirem no futuro.
Modesto Carvalhosa, ainda, preleciona que a entidade arbitral deve ser indicada desde logo na cláusula compromissória estatutária, a fim de que, posteriormente, não tropece o compromisso com arguições em juízo (CARVALHOSA, 2002). Desse modo, o autor exemplifica, descrevendo como deve ser uma cláusula compromissória estatutária:
As divergências que poderão surgir entre as partes, assim entendidas a sociedade e seus acionistas, ou entre acionistas controladores e minoritários em relação a interesses legais e estatutariamente reconhecidos, e as divergências de interpretação, aplicação e exercício dos direitos e obrigações decorrentes da atividade social ou da situação de acionistas, serão dirimidas pela Câmara de Arbitragem ‘X’, segundo as regras desta mesma entidade, e nos estritos termos da Lei nº 9.307/96 (CARVALHOSA, 2002, p. 27).
Essa cláusula compromissória completa facilita imensamente a posterior instituição do compromisso, na medida em que não será necessário apontar árbitros no momento da controvérsia da lide. Caso contrário, a discussão sobre os nomes e o número de árbitros no caso tornará difícil a celebração do sucessivo compromisso, frustrando os objetivos da adoção do juízo arbitral prevista no estatuto.
Sentença Arbitral condena a RedeTV a indenizar a empresa TopSports. Em decisão final, sem possibilidade de recurso, o Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá considerou a RedeTV culpada e deu prazo de 15 dias para que esta indenize a empresa de marketing Top Sports em cerca de R$ 5 milhões por quebra do contrato de parceria que mantinham para transmissão de eventos esportivos. (...) A sentença arbitral põe fim à disputa entre Rede TV e Top Sports, que começou no dia 16 de setembro de 2004. A utilização da arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá foi estabelecida de comum acordo entre a Top Sports e a Rede TV como o foro para dirimir qualquer divergência relativa ao referido contrato.
Fonte: Câmara de Arbitragem Guarulhos (2020, on-line)¹.
No Direito Desportivo, são inúmeras as vantagens de se recorrer à arbitragem e há vários exemplos de câmaras arbitrais especializadas em lides desportivas, merecendo menção especial a Corte Arbitral do Esporte em Lausanne, Suíça. No Brasil, infelizmente, deve-se ressaltar que a Justiça Desportiva é dotada de competência constitucional, levando o intérprete a entender que o constituinte buscou dar prevalência a essa instância desportiva, porquanto em desuso o instituto da arbitragem (GUILHERME, 2012).
É importante frisar que são os objetos dos contratos desportivos em que, muitas vezes, aparecem os direitos da personalidade (arts. 11 a 21 do Código Civil). Podem, em princípio, ser resolvidos por arbitragem, como ocorre no exterior, mas, no Brasil, há opção pela Justiça Desportiva.
Faz-se necessário ressaltar as diferenças entre a Justiça Desportiva e a arbitragem. Enquanto o objeto da arbitragem são os direitos patrimoniais disponíveis, a primeira centraliza-se nas infrações disciplinares e competições desportivas praticadas por pessoas físicas ou jurídicas compreendidas pelo Sistema Nacional do Desporto e a este, direta ou indiretamente, filiadas ou vinculadas, conforme os arts. 1º a 24 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD).
Enquanto a jurisdição da arbitragem advém da vontade das partes, expressa por meio de cláusula de arbitragem ou de compromisso arbitral, a Justiça Desportiva possui jurisdição constitucional estabelecida pelo §1º do art. 217 da Constituição Federal de 1988.
Se, na arbitragem, as partes podem escolher os procedimentos pelos quais serão julgadas suas lides, na Justiça Desportiva, os procedimentos já estão previstos no Código Brasileiro de Justiça Desportiva e não podem ser afastados ou modificados pelas partes. A arbitragem pode dirimir controvérsias oriundas dos mais variados contratos desportivos, como de direito de imagem e arena, trabalhistas, de transmissão, de transferências, nacionais e internacionais.
As especificidades formais e materiais dos contratos desportivos, o sigilo com o qual devem ser tratados para que as partes não sejam expostas a riscos desnecessários, a rapidez com que as dúvidas deles oriundas devem ser julgadas para evitar prejuízos indesejados e o caráter internacional, cada vez mais marcante, das relações desportivas são motivos que, segundo Luiz Fernando Guilherme (2012, p. 54), “levam à conclusão natural de que a arbitragem é um meio bastante eficiente e eficaz para preservar ao máximo as partes envolvidas no litígio e seu objeto, além de garantir que se faça a justiça em tempo hábil”.