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Entrever paisagens

Espinhos, argila, galhos, pedras, lã: olhando ao redor podemos concluir que estes materiais vêm da natureza para constituir estes trabalhos de arte. Os materiais parecem muito simples, eles respiram no mesmo mundo que eu. Algumas ideias obsoletas a respeito de arte, que sempre estão a nos rondar, me invadem: que a arte deve ser perene, que os materiais devem ser valiosos. Dispendiosos ou não, sinto que aqui a ênfase é na ação e não na produção de objetos. No entanto são ações muito íntimas e contidas e por isso os artistas lançam mão de recursos como a fotografia e o vídeo para dar registro ao que é efêmero.

Lembro que isso era um expediente utilizado na Land art e sua ações que se davam na natureza longe do espaço expositivo e que careciam de registro, então a fotografia, língua nativa da arte conceitual, dava conta de relatar, contar o ocorrido. Se os materiais parecem vir da natureza, a discussão aqui não é sobre uma intervenção na paisagem. A menos que seja uma paisagem interior, desconfio eu.

Então o dorso do corpo faz vezes de horizonte, a argila lembra o osso da coluna vertebral, os pequenos pontos dos espinhos mimetizam um tecido celular. A presença de um pequeno desenho de anatomia de uma cabeça parece apontar que o ponto de partida é a mente e seus fluxos. Fluxo, ação, efemeridade. No entanto, diferente do elogio ao improviso, aqui parece haver uma ordem por trás de tudo isso.

A lã é tramada, as pedras são ordenadas, os galhos são atados um a um e remontam uma àrvore, os espinhos são aninhados com esmero em um suave papel manteiga. Se o foco é no fluxo, que faz o artista se engajar na ação, parece haver uma delicadeza a ser preservada através desses gestos tão contidos. Uma verdade que escorre, que não se entrega. Como aquele momento ao sonhar em que algo muito importante foi compreendido, mas ao acordar nos escapa. Eu saio da cama, corro para o computador para escrever mas já é tarde, eu sigo escrevendo apenas para reter na escrita ao menos a sensação, pra que eu pelo menos possa relembrar mais tarde que houve um rasgo: uma verdade se deu e eu não pude retê-la.

A demanda da perenidade perde sua vez para o efeito acumulativo das ações alinhadas pela poética de cada um. Se os artistas parecem engajados em um esforço inútil é porque talvez assim seja. O impossível nunca os freou. Eles seguem trabalhando assim como eu sigo escrevendo: na tentativa de entrever aquela verdade fugidia mais uma vez.

Marcelo Amorim

(projeto coletivo com os artistas: Brisa Noronha, Élcio Miazaki e Simone Moraes)

2019

- Memorial Municipal Getúlio Vargas - curadoria de Shannon Botelho - Rio de Janeiro - RJ

Fotografia sem galeria - Mapa das artes - São Paulo - SP

2018

Galeria da FAV/ UFG (Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás)/ Goiânia - GO

MACC (Museu de Arte Contemporânea de Campinas) - SP

2017

III Bienal do Sertão - Vitória da Conquista/ BA

Casa das Onze Janelas - Belém do Pará - PA

ECEU - Espaço Cultural e de Extensão Universitária da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - SP

Casa Nubam - coletiva "Carne Levada" - São Paulo - SP

2016

Programa de exposições Galerias de Santos - SP

Programa de exposições MAC Jataí - GO

Arte no Mercearia S. Roque - São Paulo - SP

2015

18ª Bienal de Cerveira (Portugal)

trabalhos/ projetos incorporados nessa coletiva:

- 2 imagens da série 'Passiflora sapiens'

- instalação de galhos secos

- 2 gravuras em metal (até então inéditas)