Amigos,
Nesta hora de despedida
Queremos dirigir-vos umas breves palavras...
Palavras de agradecimento, de reconhecimento, por tudo o que nos proporcionaram viver,
na nossa primeira estadia
na vossa Quinta de S. Francisco!
Serão, estamos certos disso, momentos que nunca
apagaremos da nossa memória, pois neles saboreámos
a presença viva de Jesus Cristo,
a presença do Deus do Amor!
O local paradisíaco, com a corrente murmurante de
águas translúcidas do rio Teixeira,
pontuado por cascatas e enseadas,
verdadeiras piscinas naturais com spas inigualáveis,
com uma envolvente arborização multiforme exuberante
de verde, colorida aqui e ali por libelinhas azuis e
bagas vermelhas, transportaram-nos para os
"Jardins do Éden"
e efectivaram um cenário transbordante de energia vital
que nos envolveu desde a nossa chegada.
As casas e os muros em xisto com os seus socalcos
onde montámos as tendas, a capela de S. Francisco e o
campo de jogos, foram outras peças do puzzle que rechearam
a nossa permanência.
Mas acima de tudo isto, o acolhimento que recebemos
o sorriso franco,
o tratamento pelo nome próprio, não mais esquecido,
a porta aberta da sua casa,
a refeição partilhada,
A alegria do canto acompanhado pela viola,
a exigência enérgica do passeio pela Serra e
subida do rio
o empenho imprimido nos jogos disputados,
a disciplina necessária,
o toque do apito ou do sino para congregar,
a oração posta em comum ao longo dos vários momentos do dia,
tudo isto foi para nós revelador do "pão vivo descido do Céu",
da dádiva gratuita, dum dom maior,
da vivência da fraternidade verdadeira,
da experiência viva do evangelho,
sinal de esperança e da presença do Ressuscitado.
Obrigado por estes dias
Obrigado por esta vivência partilhada,
Continuem firmes na fé
Com este coração grande em acolher!
Ao Senhor pedimos que vos abençoe
e vos envie o Seu Espírito Santo,
hoje e sempre!
Bem Hajam
ENS - Equipa 136
João Paiva + Nani + Carolina + Duarte
Nelita + Nuno + Mariana + Eduardo + Beatriz
Esmeralda + Zé Adelino + João Afonso + Catarina + Susana
16 Agosto 2009
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A Quinta de São Francisco é um lugar perdido no meio da Serra da Freita, entre São Pedro do Sul e Arouca, junto ao Rio Teixeira. A dois quilómetros de penosa subida da encosta íngreme, através da floresta, fica o Carregal de Manhouce, uma aldeiazita com uns 6 habitantes. Chove muito, lá: é talvez o lugar mais chuvoso de Portugal, depois do alto do Gerês.
Em 1992, num dia de Inverno, saímos do comboio, lá na Sernada do Vouga. Caminhávamos há já dois dias pela estrada, porque não tínhamos um mapa para andar por caminhos de serra. Chegámos a uma ponte sobre um lindíssimo rio de montanha, que corria com força sobre os blocos de granito. Mas subir aquele rio, no Inverno, com comida para um dia, entrando na montanha sem fazer a menor ideia do que havia para diante, era, no mínimo, imprudente, mesmo pelos nossos padrões. Acho que naquele momento não percebi verdadeiramente o que estava em jogo. Foi uma experiência bastante dramática. Dois dias a racionar a pouca comida, debaixo da chuva impiedosa, avançando com muita dificuldade agarrados às paredes de rocha. O rio corria com tanta força que nem pescar se conseguia, nem espaço havia para montar a tenda, tivemos de dormir em cima das pedras, com a água a correr à volta, com um plástico por cima.
Dois dias depois avistámos umas ruínas sobre uma cascata, naquele vale estreito e encaixado, no meio da floresta. O lugar era tão estranho, tão fora deste mundo, que nem percebíamos como era possível haver ali uma casa, no meio do nada. Percebemos que tinha tido terra agrícola, mas a floresta tinha já tomado conta dela de tal maneira que, mais uma vez, nem espaço havia para montar a tenda. Depois acabámos por conseguir sair do rio, subir uma montanha para chegar a uma aldeia, e, alguns dias depois, regressar a casa.
A verdade é que, durante bastante tempo, nunca mais nos lembrámos daquele lugar. É verdade que era um lugar bonito, mas parecia impossível fazer ali fosse o que fosse... Foi quando começámos a lidar com os miúdos da Quinta do Chegadinho, em 95, quando surgiu o Clube da Montanha, que algo mudou. Esta amizade, com estes miúdos, foi uma coisa que aconteceu que não esperávamos. Chegou o Verão e queríamos levá-los a acampar a um lugar bonito, que lhes mostrasse algo para além daquelas barracas de lata e contraplacado, daquele lixo e das fossas cheias de ratos. Porque não para aquele lugar que tínhamos encontrado? Não tínhamos carro, tínhamos de levar tudo às costas, mas metemo-nos com uma dúzia deles no autocarro para Arouca, que era o lugar com transportes mais próximo, atravessámos a serra inteira e ali chegámos de novo, para fazer o nosso primeiro acampamento do Clube da Montanha. Aos poucos aquele lugar, a que chamávamos "Rio Teixeira", deixou de ser um um lugar qualquer, foi ganhando um rosto através do rosto de cada um daqueles miúdos cujo bem tanto desejávamos.
Ao longo destes anos, centenas de grupos que passaram pela Quinta de S. Francisco. Muitas vezes nos perguntam porque é que não pedimos dinheiro pela estadia, porque assim fazíamos frente às despesas mais facilmente. A verdade é que nos dá uma grande alegria receber quem aparece como nossa família... Outros chegam lá e olham admirados em volta. Falam das condições que o lugar não tem, olham com condescendência para a minúscula casinha de pedra, as "barracas" de madeira, as latrinas e outras curiosidades locais. Percebo que, ao olharem para as coisas, não vêem o que nós vemos: os rostos dos nossos amigos, das nossas crianças, do Vítor, da Tina e da Vera, de todos aqueles por quem demos a vida. Vêem apenas "coisas" onde nós vemos rostos concretos, uma história de encontro que acontece. E isso faz toda a diferença. É pobre, a nossa "quinta"? Pois é. Mas é a história do nosso encontro com os outros e da busca do que vale realmente a pena.
Miguel e Anabela