As últimas semanas misturaram ansiedade, medo existencial e confusão política, desorganizando praticamente todas as categorias de nosso cotidiano. A própria fibra da vida foi afetada com o veto ao ar livre, ao contato com o outro, à festa, à congregação e a alguma confiança no futuro., Foi-nos tirada a mínima parte solar que ainda era possível nessa era desde há muito difícil e confusa.
Esse panorama gera os sintomas negativos desse tempo, mas gera também, na dimensão de evento inconcebível, uma provocação e um desafio ao pensamento. Nosso tempo é de desânimo, mas é também de tentativa constante de tocar o sentido do que vivemos. Vêm circulando textos de intervenção, ou seja, provisórios, efêmeros, incompletos, variando entre a genialidade e a tolice, a lucidez e a paranoia, todos eles uma tentativa mais ou menos competente de dar conta do impossível cotidiano,o normal do agora.
A proposta do primeiro número da revista co_vid@ é, então, como um ponto de partida, pensar o que foi dito até aqui sobre a pandemia, em publicações que estão circulando, como a Sopa de Wuhan (com seu título infeliz), e as várias coletâneas de editoras, revistas e coletivos. Fazer a crítica desses textos é um primeiro passo para criar um mapa do imaginário desse período.
Convidamos então o envio de textos de intervenção — sejam ensaios, contos, poemas, imagens — sobre a pandemia para começar o trabalho crítico de pensá-la e, com alguma sorte, obter um fármaco ao menos para a mente.
Cuidem-se
Sopa de Wuhan — https://drive.google.com/file/d/1XFdCCkRsidQ9aStot-oxnO-OSIdy1a0M/view?usp=sharing
Coronavírus e a luta de classes — https://drive.google.com/file/d/1M-SG7JwdCakdlD30I2-jix8m3of8-rGi/view?usp=sharing
Coletânea online da editora N1 — https://n-1edicoes.org/textos-1
Thomas project — http://www.thomasproject.net/today-on-board/
Paul Preciado sobre a interrupção da luta feminista contemporânea — https://medium.com/@rondnunes/est%C3%A1vamos-prestes-a-fazer-a-revolu%C3%A7%C3%A3o-feminista-e-ent%C3%A3o-chegou-o-v%C3%ADrus-de-paul-b-preciado-36a1e7e800f7
Se a política brasileira desde 2013 tem se caracterizado por transe e tensão contínua, com uma surpreendente tomada de poder pela extrema-direita e o enfraquecimento e desorganização também surpreendente das esquerdas, a crise pandêmica acirrou os traços de violência já presentes na nossa contemporaneidade política e nos obrigou a confrontar a dimensão de alucinação e indiferença (ou razão política) genocida que têm marcado a política conduzida pelo governo federal nos últimos meses.
O evento existencial na pandemia e da solidão social se soma, assim, ao evento político da alucinação da democracia brasileira com suas figuras típicas: o presidente absurdo, esfíngico em sua — indiferença, maquiavelismo, loucura, ignorância…—, as carreatas embandeiradas, os ministros arrependidos, a esquerda (des)organizada que se recusa a assumir um lugar no palco, os heróis impossíveis na figura de governadores como Doria e Witzel, que a partir da mera falta de absurdo salvaram multidões. Espantosamente o silêncio das ruas ampliou retumbantemente a história de som e fúria contada por nosso idiota, e pôs objetivamente a democracia brasileira, já por si tão frágil, em risco de esfacelamento.
A revista co_vid@ número 2 se propõe a pensar os termos deste esfacelamento do sistema político brasileiro a partir de termos que parecem cercá-lo: biopolítica, fascismo, idiocracia, mas também escatocracia (o governo das fezes/ o governo do evento do fim do mundo), kakistocracia (o governo dos piores), maniacracia (o governo da loucura) para com sorte se projetar a possibilidade dos termos de saída e do caminho de fuga de nossa, enfim, distopia.
A co_vid@ receberá contribuições que versem sobre questões pertinentes ao estado de mundo em que nos encontramos, isto é, que toquem, ainda que de modo inacabado, efêmero ou fugidio, algum lado da dinâmica pandêmica -- contágio, quarentena, estado de exceção, convívio virtual, erotismo...
Toda contribuição deve ser enviada para o e-mail revistacovida@gmail.com com o assunto contribuição.
Formato:Textos em prosa de até 5 páginas (máximo de 10.000 caracteres com espaço), título e subtítulos em maiúsculas.
Poemas de até 50 versos / 2000 caracteres .
Imagens de no máximo 150 kb.