4. A especiação

Darwin questionava-se igualmente sobre as diferenças entre os indivíduos da mesma espécie: Porque existiam espécimes distintos? Tais diferenças seriam úteis? Compreendeu que a evolução das espécies só poderia existir devido à variabilidade dos seres vivos. E embora a variabilidade que tinha observado na viagem fosse imensa, parecia obedecer a padrões, a saber: 1) a relação geográ­fica e geológica entre as espécies extintas e as espécies actuais; 2) a relação entre espécies que vivem em proximidade geográfica; e 3) a relação entre as espécies insulares e as espécies dos continentes adjacentes.

Poucos meses depois de ter desembarcado da viagem do HMS Beagle de quase cinco anos, Darwin instalou-se em Londres e entregou-se à organização e à análise das pesquisas que efectuara durante a viagem. Começa então a encaixar as diferentes peças que viriam a dar origem à sua Teoria da Evolução por Selecção Natural. Pouco a pouco, ia organizando a sua grande ideia: Poderia uma espécie originar outra? E se podia, como é que tal acontecia?

Três evidências convenceriam Darwin de que a sua “transmutação" estava certa: 1) as semelhanças na estrutura dos organismos (homologias); 2) os fósseis; e 3) os embriões.

a) Espécies e Especiação

A definição do conceito de espécie, em Biologia, é essencialmente operacional: uma espécie é um grupo de seres vivos que são capazes de se reproduzir entre si, gerando descendência saudável e fértil, pois o seu material genético é semelhante e compatível.

Figura: Apesar de parecerem muito diferentes, estas aranhas pertencem à mesma espécie - Theridion grallator.

Figura: Nova espécie de roedor descoberta recentemente

na Amazónia, denominado Isothrix Barbarabrownae.

Figura: Top 10 das espécies (lista de 2009).

O Instituto Internacional de Exploração de Espécies (IISE), da Universidade do Arizona, já divulgou as espécies descobertas e registadas em 2009. Um peixe rã com aparência psicadélica e uma esponja carnívora encontram-se entre as dez descobertas mais importantes. Esta lista é realizada todos os anos pelo instituto citado e por um comité internacional de taxonomistas.

O conceito de especiação remete para um processo que decorre ao longo do tempo, produzindo alterações numa espécie que a transformam numa outra (anagénese) ou através do qual uma espécie diverge para se tornar em outras duas ou mais espécies (cladogénese).

Figura: Exemplo de especiação por cladogénese.

Ora, se uma espécie se fragmentar em grupos que permaneçam isolados durante o tempo suficiente (variável consoante a espécie),

então essas populações podem vir a acumular alterações genéticas que impossibilitem voltarem a gerar descendência saudável e fértil no caso de voltarem a reunir-se. Foi o caso dos tentilhões observados por Darwin nas ilhas Galápagos, onde o isolamento geográfico os conduziu a uma diferenciação, observável sobretudo ao nível do tamanho e dos bicos.

Figura: Diferentes espécies de tentilhões.

As principais causas da especiação devem-se ao isolamento geográfico ou à redução do fluxo genético.

Figura: O isolamento geográfico como causa da especiação.

Figura: A redução do fluxo genético como causa da especiação.

A especiação artificial vem comprovar os resultados obtidos na natureza. Diane Dodd demonstrou, através de experiências laboratoriais, como o isolamento reprodutivo pode desenvolver preferências para o acasalamento nas Drosophila pseudoobscura (moscas da fruta) após apenas oito gerações. Para tal, usou diferentes tipos de alimentação: maltose e amido. Esta experiência, ao contrário de muitas outras já levadas a cabo por cientistas, tema a vantagem de poder ser facilmente replicada, incluindo a utilização de outros tipos de moscas da fruta e diferentes tipos de comida.

Figura: Especiação artificial, em laboratório.

b) Tipos de especiação

A especiação ocorre sob condições diversas, mas geralmente o motivo é o isolamento de membros da mesma espécie. Considera-se que existem quatro tipos de especiação que apontam para as explicações mais prováveis para a sua ocorrência:

Figura: Esquema dos 4 principais tipos de especiação.

1) Na especiação alopátrica, fronteiras geográficas reais obrigam as espécies a separam-se fisicamente. Um rio ou uma cordilheira, por exemplo, podem causar a divergência de uma espécie.

Figura: Os tentilhões das Galápagos são exemplo da especiação alopátrica.

2) Na especiação parapátrica, uma espécie espalha-se em áreas grandes com ambientes diversificados. Conjuntos de indivíduos adaptam-se a essas novas áreas e, gradualmente, as espécies tornam-se distintas. Não há uma característica geográfica definida que os separe, podendo tornar-se espécies distintas simplesmente por causa da distância entre os grupos.

Figura: A especiação em anel como exemplo da parapátrica.

3) A especiação peripátrica ocorre quando um pequeno grupo se isola do núcleo principal da espécie. Como esse grupo é apenas uma pequena parte da população total da espécie, todas as diferenças genéticas que tornam a espécie robusta podem estar ausentes. Isso constitui o que os biolólogos denominam "efeito de gargalo". Assim, alguns dos genes que fluem habitualmente dentro de uma espécie foram eliminados e separados do conjunto genético.No efeito evolucionário de gargalo, uma pequena população consegue produzir gerações subsequentes.

Figura: Efeito de gargalo.

É possível que um pequeno grupo dê início a uma nova população, mas pode haver repercussões provenientes do efeito de gargalo. Os genes presentes nessa pequena população ficarão fortes, pois o fluxo genético é muito maior do que seria em uma população maior, na qual as diferenças genéticas, incluindo anormalidades, estão disseminadas: tal é denominado "efeito fundador". Os genes dos membros fundadores daquela que acaba por se tornar uma grande população tornam-se muito mais frequentes do que em populações maiores semelhantes.

Figura: Efeito fundador.

4) No caso da especiação simpátrica, os membros de uma espécie continuam a viver lado a lado, mas separados em espécies diferentes. A redução do fluxo genético ocorre, não devido a barreiras geográficas, mas a outros factores.

Por exemplo, alguns insectos alimentam-se e reproduzem-se utilizando um só tipo de fruta. Se alguns membros dessa espécie experimentarem outro tipo de fruta, os descendentes podem ser ensinados para utilizarem aquela fruta também. Se isso acontecer, os membros da espécie poderão dividir-se em dois grupos distintos, apenas com base na alimentação.

Figura: Um exemplo de especiação simpátrica: as espécies coexistem

no mesmo habitat, mas diferenciaram-se pelo tipo de alimentação.

As notícias acerca da descoberta de novas espécies não param de crescer:

Pristimantis adnus e Pristimantis educatoris (Imagens: Andrew Crawford)

«Centistas do Instituto Smithsonian de Investigações Tropicais encontraram duas novas espécies de rãs no Panamá: a Pristimantis educatoris, encontrada no Parque Nacional Omar Torrijos, e a Pristimantis adnus, que vive na província de Darién, na fronteira com a Colombia. Os investigadores, coordenados por Karen Lips, verificaram que um dos anfíbios recolhidos no parque da capital do Panamá era maior do que os espécimes encontrados em outros sítios e, ao compararem as suas formas com as demais, chegaram à conclusão de que "eram, na realidade, uma nova espécie para a ciência", comunicou o Smithsonian.

O nome Pristimantis educatoris foi uma homenagem a Jay Savage, professor de biologia da Universidade de Miami, enquanto a rã Pristimantis adnus deve seu nome às siglas ADN. “Optamos por este último nome para ressaltar as técnicas genéticas das quais nos servimos para identificá-las", sublinhou o cientista Andrew Crawford.

Esta nova descoberta eleva o número de espécies de rãs descritas no Panamá e Costa Rica para 197, 15 por cento delas identificadas nos últimos sete anos. » 28/05/2010

(Fonte: http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=43003&op=all#cont)