“A máquina enquanto fixa que depende do homem e o homem um ser maleável que vai para todas as direções”
(Wellington Gonçalves)
A obra Shaky Balance apresenta uma transfiguração sobre a imagem poética de Paul Klee.
Em seu processo, a colaboração entre performer-compositor explorou as interações entre saxofones-máquina, em que foram compostas 4 (quatro) miniaturas que dialogam com base nas setas de Klee.
Jatos, bolhas, correntes de água saem de dentro de uma concha plantada no fundo do mar. Percorrem as cavidades e os caracóis, ressoam nas paredes circulares. O vigor destas forças faz vibrar toda a estrutura de cálcio que um dia foi habitada por alguma criatura. Agora, de dentro da concha desabitada, podemos ouvir outros seres: amorfos, dinâmicos, em constante metamorfose. Eles se encontram e deixam-se levar pelas bolhas, ao sabor das águas, dialogando de forma prosaica e despretensiosa. As imagens evocadas são o contexto de nossos devaneios sonoros.
Partindo das imagens sonoras que nasceram da ideia inicial de um violoncelo borbulhante, foram usados samples gravados no próprio violoncelo - dedos da mão esquerda sendo percutidos no espelho, pizzicatos deformados por glissandos e notas longas com batimentos causados pelo choque de intervalos propositalmente dissonantes que se alteram lentamente - que são processados e criam a textura da peça. Além disso, o som do violoncelo é analisado em tempo real por meio de descritores de áudio, especialmente aqueles que possuem correlação mais direta com a percepção auditiva (altura, ataque e intensidade), fornecendo os parâmetros de controle para processos visuais generativos no ambiente Processing. A textura resultante remete a um instrumento que emerge das profundezas ressoantes de uma concha, e, nesse processo, libera tamanha energia que gradualmente a transduz em ebulição de lava, fervura e vapor.
As imagens visuais que compõem a peça são baseadas em um conjunto de aquarelas pintadas pela própria instrumentista. Buscamos aqui uma maneira de extrapolar as limitações mecânicas que a execução do violoncelo impõe ao instrumentista, desenvolvendo formas de se pintar uma aquarela por meio do gestual da performance. Seria possível que a crina do arco atritando as cordas fosse a mesma crina de um pincel que tinge uma tela? Que os dedos que percutem o espelho imprimam linhas e pontos no papel que tornem visuais as imagens sonoras buscadas? Assim, as aquarelas são também pintadas em tempo real, sendo que em cada nova execução uma possibilidade diferente de técnica pintura foi simulada: pontilhismo, pinceladas longas, o descontrole da tinta no papel molhado, a impressão de gestos, dentre outras.
A peça/performance é constituída por três movimentos, partindo do poema Inerte, de Marcello Magdaleno, como base poética e impulso para o desenvolvimento dos sons, movimentos e imagens. Os patches que exploram as relações entre esses três elementos usam o software Pure Data (Pd), gravações de campo, instrumentos, movimentos e vozes. Desenvolvemos cada movimento a partir de uma parte do poema, procurando transpor a interação do corpo com o mar - ocêanico ou metafórico - junto a imagens e sonoridades que intuímos desta atmosfera.
Além de ser o ponto de partida, o poema também foi usado para estruturar o roteiro da peça:
Movimento 1 Inerte Subinerte
Este primeiro movimento é a introdução ao poema composta por trechos de gravação de voz, de dois dos integrantes do grupo, que são convoluídas com uma gravação da paisagem sonora do mar, registrada pelo grupo. Com base neste processo acústico, foi construída uma textura intermitente, cujos parâmetros de controle são constantemente modulados estocasticamente. Estes mesmos parâmetros modulam também os efeitos visuais do vídeo, como mudança de cor e opacidade.
Movimento 2 O Corpo Levado
A partir deste momento, ocorre um aumento de complexidade da rede de interação entre som e imagem, gerando uma analogia com um mar revolto. Os processos de convolução iniciados no primeiro movimento são sobrepostos por trechos do poema processados com granulação e pitch shift. Após um período de experimentação com essas sonoridades, a performance se dirige a um rarefação textural que encaminha o movimento seguinte.
Movimento 3 O Mar Quando Quebra na Praia
Nesta última parte, a calma do primeiro movimento retorna, as imagens e os sons se tornam menos abstratos, na medida em que o poema é apresentado na íntegra de forma mais inteligível, que o som do mar se torna reconhecível e que o vídeo se torna mais estático. O mar com um quê de Caymmi.
As imagens partem de três desenhos iniciais desenvolvidos a partir do questionamento de como seria a imagem do movimento do mar. O primeiro faz referência às correntes marítimas, já o segundo e o terceiro, ao reflexo da luz na superfície da água que se movimenta conforme as ondas. Em seguida, esses desenhos foram manipulados no Photoshop utilizando as ferramentas de multiplicação e mescla de camadas, resultando nas imagens integrantes da peça.
A partir do poema Inerte foram selecionadas palavras que remetem a movimentos e qualidades de movimentos tais como inerte, fluido, submerso, jogado, colado, levado e quebrado. Assim, buscou-se experimentar uma improvisação com movimentos corporais captados em vídeo que interagisse com os outros elementos da performance. Destes gestos, seriam extraídos dados numéricos que seriam utilizados nos processos de manipulação de som e imagem. Procuramos, assim, manter organicamente uma relação entre os fenômenos sonoros, visuais e poéticos, de forma a gerar uma experiência multimodal imersiva, apesar das limitações que uma apresentação remota impõe.
Pela casa apresenta dois vídeos que consolidam experimentações realizadas pelo grupo 4 durante o Musitec2. Os vídeos tem como principal motivador o texto Pela Casa, de Juliana Araújo. Diversas interpretações do texto foram exploradas para a composição do vídeo, como por exemplo: a ideia de interior e exterior do sujeito, utilizando a tensão entre o que se observa e o que é observado e a noção de movimento que o texto sugere com a ideia de andar pela casa. Também diversas leituras do texto foram realizadas, sugerindo diversos afetos a partir da entoação da fala.
Durante o nosso processo criativo, trabalhamos na elaboração de um banco de sons e imagens. Nesse contexto, privilegiamos processos de experimentação, buscando extrair diversos pontos de vista e transformações de um mesmo material. Desse modo, em cada encontro realizávamos conversas sobre os materiais explorados por cada um, discutindo assim a sua presença no vídeo e possíveis novas experimentações.
Na elaboração final dos vídeos, optou-se por dois processos distintos. O primeiro foi elaborado a partir do som: ou seja, primeiro criou-se uma composição sonora utilizando vozes e sons (do banco de som) e, tomando o áudio como referência, o vídeo foi montado. Dessa forma, a dinâmica das imagens de alguma maneira espelha as dinâmicas das texturas sonoras.
O segundo vídeo é uma releitura do primeiro vídeo, buscando explorar processamentos de imagem e som. Neste contexto, explorou-se texturas e transformações das imagens e sons, focando em jogos de dilatação e compressão do tempo. Para sua realização, primeiramente fizemos transformações nas imagens do vídeo 1 para depois criar uma sonorização através de materiais do banco de sons e de processamentos de áudio com o objetivo de criar texturas sonoras a partir dos sons da voz.
Um incerto simulacro de ordem ou um controle da pura desordem?
Esta primeira versão – precária ainda, franca nos seus limites – da peça acusmática "Pele de Imagens" foi forjada no diálogo. Esforço coletivo, a peça foi tomando forma em ciclos por circuitos: do pensamento à palavra e da palavra ao pensamento, do pensamento ao ouvido, do ouvido à voz e à mão e de volta ao ouvido. Em um processo em que o sensível era chamado a testemunhar continuamente, as amostras se reconfiguraram em outras amostras: os originais, em novos originais, por meio de encontros que, às vezes, criavam sentidos improváveis. No pensamento, os sons foram colados, torcidos, esticados, tumultuados: o desalinho desenhou linhas, formas e diagramas nos quais o som se expandia em direções simultaneamente múltiplas – inclusive na direção de zonas a partir das quais a obra perde seus poderes, se cala, se recolhe, nada mais pode fazer.
No processo de fatura, o ouvido (e sua memória) foi a máquina convocada para gerar tropos - colamos os ouvidos aos espelhos onde os sons rebatiam. A escuta foi ao mesmo tempo um enredo com valor de outro e uma verificação instável. Essa máquina composta, trêmula, antiga, capaz de levar ao mais fundo e ao mais rarefeito e de lá trazer lumes, é a mesma que pode se mostrar hábil para ouvir e dar voz a sobreviventes, a invisíveis, a poetas, a cegos.
Nesta peça, duas máquinas encenaram um conceito: cada avanço guarda dívida com o que precede. Num canto, a máquina-ouvido; no centro, as máquinas liquidificadoras do dinheiro, pilares deste mundo: tecnologias de cultura deste sistema fechado de valores que legitimam sua marcha. Cientes da encrenca em que estamos metidos, preferimos não dar a elas a importância que elas próprias se dão de fábrica. Preferimos não ignorar que elas são produtos centrais de uma construção de mundo, o mundo da incapacidade de discernir a humanidade secreta dos existentes não humanos. Por fim, preferimos olhar com desconfiança para a representação que certas máquinas dizem ser de nós, cientes da desonestidade do autoelogio e da maneira intrusa, enxerida e malandra com que elas entram nas vidas.
"Os brancos não sonham tão longe quanto nós. Dormem muito, mas só sonham consigo mesmos". - Davi Kopenawa e Bruce Albert, "A Queda do Céu", pág. 390 (Companhia das Letras, 2019)
Poderíamos propor outro trevo: Cinema – Artes Plásticas – Literatura – Música.
"(...) meu pensamento vai de uma (palavra) para outra, em todas as direções; elas aumentam em mim sem fim". - Davi Kopenawa e Bruce Albert, "A Queda do Céu", pág. 65 (Companhia das Letras, 2019)
Vá, pensamento, toma as asas dos sons que estão prontos para o vôo: defenda-nos lá onde as mercadorias falam de forma única.
“Um som nunca é substancial, "ele é" nunca, jamais, um objeto, pois "ele é" nunca presente. Assim em que "ele é" ouvido, ele já se foi, morto, como Derrida diria. Portanto, nós não temos nenhum gancho para integrar nosso maquinário ontológico à experiência sônica; nós não podemos localizar, e portanto não podemos identificar ou re-identificar sons.” (Christoph Lischka, tradução nossa)
Art by Joan Stark
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Lidamos apenas com fantasmas; com registros materiais de um fenômeno que já passou. Em um processo de comunicação remoto isso ocorre também em outro nível, com a multiplicidade de espaços e meios em que ocorre. Em busca de uma experimentação estética utilizando a improvisação remota, buscamos potencializar a materialidade inerente no processo de interação com a máquina. O espaço da voz à improvisação e é ele que acelera o processo em direção a si mesmo.
Será apresentado um dos movimentos da composição Três Poemas e Uma Frase de Luiz Gama, ainda em andamento, em conjunto com alguns aspectos técnicos de sua construção. Faz parte deste projeto a criação de um patch de Open Music construído a partir dos estudos realizados sobre a organização harmônica na obra do compositor Magnus Lindberg. Durante o MUSITEC2 este patch foi revisado parcialmente, sob as orientações do professor Mikhail Malt.
Irá apresentar seu projeto em desenvolvimento na UFJF. Este teve a colaboração do prof. Mikhail Malt no que se refere ao uso das ferramentas Fast Fourier Transform (FFT), Spear e OpenMusic. O projeto é vinculado à composição da obra Arabesque | 19 11 97 para flauta com live electronics que faz uso de síntese e ressíntese de samples, de controles de contornos melódicos pelos crivos de Iannis Xenakis e da Afinação Justa, entre outras implementações de processos composicionais.
SIASP consiste em um sistema interativo implementado em Pure Data a partir de algoritmos baseados em processos de music information retrieval, machine listening e processamento digital de sinais. Esse ambiente interativo foi construído pensando nas possibilidades timbrísticas e gestuais da marimba e na interação entre as suas especificidades técnicas instrumentais e processos de síntese, transformação e espacialização sonora em tempo real.
O sistema conta com três módulos de síntese em tempo real, sendo dois deles elaborados a partir da biblioteca tresf desenvolvida por José Henrique Padovani (2020), baseado no algoritmo desenvolvido por Miller Puckette e utilizado por Philippe Manoury em suas peças. O terceiro módulo parte do patch background, desenvolvido por Giovanni Dettori (2009).
Cada módulo de síntese sonora possui um mapeamento paramétrico que conduz suas atuações a um conjunto restrito de interações e sonoridades. O primeiro módulo de síntese 3f articula sonoridades em resposta imediata aos eventos (ataque e conteúdo espectral) do sinal de referência, enquanto o segundo módulo 3f é responsável por atuar em um segundo plano, com amplitude reduzida e articulando o conteúdo espectral acumulado pelo histograma do descritor Croma a partir de eventos sonoros com longa duração e ataque indefinido, disparados apenas na detecção de sons ruidosos. O módulo background atua a partir do sinal de amplitude reconhecendo alturas do instrumento para sintetizar harmonias (especificadas no patch) através de sintetizadores senoidais. Nesse sentido, cada módulo responde a um conjunto distinto de estímulos sonoros, detectados pelo conjunto de descritores empregados.
Já as transformações sonoras em tempo real são realizadas por um vocoder construído a partir do exemplo do William Brent utilizando a biblioteca TimbreID. Esse algoritmo utiliza o objeto [barkSpec~] como um banco de filtros com espaçamento em um quarto de Barks. Cada oscilador recebe como amplitude a quantidade de energia na banda do filtro Bark associada à sua frequência. O ambiente ainda conta com um granulador (desenvolvido por Maximos Papakostas) e um sistema de espacialização binaural (da biblioteca HOA).
A partir deste conjunto de processos, SIASP busca relacionar a sonoridade da marimba com sons de características espectrais e perceptuais diversas, correlacionando-as localmente a partir de atributos do sinal de áudio extraídos na análise. Os dados obtidos na análise são mapeados a fim de desempenharem diversas funções paramétricas, tais como: disparo de eventos sonoros; geração de novos parâmetros de controle e de criação nos módulos de síntese e granulação; e variação do deslocamento espacial dos objetos.