Estágios de Proteção Radiológica

1. Breve Histórico

Após a ocorrência, em 1987, do maior acidente radiológico já registrado no Brasil na cidade de Goiânia – GO, que culminou da dispersão de aproximadamente 19 g de Cloreto de Césio-137 proveniente da violação do envólucro de uma fonte radioativa utilizada em um aparelho de radioterapia para o tratamento de câncer de próstata, foi observada que havia a necessidade de se capacitar e treinar equipes de pronta resposta às emergências radiológicas.

Com a participação de diversos órgãos civis e militares nos trabalhos de identificação, monitoramento de área e ambiental, e de descontaminação das áreas do acidente, foi também percebida no processo de lições aprendidas a necessidade de preparo de tais equipes para uma ação mais específica e coordenada.

Nesse mesmo passo, o Exército Brasileiro participou ativamente na segurança Química, Biológica, Radiológica e Nuclear (QBRN) em diversos eventos de grande visibilidade que aconteceram no Brasil, como os V jogos Mundiais Militares, em 2011; a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio+20, em 2012; a Jornada Mundial da Juventude e a Copa das Confederações FIFA, em 2013; a Copa do Mundo de Futebol FIFA, em 2014; e os Jogos Olímpicos e Paralímpicos, em 2016. Ao longo desses eventos, houve a participação integrada dos diversos escalões, do nível tático ao estratégico, com emprego de tropas especializadas de Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear do EB, dentre as quais figuram o 1º Batalhão de Defesa QBRN, 1º Companhia de Defesa QBRN, bem como a Escola de Instrução Especializada (EsIE); além da atuação do Instituto de Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear (IDQBRN), como de Assessoria Científica.

Considerando esse cenário marcado por uma ampla difusão do conhecimento e capilaridade do emprego da Força Terrestre, o Alto Comando do Exército Brasileiro (EB) percebeu a necessidade de criar um estágio para capacitação e preparação de profissionais do Serviço de Saúde do EB, na área de Proteção Radiológica para emprego não só em emergências, mas também na área de radiodiagnóstico, medicina nuclear e radioterapia, que são atividades comumente desempenhadas nos hospitais e clínicas militares pertencentes ao Exército.

Nesse contexto, o Ministério da Defesa (MD) aprovou, por meio da Portaria nº 00183/FA-43, de 20 de Janeiro de 1997, as Normas Básicas de Radioproteção nas Forças Armadas (FA-N-03), estabelecendo as diretrizes básicas de radioproteção. No documento em epígrafe, o MD disciplinou as atividades com radiações ionizantes no âmbito das Forças Armadas e, com isso, desde 1997 e alinhada com o Alto Comando do EB, a Seção de Engenharia Nuclear (SE/7) do Instituto Militar de Engenharia (IME) conduz o Estágio de Proteção Radiológica visando à formação e à capacitação, com periodicidade anual, dos oficiais pertencentes ao Serviço de Saúde do EB, a fim de prepará-los e torná-los divulgadores do conhecimento e das experiências adquiridas.


A importância do Estágio pode ser demonstrada, a título de informação, através do exemplo da Região Amazônica, que concentra muitas instalações militares, e que mantém suas atividades em localidades com pouco ou nenhum suporte além do provido pelo EB. Nestas localidades especiais, as orientações e decisões sobre a segurança das atividades com radiação ionizante são apresentadas basicamente pelos oficiais de saúde que participaram dos estágios básico e avançado de proteção radiológica do IME.


2. Escopo do Estágio

Os Estágios, Básico e Avançado de Proteção Radiológica, possuem como universo de seleção, tenentes e capitães de carreira do Serviço do Saúde (médicos, dentistas, farmacêuticos) e do Quadro Complementar das áreas de atividade de Enfermagem e Veterinária. Além destes, a critério do EME, podem ser abertas vagas para integrantes de Forças Singulares e Forças Auxiliares, bem como, aos oficiais de Nações Amigas.

O Estágio de Proteção Radiológica é ministrado em duas fases: (a) o Estágio Básico e (b) o Avançado. O Estágio Básico de Proteção Radiológica oferece disciplinas teóricas e acontece nas instalações da SE/7. Consiste na 1ª fase do curso completo, sendo realizado uma vez por ano, com duração de 2 (duas) semanas. Ocorre, normalmente, na segunda quinzena de abril ou na primeira quinzena de maio, com carga horária de 48 horas.

O Estágio Avançado de Proteção Radiológica consiste na 2ª fase do curso e é realizado em seis semanas, ao longo de outubro e novembro, com carga horária de 196 horas. Esse Estágio é desenvolvido em duas etapas: a primeira, parte teórica, no IME, e a segunda, parte prática, nas Instalações do IDQBRN. Nessa segunda etapa do Estágio, são desenvolvidas instruções teóricas e práticas, de forma a estimular a participação ativa dos discentes, empregando-se uma metodologia que envolve a abordagem dos princípios básicos de proteção radiológica, detecção e identificação das radiações ionizantes, bem como o uso de equipamentos de proteção individual (EPI).

Nas duas etapas do Estágio de Proteção Radiológica, os profissionais são treinados no exercício das seguintes ações: (a) fundamentos básicos de triagem de pessoal radioacidentado; (b) atendimento dos acidentados considerando a proteção radiológica da equipe; (c) ações demandadas das equipes médicas considerando os efeitos biológicos causados pela radiação ionizante e (d) atendimento às boas práticas radiológicas. Nos últimos anos, com a questão da segurança nos grandes eventos sediados, somados às possíveis ações utilizando materiais nucleares para provocar distúrbio social, em um cenário geopolítico atual marcado por crescentes guerras assimétricas no teatro de operações, aumenta-se o grau de importância de cursos e estágios desta natureza para a Força Terrestre brasileira.


3. Objetivos


a. desenvolver a capacitação básica para proteção radiológica em atividades rotineiras e para situações de emergência;

b. capacitar os militares que, no exercício das suas funções, operem direta ou habitualmente com Raios X ou substâncias radioativas, tendo em vista a ocupação de cargos e o desempenho de funções afetas ao indivíduo ocupacionalmente exposto (IOE);

c. identificar os controles de saúde ocupacional necessários para o trabalho com radiação ionizante;

d. conhecer a legislação que estabelece requisitos sanitários para a garantia da qualidade e da segurança em sistemas de radiodiagnóstico, bem como a relação mínima de testes de aceitação e de controle de qualidade que devem ser realizados pelos serviços de saúde;

e. descrever proteção radiológica e nuclear, os princípios de detecção das radiações e equipamentos de proteção individual (EPI);

f. executar exercício prático de detecção e manuseio da instrumentação nuclear e do uso de EPI;

g. descrever ações e executar exercício prático de ações de resposta a situações de emergência; e

h. conhecer e realizar procedimentos de controle de qualidade de equipamentos de radiodiagnóstico.


4. Referências


  1. Portaria nº 036-SCT, de 02 de Julho de 2002, que aprova as instruções reguladoras da inscrição, da seleção e da matrícula nos Estágios.

  2. Portaria nº 092 – DGP, de 23 de maio de 2008, que aprova as normas para codificação e estágios do Exército Brasileiro e cria o catálogo de códigos para cursos e estágios do EB;

  3. Portaria nº 204 – EME, de 14 de dezembro de 2012, que aprova a diretriz para atualização e funcionamento do Sistema de Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear do Exército (SisDQBRNEx);

  4. Portaria nº 05-EME, de 31 de janeiro de 2013;

  5. Portaria nº-14 – EME, de 05 de fevereiro de 2013, que altera as condições de funcionamento do Estágio Básico de Proteção Radiológica para oficiais;

  6. Portaria nº 012-DCT, de 10 de abril de 2013;

  7. Portatia nº 210-DECEx, de 19 de agosto de 2019.

5. Importância

Ao longo desses quase 20 anos de Estágio, houve a capacitação de mais de 300 militares do Serviço de Saúde que atuam em todo o território nacional. Este trabalho de capacitação tem se mostrado fundamental e uma condição indispensável para difundir o conhecimento e a cultura da radioproteção nas unidades militares do EB, com impactos positivos sobre a segurança radiológica de várias atividades.

6. Perspectivas futuras

Considerando o grau de importância no tema, existe um estudo para transformar os Estágios, Básico e Avançado de Proteção Radiológica atualmente oferecidos em um curso de pós-graduação latu sensu. Neste formato, o curso procuraria se adequar às necessidades imediatas do EB, de maneira que os alunos buscassem desenvolver produtos e resultados específicos para problemas urgentes e reais encontrados na prática na utilização de equipamentos que emitem radiação ou fontes radioativas.

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