Austeclínio Lopes de Farias O Limiar entre Estilo e Autoplágio enquanto Partilha: Uma comunicação acerca da interligação entre repetição, variação e percepção na construção e recepção artística


A presente proposta tem como questão central a exploração do limiar entre estilo e autoplágio como recurso explorado por diversos eixos do modernismo artístico, considerando suas implicações tanto na criação artística quanto na dimensão receptiva. A investigação destaca a importância de considerar como uma obra que sistematiza estratégias construtivas calcadas na repetição e variação pode não apenas firmar um polo fenomenológico que evidência suas "limitações auto-impostas" (BORDWELL, 1988), mas que possa deslocar o receptor em uma posição de montador, tensionando a topologia produtor-contemplador - rompimento de tal fenda entre consumo e construção que é, como insere Greenberg (GREENBERG, 1997), gesto maior para o que o pensador identificou como a pauta "modernista". Neste contexto, almeja-se estabelecer uma correspondência com o conceito de "partilha do sensível" de Jacques Rancière (RANCIERE, 2005), o qual analisa a distribuição estética das formas sensíveis no que tange, sobretudo, ao afundamento da dicotomia entre esfera pública e privada. O limiar entre estilo e autoplágio pretende cartografar, neste cenário, uma instância de "redistribuição do sensível", no qual o receptor é instado a participar ativamente da edificação e desconstrução dos elementos materializados. 

A comunicação busca argumentar que a intersecção entre estilo e autoplágio oferece ao receptor um distanciamento do olhar passivo, levantando a indagação da maneira como como dois objetos distintos podem ser percebidos como iguais, na medida em que convida-o a explorar os espaços de excesso e irregularidades presentes nesse limiar. Destaca-se nesta pesquisa o filme "Right Now Wrong Then" (2015) do diretor Hong Sang-Soo como um exemplo concreto de um jogo construtivo calcado no limiar entre repetição e diferença, em que pequenas variações sutis têm a potência de alterar significativamente a diegese e conduzir o espectador a uma multiplicidade de sínteses, indagando-se sobre as abordagens do pintor Ad Reinhardt e do musicista João Gilberto, explorando igualmente como a repetição e a diferença se manifestam em suas obras, instigando o polo receptivo a reconstruir e reavaliar sua percepção do que se apresenta enquanto diferença. Desta forma, apoiando-se nos apontamentos de Deleuze em relação ao papel da repetição na "produção da diferença" (DELEUZE, 2018), a presente investigação busca diagnosticar o papel da repetição nos exemplos selecionados não como mera reprodução do igual, mas como terreno que permite que a diferença se insinua e se desdobre. Ao final, a proposta busca sugerir a maneira como o limiar entre estilo e autoplágio não apenas opera enquanto estratégia que potencializa a jogabilidade inerente à produção artística, mas fornece igualmente tal movimento à experiência do espectador ao proporcionar um espaço para a exploração criativa e a reconstrução contínua de uma constelação de obras, aderindo assim ao imperativo modernista da retro-alimentação não apenas entre conteúdo e forma, mas também entre o fazer e o perceber. 

Austeclínio Lopes de Farias. Musicista e pesquisador de Brasília, reside em São Paulo, formado em Composição Musical na Universidade de Brasília e mestrando em Música da USP. Apresentou-se como solista, compositor, arranjador e improvisador junto a grupos de diversas formações, como orquestras de câmara, e big bands, tendo composições apresentadas em São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro, Bahia, Curitiba, Belo Horizonte e Porto Alegre. Desde 2017 participou de treze álbuns lançados, como também foi compositor das trilhas sonoras de três produções do diretor, também brasiliense, Xavier Braun (Jurupari, Conto de Caos no Império dos Sonhos e CHUMBO). Foi bolsista no Musitec 2 - 2o seminário de música e tecnologia: invenção musical e ambientes de programação, com o projeto "O Espaço Ecoa" (2020). Realizou a palestra "Space ecoes like an immense tomb: an ecological approach towards telematic improvisation" com Bruno Cunha no Simpósio internacional Open Wide organizado pela FMT society de 2021. É junto a Edgard Felipe, fundador da gravadora e selo Dobradiça Enferrujada Discos, discutida no último livro "Uncommon Music For the Common Man" do fundador do grupo britânico "AMM", Edwin Prévost. Orientou, em 2022, o Laboratório teórico e prático de improvisação livre, organizado pela LICRID - UFRJ. Foi selecionado como primeiro colocado do Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal 2022 com a série "Dobradiça Entrevista". Artista selecionado para a 40a e 41a Oficina de música de Curitiba, assim como para o Ateliê contemporâneo da Escola de Música de São Paulo de 2024 e para o São Paulo Contemporary Composers Festival do mesmo ano. Pesquisador e Artista selecionado para a 6 edição do Simpósio Internacional de Música Nova. Compositor premiado pelo Festival Nascente USP 2023 na categoria música erudita. Possui textos a respeito do trabalho de Morton Feldman, Gerard Grisey e Hugues Dufourt publicados por revistas como a Música (USP) e Vortex (Unespar), e atualmente traduz e escreve juntamente a Daniel Pitta o prefácio e posfácio de “No Sound Is Innocent” (Nenhum Som é Inocente), também de Prévost, a ser publicado pela Numa Editora. É atualmente estagiário docente no departamento de música na Universidade de São Paulo e monitora a disciplina “Criação e Performance no Repertório Musical Contemporâneo”.