Bauhaus: da Completa Subversão Educacional à Revolução das Técnicas no Século XX

Por Filipe Tramontin Santiago

No início do século XX, mais precisamente em 1919, nasce a escola politécnica de design Bauhaus, na cidade de Weimar, na Alemanha. Mesmo durando até meados de 1933, a escola era reconhecida como um antro de estudantes, professores e profissionais criativos dentro da Europa.

O leque dos discentes era muito extenso, indo desde pintores, escultores, arquitetos até a fotógrafos, muitos com carreiras já consolidadas, como Wassily Kadinsky, Ludwig Mies Van der Rohe, Walter Gropius, Lyonel Feining e etc.

Com “(...) a Bauhaus conseguiu se transformar em principal paradigma do ensino do design do século 20”1, Rafael Cardoso em seu livro “Uma Introdução a História do Design”, representa de forma sucinta a fama continental e até mundial da universidade alemã. O método de ensino da Bauhaus era o completo oposto do que sempre foi adotado na velha e elitista estrutura acadêmica de educação artística. Sem falar de que se tratando de uma universidade pública e com boa parte de seus fundadores e professores sendo socialistas, a própria filosofia da Bauhaus se propunha a se opor ao conceito de que a educação artística deveria ser algo para poucos (nobres, filhos de famílias ricas, auxiliares de artesãos/artistas etc), proporcionando assim, um acesso democrático de ensino superior artístico a qualquer um dos seus discentes.

Antes de qualquer aula sequer sobre história da arte e os movimentos artísticos que transpassaram a humanidade, o aluno era obrigado a cumprir um curso básico no qual aprendia fundamentos das artes plásticas como cores, formas, espaço etc e tipos diferentes de técnicas como pintura, escultura, marcenaria e etc, tudo isso seguindo um viés de observação e experimentação. Ou seja: O “(...) curso básico era o cerne de formação básica artístico-politécnica na Bauhaus.”2.

Elucidado inicialmente por Bernhard Bürdek com “a meta da atividade de projeto na Bauhaus era a de criar produtos para as camadas mais amplas da população”3 e com “o designer deve servir ao povo”4, a Bauhaus trouxe um paradigma novo, que o design é e deve ser um produto tal como qualquer outro de diferentes áreas da indústria, e portanto deve ser um bem de consumo acessível e de ótima qualidade. Completamente em contrapartida à noção pré-estabelecida de que a arte deveria ser sempre um produto de luxo e de uso exclusivo para parcelas ínfimas da população.

É visível como a grade atual dos cursos de design tem uma influência direta da filosofia da universidade Bauhaus. Se por um lado temos também uma educação de história da arte ao mesmo tempo que aprendemos disciplinas técnicas e de projeto de produto, por outro, vemos como toda a estrutura do curso tem um fim primordial na manufatura de produtos (bens de consumo). Indo desde o projeto de um bem de consumo físico (mobiliar, capa de livro, ferramentas, objetos de uso cotidiano etc) como um produto imaterial também (um site, arte conceitual de um jogo e/ou animação, rendering de uma planta baixa etc).

O legado do minimalismo difundido enormemente na escola (e dentro de outros movimentos europeus do século XX) também transpassou as correntes do tempo, com muitos produtos sendo inspirados na estética da escola.

No decorrer do curto prazo de vida da universidade, os docentes, assim como os discentes da Bauhaus, produziram fantásticos projetos de design minimalista que são referenciados e, dependendo até, fabricados nos dias de hoje. Dentre os frutos da escola, temos os seguintes exemplos:

Com o conforto advindo do tecido de couro e icônica estrutura de aço tubular, a Cadeira Wassily (ou modelo B3), feita pelo (na época) aluno húngaro Marcel Breuer é extremamente minimalista e modelos similares são encontrados até nos dias de hoje. A forma da estrutura foi inspirada em um guidão de uma bicicleta.

Figura 1: Cadeira Wassily.

Fonte: https://www.knoll.com/product/wassily-chair

Rompendo ainda mais barreiras e aprofundando em demasia no minimalismo, A Cadeira Brno, criada pelo arquiteto e discente e Ludwig Mies Van der Rohe possuía apenas duas pernas, que na verdade eram uma estrutura única de formato curvilíneo que servia como suporte do assento, o acolchoado também era simples com tecido de couro.

Figura 2: Cadeira Brno.

Fonte: https://www.knoll.com/product/brno-chair-flat-bar

A (também na época) estudante Marianne Brandt, criou o Infusor de Chá da Bauhaus. A forma do bule dispõe de uma ponta que impediria vazamentos do líquido contido, uma alça de ébano que teria uma alta resistência ao calor, evitando assim queimaduras à mão do usuário e, além disso, contém um filtro em seu interior. É simples e tem uma função com execução eficiente.

Figura 3: Infusor de Chá Bauhaus.

Fonte: https://shop.bauhaus-movement.com/bauhaus-tea-essence-pot-marianne-brandt

O Abajur/Luminária Bauhaus (M18) projetado pelo (no momento) aluno Wilhelm Wagenfeld possuía uma forma simples reduzida praticamente apenas a desempenhar com elegância sua função. A base e “carcaça” da estrutura de metal era feita de um vidro translúcido enquanto o vidro que recobria a lâmpada era fosco. Este abajur está em produção até hoje.

Figura 4: Abajur Bauhaus.

Fonte: https://shop.bauhaus-movement.com/wilhelm-wagenfeld-table-lamp-wa-24

O berço de bebê do arquiteto Peter Keler foi inspirado diretamente nas teorias de Wassily Kadinsky sobre as relações entre as cores, as formas e as emoções humanas. O uso de cores simples (azul, amarelo e vermelho) tal qual de formas extremamente básicas (retângulo, triângulo e círculo) iam de acordo com os ensinamentos do professor, e assim como os outros exemplos citados, dispõe de uma forma extremamente reduzida à sua função.

Figura 5: Berço de Bebê.

Fonte: https://shop.bauhaus-movement.com/bauhaus-cradle

O jogo de xadrez projetado pelo escultor e discente por Josef Hartwig. Era talhado em madeira e a forma de cada uma das peças contém uma representação minimalista dos possíveis movimentos. Além da criativa solução formal para cada uma das peças, um dos objetivos era romper com o simbolismo religioso e monárquico previamente atribuído ao jogo, trazendo-o para a era moderna.

Figura 6: Jogo de Xadrez Bauhaus.

Fonte: https://www.bauhauskooperation.com/knowledge/the-bauhaus/people/masters-and-teachers/josef-hartwig/

Todos os produtos citados tiveram soluções formais, estruturas simples e composição de materiais comuns da época. O objetivo além de proporcionar uma forma praticamente reduzida a sua função, era resultar em uma rápida e fácil reprodução e manufatura de cada um desses projetos, permitindo uma fácil aquisição para qualquer cidadão de qualquer camada da sociedade, seguindo claramente as filosofias da escola.

Portanto, mesmo com um período de existência, a faculdade Bauhaus conseguiu deixar um legado fantástico que conseguiu além de romper em muitas esferas os limites das antigas faculdades de arte, desde a própria formação do aluno, até a própria ideologia do porquê e como desenhar um produto ou bem de consumo. O minimalismo adotado em toda sua duração é algo que inspirou futuras gerações de grandes artistas, arquitetos, engenheiros e, por fim, designers.

1 CARDOSO, R. Uma Introdução à História do Design, 2008. p. 130.

2 BÜRDEK, B. Design: História, Teoria e Prática do Design de Produtos, 2010, p. 29.

3 Ibid, p. 31.

4 Ibid, p. 33.

Referências

BÜRDEK, B. Design: História, Teoria e Prática do Design de Produtos, 2010.

CARDOSO, R. Uma Introdução à História do Design, 2008.

10 Designs Imperdíveis da Bauhaus. ItalianLeather, 2019. Disponível em: http://italianleather.com.br/10-designs-imperdiveis-da-bauhaus/. Acesso em: 26/04/2021.

Josef Hartwig. Bauhaus Kooperation, 2020. Disponível em: https://www.bauhauskooperation.com/knowledge/the-bauhaus/people/masters-and-teachers/josef-hartwig/. Acesso em: 26/04/2021.

MARTINIQUI. E. Timeless Examples of Bauhaus Design Still Relevant and Popular. Widewalls, 2016. Disponível em: https://www.widewalls.ch/magazine/bauhaus-design. Acesso em: 26/04/2021.

Ficha Técnica

Texto desenvolvido por Filipe Tramontin Santiago para a disciplina Introdução ao Estudo do Design - Universidade Federal do Rio Grande do Norte - Departamento de Design - Abril de 2021. O texto colabora com o projeto de extensão “Blog Estudos sobre Design”, coordenado pelo Prof. Rodrigo Boufleur (http://estudossobredesign.blogspot.com).