MINICURSO


Introdução às noções de sexo e gênero em Judith Butler

Doramis Doria Oliveira*

“O termo ‘fêmea’ é pejorativo não porque enraíza a mulher na natureza, mas porque a confirma no seu sexo” (BEAUVOIR, O segundo sexo, 2019, p.31. grifos meus.). Butler, ao se deparar com essa frase, provavelmente diria que sim, a mulher se confirma no seu sexo, mas somente porque há uma naturalização, por meio da liguagem, dele. Ou seja, ela afirma que há uma certa construção de “coerência” do sexo como natural e causador do gênero, assim como essa “coerência” também regula uma prática de desejo presente no sexo, partindo da matriz heterossexual, visto que a estrutura dos sexos é supostamente uma estrutura binária entre “homem” e “mulher”. 

De fato, a binaridade “feminino” e “masculino” surge à sociedade como um atributo expressivo dos sexos, respectivamente, “fêmea” e “macho”, só que nessa relação, entre o casal composto pela binaridade, força-se uma heterossexualização do desejo absoluto, de modo tal que corrobora a noção dos gêneros “opostos”, como uma relação de desejo, em que o masculino se diferencia do feminino e que, por isso, através desse “desejo”, eles devem ficar juntos. De certa forma, essa noção é influenciada também pelas dessemelhanças, principalmente dos órgãos genitais, entre seus corpos*, assim levanta-se um outro problema: a heterossexualidade compulsória, esta que, por reforçar definições de gênero, colabora com as repressões de características corporais que não necessariamente deveriam pertencer, arrisco-me a pontuar, à suposta estrutura binária dos sexos (feminino e masculino). 

Acontece que a própria estrutura binária dos sexos é colocada à prova quando questionamos se o sexo é natural. Pois bem, a heterossexualidade em Butler é vista como uma prática que opera repetitivamente para confirmar a “materialidade” do sexo, não como um desejo sexual relativo ao “sexo oposto”, pois, segundo a autora, o sexo/gênero surge através de uma idealização objetivada em práticas que se auto regulam (performativas). É possível destacar que é o próprio gênero (como caráter social do sexo) que produz o “sexo” pré-discursivo, de forma tal que ambos, no final das contas, são a mesma coisa. Isso pode até parecer confuso, no entanto, para melhor esclarecer, podemos exemplificar situações como: quando observamos uma pessoa e, sem contestamentos, a identificamos como homem ou como mulher, depreende-se anteriormente o suposto gênero, ainda que o corpo não seja desvelado (“sexo” ignorado). Logo, pode-se inferir que há, de certa forma, uma ficção que se cria através da linguagem**, considerando, sobretudo, que a autora não refuta as necessidades fisiológicas e biológicas (as quais ela chama de “fatos”) do corpo apenas acredita que “...a irrefutabilidade dos fatos de modo algum compromete o que poderia significar afirmá-los por meios discursivos” (BUTLER, Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”, 2010. grifos meus) 

Dito isso, com a clareza dos tópicos apresentados, segue-se que o objetivo desse minicurso é, antes de tudo, realizar uma  introdução acerca da investigação pela qual a filósofa estadunidense Judith butler estabelece o “sexo” não como natural, mas como discursivo. Para isso, investigaremos, no primeiro momento, o capítulo 1 da obra Problemas de Gênero: feminismo e subversão da identidade (Judith Butler), no segundo momento, caminharemos brevemente pela obra A História da Sexualidade: A vontade do saber (Vol. 1) (Michel Foucault) e, já no terceiro e último momento, analisaremos a introdução do texto Corpos que Importam: Os limites discursivos do sexo. (Judith Butler). 

Palavras-chave: Sexo; Gênero; Corpo; Performatividade 

Objetivos

1- Introduzir, aos ouvintes, uma discussão sobre o “sexo” não naturalizado e sua relação com o gênero sob uma perspectiva pós-estruturalista. 

2- Investigar, a partir de uma visão histórico-crítica como se “fez” a construção do que é o sexo na sociedade segundo Michel Foucault em: A História da sexualidade: Vol. 1, A vontade do saber. 

3- Compreender, ainda que brevemente, como a noção social sobre uma suposta relação obrigatória entre sexo e gênero perfaz o conceito de “corpo” em Judith Butler. 

Metodologia

A partir de uma perspectiva analítica e investigativa, serão trabalhadas, em aulas expositivas, 3 obras (Problemas de Gênero: feminismo e Subversão da identidade; História da Sexualidade, Vol. 1: A vontade do saber e Corpos que importam: Os limites discursivos do sexo) em sala online via Google meet (link a ser disponibilizado). 


Cronograma [remoto] 


Bibliografia primária: 

BUTLER, J. Problemas de gênero: Feminismo e Subversão da identidade. Tradução de Renato Aguiar. - 21º ed. - Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2021. 

FOUCAULT, M. História da Sexualidade 1: A vontade de saber. Tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque. Rio de Janeiro/ São Paulo: Paz e Terra, 2021. 

BUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. Tradução de Veronica Daminelle e Yago Françoli. São Paulo: Crocodilo edições, 2019. 


Bibliografia secundária: 

AMBRA, P. O ser Sexual e Seus Outros: Gênero, Autorização e Nomeação em Lacan. São Paulo: Editora Edgard Blucher Ltda, 2022. 

LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pós-estruturalista. Petrópolis: Vozes, 1997. 

JESUS, B. M. Desnaturalizando o gênero e a sexualidade. Santa Maria: Sociais e Humanas, 2014. 

BEAUVOIR, S. O segundo sexo, vol. 1: fatos e Mitos. Tradução de Sérgio Milliet. - 5º ed. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2019. 

FIRMINO, H. F. FEMINISMO, IDENTIDADE E GÊNERO EM JUDITH BUTLER: APONTAMENTOS A PARTIR DE “PROBLEMAS DE GÊNERO”. São Paulo/ Araraquara, 17 2017. 

CIRINO, O. O desejo, os corpos e os prazeres em Michel Foucault. Mental, Barbacena , v. 5, n. 8, p. 77-89, jun. 2007. 

MENTOR, P. Representação, metafísica da subtância e poder em Judith Butler. Brasília, n. 11, v. 1, p. 127-138, out. 2019.


*Possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal de Sergipe (2022). Mestranda na área de Conhecimento e Linguagem na Universidade Federal de Sergipe (UFS). Tem experiência na área de Ciências humanas, com ênfase em Filosofia, atuando principalmente nos seguintes temas: Sexo e gênero. Tem experiência em sala de aula pela realização de PIBID e estágios. 

**“Embora os cientistas sociais se refiram ao gênero como um “fator” ou “dimensão” da análise, ele também é aplicado a pessoas reais como uma “marca” de diferença biológica, linguística e/ou cultural. Nestes últimos casos, o gênero pode ser compreendido como um significado assumido por um corpo (já) diferenciado sexualmente; contudo, mesmo assim esse significado só existe em relação a outro significado oposto.” (BUTLER, 2021, p. 31).

*** Linguagem” aqui não se refere estritamente às palavras, mas ao comportamento social que se cria a partir delas.