Título
Por um Museu Brasileiro de Escultura e Ecologia
Local ( Cidade, Estado , País)
São Paulo, São Paulo, Brasil
Coordenadas Geográficas
-23.573296159290997, -46.67668176444097
Data
1972-1995
Descrição
A reação popular contra a construção de um shopping no Jardim Europa resultou num longo processo de reivindicações que culminou com a ocupação do terreno pelo MuBE.
As ações, organizadas principalmente desde a associação de moradores do bairro, a SAJEP, tiveram início em 1972 quando os vizinhos descobriram que árvores do terreno estavam sendo derrubadas para proceder à construção de um shopping. A partir desse momento buscaram mobilizar a população para evitar a obra, o que foi possível por meio de um discurso pautado principalmente na defesa da vegetação do bairro, ameaçada por interesses privados. Assim, a SAJEP conseguiu inicialmente que fosse suspendido o alvará, sendo também responsável posteriormente pela solicitação e efetivo tombamento do bairro (como parte dos “Bairros dos Jardins”) no Condephaat. Entretanto, um exame do processo de reivindicações indica que o discurso de preservação ambiental, que se manifestava aparentemente como uma prática do comum, não estava movido por esses objetivos.
Por um lado, a análise do processo de tombamento, seguida da decisão de construir um museu, evidencia que a principal finalidade da solicitação da SAJEP ao Concephaat não foi preservar “o verde”, como pregavam as faixas reivindicativas e imprensa, mas preservar a exclusividade do uso do solo do bairro por parte da elite da cidade. A lei de zoneamento que autorizava o shopping colocava fim ao uso exclusivamente residencial do bairro, privilégio adquirido pelos moradores décadas atrás, resultado da transferência dos interesses econômicos da empresa loteadora para a legislação municipal. Contudo, o tombamento –que garantia a preservação da arborização, mas que não aceitou a solicitação dos moradores de preservar o uso residencial unifamiliar– não foi satisfatório para a SAJEP. Assim, foi necessária uma ação mais contundente, uma efetiva apropriação do lote, que teve lugar por meio de uma expropriação da Prefeitura e concessão à Sociedade de Amigos dos Museus (SAM), liderada por integrantes da SAJEP e responsável pela proposta da construção de um museu.
Por outro lado, a análise do processo de escolha e construção do edifício do museu reafirmam as contradições do discurso da SAJEP. Um primeiro projeto, elaborado por Sérgio Prado, partia de propostas profundamente ancoradas em preocupações ecológicas, desde a construção de um “edifício-parque” até as futuras atividades e exposições que ele abrigaria. Porém, ainda que contando com o apoio de importantes autoridades públicas, o projeto de Sérgio Prado foi desconsiderado, sendo substituído pelo projeto definitivo, elaborado por Paulo Mendes da Rocha e fruto de um concurso fechado. Desde sua concepção com preocupações ecológicas explicitamente longe do protagonismo, a obra contou com apoio financeiro e patrocínio de grandes empresas da indústria extractivista vinculadas aos principais materiais empregados em sua construção, e pertencentes a famílias dos Jardins. O museu, inicialmente proposto como Museu Brasileiro de Escultura e Ecologia passou a ser então apenas Museu Brasileiro de Escultura (MuBE).
O terreno continua em disputa desde a inauguração do MuBE, em 1995, alvo de conflitos entre a Prefeitura e a SAM, e reivindicado pela população que questiona sua utilidade pública enquanto espaço dedicado à Escultura e à Ecologia.
Principais agentes envolvidos
-Sociedade de Amigos do Jardim Europa e Paulistano (SAJEP)
-Sociedade de Amigos dos Museus (SAM)
-Prefeitura Municipal de São Paulo
-Condephaat
-Empresas patrocinadoras e financiadoras da obra (Votorantim, Grupo Klabin, Saint Gobain, etc.)
-Imprensa (O Estado de São Paulo, Folha de São Paulo)
-Arquitetos (Sérgio Prado, Paulo Mendes da Rocha)
-Empresa loteadora (Sociedade Anônima Jardim Europa)
-Proprietários do terreno que pretendiam construir o shopping (Alexandre Kliot e herdeiros)
Dados Complementares (área, eventuais conflitos e repercussoes por ex)
O resultado da disputa, que em todo momento esteve norteada por um discurso que aparentemente se fundamentava em práticas do comum ao defender dos interesses privados a população da cidade e seus recursos naturais, teve visíveis consequências violentas tanto para uns e quanto para outros.
Por um lado, a elite que impulsionou as lutas conseguiu com a construção do MuBE garantir a proteção do valor das suas propriedades e diminuir consideravelmente o desconforto causado pelo intenso fluxo de público a que estariam expostos com a construção de empreendimentos como o shopping.
Por outro lado, a ação mais violenta foi cometida contra o chão, contra os não humanos que habitavam o terreno. Grandes árvores foram derrubadas na primeira “limpeza do terreno” quando do início das obras do shopping, em 1972. As figueiras da cerca viva foram envenenadas em 1980 propositalmente, com indícios de que algum dos agentes envolvidos na disputa fosse o autor. Para a construção do edifício do MuBE 37.850 m3 de terra (turfa, rica matéria orgânica natural decomposta) foram extraídos do lote, sendo a maioria da superfície coberta por toneladas de aço e concreto moldado por madeira de primeiro uso vinda de árvores procedentes de locais remotos. Restou assim pouco espaço para criar um jardim de mínima presença vegetal na cobertura, cujo projeto de Burle Marx foi simplificado e, depois, executado com restrições derivadas da falta de dedicação de recursos a esta parte do projeto.
Imagens