Comunicado

O que está mal, muda-se

Por Manuel João Ramos (31/07/2004)

Ninguém defende melhor os nossos interesses que nós próprios. Se não é assim, pelo menos deveria ser. Muitas vezes, é por preguiça e por falta de motivação cívica que preferimos delegar em outrem a defesa dos nossos interesses e direitos.

Uma coisa é, por exemplo, confiarmos de forma participada no apoio que um médico, um advogado ou um professor nos prestam, sem deixar de acompanhar os processos decisórios outorgados pelas suas especialidades. Outra coisa, completamente diferente, é delegarmos completamente nas mãos desses especialistas a responsabilidade pela nossa saúde, pelos nossos direitos ou pela educação dos nossos filhos.

O mesmo se passa em relação aos políticos. Preferimos frequentemente delegar neles, por um processo de obscura “representação democrática”, o nosso poder de resolução de problemas, de decisão sobre matérias fundamentais para a nossa vida individual e colectiva, mesmo sabendo que os partidos a que eles se agregam são sobretudo corporações feitas de redes de amizades, de ligações familiares e de dependências perigosas a poderes constituídos.

Nesta medida, o regime estabelecido de representação democrática pode não passar de uma fraude e de um embuste, se não é acompanhado de processos formais e informais de fiscalização das acções e decisões dos governantes e dos órgãos centrais e locais da administração pública do Estado.

A monitorização das decisões, por um lado, e a promoção de ideias, por outro, são aspectos complementares de uma forma de exercer o nosso direito – e o nosso dever – de participar civicamente na vida política, seja individualmente seja por via associativa.

Se delegamos irresponsavelmente os nossos interesses nos políticos, eles farão o que sempre fizeram o princípio do mundo: apropriar-se-ão da nossa voz e abusarão da nossa confiança. É a ordem natural das coisas, e só de nós nos poderemos queixar quando isso acontece.

Mas também podemos conceber o regime democrático assente na representação eleitoral como um sistema de créditos e débitos, em que o eleito se torna automaticamente nosso devedor, com a obrigação de servir a nossa causa e os nossos interesses. Neste caso, torna-se nossa responsabilidade controlar o politico em permanência, participar nas suas decisões, monitorizá-las, orientá-las, questioná-las, e até propor-lhas.

É isso que a Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados (isto é, de cidadãos que se auto-mobilizam para a defesa dos seus interesses) procura fazer, todos os dias e não apenas de quatro em quatro anos. Porque o que está mal, muda-se.