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Este material tem como objetivo descrever e, principalmente, demonstrar os principais aspectos da Terapia Nutricional Enteral (TNE), incluindo indicações, vias de administração e fórmulas utilizadas, com a finalidade de garantir uma nutrição adequada e melhor qualidade de vida ao paciente em uso de sondas de alimentação.
A Terapia Nutricional (TN) pode ser definida como qualquer oferta de nutrientes por via oral, enteral ou parenteral com objetivo terapêutico, que ofereça energia, proteínas, vitaminas, minerais e água de acordo com a necessidade de cada paciente para a manutenção e a recuperação do estado nutricional. A Terapia Nutricional Enteral (TNE) consiste na administração de nutrientes pelo trato gastrointestinal a partir de sondas nasoenterais, nasogástricas ou ostomias localizadas em diversos locais do tubo digestivo.
A TNE é indicada em casos de pacientes com necessidades nutricionais normais ou aumentadas e sem a possibilidade de consumo total ou parcial dessas necessidades por via oral, em casos de perda de peso, incapacidade funcional temporária ou contínua da via oral (boca e esôfago) ou por alguma condição clínica específica que comprometa a deglutição, tais como:
Disfagia;
Acidente Vascular Cerebral (AVC);
Doença de Alzheimer;
Doenças neurológicas;
Tumores;
Condições que necessitem de repouso, como em caso de cirurgias.
A TNE também pode ser indicada em casos de aceitação alimentar abaixo de 60% (redução de pelo menos 1/3 da ingestão) das recomendações diárias. Quando o paciente não consegue atingir as próprias necessidades nutricionais apenas de forma via oral, a TNE pode ser ofertada de forma exclusiva ou de forma complementar junto a uma dieta via oral.
A TNE pode acontecer por intermédio de Sonda Naso Enteral (SNE), em caso de uso transitório menor de quatro semanas da TNE, ou por meio de ostomias, em caso de permanência maior de quatro semanas da TNE.
A SNE pode ser posicionada no estômago (gástrica) ou pós-pilórica (enteral). A posição gástrica é mais fisiológica e permite um volume maior de dieta. No entanto, a posição enteral é mais segura em relação ao risco de broncoaspiração do paciente.
Nos casos de ostomias, a mais utilizada é a gastrostomia posicionada no estômago do paciente. Entretanto, caso haja a impossibilidade da gastrostomia, também pode ser feita uma jejunostomia.
Observada a necessidade da TNE, o início precoce é importante para evitar a depleção nutricional do paciente e o aumento dos riscos de comorbidades. Contudo, é importante a observação de alguns critérios para o início seguro da TNE:
Para pacientes em uso de SNE via gástrica:
Débito ou resíduo gástrico (menor que 200 ml/24 horas).
Presença de ruídos hidroaéreos (presentes).
Para pacientes em uso de SNE via enteral (pós-pilórica):
Presença de ruídos hidroaéreos (presentes).
Radiografia posicionamento da sonda (posição descendente).
As dietas enterais podem ser classificadas em poliméricas, com a proteína íntegra. Elas são indicadas quando as funções gastrintestinais estão dentro da normalidade. Também podem ser classificadas em oligoméricas, com a carboidratos hidrolisada. Elas são indicadas em casos de funções digestivas prejudicadas.
As dietas também podem ser classificadas em normocalórica, quando ofertam entre 0,9 e 1,2 kcal/ml, e hipercalóricas, quando ofertam a partir de 1,2 kcal/ml. Em casos de restrição de volume e/ou necessidade energética aumentada, as fórmulas hipercalóricas são as mais indicadas. Também são encontradas no mercado dietas com e sem adição de fibras. Em caso de diarreia, o uso de fórmulas com fibras solúveis é o indicado. Em caso de evacuações normais ou constipação intestinal, usa-se dieta sem fibras ou com mix de fibras solúveis e insolúveis.
Além disso, podemos classificar as dietas enterais a partir do teor de macronutrientes: em relação às proteínas, podemos classificá-las em: dietas normoproteicas, com quantidade padrão de proteínas entre 10% e 20% do valor energético total (VCT), e dietas hiperproteicas, que contêm proteínas com uma quantidade maior que 20% do VCT. Em casos de queimados, politraumatizados, úlceras de pressão e pacientes com obesidade, é imprescindível o uso de fórmulas hiperproteicas ou específicas para a cicatrização. Dietas com menos de 10% de proteínas em relação ao VCT são consideradas dietas hipoproteicas.
Em relação aos carboidratos, podemos classificar as dietas em normoglicídicas, com quantidade padrão de carboidratos entre 50% e 60% do VCT; hiperglicídicas, com quantidade de carboidratos maior que 60% do VCT, e hipoglicídicas, que têm menos que 50% do VCT.
Em relação aos lipídeos, podemos classificá-las em normolipídicas, as quais contêm entre 15% e 35% de gorduras em relação ao VCT; hiperlipídicas, que têm acima de 35% de lipídeos em relação ao VCT. e hipolipidicas, com teor de gordura e menos que 15% do VCT.
O sistema fechado já apresenta a dieta pronta, que pode ser ofertada diretamente ao paciente, sem a necessidade de preparo ou envase. Esse tipo de nutrição tem a embalagem esterilizada, fechada hermeticamente e com uma conexão específica para a administração. É mais comumente usada em ambiente hospitalar e necessita do uso de bomba de infusão, que é programada de acordo com a prescrição de volume a ser infundida no paciente.
Exemplos:
Paciente com prescrição de nutrição enteral: 500 mL/dia = a dieta será administrada em 24 horas e infundida a, aproximadamente, 21 mL/h (500 mL dividido por 24 horas).
Paciente com prescrição de nutrição enteral: 500 mL/dia = a dieta será administrada em 20 horas, com 4 horas de pausa, e infundida a, aproximadamente, 25 mL/h (500 mL dividido por 20 horas).
Considerando que o gotejamento de dieta é contínuo nessa forma de administração, a administração da água deve ser feita sob prescrição médica em intervalos de algumas horas (3/3 horas), concomitante à administração de dieta.
A dieta enteral em sistema fechado deve iniciar em baixo volume, com cerca de 500 ml/dia e o volume deve ser progredido lentamente, cerca de 100 ml/dia, de acordo com a tolerância e desde que não ocorra intercorrências com o paciente até a obtenção das metas calóricas e proteicas do paciente.
No sistema aberto, profissionais ou cuidadores manipulam e preparam o alimento em um local específico antes de levá-lo para o paciente. Nesse caso, a dieta é colocada em frascos descartáveis na quantidade necessária para o horário e administrada de forma fracionada, na maioria das vezes, de forma gravitacional.
Portanto, no sistema aberto, devemos calcular o volume que será administrado por horário. Por exemplo: paciente faz uso de 1000 ml de dieta ao dia, sendo esse total fracionado em 4 horários no dia. Em outras palavras, 1000 dividido por 4 = 250 ml de dieta por horário. A infusão deve ocorrer de forma lenta, em cerca de 1 hora, para que a administração da NE ocorra em tempo correto.
Após o término da admiração da dieta, a sonda deve ser lavada com água filtrada ou fervida com seringa de 50 ml, sendo administrada via bolus, de forma rápida com seringa em Sonda Naso Enteral (SNE). Além disso, a água deve ser administrada ao longo do dia para a hidratação do paciente.
O volume da dieta enteral em sistema aberto deve se iniciar em baixo volume, cerca de 60 ml de dieta por horário, por exemplo: 60 ml em 5x ao dia → 300 ml/dia, com progressão do volume em cerca de 10 ml por horário até a obtenção das metas calóricas e proteicas do paciente.
Para a definição do volume e forma de administração da dieta enteral, é necessário que o nutricionista realize uma adequada anamnese e avaliação nutricional do paciente, definindo uma meta calórica e proteica apropriada e levando em consideração o histórico de saúde do paciente.
Para calcularmos as calorias e as proteínas ofertadas pelas dietas enterais, precisamos conhecer o volume ofertado ao paciente e a fórmula das dietas. Uma dieta hipercalórica, por exemplo, tem, geralmente, 1,5 kcal/ml de dieta. Se o paciente recebe 500 ml de dieta ao dia, nós multiplicamos 500 ml por 1,5 kcal. Portanto, o paciente receberá 750 kcal ao dia. Se aumentarmos progressivamente essa dieta até atingirmos 1000 ml ao dia, ele receberá 1500 kcal ao dia.
O cálculo de proteína é semelhante, desde que se conheça o volume e a quantidade de proteínas da fórmula enteral. Por exemplo: considere uma dieta com 7,5 g de proteína em 100 ml. Se o paciente receber 500 ml de dieta ao dia, fazemos o seguinte cálculo: 500 ml multiplicado por 7,5 g dividido por 100. O paciente receberá 37,5 g de proteínas ao dia. Se o paciente receber 1000 ml (1000 ml x 7,5 g / 100), ele receberá 75 g de proteína.
Para receber a dieta, o paciente deve estar sentado no leito, formando um ângulo de 45° (no mínimo) em relação à cama. Ele deve ficar nessa posição durante o recebimento da dieta e por mais 30 minutos após o término dela. Essa posição é extremamente importante, uma vez que impede que o paciente se engasgue com a dieta e que ela se dirija ao pulmão.
Se o paciente apresentar náusea, tosse excessiva, dificuldade respiratória ou qualquer alteração, é indicado suspender imediatamente a dieta e entrar em contato com o médico para orientação.
A parte externa da sonda deve ser limpa diariamente com gaze, água e álcool a 70% ou sabonete suave.
Para realizar a manipulação da dieta enteral, é importante que o manipulador realize a correta higienização das mãos e evite o uso de adornos.
É importante realizar a higienização das bancadas e utensílios com álcool 70%.
Deve-se ter cuidado para não puxar a sonda acidentalmente. Caso haja saída ou entupimento, ela deverá ser trocada pelo médico.
Dieta Enteral de Sistema Aberto (Isosource 1,5 – 1 Lt.)
Dieta Enteral de Sistema Fechado (Fresubin Energy – 500 ml)
Dieta Enteral em Pó (Nutrison Soya)
Frasco de Dieta Enteral 300 ml
Seringa 50 ml
Garrafa de Água Mineral 500 ml
Bomba de Infusão Contínua
Equipo de gotejamento
Equipo de Bomba
Sonda Nasoenteral
Luva de Procedimento Descartável
Boneco Didático Adulto
Maca
Agora que você já conhece os principais tipos e a composição das dietas enterais, vamos conhecer essas dietas na prática?
A administração da dieta enteral é realizada pelo profissional de enfermagem em âmbito hospitalar ou cuidador em domicílio. Contudo, é importante que você, como nutricionista, conheça as formas de administração e as vias de administração da TNE.
Em âmbito hospitalar, o nutricionista deve realizar a supervisão do preparo e da distribuição das dietas enterais, assim como a orientação aos profissionais de lactário. É importante conhecermos as principais apresentações e a forma de preparo das dietas enterais.
Para isso, você deverá analisar as seguintes características de cada tipo de dieta enteral:
Dieta enteral em sistema aberto em Pó (Nutrison Soya)
Para a utilização da dieta em pó, é necessário realizar a adequada diluição, de acordo com o volume prescrito ao paciente
Modo de preparo: limpe as mãos e limpe a área de preparação. Utilize água previamente filtrada e fervida. Diluir inicialmente 45 g do produto (9 col. medida) em 50 ml de água morna (previamente filtrada e fervida). Adicione mais água até completar o volume final de 200 ml. Misture até a completa homogeneização.
Instruções para administração: após o preparo, fazer uso imediato ou manter sob refrigeração em temperatura de 2 a 8° C por até 12 horas. Para a administração, retirar da refrigeração cerca de 60 minutos antes. Administrar à temperatura ambiente em até 4 horas. A fórmula não apresenta restrições para administração por via enteral ou oral.
Após a diluição, a dieta deve ser porcionada em frasco de dieta enteral de 300 ml e conectada no equipo.
No caso da dieta enteral de sistema aberto em apresentação líquida, ela está pronta para o consumo e não é necessária a diluição, apenas o porcionamento em frasco de dieta enteral de 300 ml e conectada ao equipo.
Instruções para conservação: manter a embalagem fechada à temperatura ambiente em local seco e fresco. Após aberta, conservar devidamente tampada e sob refrigeração por no máximo 24 horas.
A dieta enteral de sistema fechado não precisa ser manipulada, apenas conectada em equipo e bomba de infusão para a administração no paciente.
Sugestão: os alunos podem observar as diferenças de calibre e opacidade da sonda nasoenteral e sonda nasogástrica e realizar a passagem da SNE em boneco didático para conhecimento do procedimento, fazer o fracionamento da dieta enteral de sistema aberto em pó e líquido e a instalação da dieta a partir do equipo e da sonda.
RDC - 503 / 2021 - Competências da Equipe Multidisciplinar de Terapia Nutricional.
Acesso: https://bit.ly/4411cIE
DIRETRIZ BRASILEIRA DE TERAPIA NUTRICIONAL - Paciente grave e Terapia Nutricional Domiciliar.
Acesso: https://bit.ly/40Dzoac
DIRETRIZ BRASILEIRA DE TERAPIA NUTRICIONAL NO ENVELHECIMENTO.
Acesso: https://bit.ly/3AtzCX0
Vamos calcular o volume e valores calóricos e proteicos das dietas enterais.
Imagine o seguinte estudo de caso: paciente J. C. S., de 68 anos, pesa 75 kg e tem 1,80 m. Ele está internado em hospital. Foi necessária a prescrição da dieta enteral devido ao quadro de disfagia grave. Na rotina hospitalar, a nutrição enteral é infundida a partir de um sistema fechado em 20 horas, com pausa de 4 horas ao dia para banho e passeio do paciente.
No primeiro dia, o nutricionista calculou a prescrição de 500 ml de dieta enteral ao dia, em uso de dieta hipercalórica, com 1,5 kcal por ml, e hiperproteica, com 7,5 gramas de proteína por 100 ml.
1) Qual será a velocidade de infusão da dieta em ml/h?
a) 15 ml/h.
b) 25 ml/h.
c) 33 ml/h.
2) Quantas calorias esse paciente receberá ao dia?
a) 750 kcal.
b) 890 kcal.
c) 1000 kcal.
3) Quantas gramas de proteína esse paciente receberá ao dia?
a) 7,5 g.
b) 12 g.
c) 37,5 g.
Após uma semana e evolução da dieta sem intercorrências, o paciente recebeu alta com prescrição de dieta enteral em sistema aberto em domicílio, dieta infundida de forma fracionada, 250 ml administrados 5 vezes ao dia, dieta normocalórica com 1,2 kcal por ml e normoproteica com 4,5g de proteína por 100ml.
4) Qual é o volume total de dieta que o paciente receberá ao dia?
a) 250 ml.
b) 1000 ml.
c) 1250 ml.
5) Quantas calorias esse paciente receberá ao dia?
a) 1250 kcal.
b) 1500 kcal.
c) 1650 kcal.
6) Quantas gramas de proteína esse paciente receberá ao dia?
a) 75 g.
b) 56,2 g.
c) 45 g.
1) B - 25 ml/h (500 ml de dieta dividido por 20 horas de infusão - 500/20 = 25 ml/h).
2) A - 750 kcal (500 ml de dieta multiplicado por 1,5 kcal /ml (densidade calórica) - 500*1,5 = 750 kcal).
3) C - 37,5 g (500 ml de dieta multiplicado 7,5 /100 de proteína - 500*7,5/100 = 37,5 g).
4) C - 1250 ml (250 ml de dieta multiplicado 5x ao dia - 250*5= 1250 ml).
5) B - 1500 kcal (1250 ml de dieta *1,2 kcal /ml (densidade calórica) - 1250*1,2=1500 kcal).
6) B - 56,2 g (125 ml de dieta multiplicado 4,5 /100 de proteína - 1250*4,5/100 = 56,2g.
CUPPARI, Lilian. Guia de Nutrição Clínica no adulto. 3ed. Barueri, SP: Manole, 2014.
COSTA, Mariana F. Nutrição enteral: sistema aberto ou sistema fechado? Uma comparação de custo-benefício. Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (1): 14-9
SOCIEDADE BRASILEIRA DE NUTRIÇÃO PARENTERAL E ENTERAL; ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NUTROLOGIA; SOCIEDADE BRASILEIRA DE PATOLOGIA. Terapia nutricional no paciente grave. São Paulo: Associação Médica Brasileira, 2011. p. 339-354. (DITEN Projetos diretrizes, v. 9).
WAITZBERG, Dan L. Nutrição Oral, Enteral e Parenteral na Prática Clínica. 5.ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 2017.