TERMIONOLOGIA ANATôMICA
Prof. Reni Volmir dos Santos
Prof. Reni Volmir dos Santos
As nomenclaturas utilizadas nos termos anatômicos;
A maneira de localização de estruturas;
A divisão anatômica.
Neste primeiro tema, será abordado o assunto referente à terminologia anatômica. Porém, inicialmente, será apresentado um pouco da história, pois a terminologia tem sua origem antes de Cristo.
Na sequência, será demonstrada a divisão da anatomia com suas especificações e, na sequência, os termos utilizados para a localização das estruturas, assim como as nomenclaturas anatômicas.
Em termos mais restritos e clássicos, a anatomia confunde-se com a morfologia interna. Isto é, com o estudo da organização interna dos seres vivos, por meio de métodos precisos de corte e dissecação (ou dissecção) de seres vivos (cadáveres), com o intuito de revelar a sua organização estrutural.
O mais antigo relato conhecido de uma dissecação pertence ao grego Teofrasto (?– 287 a.C.), discípulo de Aristóteles. Ele a chamou de anatomia (em grego, “annatemnein”), o termo que se generalizou, englobando todo o campo da biologia que estuda a forma e a estrutura dos seres vivos, existentes ou extintos.
Alcméon, na Grécia, lutando contra o tabu que envolvia o estudo do corpo humano, realizou pesquisas anatômicas já no século VI a.C. (por isso muitos o consideram o “pai” da anatomia). Entre 600 e 350 a.C., Empédocles, Anaxágoras, Esculápio e Aristóteles também se dedicaram a dissecações. Foi, porém, no século IV a.C., com a escola Alexandrina, que a anatomia prática começou a progredir. Na época, destacou-se Herófilo, que, observando cadáveres humanos, classificou os nervos como sensitivos e motores, reconhecendo no cérebro a sede da inteligência e o centro do sistema nervoso. Escreveu três livros “Sobre a Anatomia”, que desapareceram. Seu contemporâneo Erasístrato descobriu que as veias e artérias convergem tanto para o coração quanto para o fígado.
Galeno (131-201) na Ásia Menor aperfeiçoou seus estudos anatômicos em Alexandria. Durante toda a Idade Média, foi atribuída enorme autoridade a sua teoria, que incluíam errôneas transposições ao homem de observações feitas em animais. Esse fato, mais os preconceitos morais e religiosos que consideravam sacrilégio a dissecação de cadáveres, retardaram o aparecimento de uma anatomia científica.
No século IX, o estudo do corpo humano voltou a interessar os sábios graças à escola médica de Salerno, na Itália, e à obra de Constantino, o Africano, que traduziu do árabe para o latim numerosos textos médicos gregos. Logo depois, Guglielmo de Saliceto, Rolando de Parma e outros médicos medievais enfatizaram a afirmação de Galeno segundo a qual o conhecimento anatômico era importante para o exercício da cirurgia.
O édito de Frederico II, obrigando a escola de Nápoles a introduzir no seu currículo o treino prático da anatomia (1240), foi decisivo para o desenvolvimento dessa ciência. Cerca de meio século mais tarde, Mondino de Liuzzi executava em Bolonha as primeiras dissecações didáticas de cadáveres, publicando em 1316 um manual sobre autópsia.
O clima geral do Renascimento favoreceu o progresso dos estudos anatômicos. A descoberta de textos gregos sobre o assunto, e a influência dos pensadores humanistas levou a Igreja a ser mais condescendente com a dissecação de cadáveres. Artistas como Michelangelo, Leonardo da Vinci e Rafael mostraram grande interesse sobre a estrutura do corpo humano. Leonardo dissecou, talvez, meia dúzia de cadáveres. O maior anatomista da época foi o médico flamengo André Vesalius, um dos maiores contestatários da tradição de Galeno. Dissecou cadáveres durante anos, em Pádua, e descreveu detalhadamente suas descobertas.
Seu “De HumaniCorporis Fabrica”, publicado em Basiléia em 1543, foi o primeiro texto anatômico baseado na observação direta do corpo humano e não no livro de Galeno. Esse método de pesquisa lhe dava muita autoridade e, não obstante as duras polêmicas que precisou enfrentar, seus ensinamentos suscitaram a atenção de médicos, artistas e estudiosos. Entretanto, provavelmente as técnicas de dissecação e preservação das peças anatômicas da época não permitiam um processo mais detalhado e minucioso, incorrendo Vesalius em alguns erros, talvez pela necessidade de dissecções mais rápidas. Entre seus discípulos, continuadores de sua obra, estão Gabriele Fallopio, célebre por seus estudos sobre órgãos genitais, tímpanos e músculos dos olhos, e Fabrizio d’Acquapendente. A D’Acquapendente se deve, ainda, a exata descrição das válvulas das veias.
A partir de então, o desenvolvimento da anatomia acelerou-se. Berengario da Carpi estudou o apêndice e o timo, e Bartolomeu Eustáquio os canais auditivos. A nova anatomia do Renascimento exigiu a revisão da ciência. O inglês William Harvey, educado em Pádua, combinou a tradição anatômica italiana com a ciência experimental que nascia na Inglaterra. Seu livro a respeito, publicado em 1628, trata de anatomia e fisiologia. Ao lado de problemas de dissecação e descrição de órgãos isolados, estuda a mecânica da circulação do sangue, comparando o corpo humano a uma máquina hidráulica. O aperfeiçoamento do microscópio (por Leeuwenhoek) ajudou Marcello Malpighi a provar a teoria de Harvey, sobre a circulação do sangue, e também a descobrir a estrutura mais íntima de muitos órgãos. Introduzia-se, assim, o estudo microscópico da anatomia. Gabriele Aselli punha em evidência os vasos linfáticos; Bernardino Genga falava, então, em “anatomia cirúrgica”.
Nos séculos XVIII e XIX, o estudo cada vez pormenorizado das técnicas operatórias levou à subdivisão da anatomia, dando-se muita importância à anatomia topográfica. O estudo anatômico-clínico do cadáver, como meio mais seguro de estudar as alterações provocadas pela doença, foi introduzido por Giovan Battista Morgani. Surgia a anatomia patológica, que permitiu grandes descobertas no campo da patologia celular, por Rudolf Virchow, e dos agentes responsáveis por doenças infecciosas, por Pasteur e Koch.
Hoje em dia, há a possibilidade de estudar anatomia mesmo em pessoas vivas, por meio de técnicas de imagem como a radiografia, a endoscopia, a angiografia, a tomografia axial computadorizada, a tomografia por emissão de pósitrons, a imagem de ressonância magnética nuclear, a ecografia, a termografia e outras.
Anatomia Sistêmica, sistemática descritiva ou organológica: é o estudo analítico macro e microscópico das partes constituintes do organismo reunidas segundo suas afinidades morfofuncionais. Estuda células (unidade biológica), tecidos (conjunto diferentes formados de células da mesma natureza), os órgãos (conjunto de dois ou mais tecidos) e os sistemas (diferentes conjuntos de órgãos). O conjunto de todos os sistemas orgânicos integrados forma o corpo humano, o qual é constituído dos sistemas esquelético, articular, muscular, respiratório, digestório, circulatório, linfático, urinário, genital, endócrino, nervoso e tegumentar, bem como pelos órgãos dos sentidos.
Quando dois ou mais sistemas ou conjunto de órgãos apresentam afinidades morfofuncionais entre si, formam os chamados aparelhos, como aparelho locomotor (sistema esquelético, articular e muscular), aparelho urogenital (sistema urinário e genital), aparelho cardiorrespiratório (sistema circulatório e respiratório), aparelho gastropulmonar (sistema digestório e respiratório), aparelho mastigador (músculos, língua e dentes), aparelho lacrimal (glândula lacrimal, saco conjuntival palpebral, papila e canalículos lacrimais, saco lacrimal, ducto nasolacrimal).
Anatomia topográfica ou anatomia regional: estuda a situação e as relações entre estruturas de todos os sistemas orgânicos existentes em uma determinada área do corpo. A anatomia regional também reconhece a organização do corpo em camadas: pele, tecido subcutâneo e fáscia profunda que cobre as estruturas mais profundas: os músculos, o esqueleto e as cavidades, que contém as vísceras (órgãos internos).
A partir desses dois tipos de estudos, ocorrerem novas subdivisões conforme o foco:
Anatomia Clínica: aplicação prática (pacientes);
Anatomia comparada: usada pela Biologia (evolução da espécie);
Morfologia: dissecação e análise (estudo da forma);
Histologia, Citologia, Embriologia…;
Anatomia Funcional: forma e funções. Compreende a Cinesiologia, Biomecânica, que estudam o movimento humano. Na anatomia funcional, também há a correlação das estruturas anatômicas com as atividades de vida diárias, assim como esporte e labor (relacionado ao trabalho).
Nomenclatura, nômina ou terminologia anatômica é o conjunto dos termos empregados para indicar e descrever as partes do corpo. É a relação oficial internacional dos termos, escrita também em latim, que designa as estruturas do corpo humano.
Um corpo básico é formado por cabeça, pescoço, tronco (subdividido em tórax, abdome, dorso e pelve/períneo), um par de membros superiores e um par de membros inferiores. Todas as partes principais podem ainda ser subdivididas em áreas e regiões.
A posição anatômica é constituída pela cabeça e olhos dirigidos anteriormente, membros superiores pendentes, palmas das mãos voltadas para frente e membros inferiores justapostos, com pés e dedos voltados anteriormente.
A arquitetura do corpo humano, como dos vertebrados em geral, obedece a um padrão de construção baseado nos princípios da antimeria, metameria, paquimeria e estratimeria.
Antimeria: trata-se do princípio pelo qual o corpo humano é constituído de duas partes iguais (direita e esquerda) simétricas, denominadas antímeros.
Os antímeros apresentam tanto simetria externa (simetria de massa) quanto interna (simetria de construção), sendo equivalentes. Há evidência de certo grau de assimetria normal que se manifesta tanto no exterior quanto no interior do corpo.
Assimetria externa: são observadas na superfície de várias regiões do corpo. Ex.: face, pavilhões da orelha (esquerdo maior e mais alto que o direito), tronco (metade esquerda mais desenvolvida que a direita na parte ventral, e dorsalmente ocorre o contrário), membro superior mais desenvolvido é o dominante.
Assimetrias internas: são divididas em forma e de posição;
Assimetria de forma: caracterizada por simples diferença dimensional ou de volume de um órgão. Ex.: ovário, em que o direito é maior que o esquerdo; pulmão direito tem mais lobos que o esquerdo;
Assimetria de posição: relacionada com a disposição dos órgãos nas cavidades do corpo. Ex.: rim direito mais baixo que o esquerdo.
Metameria: segmentação transversal do corpo em unidades homólogas (metâmeros) que se sucedem no sentido crânio-caudal. Por meio da metameria, pode-se estudar a disposição serial de partes dos sistemas orgânicos. Ex.: segmentação da coluna vertebral, artérias do tronco, dermátomos.
Paquimeria: o segmento axial do corpo (cabeça, pescoço e tronco) é dividido por um plano frontal, tangente à coluna vertebral, em partes anterior e posterior que são denominados paquímeros.
Cada paquímero contém um tubo no seu interior. No paquímero anterior, situa-se o tubo esplâncnico que aloja a maior parte da massa visceral do corpo. No posterior, está o tubo neural que contém o neuroeixo (sistema nervoso central).
Estratimeria (estratigrafia): constituição estratigráfica do corpo humano determinada pela sobreposição de camadas do mesmo tecido ou de tecidos diversos. Essa construção é observada nos segmentos corpóreos e, também, nos órgãos internos. O estudo da estratigrafia dos órgãos é chamado de histiotopia.
São aqueles relacionados com a idade, o sexo, o biótipo e o grupo étnico.
Idade: existência temporal da vida. Está associada com modificações anatômicas graduais que ocorrem nas fases intra e extra-uterinas do desenvolvimento do homem.
Sexo: caráter morfofuncional que distingue o homem da mulher (dimorfismo sexual). O dimorfismo sexual caracteriza-se por várias diferenças anatômicas, entre as quais se destacam aquelas associadas ao sistema genital (reprodutor) e aos caracteres sexuais secundários, personalizados para cada sexo.
Biótipo: refere-se ao tipo constitucional existente em cada grupo racial. Todas as raças humanas apresentam dois tipos extremos (éctipos) e um médio, além dos tipos intermediários. Tipo longilíneo e brevilíneo.
Grupo étnico: compreende os diferentes grupos raciais (branco, negro, amarelo) e seus graus intermediários de mestiçagem. Apresentam, entre si, diferenças anatômicas tanto externas quanto internas (cor da pele, características faciais, desenvolvimento somático e visceral).
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Coordenação e Revisão Pedagógica: Claudiane Ramos Furtado
Design: Gabriela Rossa
Diagramação: Marcelo Ferreira
Ilustrações: Marcelo Germano
Revisão ortográfica: Igor Campos Dutra