2.2.9

2.2.9 Categorizando a educação em astronomia

 

Um panorama geral da educação em astronomia no Brasil mostra que a produção bibliográfica nacional nesta área tem aumentado sensivelmente nos últimos anos, como é percebida mediante o crescente número de trabalhos apresentados em eventos sobre ensino de ciências e de física, a grande área na qual se insere o ensino da astronomia (CASTRO, PAVANI e ALVES, 2009). Porém, não é nossa intenção, neste estudo, apresentar uma exaustiva análise de todo o material produzido, no Brasil, relacionado à área de educação em astronomia. Estudos neste sentido foram conduzidos, no Brasil, por Marrone Junior (2007) e Iachel (2009). Antes, objetivamos descrever brevemente o panorama que se encontra a investigação nacional e sua produção científica sobre este tema, e os locais onde a astronomia e seu ensino podem ser encontrados no país, classificando-os de acordo com suas atividades de ensino formal, não formal, informal, e de popularização.

Quanto aos significados específicos destes termos, não há ainda um consenso nacional, embora diversos trabalhos apontem para a necessidade de uma definição para tais diante do uso de critérios bem estabelecidos, conforme mostra Marandino at al (2004), ao apresentar um aprofundado levantamento bibliográfico da área. Há dificuldades maiores quando se tenta expressar o ato de tornar conteúdos científicos acessíveis à população em geral, resultando em termos tais como: difusão, disseminação, divulgação e popularização; normalmente usados com mesma significação (SILVA e CARNEIRO, 2006), embora Bueno (1984) já tenha demonstrado suas distinções. Para Gouvêa (2000), o uso do termo popularização parece ser mais apropriado quando se leva em conta as concepções do público-alvo ao se realizar uma transposição didática de saberes científicos, tornando este termo, portanto, mais amplo do que o uso de divulgação, disseminação ou difusão, os quais parecem denotar uma via de mão única, partindo dos cientistas e atingindo o povo, sem consulta prévia.

Assim, reconhecendo a inexistência de uma definição comum desses termos, e baseando-se na leitura da revisão bibliográfica apresentada por Marandino at al (2004), apresentamos, a seguir, o que consideramos provisoriamente por educação formal, informal, não formal e popularização da astronomia.

A educação formal ocorre em ambiente escolar ou outros estabelecimentos de ensino, com estrutura própria e planejamento, cujo conhecimento é sistematizado a fim de ser didaticamente trabalhado. Por isso, as práticas educativas da educação formal possuem elevados graus de intencionalidade e institucionalização (MARANDINO et al, 2004; LIBÂNEO, 2005), sendo sua obrigatoriedade garantida em Lei. Porém, nem sempre todos os conteúdos são trabalhados durante a educação formal, haja vista o exemplo de conceitos de astronomia fundamental, os quais, na maioria das vezes, deixam de ser considerados – ou são pouco contemplados – durante a trajetória formativa do aluno do ensino fundamental e médio, bem como do futuro professor, tanto no ambiente escolar como nos materiais didáticos utilizados (BRETONES, 1999; MALUF, 2000). Isto traz algumas conseqüências com relação à atuação docente em sala de aula, uma vez que a sua educação formal não lhe garantiu uma abordagem destes saberes disciplinares (LANGHI e NARDI, 2004 e 2007). Algumas destas conseqüências são as dificuldades em ensinar/aprender conteúdos de astronomia e a propagação de erros conceituais, concepções alternativas, mitos e crenças sobre fenômenos astronômicos (LANGHI e NARDI, 2004 e 2007; LANGHI, 2005).

Mesmo os cursos de graduação em que normalmente se deveriam contemplar conteúdos de astronomia (física, por exemplo) não a apresentam como uma disciplina obrigatória, mas apenas como optativa – quando a oferecem. O estudo de Bretones (1999) revelou apenas 54 cursos com a disciplina específica de astronomia como conteúdo integral, em uma amostra de 46 instituições de ensino superior em todo o país (67 % públicas e 33 % particulares). Esta amostra representa a seleção dos cursos pesquisados que ofereciam disciplinas com o conteúdo integral de astronomia, dentro de um universo de 221 respostas dos 628 questionários enviados pelos correios aos cursos do país que poderiam ter conteúdos de astronomia em seus currículos (35,2% de retorno).

No âmbito da educação formal encontramos também cursos denominados de “formação continuada” em astronomia, oferecidos por algumas instituições que contemplam conteúdos sobre astronomia. A preocupação, contudo, reside na já mencionada direção na qual o ensino formal da astronomia poderia estar seguindo nos chamados “programas de formação continuada” voltados especialmente para um modelo formativo exclusivamente conteudista, sem levar em conta os resultados de pesquisas sobre educação em astronomia.

A educação não formal, por outro lado, com caráter sempre coletivo (GOHN, 1999), envolve práticas educativas fora do ambiente escolar, sem a obrigatoriedade legislativa, nas quais o indivíduo experimenta a liberdade de escolher métodos e conteúdos de aprendizagem (CHAGAS, 1993). Alguns exemplos de locais que oferecem a educação não formal são: museus, meios de comunicação, agências formativas para grupos sociais específicos, organizações profissionais, instituições não convencionais de educação que organizam eventos tais como cursos livres, feiras e encontros (SILVA e CARNEIRO, 2006; LIBÂNEO, 2005). No entanto, a educação não formal também não está livre de um determinado grau de intencionalidade e sistematização. Embora a educação não formal venha ganhando nova caracterização – pois, de acordo com Marandino et al (2004), há a falta de consenso na literatura nacional na definição deste termo – podemos considerar de modo sintético, neste texto, que este tipo de educação se caracteriza por qualquer atividade organizada fora do sistema formal de educação. Neste caso, os museus de astronomia, planetários, observatórios astronômicos e clubes de astrônomos amadores que oferecem tais atividades, podem ser incluídos na listagem de estabelecimentos de educação não formal em astronomia.

A educação informal não possui intencionalidade e tampouco é institucionalizada, pois é decorrente de momentos não organizados e espontâneos do dia-a-dia durante a interação com familiares, amigos e conversas ocasionais (SILVA e CARNEIRO, 2006; LIBÂNEO, 2005), embora também haja incertezas quanto à sua concreta significação, seguindo critérios definidos (MARANDINO et al, 2004). A esse respeito, momentos de convívio durante uma observação casual do céu estrelado, uma visita ocasional a um colega que possua um telescópio, ou a um clube de astronomia amadora, com fins apenas hobbisticos, constituiriam, a princípio, exemplos de educação informal em astronomia.

Quanto à definição de popularização, podemos determinar, para este trabalho, que o seu objetivo vai além de divulgação, pois considera as necessidades e expectativas de seu público-alvo, focando a dimensão cultural desta ciência, embora ainda haja controvérsias a respeito da utilização deste termo (MARANDINO et al, 2004). No caso da popularização da astronomia, é especialmente notável o trabalho de clubes e observatórios astronômicos que voluntariamente dedicam-se em divulgar o conhecimento astronômico para a comunidade onde estão inseridos. Em alguns casos, encontra-se também planetários e universidades engajadas neste tipo de atividades, embora seja necessário um cuidadoso estudo qualitativo e quantitativo a esse respeito, principalmente no tocante às diferentes formas de divulgação e/ou popularização. Assim, encontramos, no território nacional, diversas atividades pontuais em astronomia, realizadas de forma difusa e dispersa, através de sua educação formal, não formal, informal e da popularização. Antes de pensarmos, porém, em eventuais ensaios de possíveis articulações entre estas atividades, caracterizando um movimento contrário à sua pulverização, faz-se necessário um levantamento de todas as entidades nacionais envolvidas com ações desta natureza.

Trabalhos envolvendo levantamentos semelhantes e classificações do ensino da astronomia já foram efetuados anteriormente, como em Bailey e Slater (2003) no contexto norte-americano. Em nosso caso brasileiro, porém, optamos por estabelecer sete categorizações a fim de clarificar o panorama geral da educação em astronomia: educação básica, graduação e pós-graduação, extensão, pesquisa, popularização midiática, estabelecimentos, materiais didáticos.

No âmbito da educação básica, as escolas de educação infantil, ensino fundamental e ensino médio atuam de modo formal no papel de instituições que promovem o processo de ensino/aprendizagem de conteúdos de astronomia, embora de modo reduzido, e muitas vezes até nulo, como mostram os resultados das pesquisas da área de educação em astronomia (BRETONES, 1999; MALUF, 2000; LANGHI e NARDI, 2004 e 2005; LANGHI, 2005). Sejam estes conteúdos impostos por órgãos e documentos oficiais (Secretarias de Educação, Ministérios, Referenciais Curriculares para a Educação Infantil, Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Médio, Orientações Curriculares Nacionais, etc), sejam administrados por opção própria dos professores comprometidos com sua formação continuada individual, alguns elementos de astronomia podem vir a estar presentes nas aulas de ciências ou de física.

Incluindo a educação formal, está a segunda categoria composta dos cursos de graduação e pós-graduação, em universidades que abordam, em sua estrutura curricular, disciplinas de astronomia introdutória, seja ela obrigatória ou optativa. No entanto, como mostram principalmente os resultados de Bretones (1999), são poucos estabelecimentos deste nível que a contemplam.

Outra categoria em que encontramos astronomia é a extensão, cujos estabelecimentos promotores de cursos deste nível (culturais, curta duração, formação continuada, oficinas, etc) estão geralmente ligados a universidades ou instituições públicas.

Uma área que mostra um sensível aumento em relação ao ensino da astronomia é a pesquisa, com suas teses, dissertações de mestrado, trabalhos de conclusão de curso, produção de artigos em literatura conceituada da área, e apresentação de trabalhos em eventos relacionados, tais como os simpósios nacionais de ensino de física (SNEF), os encontros de pesquisa em ensino de física (EPEF), os encontros nacionais de pesquisa em educação em ciências (ENPEC), e os encontros nacionais de didática e prática de ensino (ENDIPE).

Há também eventos nacionais específicos em astronomia e seu ensino: a) os encontros nacionais de astronomia (ENAST), compostos principalmente de astrônomos amadores que reúnem seus trabalhos a fim de congregar pessoas e instituições em torno da divulgação da astronomia e despertar o interesse do grande público para essa ciência (estes encontros possuem uma sessão específica de Ensino e Divulgação); b) os encontros brasileiros para o ensino de astronomia (EBEA), os quais se focalizam em trabalhos de pesquisa exclusivamente na área educacional (o último EBEA teve a sua oitava edição em 2004 e atualmente está temporariamente descontinuado, ocorrendo, em 2009, os encontros regionais de ensino de astronomia, EREA); c) as reuniões da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB), cujos participantes têm apresentado um volume crescente de resumos que abordam temas sobre educação e divulgação em astronomia; d) as reuniões anuais da Associação Brasileira de Planetários (ABP), cujo objetivo central tem sido a troca de experiências sobre a popularização deste tema; e) os encontros regionais de ensino de astronomia (EREA), iniciados no segundo semestre de 2009, com previsão para quatro edições neste período e o possível retorno de encontros nacionais.

Um estudo de Castro, Pavani e Alves (2009) mostra que houve um aumento quantitativo de 61% de trabalhos sobre educação em astronomia durante os últimos sete anos somente nas reuniões da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) e nos simpósios nacionais de ensino de física (SNEF). Apesar deste crescimento, a quantidade total de 36 teses e dissertações relacionadas com a educação em astronomia, desde 1973 (quando surgiu o primeiro trabalho neste sentido) até 2008, distribuídos em 20 dissertações de mestrado, 10 dissertações de mestrado profissionalizante, e 6 teses de doutorado, demonstra quão fértil este campo ainda se encontra para desenvolvimento.

Este levantamento iniciou-se com os estudos de Bretones e Megid Neto (2005), encontrando, até então, um total de 16 dissertações e teses. Uma busca de demais trabalhos sobre este tema, em setembro de 2008, no Banco de Teses da CAPES, utilizando-se como palavras-chave “ensino” e “Astronomia”, apresentou-nos um total de 36 itens. Produzimos uma lista de seus resumos que pode ser encontrada clicando aqui. Ou na homepage do Observatório Didático Astronômico, da UNESP (Bauru), no menu downloads.

Quanto à literatura nacional, identifica-se certa carência de revistas científicas especializadas sobre educação em astronomia. A única publicação específica no país que contempla artigos sobre a pesquisa em ensino de astronomia é a Revista Eletrônica Latino-Americana de Educação em Astronomia (RELEA), desde 2004. Há também resultados resumidos de pesquisas desta natureza publicadas no Boletim da Sociedade Astronômica Brasileira, que há mais de 30 anos é distribuído a todos os seus sócios, e disponível a qualquer indivíduo interessado. Conforme Bretones, Megid Neto e Canalle (2006), até o início dos anos 90 havia apenas três artigos publicados neste boletim envolvendo o ensino da astronomia (um de 1977 e dois de 1986), sendo que, a partir de 1993, com a apresentação de seis trabalhos, começaram a surgir anualmente pesquisas voltadas à educação em volume crescente, provavelmente devido à criação da Comissão de Ensino da SAB (CESAB) neste ano. Ao todo, desde 1974 (ano de fundação da SAB) até 2003, foram publicados, neste boletim, 137 trabalhos sobre educação em astronomia por pesquisadores de um total de 66 instituições. Estes autores divulgam a lista completa dos 137 temas publicados, e concluem que, principalmente nos últimos dez anos, este campo vem sendo considerado com relativa importância nas reuniões da SAB.

Quanto às demais revistas científicas da área do ensino de ciências e de física, ocasionalmente surgem publicações de artigos que abordam aspectos do ensino de astronomia. Enquanto um rápido levantamento casual na ferramenta de busca da web, denominada Google Acadêmico, aponta mais de 400 trabalhos nacionais nos últimos 10 anos (digitando-se as palavras-chave ensino e astronomia por ocasião da redação final desta tese), outra pesquisa mais apurada sobre artigos que levam em conta o ensino da astronomia, efetuada por Marrone Júnior (2007), mostra 70 produções de um total de 1638 artigos (desde o ano de disponibilidade do artigo on-line do periódico até 2005), publicadas em cinco revistas principais divulgadas pela ABRAPEC (Associação Brasileira de Pesquisa em Ensino de Ciências). No entanto, o autor mostra que somente a partir de 2000 estes artigos passaram a assumir uma postura de estrutura cientifica em sua redação normativa. E Iachel (2009) identifica 1999 como o início de publicações anuais sobre o tema.

Efetuamos a procura por artigos, a partir de Marrone Júnior (2007) e Iachel (2009), publicados entre 1985 e 2008, que abordassem o tema sobre educação em astronomia, dentro do universo de toda a literatura de circulação nacional da área de Ensino de Ciências e Matemática (CAPES 46), avaliados com Qualis A e B (até a data desta consulta, em outubro de 2007, constavam registradas 61 publicações de acordo com a classificação de periódicos, anais, revistas e jornais do sistema WebQualis da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), encontrando um total de 95 artigos em cinco periódicos, que representariam a produção nacional sobre ensino e divulgação da astronomia. Destes, 89 artigos são das principais publicações contribuintes, Revista Brasileira de Ensino Física e do Caderno Brasileiro Ensino Física, sendo que, entre 1990 e 2008, apenas dois fazem referência à formação de professores e dez se aplicariam ao ensino fundamental. A tabela 10 resume quantitativamente tal produção.

A listagem dos artigos com seus respectivos links de acesso encontra-se disponível clicando aqui. Ou na homepage do Observatório Didático Astronômico, da UNESP (Bauru).

 

Tabela 10 – Produção nacional em periódicos Qualis A e B sobre educação em astronomia, baseada em Marrone Júnior (2007) e Iachel (2009).

Continuando com nossa classificação, a quinta área, que denominaremos de popularização midiática, aparece como a mais débil em conteúdos de astronomia, pois nota-se, nestes meios de divulgação – revistas populares (não da comunidade científica) de divulgação científica, jornais de notícias, programas de rádio e TV – uma escassez de documentários nacionais sobre astronomia, bem como a reduzida atenção fornecida a descobertas ou assuntos relacionados com este tema ou a ciência espacial, e muito menos aos resultados de pesquisas na área de ensino deste tema.

Há os estabelecimentos específicos da área da astronomia que se preocupam em popularizar, divulgar, ensinar, pesquisar, e estudar este tema e o seu ensino: planetários, observatórios astronômicos, institutos, museus de astronomia e ciências afins, clubes e associações locais de astronomia amadora, e as sociedades científicas de âmbito nacional, como por exemplo, a Sociedade Brasileira de Física (SBF), a Sociedade Brasileira de Ensino de Astronomia (SBEA), a Associação Brasileira de Pesquisa em Ensino de Ciências (ABRAPEC), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Comissão de Ensino da Sociedade Astronômica Brasileira (CESAB), dentre outras. São diversas as atividades de ensino e divulgação que tais órgãos promovem, de modo que é incabível, para o momento, alistar todas elas. Apenas para exemplificar, citamos a Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica, anualmente organizada pela Sociedade Astronômica Brasileira, que envolve centenas de milhares de alunos, dezenas de milhares de professores e milhares de escolas brasileiras, mobilizando-os a buscar conteúdos sobre este tema.

A sétima categoria da situação brasileira para a educação em astronomia está contida nos materiais didáticos, os quais incluem as apostilas de cursos de extensão e de formação continuada, os livros didáticos e paradidáticos, as revistas de divulgação especializadas em astronomia (como as recém-extintas Astronomy Brasil e a Revista Macrocosmo, virtual, que vinham atuando significativamente nesta área, trazendo informações periódicas referentes a atividades da comunidade astronômica amadora e profissional), e as homepages específicas da web que funcionam como fontes confiáveis de informações para a educação em astronomia.

Portanto, estas sete categorias englobam o que denominaríamos de estado da arte da educação em astronomia no Brasil, o qual apenas se tornaria completo após uma revisão cabal de toda a produção desenvolvida até hoje neste sentido, e aprofundando, assim, esta breve visão geral que aqui apresentamos.

Concentrando a atenção nos estabelecimentos engajados com a educação em astronomia no Brasil, podemos identificar pelo menos quatro subcategorias principais: planetários, observatórios, associações e universidades.

A fim de localizar tais entidades, outros autores efetuaram levantamentos em cada estado brasileiro, listando seus dados cadastrais (VARELLA e OLIVEIRA, 2008; ABP, 2008; ASTERDOMUS, 2008; IPS, 2008; MOURÃO, 2004; CALIL e FABIANO, 2008). No entanto, devido a alterações destes dados (nome, endereço, telefone, etc), a inaugurações de novas entidades, e à dissolução de outras, nem todos os levantamentos conseguem manter suas informações completas e atualizadas. Assim, trabalhos como estes poderiam, talvez, ser agilizados com a implementação de um cadastramento nacional, realizando alterações em um banco de dados fixo, catalogando-se automaticamente quaisquer novos membros, ou cancelando-os, conforme cada caso. De fato, uma inovação neste sentido, e que já está sendo efetivada, é a encontrada na homepage que representa o Brasil no Ano Internacional da Astronomia, onde há o cadastramento de instituições intencionadas em participar das atividades deste evento mundial, as quais foram incentivadas a manter seus dados constantemente atualizados (IYA2009, 2008). Embora este passo nunca tivesse sido dado anteriormente no Brasil, ele antecede a qualquer proposta de se estudar integrações entre estas entidades relacionadas à astronomia e seu ensino formal, não formal e informal, bem como a sua popularização, pois facilita a localização e o contato dos mesmos, além de fornecer informações quantitativas por região.

Visando facilitar a consulta, elaboramos uma lista completa de todos estes estabelecimentos, atualizada até o momento da redação deste texto. Os dados dos estabelecimentos que trabalham com a astronomia, nos âmbitos de sua popularização, e educação formal, informal e não formal – planetários, observatórios, estabelecimentos amadores e profissionais (clubes e associações), e universidades – não são definitivos, pois constantes modificações cadastrais estão sendo realizadas. Esta listagem provisória poderá ser consultada clicando aqui. Ou na homepage do Observatório Didático Astronômico, da UNESP (Bauru).

Uma análise quantitativa deste cadastro nacional aponta, até o momento da edição deste artigo, para um total de 33 planetários fixos, estando 30 em funcionamento, e 95 observatórios astronômicos com fins diversos: públicos, particulares e amadores “não-hobbystas”. Analisando os objetivos a que um observatório se destina, podemos subclassificar os observatórios astronômicos em: a) observatórios profissionais, que se destinam à pesquisa científica; b) observatórios didáticos, públicos, ou os ligados a universidades, cujo objetivo principal é o ensino e a divulgação; c) observatórios particulares, com fins voltados à prática amadora ou como hobby.

Até a produção deste texto (segundo dados obtidos durante o 12º. Encontro Nacional de Astronomia, ENAST, em novembro de 2009), havia 249 entidades brasileiras ligadas à astronomia (embora nem todas estivessem, de fato, ativas na época), denominadas de “nós locais”, pela organização mundial do Ano Internacional da Astronomia, em alusão a uma rede interligada nacional e internacionalmente. Estima-se que 25% são ligadas a universidades, 15% são constituídas por planetários e museus de ciências, e 60% referem-se às sociedades, clubes, associações e grupos de astrônomos amadores.

Tabela 11 – Onde encontramos astronomia no Brasil atualmente. Legenda: F=educação formal, N=educação não formal, P=popularização, I=educação informal.

Quanto às universidades e institutos, totalizam-se 14 os que promovem uma educação formal em astronomia (graduação e pós-graduação), mediante seus cursos (apenas duas oferecem um curso de graduação em astronomia), disciplinas específicas, grupos e linhas de pesquisa em pós-graduação, e cursos de extensão relacionados com o tema (conforme já levantado em um item anterior). Uma parte destes estabelecimentos (universidades, planetários, observatórios e clubes de astronomia) está comprometida também com a oferta de cursos de extensão cultural sobre esta temática, no âmbito da educação não formal, porém, sem certezas quanto a se estes cursos consideram os resultados de pesquisas sobre a educação em astronomia.

Apresentamos a tabela 11 a fim de sintetizar a nossa busca de instâncias e de iniciativas brasileiras dedicadas à astronomia, levando em conta os seus objetivos, tais como o ensino formal, informal, não-formal, bem como aqueles destinados à popularização dessa ciência. Segundo nossa visão, é possível notar, através da análise das quatro últimas colunas da tabela, uma abrangência cada vez maior nestes âmbitos educacionais e de divulgação, à medida que partimos desde a educação básica até atingirmos a popularização midiática. À esta característica, atribuiremos a denominação de ampliação da abrangência educacional das categorias de ensino e popularização da astronomia. Deste modo, a categoria estabelecimentos, por exemplo, contém uma abrangência educacional maior do que categorias anteriores, tais como a graduação e pós-graduação.

Através desta rápida análise sobre onde encontramos astronomia no território nacional, destacamos a importância da atuação contextualizada destas instituições para o ensino deste tema, porém reconhecemos que há o desafio ainda a ser considerado referente ao estudo das possíveis relações entre estes estabelecimentos e iniciativas, visando o avanço da educação em astronomia. Estas articulações atuariam em um movimento contrário à atual dispersão das suas atividades, as quais se encontram pulverizadas em seus locais e pontos quase que isolados do contexto nacional, apresentado suas divulgações apenas em âmbito regional.

Analisando a tabela novamente, percebe-se visivelmente a significativa atuação dos estabelecimentos no ensino e divulgação da astronomia nos âmbitos do ensino não formal, informal e da popularização. Contudo, para que se complete o quadro das suas funções, há a necessidade de preenchê-los com atividades de ensino que atuem de maneira mais formal, conferindo-lhes certo grau de formalização. Em outras palavras, a nosso ver, o potencial destes estabelecimentos, conforme já comentado em capítulos anteriores, poderia ser aproveitado para a educação formal, envolvendo tais instâncias de modo mais significativo na educação em astronomia realizada nas escolas no país. No entanto, entendemos que para esta ação efetivar-se adequadamente, deve-se levar em conta, dentre outras variáveis, o papel integrador dos resultados de pesquisas nesta área.

Assim, pensando na quantidade de estabelecimentos nacionais envolvidos com a educação e popularização da astronomia, retomamos uma questão preocupante: por que a astronomia continua sendo um saber repleto de concepções espontâneas, erros conceituais, mitos e dificuldades no processo de ensino e aprendizagem, mesmo com a atuação de estabelecimentos desta natureza?

De momento, podemos formular três hipóteses provisórias: a) há pouco interesse da população e dos alunos em aprender astronomia; b) há uma quantidade insuficiente para atender a demanda de educação em astronomia, conforme identificado por Araripe (2008) – conforme noticiado por Araripe (2008), estes números representam um “déficit histórico” no Brasil. Atualmente, numa tentativa de se reverter este quadro, há 40 projetos de museus de ciências (incluindo planetários e observatórios), de porte médio, em todos os estados brasileiros; c) há pouco interesse dos clubes, observatórios e planetários existentes em se envolver com a educação em astronomia, optando por contemplar atividades de popularização, educação não formal, ou mesmo informal, na base do senso comum.

Não é objetivo deste texto aprofundar-se nestas hipóteses, mas deixamos este debate em aberto para considerações em futuros trabalhos da área. Porém, diante de um breve olhar superficial, ressaltamos que parece haver a validade das hipóteses “b” e “c” em detrimento da hipótese “a”, pois pesquisas apontam para a existência de interesse em astronomia pelo público escolar e comunitário (PASACHOFF e PERCY, 1990; MOORE, 1990). Em outras palavras, mesmo que houvesse estabelecimentos desta natureza em uma quantidade suficiente no Brasil, eles não atuariam adequadamente como focos de educação formal e não formal em astronomia, se funcionassem apenas como pontos turísticos ou de lazer, descomprometidos com a formação continuada de professores e com a alfabetização científica e tecnológica da comunidade inserida em seu contexto (BARRIO, 2007).

Assim, arriscamos a seguinte especulação: um olhar mais cuidadoso nas atividades de cada estabelecimento poderá revelar que talvez seja isto o que ocorre atualmente, no caso de vários planetários (cujos ambientes são utilizados apenas para lazer e diversão, não para atividades de ensino), e dos clubes (TREVISAN, 2004), muitos dos quais são de pequeno porte e de curta duração, compostos de membros simpatizantes e sem formação específica. E embora esta popularização e ensino possam ocorrer, talvez não esteja sendo levado em conta as pesquisas na área de ensino e de divulgação científica, bem como seus aportes teóricos. Deste modo, caso essas instâncias não respeitem a produção de pesquisa sobre educação em astronomia, suas ações de educação formal, informal e não formal, bem como de popularização, estariam baseadas no senso comum.

  

 

Este texto é parte integrante da tese de doutoramento:

LANGHI, R. Astronomia nos anos iniciais do ensino fundamental: repensando a formação de professores. 2009. 370 f. Tese (Doutorado em Educação para a Ciência). Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru, 2009.