2.2.3
2.2.3 Justificativas para o ensino da astronomia
A ação modificadora comentada no item anterior, em favor da educação em astronomia, justifica-se pelo fato desta ciência, segundo Oliveira (1997), participar de nossas vidas de modo intenso e inexorável: o suceder dos dias e das noites, a divisão do tempo em horas, minutos e segundos, o calendário com o ano de 365 dias, seus meses e semanas, as estações do ano, as marés, as auroras polares, e até mesmo a vida em nosso planeta – sustentada pela energia que recebemos do Sol – são exemplos de temas ligados à astronomia. Além disso, várias outras áreas do saber humano foram supridas com informações e inspirações provenientes da astronomia: a física, a química, a biologia, a história, a geografia, a navegação, a filosofia, a sociologia, a música, a poesia, a literatura e muitas outras.
O papel da astronomia inclui promover no público o interesse, a apreciação e a aproximação pela ciência geral. Normalmente surgem questões de interesse comum que despertam a curiosidade das pessoas, tais como buracos negros, cosmologia, e exploração do sistema solar. Como conteúdo a ser ensinado, a astronomia também possui um certo grau de potencial motivador tanto para alunos como para professores, pois há nela, intrínseca, uma universalidade e um caráter inerentemente interdisciplinar, sendo de fundamental importância para uma formação minimamente aceitável do indivíduo e cidadão, profundamente dependente da ciência e das tecnologias atuais (OLIVEIRA, 1997). Entendemos que a astronomia é especialmente apropriada para motivar os alunos e aprofundar conhecimentos em diversas áreas, pois, o ensino da astronomia é altamente interdisciplinar (DOTTORI, 2003).
Assim, ao mesmo tempo em que o seu aspecto motivacional coloca-se como uma justificativa para o ensino da astronomia, ele assume também um papel diferenciador, que a pode distinguir das outras ciências, conferindo-lhe um certo grau “popularizável”, uma vez que o seu laboratório é natural e o céu está à disposição de todos, favorecendo a cultura científica (MOORE, 1990). Para Percy (1996), esta ciência está profundamente enraizada na história, possui aplicações práticas para o dia a dia, contribui para a evolução de outras ciências, tais como a física e a química, revela um universo que promove curiosidade, admiração, imaginação, desenvolvendo o senso de exploração e descoberta, envolve os estudantes com o método científico, atraindo-os assim para se interessar em ciências. Segundo Compiani (1996), a astronomia abre um leque de opções de trabalho, do ponto de vista teórico e prático, o que é confirmado por Osborne et al (1983), quando salienta que os temas da astronomia permitem a realização de trabalhos práticos.
Para Caniato (1974), entre as diversas razões que justificam a introdução da astronomia como um dos meios para o processo ensino-aprendizagem, as principais são:
A astronomia, pela diversidade dos problemas que propõe e dos meios que utiliza, oferece o ensejo de contato com atividades e desenvolvimento de habilidades úteis em todos os ramos do saber e do cotidiano da ciência.
A astronomia oferece ao educando, como nenhum outro ramo da ciência, a oportunidade de uma visão global do desenvolvimento do conhecimento humano em relação ao Universo que o cerca.
A astronomia oferece ao educando a oportunidade de observar o surgimento de um modelo sobre o funcionamento do Universo, bem como a crise do modelo e sua substituição por outro.
A astronomia oferece oportunidade para atividades que envolvam também trabalho ao ar livre e que não exigem material ou laboratórios custosos.
A astronomia oferece grande ensejo para que o homem perceba sua pequenez diante do Universo e ao mesmo tempo perceba como pode penetrá-lo com sua inteligência.
O estudo do céu sempre se tem mostrado de grande efeito motivador, como também dá ao educando a ocasião de sentir um grande prazer estético ligado à ciência: o prazer de entender um pouco do Universo em que vivemos.
No entanto, este interesse pela astronomia pode estar sendo afetado negativamente devido a uma espécie de poluição visual, predominantemente nas grandes cidades. Conforme noticiado por Werb (2008), as pessoas já não observam o céu noturno como antes por estarmos perdendo mais uma beleza natural: o céu estrelado, pois o excesso de luminosidade urbana provoca mais uma espécie de poluição, a poluição luminosa. Um céu noturno comum, sem luar e nuvens, poderia apresentar a visão de cerca de cinco mil estrelas, mas a iluminação dos postes públicos, monumentos e empresas as ofuscam de tal maneira que apenas mal se observa umas 200 estrelas, ou menos, dependendo das dimensões da cidade.
Além dos problemas visuais, a poluição luminosa pode afetar animais de hábitos noturnos, aves migratórias e plantas, além de ser uma das maiores fontes de desperdício de energia, pois boa parte da energia é perdida ao se usar lâmpadas ineficientes e luminárias mal projetadas, que espalham a luz para o céu, para o topo de árvores, para a fachada dos prédios e para outros pontos que pouco interessam. Tentando compensar a luz que é desperdiçada, instalam-se lâmpadas mais potentes, aumentando o consumo de energia e causando mais poluição luminosa. Atualmente, campanhas mundiais fazem medições da influência da luminosidade no céu de cada região, e esforçam-se no sentido de aprimorar os sistemas de iluminação para evitar desperdícios, mostrando uma preocupação ambiental, além de observacional, uma vez que aproximadamente 19% da energia elétrica mundial é utilizada para iluminação do planeta, e em muitos casos, boa parte desta energia é proveniente de usinas termoelétricas a carvão (WERB, 2008).
Mesmo diante deste problema visual, o interesse por temas sobre astronomia eventualmente tem sido despertado, principalmente quando ocorrem fenômenos astronômicos, ou descobertas sobre o cosmo, que interessam especialmente à divulgação sensacionalista da mídia. Apesar disso, ainda se preserva, no íntimo humano, o desejo e a necessidade de ampliar seus limites do saber, abrangendo lugares tão distantes quanto os limites do cosmo, na ânsia de exploração do espaço e do tempo (ver os itens apresentação e particularidades distintivas da astronomia para o ensino, cujos textos poderão complementar as justificativas para o ensino da astronomia, apresentadas aqui).
Este texto é parte integrante da tese de doutoramento:
LANGHI, R. Astronomia nos anos iniciais do ensino fundamental: repensando a formação de professores. 2009. 370 f. Tese (Doutorado em Educação para a Ciência). Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru, 2009.