A nossa sisífica cognição

…Infinito?!? …questionando o postulado…

A nossa sisífica cognição

Maria Odete Madeira

21/07/2017

No sistema cognitivo humano, tal como em qualquer outro sistema cognitivo, há limites de processamento a níveis de percepção, compreensão, interpretação, explicação e respectiva comunicação. No caso humano, quando esses limites são atingidos, a declinação reflexiva torna-se inevitável com consequências a níveis das dinâmicas de produção de juízo por abrandamento conectivo, favorecendo o colapso do juízo especulativo.

Assim é o caso da produção do juízo científico quando tropeça com cenários de construção de absolutos concretos de presença, ontologicamente indetermináveis, no que diz respeito à causalidade responsável pela sua permanência.

A fobia de perda de controlo de produção científica, por incapacidade cognitiva, empurra os fazedores de ciência para a construção de postulados com fundamentos em mecânicas pragmáticas, com imposição de códigos paradigmaticamente serializáveis, rapidamente empacotáveis, legitimadas e validadas por enunciados desconectados do processamento cognitivo de raiz ontológica que sustenta o fundamento do processamento orgânico explicativo de razão fundamental e, assim, reflexivo para dinâmicas de indeterminação auto-sustentável, perante as quais nos situamos, em interface de sobrevivência.

A falência cognitiva despoletada por cenários de indeterminação constitutiva arrastou os fazedores de ciência para mecânicas de esvaziamento conceptual, integradas em cenários de síntese de padrões, construídos com recurso a infinitos postulados e em transgressão conceptual, postos como atractores finais em seriais paradigmatizados com valor instrumental para um jogo de imagens, deslocado por estratégias de produção e consumo científico com objectividades controladas para cenários de permanência, capazes de satisfazerem critérios de rigor acumulados para riscos, também, eles, cenarizados e necessariamente excluídos de tecituras ontológicas de absoluta presença e respectiva permanência sistémica.

Em termos semióticos, absoluto sinaliza um sentido de completude. Um sistema, qualquer sistema, qualquer natureza sistémica individuada, constitui um absoluto de presença que segue as suas próprias e únicas regras de estrutura ou “leis” de construção auto-sustentada.

Um sistema, qualquer sistema, é constituído por uma localidade, por uma totalidade e por uma não-localidade que necessariamente tem de reflectir com exactidão, sem perda de padrão, quer o local, ou localidade, quer a passagem do local para o global/total ou totalidade, pois dessa passagem, que deve ser tão simultânea quanto imediata, depende a unidade sistémica que determina a respectiva identidade de presença, sempre causalmente irredutível.

Absoluto não é acerca de infinito, absoluto é acerca de unidade e unidade é acerca de completude e completude é acerca de cada coisa determinada, acabada, completa, finita.

Absoluto, do latim absolutus, de absolvo: libertar. Livre, nesta nossa perturbadora, insensata e razoavelmente improvável dimensão, não é sem regras, livre é aquele que se ergue segundo regras que lhe são próprias, inalienáveis, livre é ter em si mesmo a sua condição de poder ser, de poder ser presença e permanência em (co)existência de acordo com as suas regras de estrutura com determinação de fronteira.

Nesta nossa dimensão cosmológica de presenças sisíficas passantes, completude é acerca das coisas, é acerca de entidades, é acerca de estruturas, é acerca de sistemas, de padrões, é acerca de relações. Completude é acerca do que somos, do que cada coisa é, do que cada entidade é.

Postular a negação do finito sistémico, para a validação de valores de verdade científica, é uma imprudência cognitiva, com consequências a níveis da sistémica de sustentabilidade. A verdade e a necessidade das coisas estão nas coisas que fazem Mundo: entes, entidades, padrões, estruturas, relações, situações e processos. As condições iniciais das coisas incorporam as próprias coisas e os seus respectivos campos de sustentabilidade.

No caso humano, a actividade celular e infra-celular de cada indivíduo computa, permanentemente, as condições iniciais do mesmo, as quais incorporam toda a sua genética constituinte, não precisamos de fazer a redução ao nosso antepassado humanoide porque a doação genética do humanoide é permanentemente computada, a níveis celulares e infra-celulares por nós. A nossa dimensão cosmológica computa permanentemente e necessariamente as suas condições iniciais, as suas razões de existência, a sua necessidade.

As nossas células reflectem e computam o Cosmos, a ordem que nos deu origem. Fazer regressões metafísicas para razões explicativas não se aplica à nossa expressão dimensional.

As razões explicativas das coisas estão incorporadas nas suas regras de estrutura, nas suas leis, e não num postulado negativo ritualizado que absurdamente é suposto simultaneamente negar e incorporar definições, determinações, fronteiras, regras, lugares, padrões, estruturas, relações, completudes, permanecendo ele mesmo, sem fronteira, sem topos, sem padrão, sem estrutura, sem regras, sem leis, sem localidade, sem limite, “sobrevivendo”, contudo, enquanto postulado abstractamente desejado, como limite instrumental, conceptualmente indeterminável de meta-de-chegada num topos determinado, lá longe, num sítio que não se mostra, que não se vê, mas é claro que, para os fazedores de ciência, e outros, está lá, tem de estar, inteirinho, completo, absoluto, necessário, paciente, obediente, sacralizado pelo imprudente desejo de código com poder virtual para esvaziamento do valor de natureza, numa sistémica relacional de diferenças e diversidades individuadas, passantes, finitas que sensatamente deveriam ser reflexivamente percepcionadas, compreendidas, interpretadas e explicadas, enquanto tais.

Obras Consultadas

Baudrillard, Jean (1972) “Pour une critique de l’économie politique du signe”, Éditions Gallimard, Paris.

Madeira, Maria Odete (2013) “…on nonlocality: hypertextualizing…”, https://www.academia.edu/5048643/_on_nonlocality_hypertextualizing_.

Madeira, Maria Odete (2013) “Existence, Life, Death, Eternity”, http://www.academia.edu/4183325/Existence_Life_Death_Eternity.

Madeira, Maria Odete and Gonçalves, Carlos Pedro (2012) “On Systems and Their Fields of Sustainability”, http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2185513.