7ºs Anos
Sob orientação da professora Ana Carolina Alvarenga
Sob orientação da professora Ana Carolina Alvarenga
Outra coisa que não parece ser entendida pelos outros é quando me chamam de intelectual e eu
digo que não sou. De novo, não se trata de modéstia e sim de uma realidade que nem de longe me
fere. Ser intelectual é usar sobretudo ainteligência, o que eu não faço: uso é aintuição, o instinto.
Ser intelectual é também ter cultura, e eu sou tão máleitora que agorajásem pudor, digo que não
tenho mesmo cultura. Nem sequer lias obras importantes da humanidade. Além do que leio
pouco: só li muito, e lia avidamente o que me caísse nas mãos, entre os treze e quinze anos de
idade. Depois passei a ler esporadicamente, sem ter a orientação de ninguém. Isto sem confessar
que — dessa vez digo-o com alguma vergonha — durante anos só lia romance policial. Hoje em dia,
apesar de ter muitas vezes preguiça de escrever, chego de vez em quando ater mais preguiça de ler
do que de escrever.
Literata também não sou porque não tornei o fato de escrever livros “uma profissão”, nem
uma “carreira”. Escrevi-os só quando espontaneamente me vieram, e só quando eu realmente
quis. Sou umaamadora?
O que sou então? Sou uma pessoa que tem um coração que porvezes percebe, sou uma pessoa
que pretendeu pôr em palavras um mundo ininteligível e um mundo impalpável. Sobretudo uma
pessoa cujo coração bate de alegria levíssima quando consegue em uma frase dizer alguma coisa
sobre avida humana ou animal.
Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro por que exatamente eu o disse, e
com sinceridade. Hoje repito: é uma maldição, mas uma maldição que salva.
Não estou me referindo muito a escrever para jornal. Mas escrever aquilo que eventualmente
pode se transformar num conto ou num romance. É uma maldição porque obriga e arrasta como
um vício penoso do qual é quase impossível se livrar, pois nada o substitui. E é uma salvação.
Salva a alma presa, salva a pessoa que se sente inútil, salva o dia que se vive e que nunca se
entende a menos que se escreva. Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o
irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador.
Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada.
Que pena que só sei escrever quando espontaneamente a “coisa” vem. Fico assim à mercê do
tempo. E, entre um verdadeiro escrever e outro, podem-se passar anos.
Lembro-me agora com saudade da dor de escrever livros.
Quando não estou escrevendo, eu simplesmente não sei como se escreve. E se não soasse infantil
e falsa a pergunta das mais sinceras, eu escolheria um amigo escritor e lhe perguntaria: como é
que se escreve?
Por que, realmente, como é que se escreve? que é que se diz? e como dizer? e como é que se
começa? e que é que se faz com o papel em branco nos defrontando tranquilo?
Sei que a resposta, por mais que intrigue, é única: escrevendo. Sou a pessoa que mais se
surpreende de escrever. E ainda não me habituei a que me chamem de escritora. Porque, fora das
horas em que escrevo, não sei absolutamente escrever. Será que escrever não é um ofício? Não há
aprendizagem, então? O que é? Só me considerarei escritora no dia em que disser: sei como se
escreve.
Quando comecei a escrever, que desejava eu atingir? Queria escrever alguma coisa que fosse
tranquila e sem modas, alguma coisa como a lembrança de um alto monumento que parece mais
alto porque é lembrança. Mas queria, de passagem, ter realmente tocado no monumento.
Sinceramente não sei o que simbolizava para mim a palavra monumento. E terminei escrevendo
coisas inteiramente diferentes.
“Minhas intuições se tornam mais clara são esforço de transpô-las em palavras.” Isso eu escrevi
uma vez. Mas está errado, pois que, ao escrever, grudada e colada, está a intuição. É perigoso
porque nunca se sabe o que virá — se se for sincero. Pode vir o aviso de uma destruição, de uma
autodestruição por meio de palavras. Podem vir lembranças que jamais se queria vê-las à tona. O
clima pode se tornar apocalíptico. O coração tem que estar puro para que a intuição venha. E
quando, meu Deus, pode-se dizer que o coração está puro? Porque é difícil apurar a pureza: às
vezes no amor ilícito está toda a pureza do corpo e alma, não abençoado por um padre, mas
abençoado pelo próprio amor. E tudo isso pode-se chegar a ver — e ter visto é irrevogável. Não se
brinca com a intuição, não se brinca com o escrever: a caça pode ferir mortalmente o caçador.
Pessoas que são leitoras de meus livros parecem ter receio de que eu, por estar escrevendo em
jornal, faça o que se chama de concessões. E muitas disseram: “Seja você mesma.”
Um dia desses, ao ouvir um “seja você mesma”, de repente senti-me entre perplexa e
desamparada. É que também de repente me vieram então perguntas terríveis: quem sou eu? como
sou? o que ser? quem sou realmente? e eu sou?
Mas eram perguntas maiores do que eu.
Às vezes tenho a impressão de que escrevo por simples curiosidade intensa. É que, ao escrever, eu
me dou as mais inesperadas surpresas. É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente das
coisas, das quais, sendo inconsciente, eu antes não sabia que sabia.
A dificuldade de encontrar, para poder exprimir, aquilo que no entanto está ali, dá uma impressão
de cegueira. É quando, então, se pede um café. Não é que o café ajude a encontrara palavra mas
representa um ato histérico-libertador, isto é, um ato gratuito que liberta.
Às vezes tenho a impressão de que escrevo por simples curiosidade intensa. É que, ao escrever, eu
me dou as mais inesperadas surpresas. É na hora de escrever que muitas vezes fico consciente das
coisas, das quais, sendo inconsciente, eu antes não sabia que sabia.
Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro por que exatamente eu o disse, e
com sinceridade. Hoje repito: é uma maldição, mas uma maldição que salva.
Não estou me referindo muito a escrever para jornal. Mas escrever aquilo que eventualmente
pode se transformar num conto ou num romance. É uma maldição porque obriga e arrasta como
um vício penoso do qual é quase impossível se livrar, pois nada o substitui. E é uma salvação.
Salva a alma presa, salva a pessoa que se sente inútil, salva o dia que se vive e que nunca se
entende a menos que se escreva. Escrever é procurar entender, é procurar reproduzir o
irreproduzível, é sentir até o último fim o sentimento que permaneceria apenas vago e sufocador.
Escrever é também abençoar uma vida que não foi abençoada.
Que pena que só sei escrever quando espontaneamente a “coisa” vem. Fico assim à mercê do
tempo. E, entre um verdadeiro escrever e outro, podem-se passar anos.
Lembro-me agora com saudade da dor de escrever livros.
Outra coisa que não parece ser entendida pelos outros é quando me chamam de intelectual e eu
digo que não sou. De novo, não se trata de modéstia e sim de uma realidade que nem de longe me
fere. Ser intelectual é usar sobretudo ainteligência, o que eu não faço: uso é aintuição, o instinto.
Ser intelectual é também ter cultura, e eu sou tão máleitora que agorajásem pudor, digo que não
tenho mesmo cultura. Nem sequer lias obras importantes da humanidade. Além do que leio
pouco: só li muito, e lia avidamente o que me caísse nas mãos, entre os treze e quinze anos de
idade. Depois passei a ler esporadicamente, sem ter a orientação de ninguém. Isto sem confessar
que — dessa vez digo-o com alguma vergonha — durante anos só lia romance policial. Hoje em dia,
apesar de ter muitas vezes preguiça de escrever, chego de vez em quando ater mais preguiça de ler
do que de escrever.
Literata também não sou porque não tornei o fato de escrever livros “uma profissão”, nem
uma “carreira”. Escrevi-os só quando espontaneamente me vieram, e só quando eu realmente
quis. Sou umaamadora?
O que sou então? Sou uma pessoa que tem um coração que porvezes percebe, sou uma pessoa
que pretendeu pôr em palavras um mundo ininteligível e um mundo impalpável. Sobretudo uma
pessoa cujo coração bate de alegria levíssima quando consegue em uma frase dizer alguma coisa
sobre avida humana ou animal.
Quando não estou escrevendo, eu simplesmente não sei como se escreve. E se não soasse infantil
e falsa a pergunta das mais sinceras, eu escolheria um amigo escritor e lhe perguntaria: como é
que se escreve?
Por que, realmente, como é que se escreve? que é que se diz? e como dizer? e como é que se
começa? e que é que se faz com o papel em branco nos defrontando tranquilo?
Sei que a resposta, por mais que intrigue, é única: escrevendo. Sou a pessoa que mais se
surpreende de escrever. E ainda não me habituei a que me chamem de escritora. Porque, fora das
horas em que escrevo, não sei absolutamente escrever. Será que escrever não é um ofício? Não há
aprendizagem, então? O que é? Só me considerarei escritora no dia em que disser: sei como se
escreve.
“Minhas intuições se tornam mais clara são esforço de transpô-las em palavras.” Isso eu escrevi
uma vez. Mas está errado, pois que, ao escrever, grudada e colada, está a intuição. É perigoso
porque nunca se sabe o que virá — se se for sincero. Pode vir o aviso de uma destruição, de uma
autodestruição por meio de palavras. Podem vir lembranças que jamais se queria vê-las à tona. O
clima pode se tornar apocalíptico. O coração tem que estar puro para que a intuição venha. E
quando, meu Deus, pode-se dizer que o coração está puro? Porque é difícil apurar a pureza: às
vezes no amor ilícito está toda a pureza do corpo e alma, não abençoado por um padre, mas
abençoado pelo próprio amor. E tudo isso pode-se chegar a ver — e ter visto é irrevogável. Não se
brinca com a intuição, não se brinca com o escrever: a caça pode ferir mortalmente o caçador.
Quando comecei a escrever, que desejava eu atingir? Queria escrever alguma coisa que fosse
tranquila e sem modas, alguma coisa como a lembrança de um alto monumento que parece mais
alto porque é lembrança. Mas queria, de passagem, ter realmente tocado no monumento.
Sinceramente não sei o que simbolizava para mim a palavra monumento. E terminei escrevendo
coisas inteiramente diferentes.
Possui Licenciatura em Língua Portuguesa e Língua Grega pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, entre os anos de 2004 -2009, onde realizou Iniciação Científica com o Projeto : "O Mito de Helena em Eurípides", sob orientação da Profª Drª Adriane da Silva Duarte, tendo obtido Bolsa de Pesquisa da FAPESP.
Mestre em Literatura Portuguesa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, 2010- 2013. Título de sua Dissertação é: " Presença das Heroides de Ovídio no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende" , sob orientação da Profª Drª Marcia Arruda Franco, tendo obtido Bolsa de Pesquisa da FAPESP.
Doutoranda em Literatura Portuguesa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, 2018-.... Título de sua Pesquisa é: "Os tratados didáticos-alegóricos de Christine de Pisan e a Educação de Damas", sob orientação da Profª Drª Marcia Arruda Franco.
Leciona no Instituto Nossa Senhora do Carmo desde 2016, a disciplina Redação.