FÉRIAS, FINALMENTE! Letícia estava animada, arrumando a mala para passar uns dias na casa da avó. Já era uma tradição, todo ano ela ia para a chácara da dona Ângela, botar os pés na terra, comer os pratos deliciosos que só a vó faz e nada de dever de casa. Seus pais levaram Lelê até lá e a menina nem olhou pra trás! 

— Oi, vó! Tchau, mãe, tchau pai! Tô indo pro quintal!

Nas férias de janeiro, o avô Luiz Paulo tinha construído com a neta uma gangorra feita de pneu. Pintou-a de amarelo, e o vovô deu um jeito de pendurá-la em uma árvore. O quintal era o lugar preferido de Letícia. Ela passava o dia inteiro subindo em árvores, comendo fruta do pé, brincando com galhos, tirando foto de passarinho, desenhando e tirando um cochilo na rede. 

— Letícia se esquece do mundo quando fica pendurada nas árvores! Impressionante. Cuidado pra não cair, hein? As férias só começaram. Tô indo com o seu avô aqui na vizinha, pegar umas encomendas. Qualquer coisa, é só gritar, viu?

A menina estava tão animada, que nem percebeu que estava bem cansada. A mãe tinha dado um livro chamado “Sankofa” para ela ler nesses dias na casa dos avós. Ela aproveitou que o céu estava bem azul, deitou-se em uma sombrinha no quintal e começou a ler… até que, de repente, ela ouviu um “Psiu”. 

— Ué? Eu não estava sozinha? Quem tá me chamando?

— Pssssssiu! — continuou chamando uma voz, que Letícia não sabia de onde vinha.

— Quem está aí?

— Eu, ué! Você está deitada em cima de mim e nem reconhece a minha voz?

— UMA ÁRVORE ESTÁ FALANDO COMIGO? —  perguntou, assustada, a menina. 

— Poxa, mas eu não sou uma árvore qualquer. Eu vi você nascer, sabia? Vi seus primeiros passos, estava aqui quando você experimentou pela primeira vez um pedacinho de manga e amou!

— Uau… manga é mesmo minha fruta preferida… Mas como pode uma árvore falar? Você é mágica? Qual o seu nome? De onde você veio? 

Eram tantas perguntas, que a árvore começou a rir. E quando ria, seus galhos balançavam e algumas folhas caíam. Com toda a calma do mundo, ela respondeu as perguntas da Letícia, que agora estava de pé, olhando abismada para uma árvore que fala!

— Vem, Letícia. Sobe aqui nos meus galhos pra gente conversar. Chegou a hora de você saber um pouco da nossa história. Eu sou um Tamarindeiro! Muita gente ama a fruta que nasce de mim. Mas você sabe de onde eu vim?

A menina não demorou nem cinco segundos e já tinha escalado o Tamarindeiro. Sentou em um galho bem firme e ficou tentando adivinhar de onde ele vinha. 

— Eu vim diretamente das savanas da África. Vêm de lá as minhas raízes. Aqui, neste quintal, você vai encontrar várias árvores e plantas que vieram de lá. Nos trouxeram pra cá, sabe?

Letícia ouviu bastante impressionada cada palavra da árvore . Durante a conversa, o Tamarindeiro começou a mostrar à menina quais são as plantas e árvores africanas de origem.

— Além de mim, temos o Flamboyant. Lá, na frente da casa, você dá de cara com ele. Ele veio lá de Madagascar! Lindo, grande, colorido. O chão ao seu redor parece um tapete, de tão lindo. Sua avó cuida bem de todos nós. Ali, perto da cerca, temos a Espatódea! Ela vem lá da África Central e as suas flores são alaranjadas ou amarelas. Lindas demais. 

— Nenhum de vocês é daqui, então? Vocês são africanos… — comentou  a menina, claramente impressionada com as descobertas.

— Sim. Eu, o Flamboyant, a Espatódea, as plantas que sua família ama colocar no quintal, como a Espada-de-São-Jorge, o Agapanto, o Copo-de-Leite e até a Babosa! Todas elas têm origem lá na África… mas eu vim mostrar a você que não é só a gente, que veio de lá não…

— É mesmo, Seu Tamarindeiro? Quem mais? Mais alguma planta? Passarinho?

— VOCÊ!

— EU?

— Sim, Letícia! Você! Olhe a cor da sua pele. Olhe para a sua família. Você conhece  suas raízes? Seus tataravós foram trazidos da África. Mas não foi só você que veio de lá não. A HUMANIDADE TODA VEIO DE LÁ!

Letícia ficou sem palavras. Seus tataravós, seus bisavós, seus avós, ela… todos vieram da África. Ela conseguia entender isso. Mas… a humanidade também?

— Muitos cientistas pesquisam e defendem que o primeiro homem surgiu na África e de lá se espalharam para os outros continentes. Por isso dizem que a África é o berço da humanidade. Todos vieram de lá!

— A gente precisa contar isso pra todo mundo, Tamarindeiro! Espalhar essa notícia… saber disso muda tudo!

— Sim, minha menina. Por agora, eu fico contente de VOCÊ saber disso. De você conhecer as suas raízes. Gostar de onde você veio, para poder pensar para onde você vai.

— Olha só, o livro que eu estou lendo fala disso! SANKOFA! Um pássaro que voa pra frente, mas a cabeça está voltada para trás e no bico está carregando um ovo…

— É isso mesmo! Seguir em frente voando, mas não é problema algum olhar pra trás, voltar e buscar o que se esqueceu. E o ovo no bico do pássaro significa o futuro que virá! Obrigado, Letícia, por olhar pra trás e me encontrar. 

Quando a menina ia agradecer ao Tamarindeiro, ela ouve uma voz chamando lá da cozinha. Era a avó, dizendo que o almoço estava na mesa. Letícia percebe que não está sentada no galho da árvore e sim deitada na sua sombra. Foi tudo um sonho? Letícia não sabe. Ela se levanta, abraça o Tamarindeiro, que deixa cair um fruto de presente. Bem baixinho, ela ouve “Psiu… hora de olhar pra frente! E sempre que precisar, venha buscar suas raízes”. 

Vamos descobrir de onde vieram as árvores que encontramos pelo caminho?