A Contrastação de elementos

e a linguagem da visão



Desde o princípio o ser humano é condicionado a contrastar elementos, conceitos e sensações, seja indiretamente ou diretamente. Essa atribuição de oposição é perceptível em situações como o que é certo e o que é errado, ação e inércia , calor e frio e ,partindo para o âmbito do design, o que é esteticamente agradável e o que não é com base em formas, cores e designações atribuídas . Esses valores perceptivos apesar de parecerem banais no panorama cotidiano, são essenciais no âmbito estético e podem apresentar relação cultural e biológica. Desse modo, tomando como objeto as diferentes visões humanas sobre elementos e os estudos do design acerca da forma visual é possível buscar um entendimento sobre o uso de contraste e formas na linguagem visual.

“Kandinsky concebeu essas cores e formas como uma série de oposições; o amarelo e o azul representam os extremos de quente e frio, claro e escuro e ativo e passivo, enquanto o vermelho é seu intermediário. Triângulo, quadrado e círculo são equivalentes gráficos das mesmas polaridades.” (MILLER, J Abbott, LUPTON, Ellen, 2008, pg. 30)


A partir das constatações de Kandinsky, é possível fazer uma relação entre o uso de cores e formas no design e como as pessoas interpretam essas composições. Sendo assim, pode-se gerar em uma obra maior foco em determinado objeto com o uso de cores, por exemplo, um objeto de tom muito escuro em um poster e um tom claro no exterior podem gerar maior foco para o objeto a partir do contraste. Além disso, os contrastes também são observados no uso de sombreamento, a aplicação de uma saturação adequada e oposição tonal são muitas vezes utilizadas como forma de apresentar uma dramaticidade, complementação e ocasiona em maior interesse.

(E.T. the Extra-Terrestrial,1982. Toy Story poster by Tom Whalen.)

Já sobre as formas, elas possuem grande viabilidade, como dinâmica, simetria, ilusão de óptica, sobreposição e modernismo. Seu uso com oposição é observável em situações como criação de personagens na área de animação, quadrinhos, games, publicidade e outros, exemplificando, é comum que personagens criados com base em círculos apresentem características visuais de amabilidade e gentileza, já em contrariedade, personagens mais ativos ou perigosos são baseados em triângulos.

(Arte de @MitchLeeuwe)

Paralelamente, isso também é notável na produção de logotipos, o modo como uma marca pode causar um impacto de confiabilidade e excelência em uma primeira visão superficial a partir da construção gráfica, seguindo os impactos psicológicos que as formas triângulo, quadrado e círculo juntos com cores específicas alcançam o interesse do público consumidor.

É claro que esse uso de formas não é regra, a liberdade criativa de narração, publicidade e arte não segue sempre esse padrão e por muitas vezes podem surpreender quando desapegam desses conceitos, porém o contraste das formas triângulo, círculo e quadrado são bem interessantes quando apresentam certa polaridade para o indivíduo que está observando.

(NASA logo, 2013. Microsoft logo,2012. Qantas logo,2013)
(Cine Bauhaus logo,Shopping Bauhaus logo, Petrópolis, 2018).

“Kandinsky concebia a composição pictórica como um sistema de "forças", em que cada marca ou cor relaciona-se a oposições geométricas como vertical/horizontal, reto/curvo, quente/frio e ativo/passivo” (MILLER, J Abbott, LUPTON, Ellen, 2008, pg. 30).


Dando continuidade ao uso de formas e cores, esse sistema de forças apresentado por Kandinsky constitui relações antagônicas, na qual instauram uma certa harmonia quando o uso de eixos, posições, distribuição e cor são aplicados de forma correta em uma composição gráfica. A posição de um quadrado de cor azul juntamente com uma sobreposição de um círculo de cor vermelha, por exemplo, pode ter um efeito diferente do que os dois objetos separados, por essa razão as possibilidades de combinação e oposição são diversas, assim como o seu impacto na linguagem visual. Por conseguinte, essas relações contrárias evocam respostas e acatam múltiplas concepções pessoais frente às figuras, logo, elas influenciam em quesitos como identificação, interesse de compra, julgamento e comparação.

(https://casavogue.globo.com/)

É de suma importância como a arbitrariedade gera indagações e efeitos não só na esfera visual, mas em quesitos sonoros, psicológicos, subconscientes e linguísticos. O contraste comumente presente em múltiplas facetas do cotidiano ajudam o ser humano a inferir opiniões, mesmo que elas não sejam expressadas verbalmente ou percebidas pelo próprio indivíduo, circunstância presente em vários planos e apresentada pela análise do linguista Ferdinand de Saussure:


“ De acordo com a teoria do signo verbal proposta pelo linguista Ferdinand de Saussure na virada do século XX, a linguagem consiste em dois planos distintos, porém inseparáveis: sons e conceitos, ou significantes e significados. Para que a massa caótica e indiferenciada dos sons potenciais possa se tornar o material fonético da linguagem, ela deve articular-se em unidades distintas e repetíveis; da mesma forma, o plano do pensamento precisa ser decomposto em conceitos distintos antes de poder ligar-se a sons materiais.”

(MILLER, J Abbott, LUPTON, Ellen, 2008, pg. 31)


Portanto, de uma forma complexa a decomposição de conceitos e os planos da linguagem se articulam como um material fonético, fazendo conexões e formulando organizações que se direcionam a significados e conceitos. Ademais, é evidente como a linguagem e seus efeitos de uma forma conjunta ocasiona em muitos prismas de pensamento, pesquisas e possibilidades de uso, na qual seus vários desdobramentos são materiais de estudo interessantes no design, assim como apresentado por J Abbott Miller e Ellen Lupton:


“A tarefa dominante da teoria do design moderno tem sido a de desvelar a sintaxe da linguagem da visão, ou seja, as maneiras de organizar elementos geométricos e tipográficos em relação a oposições formais tais como ortogonal/diagonal, estático/dinâmico, figura/fundo, linear/planar e regular/irregular.”

(MILLER, J Abbott, LUPTON, Ellen, 2008, pg. 36)


Em síntese, é compreensível a importância dos recursos figurativos no cotidiano e sua relação de causalidade e efeito a partir do contraste. Indubitavelmente, ainda existem diversas questões no que se diz a esse fenômeno visual, no entanto, recursos figurativos como as formas geométricas citadas, o uso de cores e a forma de organização são um material de estudo e de aplicação essencial na área gráfica, e de fato possuem uma usabilidade estética abrangente e primordial na contemporaneidade.

Bibliografia:

LUPTON, E.; MILLER J. A. Abc da Bauhaus. São Paulo: Editora Gustavo Gili, 2019.


Texto desenvolvido por Stela Brenda Lima Grilo para a disciplina Introdução ao Estudo do Design - Universidade Federal do Rio Grande do Norte - Departamento de Design - Abril de 2021. O texto colabora com o projeto de extensão “Blog Estudos sobre Design”, coordenado pelo Prof. Rodrigo Boufleur (http://estudossobredesign.blogspot.com).