ASPECTOS DA LINGUÍSTICA DE SAUSSURE INCORPORADOS NA LINGUAGEM VISUAL


Ao prestar homenagem sobre os estudos e teorias estruturalistas da linguagem visual, tanto no campo artístico quanto no campo do design, é imprescindível ter como base o arcabouço teórico alavancado pelos pensadores modernos da Bauhaus, que desde o princípio do século XX almejavam alcançar um determinado código expresso em formas sob o viés da percepção biológica do ser humano.

Um dos principais pilares dessa teoria encontra-se na psicologia e estudo da Gestalt na qual consiste no entendimento da percepção visual humana como um agente formador de imagens das quais são processadas e organizadas mentalmente, em outras palavras, o comportamento visual do ser humano é naturalmente composto por padrões organizacionais. Tal efeito é concebido com a ação de forças externas (a luz que reflete no objeto e atinge a retina) e forças internas (processo fisiológico desempenhado pelo sistema nervoso) que, juntas, atuam na concepção de formas e na regulação espontânea desse fenômeno.

Pondo essa perspectiva em foco, o ensino básico do design na época embebedou dessa fonte na tentativa de descrever uma linguagem do próprio design que reunia um “vocabulário” de elementos como ponto, linha, plano, cor e textura em arranjos de contrastes.


“A tarefa dominante da teoria do design moderno tem sido a de desvelar a sintaxe da linguagem da visão, ou seja, as maneiras de organizar elementos geométricos e tipográficos em relação a oposições formais tais como ortogonal/diagonal, figura/fundo, estático/ dinâmico, linear/planar e regular/irregular’’ (Lupton, 1991, p.36)


Ademais, apropriando-se de estratégias organizacionais (gráfico, grid, tradução e figura) que apelam para a elaboração de um código gráfico universal. Uma dessas conexões é visível na dialética do discurso de Wassily Kandinsky, um dos grandes nomes da Bauhaus bem como da teoria da linguagem visual, em relação à linguística de Ferdinand Saussure.


“O progresso obtido com o trabalho sistemático criará um dicionário que, em seu desenvolvimento posterior, levará a uma ‘gramática’ e, finalmente, a uma teoria da composição que ultrapassará as fronteiras das expressões artísticas individuais e se tornará aplicável à ‘Arte’ como um todo’’ (Kandinsky, 1926, p.83)


Sumariamente, Saussure foi um linguista e filósofo suíço que defendia a autonomia científica da Linguística como campo de estudos além de agregar com diversas teorias na área literária e macroscopicamente no estruturalismo. Tendo isso em vista, destacam-se os conceitos de língua, linguagem e signo com base na obra Curso de Linguística Geral.

Para Ferdinand, a linguagem entendia-se pela faculdade humana de se comunicar por meio da constituição de uma língua em diferentes manifestações no espaço-tempo, seja civilizações antigas ou sociedades contemporâneas. Além disso a linguagem é dualista, ou seja, é composta por duas faces que se completam indivisivelmente. Para Saussure, a linguagem é social e individual - dois polos representados respectivamente pela língua e pela fala – bem como sua natureza é psíquica, fisiológica e física.

Nesse viés, por intermédio de um circuito gráfico em que duas pessoas ou mais participam do fenômeno linguístico: conceitos internalizados, uma vez associados a signos linguísticos (psíquico) de uma pessoa, são transmitidos pelos órgãos do corpo responsáveis pela fonação (fisiológico), em que a o som contendo a mensagem é propagado (físico) até a outra pessoa do circuito, reiniciando o ciclo.

Circuito da fala, Curso de Linguística Geral, p.19-20

A partir desses gráficos entende-se a dualidade da linguagem, entretanto, como uma unidade obrigatoriamente existente da sincronia entre a língua e a fala para que o fenômeno se concretize. Conforme Saussure, a língua é um produto social que abarca toda bagagem comunicativa da qual os humanos usufruem a fim de comunicarem-se.


“Ela (língua) é a parte social da linguagem exterior ao indivíduo, que, por si só, não pode nem criá-la nem modificá-la; ela não existe senão em virtude duma espécie de contrato estabelecido entre os membros da comunidade.” (Saussure, 1995, p.22)


Se por um lado a língua é a parte social da linguagem, a fala constitui a parte individual pois cabe ao falante do discurso articular conceitos, signos e imagens visuais de uma língua especifica para expressar uma determinada ideia. Ambos polos estão convergem em uma outra instância da linguagem igualmente fundamental: os signos.

Para Saussure, o signo é uma entidade psíquica que vincula duas faces: o conceito (a ideia) e a imagem acústica (representação gráfica e sonora), em outras palavras, respectivamente o significado e o significante. Logo, o signo é a representação de algo, seja material ou não em uma determinada língua. Dessa forma, o signo é arbitrário, ou seja, a associação entre significado e significante ao representar algo é puramente convencionado pois não há exatamente uma relação com a realidade.

Diagrama da relação conceito, imagem acústica (sound pattern). Disponível em:Notes, TOUT-FAIT: The Marcel Duchamp Studies Online Journal (toutfait.com)

Em relação a Linguagem visual, Kandinsky cunhou o termo “tradução” como a tentativa de estabelecer um vínculo análogo ao diagrama significado-significante de Saussure, no contexto dos contrastes formais na busca de equivalentes gráficos. De acordo com Lupton, a série: triângulo amarelo; quadrado vermelho; círculo azul, foi um dos experimentos realizados por Wassily mais famosos dentro da Bauhaus.

Nele, estudantes membros da instituição foram ordenados a intuitivamente associar as três formas básicas geométricas às três cores primárias, tal processo visava a capacidade de construir uma linguagem independentemente de convenções culturais e linguísticas, apenas com o mecanismo fisiológico do ser humano. Assim, pode-se afirmar que o ponto central que difere a linguagem verbal, de Ferdinand, da linguagem visual de Kandinsky é o fator cultural arbitrário nos signos linguísticos.


“A imagem [...] contém uma mensagem inerente. Embora tenhamos de nos esforçar [...] para ler suas formas externas [...] ela, entretanto, nos fala diretamente. Diferentemente das letras, as figuras irradiam movimento, valores tonais, e formas como forças que evocam uma resposta imediata.’’

(Manual de design gráfico, Armim Hofmann, 1966.)

REFERÊNCIAS:

MILLER, Ellen Lupton e J. Abbott. ABC da Bauhaus: a bauhaus e a teoria do design. São Paulo: Cosac Naify, 2008. 72 p.

SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Linguística Geral. 28. ed. São Paulo: Pensamento Cultrix, 2007. Disponível em: http://paginapessoal.utfpr.edu.br/. Acesso em: 26 abr. 2021.

COSTA, M.A. Estruturalismo. In: MARTELOTTA, M.E. (Org.) et al. Manual de Linguística. São Paulo: Contexto, 2008.

FICHA TÉCNICA:

Texto desenvolvido por Murilo Augusto Neves Cavalcante para a disciplina Introdução Estudo do Design - Universidade Federal do Rio Grande do Norte - Departamento de Design - Abril de 2021. O texto colabora com o projeto de extensão “Blog Estudos sobre Design”, coordenado pelo Prof. Rodrigo Boufleur (http://estudossobredesign.blogspot.com).