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LEMBRANÇAS DOS POMBEIROS
Obra de Angel San Martim
Varina portuguesa
Pombeiro da antiga Desterro (Florianópolis) - fonte: Portal Floripa Centro
(...) Depois de seco e empilhado
O pescado ia ao consumo
Com porções, a cada rumo,
Dependendo do mercado.
Vendido no atacado,
Também aos comerciantes
Que cotavam o preço antes
De obter mercadoria.
E, no final, ele se ia
Por pombeiros – ambulantes.
Trecho do livro: Ilha de Idílios
Conhece-se o pombeiro como uma figura folclórica dos Açores e do litoral de Santa Catarina. Sujeito ambulante que comercializava de tudo: peru, pomba, galinha, fruta, hortaliça, e no nosso litoral, principalmente, peixes dos mais diversos. Existiam também as varinas, em Portugal, mulheres que transportavam o produto em canastras ou cestos rasos sobre a cabeça protegida por um arco de tecido improvisado com um lenço enrolado. Aqui, o pombeiro percorria as ruas carregando aos ombros um cambão, vara que sustentava, em cada extremidade, uma balaia pendurada por cordoalhas. Os cestos eram cheios com porções iguais no peso, para dar equilíbrio à carga, facilitando a locomoção do vendedor no anúncio e nas vendas dos seus produtos, às portas. Havia alguns pombeiros que possuíam burros de cargas, e nos cestos ou serões dispostos nas laterais da cavalgadura, transportavam a mercadoria. Pelas ruas anunciavam, em voz alta, a natureza do que vendiam. Sabe-se até que um deles, meio atrevido, certa vez se deu mal ao anunciar: "ovo e uva boa", frente à casa de uma recente viúva.
Na verdade, ainda hoje há um pombeiro que passa pela minha rua vendendo camarão, transportado em baldes plásticos. Sou do tempo em que camarões eram comercializados pelos próprios tarrafeadores que saiam às ruas com os samburás cheios e os vendiam por cambulhões, porções resultantes das coletas possíveis desses crustáceos pegos, aleatoriamente, pelas barbas. E, ainda gratificavam o comprador com uma inhapa – que seria uma porção a mais do produto – como um agrado ao freguês.
Mais tarde, para quantificar o produto, começaram a medi-lo pelo volume de uma latinha de azeite destapada, que afirmavam pesar um quilo. Caso o freguês dissesse que o camarão era graúdo só na parte de cima do samburá e miúdo por baixo, o vendedor fazia uma demonstração engenhosa para ludibriar o desavisado. Levava a mão espalmada até o fundo do cesto, mantendo cuidado de prender na forqueta do polegar e do indicador, um camarão graúdo de cima e, ziguezagueando com movimentos para baixo, a desviar de esporões, trazia-o facilmente para cima. Finalmente, dizia: Táx vendo teimoso, como eu não minto!...
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Rebaldaria ou Ribaldaria
*Modelo típico de embarcação utilizada na Praia de Nazaré, Portugal, com proa altaneira para evita que os grandes vagalhões da quebrança na praia alaguem o interior do bote na hora de entrar ao largo do oceano.
*Praia do antigo porto baleeiro de Armação do Itapocoróy, Penha, SC. Na imagem, representando os filhos do lugar, Paulo Renato Freitas (D) e Emir Custódio (E).
Observem a tradição portuguesa pela Cruz de Malta em uma lancha baleeira e o nome do bote - Divina Providência
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*Antigamente, na tradição do povo do litoral catarinense, entre descendentes de portugueses açorianos e continentais (do Porto, Braga e Nazaré), a Rebaldaria era um costume corriqueiro. Em Armação do Itapocoróy, Penha, na madrugada de Sexta-feira Santa para o Sábado de Aleluia, a rapaziada saia às ruas a fim de praticar suas traquinagens. Junto à população mais antiga é possível se ouvir relatos curiosos sobre o assunto, muitas vezes hilariantes.
*Geralmente, em grupo, os mais moços tinham por hábito fazer uma verdadeira bagunça na rotina da vida dos habitantes locais, provocando transtorno no transcurso do pacato sítio; surpreendendo a população, ao amanhecer. Entre as travessuras constam a obstrução de vias públicas, em que atravessavam canoas, lanchas e carroças no meio das estradas; amarravam os portões das residências com cordoalhas, dificultando a abertura; colocavam estivas, vaus ou rolos (peças de estrado de carreira usadas para puxar as embarcações miúdas na praia) em pé e encostados nas portas das residências para que quando o morador fosse abri-las, tudo caísse dentro da casa.
*Num episódio ocorrido em Luiz Alves, município vizinho à Penha, de tradição cultural semelhante, consta que um jovem rapagão e sua turma, na prática de rebaldaria, arrancou a porteira de um pasto lotado de gado deixando o fazendeiro com seu plantel solto e os animais dispersos em toda a área contígua à propriedade. Ao descobrir a autoria do delito, o proprietário prestou queixa na delegacia, o delegado chamou os autores e ordenou a prisão do líder. Passado algum tempo, o moço infrator engraçou-se pela filha do antigo denunciante; os jovens começaram a namorar e sem qualquer empecilho, terminou em casamento.
*Não se tem certeza da origem do costume. Alguns pescadores mais antigos supõem ser uma representação sadia da indignação do povo cristão contra a crueldade cometida a Cristo, ao sacrificar um inocente que só o amor pregava. Outros dizem ser sinal de regozijo pela ressurreição do Salvador. A verdade é que a sociedade sabendo, que dentro do possível, tudo era praticado em nome da tradição, relevava a nefasta atitude, considerando-a uma brincadeira apesar de surtir, algumas vezes, prejuízos.
*A palavra ribaldaria ou rebaldaria é comum no linguajar em Portugal, significando confusão, tumulto, caos. Consta que no Alentejo, até uns cinquenta anos, havia rebaldaria de forma mais branda, na manhã de Sábado de Aleluia em menção de felicidade pela ressurreição de Cristo. Consultada uma amiga portuguesa, ela respondeu: "Por cá há algumas tradições assim, mas na altura do Carnaval, mesmo antes de entrar na época da recolha da Quaresma. Talvez o mais parecido que há aqui, é uma tradição numa cidade perto da minha onde fazem uma "queima de Judas" que consiste num espectáculo de teatro, música, fogo de artifício e onde se aproveita para chamar à atenção de certas questões "difíceis" que tenham acontecido nesse ano."
Ah, santa Rebaldaria!
Que o povo português
Deixou de herança e a fez
Por tradição, que seria
Revolta com rebeldia
Contra a morte de Jesus
Crucificado-o na cruz
Sem ter culpa – um inocente
Que pregou o amor somente
E ao amor não fez jus.
Soltam cavalos, cabritos...
Obstruem vãos inteiros,
Prendem gente nos terreiros,
Alteram jardins bonitos
E seguem os antigos ritos
Preservando a tradição.
E, assim, esses atos são
Pouco levados a mal,
Dado o lado cultural,
Mesmo que fuja à razão.
Suvenir da Praia de Nazaré, Portugal. – Miniatura de embarcação utilizada naquele lugar
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COLONIZAÇÃO AÇORIANA
274 anos em 2022
Imagem : fonte Internet
No ano de 2018 ocorreu o 270º aniversário da chegada dos primeiros Açorianos em Santa Catarina, que partiram do Atlântico Norte, em 21 de outubro de 1747, e chegaram ao Brasil em fevereiro de 1748 para tomar posse do solo e povoar parte do território brasileiro. Apesar disso, a cultura lusitana exclui os termos migração, tendo esse deslocamento humano como uma redistribuição de habitantes de uma mesma nação, a territórios diferentes – muito comum é o termo "diáspora" a evocar a dispersão do povo judeu.
Conforme consta na história, o Arquipélago dos Açores fora "encontrado" por navegadores portugueses em meados do século XV, anos antes de “descobrirem” o Brasil e começarem a explorá-lo. Deram-lhe nome de Açores, devido aos bandos de aves que sobrevoavam as ilhas, pássaro que confundiram com o açor, uma espécie de gavião do mar. Mais tarde foram entender que os bandos não eram de açores e sim de milhafres, mas pela denominação formada, o local se manteve por Arquipélago dos Açores.
Ao habitar o novo mundo, a corrida exploratória entre Portugal e Espanha às novas terras tornou-se intensa. Os espanhóis optaram em agir pela força; os portugueses pela força e um pouquinho de esperteza, já que Açores mergulhava em problemas, ao ter suas nove ilhas superlotadas e tomadas de assalto por diversas etnias. Uma delas, a Faial, atingida por uma erupção vulcânica de grande magnitude, obrigou-se a despejar seus habitantes para as ilhas vizinhas, o que estabeleceu o caos, gerando a falta de comida, miséria, prostituição e fome, pois suas fontes de subsistência como a produção de trigo e da planta do pastel (espécie usada como corante azul em tinturaria) estavam em escassez.
No intuito de resolver o problema, o brasileiro Alexandre de Gusmão, ministro do Rei de Portugal, que vinha negociando o plano do Tratado de Madrid na definição de limites entre as terras descobertas, participou do estudo e concepção da tomada de posse das terras brasileiras pelos portugueses. Para tanto, optou pela ocupação do solo que asseguraria o direito de propriedade, frustrando o sonho espanhol em dominá-lo, conforme vinha fazendo com seu pouco pessoal. Além disso, o brigadeiro português José da Silva Paes mantinha as construções de fortificações e idealizava maior população à Ilha de Santa Catarina, como um entreposto a outros portos ao sul. E, tão logo agravado o problema açoriano, fomentaram migração de habitantes portugueses para o Sul do Brasil, sendo a maioria de etnia não lusa continental. Alguns de ancestralidade holandesa – basta ver os de olhos azuis, açorianos aqui encontrados. Os continentais, principalmente do Porto, não vinham ao Brasil para serem empregados como trabalhadores nos campos. Eles permaneciam nas cidades, servindo pequenas indústrias ou na aprendizagem no comércio.
O edital emitido por Sua Majestade o Rei de Portugal, proclamava regras que estabeleciam doações enumeradas de diversos bens e objetos aos trabalhadores, para as atividades nos campos – uma pá, uma enxada, um machado, uma espingarda, uma vaca leiteira... Quando aqui chegaram, receberam da listagem insignificantes apetrechos e tiveram de lidar com o suor e a criatividade, estreitando laços com os indígenas e deles tomar hábitos à própria sobrevivência.
As sementes de trigo que trouxeram, em razoável quantidade, não se adaptaram às condições do solo, altitude e clima. E para sobreviver foram se reinventando, agregando às suas práticas culturais e de produção, as técnicas aprendidas a partir do convívio com a população negra e indígena. Do negro, além da mão-de-obra, parte essencial na economia, agregaram costumes e adaptações à fala que influenciou a cultura local, além de adotarem as festas e as danças. O cultivo da mandioca, ao ser observado na cultura dos indígenas, fora associado a uma produção mecanizada à obtenção da farinha de mandioca, com os engenhos que conceberam em projetos e os construíram. O açoriano assimilou do índio Carijó o aprendizado da confecção de cestaria em hastes de taquara ou bambu e cipó, aperfeiçoando o feitio de balaios e do covo para captura de peixes e lagostas, além da confecção de armadilhas à caça, como o mundéu, a arapuca, a esparrela, o laço e o alçapão falso. Construiu igualmente, à moda indígena, a canoa escavada num único tronco da gigante árvore garapuvu, com a qual se fazia ao mar. Mais tarde, para produção de embarcações maiores, usaram projeto de lanchas baleeiras munidas de tábuas vergadas sobre o cavername. Nas as cordoalhas de pesca era usada a corda em cânhamo e a do sisal e para o tecido de tear, o algodão produzido in loco.
Os portugueses continentais, quando casados, principalmente do Porto, vinham ao Brasil sem suas famílias, a tentar a vida para trazê-las posteriormente. Muitos deles casavam-se aqui e por aqui ficavam.
A luta pela sobrevivência em um dos lados sombrios da imigração, em meados do século XIX, talvez tenha sido a prostituição nos grandes centros como do Rio de Janeiro quando, muitas vezes, a falta de mulheres era suprida por rapazes, por alguns comerciantes portugueses ao se utilizarem dos “serviços” de jovens compatriotas portugueses. É o que descreveu Amilcar Filho. "Tornou-se tão intensa essa prática que o Cônsul de Portugal, barão de Moreira, em 1846, por cartas, providenciava a importação de muitas mulheres dos Açores para substituir a prostituição masculina".
Achava-se que o povoamento açoriano terminara em 1807, conforme consta, mas em meados do mesmo século chegaram muitas mulheres açorianas, várias delas destinadas aos prostíbulos do Rio, Bahia e São Paulo, não chegando ao Sul do Brasil; o que após um tempo foi proibido. Ramalho Ortigão, em seus registros, afirma que se "passou a alertar a permissão da saída, somente de raparigas acompanhadas de familiares, já que os Açores era a parte do país que exportava maior quantidade de mulheres e trabalhadores do campo". Com a proibição houve, mais tarde, a importação de prostitutas judias, polacas e das famosas francesas.
Entre diversos relatos sobre os colonizadores, consta o de uma família escandinava que migrou da Noruega para os Açores, em embarcação própria. Dos Açores, os modernos vikings seguiram a Fortaleza, norte do Brasil e alguns de seus descendentes, anos depois, partiram de Fortaleza à Ilha de Santa Catarina com uma jangada de manufatura construída pela própria família. Um de seus descendentes de sobrenome Gondin, em meados de 1800, foi provedor da Irmandade do Senhor Jesus dos Passos na antiga Desterro. Em 1942, outro descendente da família, Nilson Vasco Gondin (meu amigo e colega de trabalho) alistou-se como voluntário combatente à Segunda Guerra Mundial, desembarcando em Nápoles em 1944, já promovido a sargento da Força Expedicionária Brasileira. Gondin foi um dos militares brasileiros (um ilhéu catarinense) que deu combate no campo de batalha em diversos assaltos como a tomada de Monte Castelo, Castelnuovo, Montese e Zocca, desalojando sangrentamente os alemães encastelados em picos de altos morros. Sendo que nosso herói retorna da batalha, após ter sofrido ferimentos leves por estilhaços das granadas de morteiros do fogo inimigo, recebido em terra natal como herói de guerra, condecorado inúmeras vezes.
*Um pouco da história de Gondin e outros importantes combatentes, consta no meu livro (romance) “Um Soldado à Liberdade”
Fontes históricas: obra “As Farpas” - 1872 tomo X de José Duarte Ramalho Ortigão.
“Tríbades Galantes, Fanchonos Militantes” de Amilcar T. Filho.
“Liberdade Escrita com Sangue” de Nilson Vasco Gondin.
ANIVERSÁRIO DA COLONIZAÇÃO AÇORIANA
https://silolirico.blogspot.com/2018/03/270-aniversario-da-colonizacao-acoriana.html
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Anita na Fonte – obra do
catarinense Martinho de Haro.
Acervo do Museu Casa de Anita
ANITA
Na praia uma linda flor
A bela orquídea imita.
Porém muito mais bonita
Dado o matiz multicor.
Um nauta navegador,
Com lentes, busca a infinita
Visão. Vendo a flor Anita
Jura-lhe um eterno amor.
Saltando em terra, o guerreiro
Inala da flor o cheiro
Quando a fragrância a ilumina.
Como esposa e companheira,
Anita fez-se a guerreira
De dois mundos – a heroína.
*Por Laerte Tavares
Obra contemporânea em homenagem ao bicentenário da heroína Anita Garibaldi, de autoria do genial artista da arte literária e pictórica Umberto Grillo, Desembargador Federal, escritor que enalteceu, em obra literária esmerada, a vida do cofundador de nossa centenária Academia Catarinense de Letras, Othon da Gama Lobo D’Eça que, junto a José Boateaux e outras figuras ilustres, criaram nosso Sodalício.
Anita Garibaldi – obra do artista genovês
Gaetano Gallino.
Anita, obra do pintor catarinense Willy
Zumblick, Ano de 1845 na cidade de Montevidéu
Uma amiga portuguesa me perguntou quem foi Anita Garibaldi. Respondi ser uma brasileira catarinense de nome Ana Maria de Jesus Ribeiro, que viveu na primeira metade do século XIX, considerada “heroína de dois mundos”, por lutar na América do Sul e na Europa. No Brasil lutou pela Revolução Farroupilha e no Uruguai contra as tropas argentinas que visavam controlar o comércio no Rio da Prata. Já na Itália, seu grande feito foi lutar pela unificação do país, combatendo ao lado do companheiro Giuseppe Garibaldi, também consagrado herói.
Ana, para o mundo, ficou conhecida como Anita, devido à dificuldade de pronúncia de Garibaldi que assim a tratava. A jovem guerreira atuou efetivamente nos movimentos revolucionários a diferentes países: Brasil, Uruguai, San Marino e Itália. Exemplo de bravura que motivou os italianos na busca pela unificação do país.
À época de Ana, a atividade comercial do Estado de Santa Catarina era insipiente, mas seus entrepostos marítimos contavam com o Porto de Laguna (cidade que serviu de marco territorial ao Tratado de Tordesilhas), movimentado com o comércio terrestre e marítimo. Duzentos quilômetros distantes dali, em altitude a cerca de 900m, situava-se o município de Lages, com seus vilarejos circunvizinhos no Planalto Serrano, onde predominava a atividade agropecuária. O transporte de mercadorias, a exemplo do sal e dos produtos industrializados, como lampiões, enxadas e outros artigos, eram levados à serra. Já o charque, pinhão, canjica, fubá, jacás de fumo em corda, enchidos defumados, toucinho salgado e torresmo, iam de Lages para o litoral; mercadorias essas, transportadas nos seirões (grandes cestos oblongos atrelados às cangalhas) sobre lombos de muares e asininos, dado o caminho íngreme, acidentado, possível apenas para animais de cargas ou cavalo de montaria individual que, além da sela encilhada, levava à garupa nos peçuelos (espécie de dois alforjes – um de cada lado das ancas do animal em couro curtido) roupas e utensílios pessoais, sobreposto à presilha do laço (em tentos de couro cru tramados) ou do sovéu (fino e curto laço grosseiro em três tentos de couro cru torcidos – tipo corda). Demais ferramentas, alimento e roupas iam nas bruacas (grandes malas retangulares – uma de cada lado da cavalgadura, em couro cru, costuradas à mão com tentos de couro cru), transportadas por animais cargueiros.
Ana nasceu de pais tropeiros – talvez até em uma dessas tropeadas, num trecho do caminho entre as duas cidades, enquanto conduziam uma tropa de bovino a Laguna para uma feira pecuária. É fato que, desde menina, ela acompanhava os progenitores nas jornadas, tornando-se exímia amazona nas lidas das tropeadas.
Ainda adolescente, Ana se casa com um morador de Laguna, tamanqueiro por profissão, cujo enlace pouco durou devido às diferenças de gênios, culturas e costumes. Com a separação do casal, ela passa a morar com parentes, enquanto ele se alista na Guarda Nacional do Império, que lutava contra a revolta republicana, que veio a se instalar na região sul do Brasil. Ao conhecer o revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi, decidida, Anita se junta às suas tropas contrárias ao Império, surpreendendo a todos pela denodada bravura em combate. Ao tempo em que viveu com Garibaldi, ela se superou nas batalhas, lutando até seu último instante de vida.
Obs.: um relato curioso narrado pelo senhor Jacinto Bagio, 94 anos, quanto ao transporte de mercadorias à época. Isso ilustra a vida campeira daquele tempo, transportando porcos:
(Fonte: Vídeo – Rádio Guarujá)
Alegoria da Revolução – Anita, óleo sobre papel sobreposto a cartão; de Johann Moritz Rugendas, 1846-48
Anita, pelo artista brasileiro Galdino Guttmann Bicho, 1919
ANA MARIA
Do grande amor de um tropeiro
E de um cavalgante ventre,
Entre equinos, gado e entre
Jornadas sem paradeiro,
Ana de Jesus Ribeiro
Nasceu; e um certo retardo
Foi feito para o resguardo.
Pra mãe não ficar sozinha,
A comitiva inteirinha
Parou também no aguardo.
Depois de uns dias passados
De repouso e muito zelo
Reuniram o sinuelo
Com o gado, dos dois lados
Da via. Já encilhados
Os cavalos, mulas cargueiras
Carregadas e pelas beiras
Da sinuosa estrada
Iniciaram a jornada,
Atrasados para as feiras.
Ana de Jesus Ribeiro,
Apelidada de Aninha,
Das veias paternas tinha
Bons dotes de cavaleiro
Herdados do pai boiadeiro,
Visto que desde menina
Foi a criança ladina
Que aprendeu cedo e seria
Melhor que ele em montaria
Por ter bem mais disciplina.
Um dia, em pelo, ao cavalo
Sem sela e só barbicacho,
Aninha enfrentou um macho
Atrevido e, ao surrá-lo
Ele cai dentro de um valo
E quase perde sua vida.
Mas Ana o socorre em lida
Sozinha, essa heroína,
Adolescente menina,
Tornando-se bem conhecida.
Contam que a moça, a trote
Ligeiro, de erguido relho,
Correu atrás do fedelho
Por entender ser preciso
Que ele tomasse juízo.
O moço, em disparada
Zarpou. À margem da estrada
O cavalo tropeçando
Derruba o jovem. Foi quando
Ana o livra da enrascada.
Esse, o primeiro feito
De denodo e valentia
Da rapariga, que iria
Levar-lhe a um conceito
De nobreza por seu jeito
Altruístico e de valor,
Perdoando o pecador
Mas condenando o pecado,
Pelo tratamento dado
A um filho do Criador.
*Por Laerte Tavares
*Em alguns registros, autores destacam a importante participação feminina, mesmo que indiretamente, na Guerra dos Farrapos. Diversas mulheres assumiram os negócios da família enquanto seus maridos e filhos lutavam na guerra. Outras, na maioria índias, anônimas em relação à Anita, acompanharam seus maridos nos campos de batalha. Muitas delas tomavam conta das pontas de gado, da munição, tratavam os feridos e algumas até pegavam em armas na defesa contra o inimigo.
Anita com seu chapéu de feltro
(calabrês) com penacho
Anita, (obra) morte ocorrida em Mandriole, Itália. Instante em que as tropas garibaldinas fugiam das tropas suíças. Acometida por uma crise de febre tifoide, Anita falece em 4 de agosto de 1849, grávida de cinco meses do quinto filho.
Narrativa escrita por Garibaldi, entregueao seu amigo e admirador Alexandre Dumas (pai), que publica no final de 1860.
Letra para o hino em homenagem à heroína - 1915. Material referente ao “Levantamento Bibliográfico, Anita Garibaldi. Pesquisa realizada nos Jornais Catarinenses da Biblioteca Pública de Santa Catarina, disponíveis na Hemeroteca Digital Catarinense e Hemeroteca Digital Brasileira (1889 – 1968).”
Organizado por Helen Moro de Luca
Varais com charque (carne-seca) – Rio Grande do Sul. Fonte: GZH/RS
O charque do Rio Grande do Sul abastecia o mercado interno, mas com os altos tributos sobre o sal, o couro bovino mais o charque (alimento principal dos escravos), gerou a insatisfação entre os estancieiros. As altas
taxas teriam levado os produtores gaúchos a lutar pela independência do estado em relação ao governo central, o que motivou os conflitos. Os farroupilhas almejavam uma República Federativa permitindo
autonomia às leis, para a economia local.
Pergunta que não cala e insistente,
Mas sempre sem razão: Quem foi Anita?
Respondo ser um ente que gravita
À frente do seu tempo – muito à frente!
Exímia em equitação, sóbria e valente
Era a bela donzela e esquisita
Fera indomável e arisca que habita
A selva virgem, solta e independente.
Quando acuada, mostrava quem era.
Punha de fora as garras de pantera
A incendiar o mundo, a leve chama.
E essa indomável peregrina fera
Se fez universal, em atmosfera
De guerra heroica, a heroína dama.
Laerte T.
Lanchão, suspenso sobre rodas atrelado a juntas de
bois – carregado até o rio Tramandaí-RS
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Obra de Rodrigo de Haro pertencente a Sandra, minha esposa
Eis Pierrô a chorar por Colombina. E eis a ilha emocionada e abraçada à serra frígida junto aos elegantes aparados pétreos demonstrando que seus corações não são empedernidos, a prantear aos quatro ventos, em uníssono com a Ilha de Santa Catarina, humilde e reservada chorando pela perda de Rodrigo.
Cartaz / Rodrigo H - Fundação Badesc
Semana passada, perdi um dos últimos amigos de fraternos convívios na pujante e bela juventude, Rodrigo de Haro, um dos maiores artistas brasileiros da arte pictórica e literária, filho do grande pintor Martinho de Haro. Conheci Rodrigo apresentado por Marcos Konder Reis, na década de 1960, num excelente boteco instalado em humilde rancho de canoa à beira da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, quando à mesa rústica, ele compartilhava com Benito Batistotti, um rico madeireiro catarinense, mecenas do cinema novo, que veio a ser, mais tarde, concunhado do irmão de Rodrigo, cujas festas de núpcias, Marcos e eu viemos de Armação do Itapocoróy a Florianópolis à sede do Veleiros da Ilha, para participar do evento com Rodrigo; e não demorando, chegaram outros ilustres amigos. À mesa do boteco no Rio, entre prosas descontraídas, degustamos alguns camarões ao bafo, pescados na hora e preparados em seguida, regados à cerveja gelada, após doses de caipirinha.
Rodrigo e Marcos conviviam cultural e socialmente, na cidade maravilhosa, com as mais ilustres figuras icônicas da arte, àquela época; a exemplo de Vinícius de Moraes, colega de Itamarati do Marcos; Paulo Mendes Campos, escritor que viajara com Marcos em turnê pela Europa; Maria Alice Barroso; Lúcio Cardoso; Murilo Mendes; Otto Lara Resende; Paulo Saraceni, cineasta amante do cinema novo; e outros. Frequentavam também essas figuras, um barzinho de Ipanema, juntos a outras figuras icônicas como, ainda, Vinícius, Leila Dinis, Helô Pinheiro (a garota de Ipanema) e gente ligada à música.
Voltei a encontrar Rodrigo nos fins dos anos sessenta em Florianópolis, onde a família havia fixado residência. No Rio de Janeiro, moravam em casa própria, muito aconchegante no bairro de Laranjeiras e, em Florianópolis, em residência à Rua Altamiro Guimarães. Já formado, de Porto Alegre, passei a residir à Rua Alves de Brito, vizinha à Família De Haro. Foi quando reencontrei Rodrigo, mantendo nossa amizade até seus últimos dias.
Faço homenagem à memória do amigo Rodrigo, em meu estilo literário porque ele era apaixonado pelas décimas do cancioneiro; e em arremedo ao seu estilo em prosa poética na qual ele era exímio.
Rodrigo de Haro - Imag Internet
Despede-se, enlutada, a ilha,
Do seu magistral pincel
Mais ilustre e o mais fiel
Intérprete da maravilha
Do belo insular que brilha
Nas eternizadas telas
Pictóricas nas belas
Paisagens, com brilhos, cores,
OU Máscaras, arcanos, flores
E anímicas formas singelas.
Laerte Tavares
Santa Carina de Alexandria - desenho
Desenho de Rodrigo, sua santa de devoção e nome do nosso Estado. Imagem que tanto ele pintou, cantou, escreveu e produziu um extraordinário livro que levou de presente, junto a uma comitiva do Governo do Estado catarinense, ao Mosteiro de Santa Catarina, no Monte Sinai, Egito. Para Rodrigo um milagre contínuo e perpetuado presente em nosso templo, é que três religiões (Islamismo, Cristianismo e Judaísmo) proprietárias do bem, convivem simultânea e harmonicamente, com seus ritos e liturgias diversas no mesmo local em horários diferentes, frequentados por multidões dos seguidores diversos, em que nos arredores, todos se aglomeram e convivem fraternalmente. É um milagre! – dizia Rodrigo que interagiu com esse povo eclético.
Foto de nosso acervo
Eis que é chegada a hora, o dia, o mês, o ano! E tu, vate imortal em ser humano, findaste-te à Terra, oh mestre! A tua alma poética singrou ao panteão dos deuses, enquanto Deus, no Reino da Glória, recebeu o teu espírito para o descanso eterno. Tua memória irá permanecer por tempo afora ao consumar dos anos de lembranças à tua obra perene. Porém, amigo, vai chegar a hora indefinida do esquecimento. Sabeis agora, oh, imortal de luz tão pura, que quando a luz da barca rompe o cerco e chega com aferro, com garras e com dentes, entre diáfanos nevoeiros, já não há tempo para o desespero; e num efêmero e longo suspiro, a luz de nossa vida é ofuscada e repentinamente tudo é nada para ser tudo em outro plano onde deveis estar. Junto ao Altíssimo, vate, sabemos que vós contemplais nossos pobres espíritos a tentar buscar a luz do sonho, mas até chegar o dia, a hora, o mês e o ano para partir e vos encontrar no plano desse confuso e perfeito universo, espírito de luz. Hoje, canto em verso e prosa mansa, nossos entendimentos, para que sintas, igual à criança que tu foste como ser humano, Rodrigo – em atrevido adulto que optou por ser um pobre artista rico do saber.
Sabeis também, oh vate transcendente, que a vida é, talvez, qual luz de vela que ao leve sopro da brisa mansa e resfolegante apaga ao entrar pela janela da casa antiga do Morro do Assopro, a encimar o belo promontório junto a secular capela de Nossa Senhora da Conceição, na bela Lagoa da Conceição, cantada em versos, a exemplo do hino de Zininho que tu, humano artista, o homenageaste em afresco na Caixa Econômica Federal da Praça XV em Florianópolis.
À partida de Rodrigo, aos prantos, a serra abraçou o mar ao enxugar seus olhos tristes. A terra dos ancestrais de Rodrigo, nascido em país europeu, aos eflúvios hibernais de São Joaquim, gelado, beijou a Ilha do Desterro desse artista.
Os entes, entre querubins, silfos, ninfas, musas, serafins, arcanos, orixás, ao toque de uma trombeta sacra, entoando uma canção bem popular, gravitando, levaram a alma do velho amigo – o bardo augusto, à morada eterna do céu preparada para o justo pecador, redimido pelas graças redentoras.
São Galo (internet)
O nosso pintor partiu no dia de São Galo (Saint Gall), o santo artista da música, falecido em 01 de julho de 554, descendente de família tradicional da corte da França, país onde Rodrigo nasceu. S. Galo era um servo dedicado às cerimônias da Santa Missa, causa que o levou a se especializar nos cânticos sacros. Relatos afirmam que além do talento à música, era dotado de uma excelente voz, capaz de encantar e atrair fiéis para ouvi-lo cantar no coro do convento. Em seus feitos, o mais citado, foi ter salvado a cidade de um incêndio que ameaçava transformar em cinzas as construções locais. Galo teria aplacado as chamas que se apagavam, conforme as suas orações eram entonadas.
Cartaz / Rodrigo - Fundação Badesc
UM HINO A RODRIGO DE HARO
Autor: Laerte Tavares
Os anjos dos céus, contentes,
Recebem o vate Rodrigo,
Na paz de Deus e ao abrigo
Da morada dos bons entes,
Dos justos e dos inocentes,
Cantando glória e louvor
A Deus Pai Nosso Senhor,
Por chegar mais um eleito
Triunfante pelo pleito
Em vida, vivendo o amor.
Rodrigo partiu, mas resta
De sua vida, a obra sua
Tão viva que continua
Florindo em gloriosa festa
Perpetuada, e à testa
De outras obras completas
De pintores, de poetas,
De excelentes muralistas
E de tanto outros artistas
Com baliza em mesmas metas.
Deixaste uma obra enorme,
Sublime e de conteúdo
Denso de beleza em tudo,
Por diversa, a ser conforme
Ao teu ser que à campa dorme,
Mas teu espírito glorioso
Dos céus, sob o eterno gozo
Da Luz do Pai Criador
Reflete o teu grande amor
Aceso e esplendoroso.
ESTRIBILHO:
Cantemos Glórias ao ente
E a monumental obra,
Que nos deixou de presente
Do excesso que, ora, sobra
Da su’alma indulgente.
Rodrigo à hora do nosso café semanal junto ao amigo Pedro Port, grande poeta, quando declamávamos nossos mais recentes versos.
Foto de Marcos Konder Reis
(capa de excelente obra do
confrade Artêmio Zanon)
Foto de Gilberto Gerlach - reprodução/
Rodrigo H - divulgação ND
Foto de Rodrigo com Sandra, em visita
Mosaico de anúncio do filme
GENIALIDADE TOTAL
Última foto que temos do amigo Rodrigo com nossa querida amiga Leila, esposa do artista plástico Idésio Leal que com fidelidade canina acompanharam Rodrigo até o último leito. Junto a foto, que a pedido dele, Leila nos encaminhou.
Com a fotografia, Leila escreveu-nos:
"Hoje reparei que o azul do céu estava intenso; que havia um formato um pouco surrealista nas nuvens, em pleno meio-dia; que os raios de sol entravam pelas janelas do quarto e faziam aqueles desenhos clubistas na parede branca. Sim, era mais uma manhã de inverno, eu e meu querido Rodrigo de Haro contemplando nosso jardim." – Leila Leal.
Fotos ajustadas a esta plataforma de: Leandro Foto
Uma das festas essencialmente comunitária em minha terra natal, Penha, Santa Catarina, acontece há 185 anos. É a Festa do Divino Espírito Santo, evento de tradição portuguesa trazida pelos portugueses que colonizaram a região litorânea.
Coroado o Imperador daquele ano, sorteia-se, entre doze inscritos, o nome do imperador do ano seguinte que, eleito, a partir desse instante começa com as tratativas para os festejos do evento vindouro. Dalí, desencadeia-se o início dos preparativos, com os convites aos festeiros e recebimento das doações do povo em geral, em espécie (dinheiro) e bens materiais ao imperador responsável em promover uma grande festa com comida farta à comunidade e aos convidados de fora. Mais tarde, “visitas da bandeira do Divino” pelo cortejo, até às vésperas da novena do evento principal, aos fiéis convidados como o Trinchante, Alferes, Empregados de Vela, Empregados de Bandeira, Espadins e demais representantes.
Meu avô paterno foi um dos Imperadores e depois meu pai, em 1950. Lembro-me, ainda muito jovem, dos detalhes e preparativos. (Tão jovem eu era, que quando adulto queria saber o que seria Pai do Espadim, que minha família tanto falava e, finalmente, descobri que eram: Pajens e Espadins). Papai, comerciante local, abriu uma conta bancária somente para os depósitos de doações recebidas – crescente a cada dia. Antecipava-se a encomenda de tecidos e acertos com alfaiates e costureiras às confecções de alfaias; encomenda ao artesão de fogos de artifício, dos foguetes para os eventos principais e principalmente à grande queima de fogos da noite de véspera da Festa; contratos com os foliões – músicos responsáveis pelas cantorias; construção de chiqueiros à criação de leitões especiais; doações de novilhas e de cordeiros para engorda que ficavam sob cuidados de vizinhos e parentes. Tudo era às expensas dos fiéis, embora papai despendesse também.
Com a aproximação da data começavam as doações em gêneros alimentícios de consumo oportuno; de criações vivas como patos, marrecos, perus, faisões e outros galináceos, que de tão abundantes foi preciso improvisar um enorme cercado com galinheiros. Quase às vésperas, chegavam produtos como trigo, farinha de mandioca, açúcar, feijão, arroz, macarrão.
Já na semana da festa, formavam-se os mutirões para o corte de palmeiras (palmiteiras) na mata, as quais eram afixadas a ladear as vias do percurso próximo à igreja, onde aconteceria a celebração, e de nossa casa, local em que seria servido o almoço. Nos espaçamentos entre palmeiras, pendiam linhas munidas de bandeirolas multicoloridas a trepidar ao vento, enquanto o pavimento era alcatifado com flores e folhagens em desenhos sugestivos ao evento.
Eram erguidas armações com cobertura de lonas em forma de grandes barracas à proteção de mesas e bancos improvisados sobre estacas cravadas no solo com madeiramento encimando feito assento e tablados a formarem tabuleiros de mesas às refeições. Talheres e louças chegavam por empréstimos da vizinhança. Por fim, no dia, todos se fartavam com as iguarias que se costumava oferecer aos convivas. E por mais um ou dois dias, a comilança permanecia com as sobras e complementos de cocção de suplementares acompanhamentos, a terminar as bebidas. (xarope de groselha, capilé, consertada, refrigerantes, vinhos, cervejas, vinhos frisantes...).
Ao passar do tempo, diversas mudanças operaram-se ao ritual da festa, mas o louvor ao Divino continua, e com o mesmo cortejo que segue ao som da viola tocada pelo mestre folião, (em primeira voz), da rabeca tocada pelo contra voz e do tambor pelo batuqueiro na terceira voz, popularmente alcunhada de tripa.
A fé ao Divino Espírito Santo representado sob o símbolo de uma pomba, conforme o Novo Testamento, mantém-se forte.
“É a fé, é a esperança, é a paz, é o amor. / É assim nossa bandeira, por todo lugar que for. / Essa é a nossa festa, nossa gente já chegou / trazendo a imperatriz e o senhor imperador. / O imperador agradece sua valiosa oferta, / transformando em alimento no dia da grande festa. / Se Deus quiser, o ano que vem, a nossa bandeira volta / com o outro imperador entrando em sua porta”.
Recitado pelo mestre folião da Festa do Divino José Olavo Coelho.
Guião com a Pomba do Divino Espírito Santo que vai à frente do cortejo
Imperador e Imperatriz na 185ª Festa do Divino em Penha
Imperador e Imperatriz com as meninas
Os pães bentos
mini-candeeiro português (popularmente - pomboca, candeia, lamparina) alimentado a óleo de peixe ou a querosene (atualmente). Ele estampa a pombinha com os sete dons do Divino Espírito Santo (em alto-relevo).
mini-candeeiro português (popularmente - pomboca, candeia, lamparina) alimentado a óleo de peixe ou a querosene (atualmente). Ele estampa a pombinha com os sete dons do Divino Espírito Santo (em alto-relevo) aceso
OBRA DE RODRIGO DE HARO PARA O LIVRO "CANOAS VENTOS E MARES" DE LAERTE TAVARES
Na Ilha de Santa Catarina o antigo ilhéu nativo, de origem portuguesa, é de característica notável por seu desprendimento material, perfil bonachão, modos simples e um linguajar peculiar que o distingue, ao falar com entonação rápida e entrecortada num sotaque de origem açoriana e arcaico. Além disso, ele mantém ainda, o secular espírito do pescador artesanal, emérito gozador e otimista. Até pouco tempo, letrados julgavam-no simplório, porém hoje, o Manezinho (figura cada vez mais rara), como é chamado carinhosamente, é indivíduo proeminente e venerado pelos demais habitantes. Assim, todo mundo que chega a terra, quer ser um “Manezinho da Ilha”.
A Prefeitura local estabeleceu um dia do ano comemorativo a essa figura especial, sendo o dia consagrado a ele, o primeiro sábado do mês de junho. Isso, para não esquecermos tal “espécime” que jamais poderá ser extinta ou esquecida. Cabe a nós o dever de preservar a notoriedade do Manezinho, meio às diversas etnias cá estabelecidas.
Junto ao ilhéu, vive também o gaúcho rio-grandense, do sul. Outra figura folclórica, caracterizada por “macho de faca na bota”, feito à imagem do valentão destemido... Consta que um deles, certa vez, quis gozar de um Mané e o “pau pegou”. Em homenagem ao Dia do Manezinho, apresento alguns versos referentes a essa façanha.
Cantiga ao Desafio Entre Manezinho e Gaúcho
Eu sô Mané i nô nego.
Mas não sô burro nem cego
Como tu pensa, istepô!
Não intisica, qu’eu brigo!
Sô amigo dus amigo.
Não caçoe, pur favô!
Pos tu, a modi qui qué
Fazê qui eu sô zé mané...
E mi dexa incanzinado
Pra briga, seu disgramado!
Mas cuaal, tchê?
Você não vê
Que amo o sotaque teu?
Sou gaúcho de respeito!
Eu ademiro o teu jeito
De não falar como eu.
Até já sou manezinho,
Bebo o café com o vizinho
Em lugar do chimarrão
E ando até de pé no chão.
Intão: enche teu pandulho
Di tainha cum dibulho
I a inhapa di cachaça...
I vê si não mi arrenega,
Si não ti dou uma esfrega
Pra ti mostrá minha raça!
Não mi vem cum arremedo.
Di macho, não tenhu medo!
I não mi encazini más,
Qui já tô di pé atrás.
Mas bah, eu ti-ve o a-zar
De assim eu pro-nun-ci-ar
Teu so-ta-que especiall...
Que-ro que sa-i-bas amigo,
Qui me dou tão bem con-ti-go,
Qui, sem querer, fa-lo iguaal.
Eu a-de-miro o teu je-i-to
Por ser um amigo do pe-i-to.
Ti guardo no coração
Como se foste um irmão.
A modi qui, intão, gaúcho,
Adiscurpa! Eu disimbucho
Quandu mi tiram du sério.
I sou um lobo do mar,
Possu insinar-ti a pescar
Como pretendis, gaudério!
Disarrisca o qui ti disse:
Eu fui tanso, foi tolice
Di um Mané arreliado.
Adiscurpa, i obrigado!
Eu que agradeço, meu rei,
Por me desculpar. Nem sei
Te agradecer, guasca macho!
Tu me deixastes sem graça.
Sem tu, de amigo na praça
Fico com cara de tacho.
Porém, agora eu já sei
Que sou amigo do rei
Desta fabulosa ilha
Que tanto me maravilha!
Gosto de te ver na venda,
Deixo em casa minha prenda
E venho beber contigo.
Tu és um amigo que eu gosto.
Não duvido, mas aposto,
Que concordas com que eu digo.
Vamos beber mais um trago
E esquecer de tudo, agora.
Deixa que a cachaça eu pago...
Saúde por vida afora!
***
COMEMORAÇÃO AO DIA DO EXPEDICIONÁRIO
BRASILEIRO NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
Cinco de maio, dia em que celebramos a memória do grande herói brasileiro, o expedicionário que ajudou a conquistar a “liberdade aos países livres” ao preço de seu sangue e das lágrimas de seus familiares. Como olvidá-lo? Não queremos repetir o que é da História desta amada Nação. O expedicionário é um herói consagrado e conhecido pelos adultos que têm o dever de transmitir conhecimentos cívicos às crianças e aos adolescentes. Importante nos lembrar desse valoroso homem e de seus feitos ao serviço da Pátria.
Alguém disse que o brasileiro só iria à guerra no dia em que a cobra fumasse. Símbolo, depois empregado pela Força Expedicionária Brasileira (FEB) – uma cobra fumante. Em meio aos horrores enfrentados na luta, no inverno, ao chegar à cordilheira dos Apeninos, ante as batalhas severas em que mal conseguia dormir, nosso soldado teve de improvisar.
No frio de 20ºC negativos, forrava os pés com jornais velhos sob as meias ao coturno, excelentes isolantes térmicos, o que fez os soldados americanos imitá-lo. O jovem obrigava-se a comer o que lhe fosse oferecido, e por isso, colocaram-lhe o apelido de Avestruz – símbolo desenhado nos tanques de guerra e nos narizes dos aviões caças – um avestruz atirando para todos os lados. (O bullying não funciona para os fortes). Há relatos de que os pilotos brasileiros foram os mais audazes em combate. Exemplo: Durante a tomada do Monte Castelo davam rasantes extremos, radicais e perigosíssimos, conseguindo com precisão, disparar as bombas no colo do inimigo.
O principal objetivo do pracinha brasileiro era vencer a luta e voltar para a sua casa sob a luz da atmosfera brasileira. E conseguiu quando da tomada do Monte Castelo, último bastião dos nazistas. Chegou lá cantando os sambas improvisados. Fez amizades com italianos e até hoje é homenageado na Itália por ter sido o liberatori, ao contrário da sua Pátria que logo ao pisar em solo brasileiro, a FEB já estava extinta.
Posto aqui foto do herói condecorado por atos de bravura, Nilson Vasco Gondin, de família de origem Viking que imigrou aos Açores e de lá para o Brasil. Nilson, nascido em Florianópolis, foi meu chefe quando assumi como engenheiro fiscal da Caixa Econômica Federal. Tive a honra de conhecer muito da história da Segunda Guerra a partir dos relatos de Nilson e de outros expedicionários com quem convivi, como é o caso do Sr. Milton Fonseca e Emanoel Assis, irmão de um tio meu. O que me fez escrever o romance UM SOL DADO À LIBERDADE, narrando fatos históricos e pormenores vivenciados no teatro de guerra quando da participação desses catarinenses até hoje festejados em nosso Estado.
Saíram da Itália aos aplausos do povo, principalmente às enfermeiras brasileiras que tiveram um papel extraordinário na guerra pelo excepcional atendimento. Despediram-se daquele maravilhoso povo cantando a Canção do Expedicionário.
IMAGEM DO SOLDADO BRASILEIRO
NA CAPA DA CANÇÃO DO EXPEDICIONÁRIO
SÍMBOLO DA FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA
SÍMBOLO USADO À OCASIÃO PELA FORÇA AÉREA BRASILEIRA
A TOMADA DO MONTE CASTELO
Meu Brasil, cinco de maio
É Dia do Expedicionário,
Merecedor de um sacrário
De luz, pois igual Sampaio,
Demonstrou não ser lacaio
E deu sua vida à Guerra
Para defender a terra
Desta Nação brasileira,
Tendo por sua bandeira,
O que a brasileira encerra.
Os pracinhas brasileiros
Mostraram brio, destemor,
Moral, paz interior
E altivos, sobranceiros,
Provaram aos estrangeiros
Serem vocacionados
À guerra; como os soldados
Mais combativos no front
E com a tomada de um Monte
Eles foram consagrados.
Famoso o Monte Castelo,
Covil sacro do inimigo
Representando um perigo
Pelo local – "il capello”
Que o diabo, em flagelo,
Usava para assustar
Todo e qualquer militar
Que se arriscasse às subidas,
Porém com perdas de vidas
O Brasil pode o escalar.
O P-47 Thunderbolt era
Famoso avião de caça
Que o brasileiro, com raça,
Usou a “nova pantera”
Fazendo o que não se espera
De um piloto aprendiz
Que desenhou no nariz
Do avião um avestruz,
Para poder fazer jus
Ao que a herói não condiz.
De ações quase suicidas,
Em seus radicais rasantes,
Ele arrasou tudo, antes
Dos infantes, às subidas
Em progressões protegidas
Por fogo da artilharia
Que à retaguarda cobria,
Chegassem para dar cabo
Ao tal chapéu do diabo
Invencível, se dizia.
Estribilho:
E foi à desforra, ao fim
Do fogo inimigo atuar
E a ter que ceder lugar
Ao intrépido clarim
E a nossa bandeira, assim
Ser hasteada no alto
Do Monte, ao último assalto
Que à guerra pôs um fim!
PESCA DE TAINHA NA ILHA DE SANTA CATARINA
Imagem - internet
Imagem - internet
Imagem - acervo
Procissão antes da missa celebrada em rancho de canoa no Campeche abençoando a abertura da temporada da pesca de tainha em 2017
imagem - acervo
A pesca da tainha, atendendo à lei federal brasileira, tem início em 1° de maio. Na Ilha de Santa Catarina é um dos eventos mais importantes à comunidade pesqueira, a comparar-se com a festa da colheita no Continente Europeu. A tainha é um peixe sazonal de dois quilos, em média, que vive em água doce e entra no oceano para a desova aos primeiros frios do ano, quando gelam rios e lagoas e, ao receber a água salgada, purifica as vísceras e a carne à condição do sabor excelente característico.
A partir de julho os peixes retornam às suas origens de nascimento, já com os grãos das ovas fecundados, depositados sob as escamas – antes, terminado o período pesqueiro. A tainha sai pelas barras dos rios ao estuário, em milhares, lotando o litoral da costa sul brasileira, sendo em maior quantidade em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, dada a existência da Lagoa dos Patos de dimensão enorme, seu principal habitat. Alguns peixes vêm também do Uruguai e do estuário do Rio da Prata. A Tainha, além de ser um peixe saborosíssimo, sua ova, divina iguaria, tem comparação ao caviar, defumada ou salgada e seca é a botarga brasileira.
Na nossa ilha, no século dezenove, a partir da colonização açoriana no litoral, o português teve de inventar sua maneira de pescar em maior quantidade essa espécie de cardume, por ser um peixe costeiro de ocorrência também no Mediterrâneo, mas não nas ilhas oceânicas. A partir da pesca feita pelos indígenas em canoas de um só pau, que cercavam o cardume em águas rasas com redes de fios de tucum (confeccionadas de fibras retiradas das folhas de uma determinada palmeira de nome tucum). Uma vez o cardume cercado pela rede, as tainhas eram abatidas à flecha e recolhidas uma a uma ou mesmo pegas à unha (à mão).
Conceberam os açorianos, as redes de arrasto, resistentes o suficiente para serem lançadas das canoas indígenas e puxadas da praia a encalhar na areia. E, por força humana, conseguiam capturar grandes quantidades do produto que chegavam, pelo excesso, à distribuição gratuita aos mais pobres, cuja maioria era indígena, descendente daqueles que os ensinaram a pescar. Eis, pois, a retribuição grata e natural do intruso aos nativos. O relato mais antigo que se tem sobre a pesca da tainha vem do aventureiro alemão Hans Staden (1525-1579) que descreve essa atividade pelos índios carijós no litoral paulista.
Pesquisando História, achei dados interessantes e resolvi compor um poema narrativo sobre a saga dessa pesca pelos açorianos em nossa ilha no século XIX. Poema esse constante do livro “Ilha de Idílios”. É uma narrativa comprida e chata tipo espada sem corte ou fio, que não chega a matar. Por isso vou postar aqui aos mais interessados pelo tema.
Pesca de Tainha na Ilha de Santa Catarina
Em Florianópolis, antes...
Como era de primeiro,
Começava por janeiro
A muitos dos habitantes
De profissão ou amantes
De uma pesca, a de tainha...
E todo o trabalho tinha
Que iniciar no verão
Para a rede de arrastão
Já pronta ao inverno que vinha.
Idílio de sol e mar,
Porém, Ilha do Desterro,
Nome a sugerir o enterro
A quem viesse morar
Neste divino lugar
De nome feio, mas belo,
Singular sem paralelo.
E aqui, seu habitante
Tinha um apelido bastante
Original – o Amarelo.
Quer da roça ou quer do mar,
Todo o povo em seu serviço
Vivenciava bem isso
Com prazer em trabalhar
Em um e noutro lugar,
Fazendo parte da vida
Para ele apetecida.
Não seria um mar de rosas,
Mas lhe eram prazerosas
Tanto uma ou outra lida.
Antes do inverno, a função
Era com o feitio das redes.
Dentro das quatro paredes,
Pois, da própria habitação.
A mulher dava uma mão
À confecção, o que apraz
Quando a noite traz a paz,
Sob a luz do candeeiro
Que fumega e exala um cheiro
De banha de peixe e gás.
Pomboca – uma lamparina
Alimentada a gordura
De peixe, líquida e pura.
Sendo vasilha munida
De banha e uma torcida
Posta em seu interior,
Qual pavio acendedor
De extremidade exposta
Ao exterior, disposta
À queima, a dar o fulgor.
A esposa é a fiandeira
A cochar o fio no fuso,
Ao clarão meio difuso
Da pequenina fogueira
Acesa ao fogão, à beira
Da esteira posta ao chão.
E assim, seguia o serão
Até quase madrugada.
Já no outro dia, a enxada
E o remo seriam o ganha-pão.
Cada família, um tanto
De rede deixava feito
Que servia de proveito
A todos. E esse manto
Virava parte e um quanto
Perfazendo a rede inteira,
Entralhada à maneira
Da lida para arrastão
E posta à embarcação,
Pronta à faina pesqueira.
No inverno, a água do mar
Conserva maior calor
Que a terra. Esse fator
Faz mais rarefeito o ar
Na superfície a esquentar.
A terra um tanto mais fria
Por muito ar denso, o envia
À direção do oceano
Que o recebe forte e insano
Em forma de ventania.
O vento que cai de oeste
Por onde passa regela,
O brutal rapa canela.
A perna que não se veste
É cobaia para o teste
De que lado está ventando.
Se não tem um pano pando,
Sinal que é intenso o ventar.
Tempo que os rios jogam ao mar
Cardumes, de bando em bando.
Estando as lagoas frias
A tainha sente o frio
E tenta fugir do rio.
Com o rapa em ventanias,
Os cursos fluviais são vias
Para ela ir ao mar
Mais ameno. Ao chegar,
Afasta-se milhas da costa,
Menos quente, volta e encosta
Ao raso, em qualquer lugar.
Fica a ilha inteira cheia
Por toda a orla marinha
Com cardumes de tainha
Quase a encalhar na areia,
Desde Armação – da baleia,
Volta à ilha, aos Naufragados.
Vê-se por todos os lados
As canoas lanceando.
A faina só para quando
Vier agosto – por meados...
Lindo é o lanço de tainha
Pelo aceno do vigia,
Vendo na água sombria
Que o magote se avizinha,
Estendendo-se numa linha
Paralela à praia inteira,
Muito próximo à beira
Da areia, à arrebentação.
E eis a vez do patrão
Agir à sua maneira.
Grita com voz abafada
Pelo silêncio exigido
Para aguçar o ouvido
De toda a rapaziada
Que estava sem fazer nada,
Até então. E, agora,
Eis que é chegada a hora
Da companha e seus trabalhos;
E entre elogios e ralhos
Forma o grupo, sem demora.
Logo, arrastam a canoa
Sobre rolos rolando aos vaus,
Que é a esteira de paus
Como se estivesse à toa
Estendida em frente à proa,
Sob os rolos a suportar
A canoa ao ir ao mar.
Às pressas, vão revezando...
Vaus, rolos – só tiram quando
A embarcação flutuar.
Nessa hora, o patrão dá
Ordens para cada um;
E que tripulante algum
Desobedeça-lhe ou vá
Errar algo, porque já
É expulso sem perdão,
Pois não pode haver se não,
Senão tudo é arruinado
E o sujeito sai a nado,
Jogado da embarcação.
O patrão grita: proeiro!
E ele toma o lugar.
Depois retorna a gritar
E embarca o contraproeiro.
Sota! Voga! E o remeiro;
Último a ir é o patrão:
Pula com o remo na mão
Com uma destreza perfeita,
Enquanto tudo se ajeita
Para armar o arrastão.
Cercam o cardume à frente,
No sentido da espia
Para onde o peixe ia
E é travado, de repente,
Quando, imediatamente,
Lançam a rede ao mar
Depois de o voga atirar
À praia a boia e o calão,
Que aos cuidados ficarão
De um homem em certo lugar.
Jogam chumbo e cortiça
E seguem remando apressados
Com peixes aos pulos, cercados,
Os objetos da cobiça.
O patrão, a rede iça
Para não pularem fora.
Logo, com pouca demora,
Retorna todo o cardume,
Mas o espaço se resume
E parte do magote aflora.
Com a tainha cercada,
Então é só tentear,
Tracionando-a devagar.
Toda turma é camarada
A não pensar em mais nada,
Além do próprio quinhão
Do ajudante ao patrão
Daquela faina pesqueira.
E começa a brincadeira
Na maior animação.
E o cerco fecha-se assim,
Feito um rosário de contas
O lanço, tendo suas pontas
No combro sobre o capim.
E o pessoal puxa, em fim,
Os dois cabos, de vagar
Até a rede chegar
À praia; e a arrastam à areia
Que por ter toda ela cheia
Param à beira do mar.
Pouco a pouco a rede vem
Se aproximando da areia
E parecendo mais cheia.
Perto dá de se ver bem
A tainha, em vai e vem,
Nadando contra o tecido
Da rede, muito comprimido,
Onde o peixe é confinado,
Não correndo mais a nado,
Que arrastado é vencido.
E quando a manta encalha,
A tainha pula ao alto
Em desesperado salto,
A transpor-se sobre a tralha.
Para sanar essa falha
Toda a cortiça é erguida,
Fazendo parte da lida
Já programada também,
Pois a dita faina tem
Sua função definida.
Com o lanço bem mais perto
Todo o negrume, distante
Da manta, é um estonteante
Fulgor de prata coberto
Por ondas do mar aberto,
Também argento na cor
De um idêntico fulgor
Entremeado com o escuro
Que de longe era mais puro,
E ali, quase que incolor.
O arrastão forma uma saia
Ou um saco intumescido
Em um estranho tecido
De areia escura da praia
Junto a rede, antes cambraia
Quarada, e muito limpinha.
Mas com a parede de tainha
Espremida à face inteira
Escurece à maneira
Que o cardume se apinha.
E vão canoas por fora
Para levantar a tralha.
Há peixe entalado à malha,
Outro acuado, aflora
E ao tentar ir embora,
Saltando cai na canoa
Que se enche desde a proa
Até a popa altaneira.
E a atividade pesqueira
Continua numa boa.
Em terra, quase encalhado,
O magote está seguro,
Mas sempre aparece um furo
No pano da rede, achado
Pelo fujão que, a nado,
Escapa com a onda vazante.
Porém, encontra distante
Mãos de garotos espertos
Que ao ver os furos abertos
Esperam logo adiante.
Está na regra da lida,
Pegar o peixe fujão.
Ninguém fica sem quinhão,
Ninguém fica sem comida,
Pois gente desconhecida
Que ali passar, vai levar
Para o sustento do lar,
Tainha, graciosamente,
Dada por um componente
Ao ver alguém sem ganhar.
E essa grande fartura
Tem a distribuição
Para qualquer cidadão
Que se alimentar procura,
Pois sua parte assegura
Levando cheio o bornal.
E a noite, todo animal
Como cães, bichos do mato
Terão também o seu trato
Pela fartura, afinal.
Quando a rede chega em terra
Logo levantam a tralha
Da cortiça. O patrão ralha,
Gesticula, aponta e berra.
Ali, a força se encerra
Para o pano não rasgar.
Puxam-no bem de vagar
Tenteando ao mar vazante
Que pode levar avante
Todo peixe, por azar...
Tainhas seguem aos balaios,
Depositadas num monte
Lá em cima, bem defronte
Da rede, feita em lambaios,
Ante menções e ensaios
De retorná-la ao mar
Com o propósito de lavar,
Depois de tirar o peixe,
De forma que não se deixe
As ondas a enterrar.
Com trabalho duro e lento
Igual cortiço de abelha,
Esvazia-se, parelha,
A rede, com o movimento
Preciso. Nesse momento,
Erguem toda a cortiça
E a montanha roliça
Reduz-se, na areia, a nada.
Mais uma vez enrolada,
Novamente ela se ouriça.
Chega a hora do balanço
Para o montante estimado
De tudo, de um e do outro lado:
– Deu vinte mili, esse lanço!
– Deu muito mai, olha o avanço
Daquele tão grandalhão!
– Eu acho quele é, então,
Do tamanho deste monte.
Por mais tainha que eu conte
Não acaba a contação!
Um desce um tanto e outro aumenta
Como uma nova montanha
Em lugar que o mar não banha.
E quanto mais se acrescenta,
Mais aquela cor argenta
Vai ficando esfumaçada.
Depois, já com a cor de nada,
Como se de areia pura
Colore-se toda a mistura
De tainha amontoada.
Quando fica esclarecida
A contagem aproximada,
Começa a rapaziada
Alvoroçar-se em torcida
À pesca ser dividida,
Mas não será ainda, não.
Tem lá fora a embarcação...
Pôr a rede no varal...
Só bem no fim, afinal,
Que é feita a repartição.
Em seguida, sem demora,
O montão é feito em dois:
O dos donos das redes, pois,
E o do pessoal de fora.
Depois dividem na hora,
Por mais uma vez,
Essa porção feita em três:
Para os que deram uma mão;
A parte da tripulação
E a de quem em terra se fez.
Os quatro tantos terão
Outras divisões, de novo,
Em que também ganha o povo.
As dos tripulantes são
Definidas em quinhão
Por função de cada qual.
A uns, o quinhão é igual;
Para outros, diferentes,
Mas todos saem contentes
E isso é o fundamental.
A maioria vai embora
Depois de vender ou dar
Certas tainhas. No lar,
Cada qual se farta, agora,
Com peixe frito na hora
Ou com a ova de tainha,
Uma iguaria fresquinha
E muito deliciosa:
Degustam-na, por oleosa,
Acompanhada à farinha.
A parte mais trabalhosa
Era a dos donos da rede,
Não tendo matado a sede
Com a cachacinha (a tinhosa)
Em dois dedinhos de prosa.
Coisa que faziam à tarde,
Do lado ao tição que arde,
Tendo que o fogo apagar
Antes de o galo cantar
No dia, seu último alarde.
Carros de boi carregados
Levavam cada quinhão
Ao seu dono ou patrão.
Quase por todos os lados
Com a abundância de pescados
Recendia-se o seu cheiro.
Circulava o dinheiro
Para toda aquela gente,
Além do escambo corrente:
Peixe seco – o inverno inteiro.
Resto do arrasto, na praia,
Alimentava o graxaim
E o gambá. Coisas assim,
Como o cação e a arraia
Que a maré levava à raia
Do cômoro, ou mesmo à beira
Do mato, a sujeira
Daquele arrastão do dia.
Sobrava só ninharia
Para a bicharada inteira.
À noite havia um serão
Ao serviço de escalar
O pescado. E, em cada lar,
Faziam um mutirão.
Em enorme caldeirão
Preparavam a caldeirada
E com a lida terminada,
Cansados, iam dormir
A sonhar com o porvir,
Já no fim da madrugada.
O peixe escalado era
Estendido nos varais,
Aos pares proporcionais
Em peso e tamanho – vera
Estética, por mera
Beleza mais singular
Do produto após secar.
Amarrados, dois em dois,
Punham-nos ao sol, depois
Guardavam par sobre par.
A graxa ou banha era
Separada e derretida
Para a pomboca, na lida
Da vindoura primavera.
Tendo o fuso já à espera
De futura obra caseira
Da mulher sobre a esteira
A fiar embiras novas,
Por outros tipos de provas
Cochadas de outra maneira.
O produto empilhado
Ia à venda e ao consumo,
Em porções, a cada rumo,
Dependendo do mercado.
Vendido no atacado
A vários comerciantes
Locais. E para os distantes
Mercados o peixe ia,
Qual rara mercadoria,
Por pombeiros – ambulantes.
Posta ao fogo e derretida,
A graxa torna-se o óleo
Com efeito de petróleo
Para iluminar a lida
De ter a rede tecida
Sob a luz do candeeiro
A desprender o tal cheiro
De banha de peixe e gás,
Quando a noite traz a paz,
Como era de primeiro.
https://silolirico.blogspot.com/2017/05/a-tainha.html
Poema narrativo do livro ILHA DE IDÍLIOS
*
No dia 25 de fevereiro de 2021, tomou posse a nova diretoria da Academia de Letras Catarinense - ACL
A nova Diretoria é integrada pelos acadêmicos Moacir Pereira (Presidente), Maria Tereza Piacentini(Vice-Presidente), Lélia Pereira Nunes(Secretária) e Laerte Tavares(Tesoureiro). O Conselho Fiscal é integrado pelos acadêmicos Celestino Sachet, João Nicolau Carvalho e Pinheiro Neto.
Parte do plano de trabalho da nova diretoria visa:
“Nosso propósito será o de procurar executar o Plano de Gestão apresentado após o processo eleitoral. Recordando:
– Promover os eventos previstos para 2020, comemorativos do Centenário.
– Preenchimento das 5 cadeiras vagas
– Realização das sessões de saudade pendentes
– Reuniões mensais virtuais enquanto durar a pandemia
– Promoção de Debates, Palestras e Encontros literários e culturais, pela Internet
– Executar e participar da programação do bicentenário de Anita Garibaldi
– Estruturar um portal informativo e moderno na rede mundial computadores
– Firmar parcerias para agilizar o programa “Nenhum município sem biblioteca e Nenhuma biblioteca sem autor catarinense” - Escolas – Salomão Ribas
– Dar maior visibilidade aos clássicos da literatura catarinense
– Promover os novos autores de todas as regiões do Estado.
– Maior integração com as demais academias de SC e do Brasil
– Propor parcerias com instituições públicas e privadas para divulgar a literatura
– Editar e promover lançamento de livros de autores de SC, ainda que virtualmente
– Manter comunicação cultural permanente entre acadêmicos pelas ferramentas digitais
– Instituir Prêmios Anuais de Literatura
– Propor projetos de parcerias com TV-Alesc- TV Câmara e outras
– Acordos com instituições corporativas
– Incluir a Academia e os Acadêmicos em eventos nacionais e internacionais-internet
– E, sobretudo, sugerir parcerias com a Acafe para incluir fundações educacionais e universidades do Estado.”
Ah, outubro... Ah, outubro, o matiz rubro em nuança ao meio-tom verniz, na primavera, faz-me mais feliz com a cor da flor-de-lis pelo que a augusta flor me diz simbolizar as letras acadêmicas. E, em incandescente e rutilante brilho, as cores que há nos lírios, nas dálias e nos girassóis ladeiam um caminho ao dia trinta de outubro, data em que a Academia Catarinense de Letras completará cem anos de existência.
Aqui exaro minha exaltação à ACL e a confissão de que, sensibilizado, sinto orgulho pela glória de nossa Academia centenária. Alguns poderão julgar tempo irrisório, ante as idades de outras Arcádias do velho mundo, mas creiam: cem anos à tradição da literatura brasileira é bastante para me comover por tanto regozijo; e quero dividir essa alegria com todo(a)s o(a)s amigo(a)s leitores, sendo eu um dos membros, na Cadeira 16, desse Egrégio Sodalício que me faz honrado e tomado de responsabilidade na produção literária, pelo compromisso que me cabe em fazer jus ao galardão que me foi conferido, na tradição daqueles que nele nos antecederam e se empenharam para passar tão importante legado a que pudéssemos estar a comemorar tão auspiciosa data. Deus seja louvado!
Casa José Boiteux – A soberba Casa José Boiteux, / É um templo erguido à vida acadêmica, / Cuja primeira matéria sistêmica / Foi o comércio. E ora, está à mercê / Das instituições que a lei prevê / Ser de interesse à história, à cultura / E ao mestre Boiteux, que aqui perdura / Como o patrono supremo do ensino / Em belo busto brônzeo de um divino / Feito à imagem da sua figura.
A Academia Catarinense de Letras é um marco histórico na vida cultural de Santa Catarina e brasileira, também, por ser uma das primeiras academias estaduais fundadas depois da Academia Brasileira de Letras constituída nos padrões da Academia Francesa. Porém, a ACL seguindo modelo da ABL, destacou-se por ter sido a primeira Academia de Letras no Brasil com ingresso de mulheres em seus quadros. Inicialmente, duas extraordinárias literatas catarinenses tomaram posse em cadeiras da confraria – sendo as primeiras confreiras brasileiras: Maura de Senna Pereira e Delminda Silveira de Sousa.
Importante dizer que a Academia Catarinense hauriu da convivência cordial entre escritores que se congraçaram para, a partir de um instituto literário, formar a confraria. Instituto que contou com o tino político, jurídico e administrativo de José Boiteux, fundador da ACL que, junto ao professor Othon da Gama D’Éça e outras ilustres personalidades constituíram a centenária ACL no ano de 1920.
Para homenagear a ACL nessa data especial, compus um modesto poema em décimas do cancioneiro ibero-português:
ACADEMIA CATARINENSE DE LETRAS
Autor: Laerte Tavares
Viva a nossa academia
Das letras catarinenses!
Deusa e musa, tu pertences
Ao povo que a ti confia
Às letras, por seres guia
Na criação literária
Esmerada, bela e vária
No contexto universal
Da arte academial
Como Arcádia centenária!
És do teu povo um farol
Que verso e prosa ilumina!
És a estrela matutina
Antes do nascer do Sol.
O teu brilho é sempre em prol
Da nossa literatura
Secular e que perdura
Como arte de nosso povo
Partilhando o texto novo
Com uma geração futura.
Insigne Academia,
És a Santa Catarina
Leme, velame e bolina
Da nau capitânia guia
Que a luz de popa alumia
O mar da literatura
Em esteira e rota segura
Dando brilho ao itinerário
Do destino literário
A um cais que se transfigura.
Dentre as academias
Do Brasil, tu és a antiga!
Tua existência mitiga
Sede do saber, por vias
Dos teus feitos e porfias
De tempos memoriais
Das figuras imortais
Em nossa arte literária.
Icônica expressão lendária
É Cruz e Sousa!... E outras mais!
Academia Catarinense de Letras 100 Anos
https://www.youtube.com/watch?v=kXjz_OiDKCc&feature=emb_logo
https://www.youtube.com/watch?v=kXjz_OiDKCc
Hoje eu quero mandar flores
A todos os meus amores.
À Rainha de Sabá,
À dama de Calcutá,
Para a minha mãe também
Que me vela do além.
À minha mulher amada,
Já a trouxe à luz da alvorada,
A eleita rosa encarnada.
Flores para Gioconda
Que tanto me olha e sonda.
Flores para Salomé,
À Virgem de Nazaré,
Àquela linda menina,
Sheherazade, Messalina...
Flores para a matriarca,
Às súditas e à monarca.
Flores à índia guerreira,
Para a mulher benzedeira.
Flores, flor, flores e flor
Com afeto, com amor
Neste dia da mulher
Que homenagem é mister.
Dia de consagração
Por tamanha devoção
Que devoto ao ser querido.
Mulher faz todo o sentido
Da minha vida e destino.
Mulher é o ente divino
Que tanto me faz sonhar...
A ela um trono ou o altar!
Dedico o poema abaixo aos autores imortais de extraordinárias obras literárias, confrades e confreiras da Academia Catarinense de Letras, que ao longo de suas existências criaram e difundiram a arte literária em suas obras ao amado Estado de Santa Catarina, como luzeiros da literatura de nosso sodalício, farol literário do Estado, que no corrente ano comemora seu centenário – ACL100Anos. A Academia Catarinense, constituída vinte e três anos após a instalação da Academia Brasileira de Letras, é uma das mais antigas do país, sendo a primeira a admitir mulheres em seus quadros. Logo após sua fundação, em 30 de outubro de 1920, foram eleitas e tomaram posse: Maura de Senna Pereira, poetisa, jornalista e escritora e Delminda da Silveira, professora de língua portuguesa e língua francesa, poetisa e escritora. E hoje, a Academia Catarinense tem a honra de contar com três confreiras: Urda Klueger, Lélia Pereira da Silva Nunes e Maria Tereza Piacentini.
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Lembro-me de um ditado antigo que dizia: “Festas findadas, músicos a pé!” Nós, de volta à cidade sede e ao lar, depois das férias findadas. Casa de praia fechada e o reinício das jornadas do dia a dia dos dias dados por dias de “trampo”. Na bagagem o reconforto e um pouco de nostalgia com resquícios de tristeza vendo que tudo tem fim.
De seis irmãos, somos em dois, agora. Antônio, oitentão, depois da morte da esposa, sentido pela perda e arraigado à casa da Praia Alegre, onde eles escolheram, na juventude, para veranear e, na velhice, descansar. Mais que a casa, ora, apegado a uma determinada cadeira em que a esposa descansava sempre, compôs a partir dela, a letra de uma canção popular para homenagear a memória da querida amada, procurando reanimar a alegria da Praia Alegre transformada em triste praia ao seu sentimento.
Para fixar à memória, Antônio afixou um quadrinho, com fotografia da esposa e letra da música sobreposta à imagem, na parede da sala, acima da cadeira posta em que ela repousava e cantava, depois de dedilhar seu teclado eletrônico. Atualmente, em derredor a cadeira, ele canta a reviver momentos, tentando fazer mais feliz a sua viuvez. Fotografei um desses flagrantes e, sensibilizado, compus um poeminha para a minha saudosa cunhada, como se feito por ele.
TERESINHA
Venerável Teresinha,
Com Deus tu estás no céu
E eu sozinho e ao léu
Cumpro ainda a sina minha
Como um inocente réu
Vendo que o fim se avizinha.
Em tua cadeira sozinha,
Sob diáfano véu,
Enxergo toda memória
Da saudosa trajetória
Nossa, meu saudoso amor!
Ela representa a história
Que lá no Reino da Glória
Findaremos, quando eu for!
Autoria da Letra - Antônio Tavares
Na pequena praia de colonização portuguesa Armação do Itapocoróy há santos às devoções diversas. Entre os mais importantes se destacam São Pedro o patrono dos pescadores e São João Batista, padroeiro do lugar. Santo, também muito recorrido às graças, era São Gonçalo do Amarante, santo português tocador de viola que segundo as más-línguas, tomava umas e outras para celebrar a vida.
Entre santos tantos, os festejos de São Sebastião dar-se-ão em janeiro e têm grande evidência dado o ritual, principalmente em relação ao seu mastro sincrético de outra religião, com uma enorme procissão dos fiéis. É interessante a celebração, por obedecer ritos tradicionais dos quais muitos se perderam no tempo. Inclusive o refrão do cântico principal "Minero Dô, Minero Dô!...”, semelhante ao ritmo da congada africana que coroava o rei do Congo ou do Moçambique, bailado guerreiro africano, não se sabendo ao certo a tradução literal que para aproximar religiões pelo sincretismo, veio à festa do santo.
A procissão do mastro, como outras festividades religiosas, conta com seus festeiros – devotos responsáveis principais pelo evento ao respectivo ano. O festeiro ou promesseiro de 2020 a São Sebastião seria meu nobre amigo Carlos Malburg, arquiteto carioca que faleceu no transcurso deste ano de 2019. Ficando seus familiares responsáveis pela organização dos preparativos. Carlos era devoto de São Sebastião padroeiro da cidade do Rio de Janeiro, sua terra natal, também admirador da tradição do mastro trazida pelos portugueses e que se mantém viva em Armação.
Muitos milagres são atribuídos a esse santo aos mais diversos casos de enfermidade humana. São Sebastião também tem referência à proteção dos animais, produzindo curas em rebanhos doentes.
SÃO SEBASTIÃO
Que bom que o falo pagão,
Marco da fertilidade,
Serviu como identidade
A que São Sebastião
Fosse símbolo cristão,
Devido ser amarrado
A um tronco e transpassado
Por flechadas de arqueiros,
Para dar seus derradeiros
Suspiros de infiel soldado.
Ele, soldado romano,
Foi um pagão convertido
E não fazia sentido
Ao imperador soberano
Ver seu herói noutro plano
Que não fosse planos seus.
Porém, os planos de Deus
Eram outros, e o soldado
Depois de preso e flechado
Ainda pregou aos ateus.
Porque foi tido por morto,
Com o corpo todo ferido
Sem exalar um gemido.
Mas, por um caminho torto
Conduziram-no ao conforto
De um lar. E o santo soldado
Com o seu corpo mutilado,
Por obra divina e plano,
Fez o sagrado e o humano
Suplantarem aquele estado.
Curado, saiu pregando
E convertendo pagãos
Para os preceitos cristãos
Ensinados desde quando
Cristo pregou e ao Seu mando,
Dizia o doutrinador.
Estava ali dando o Amor
Trazido por Deus Menino.
Ia levando esse ensino
De Jesus Nosso Senhor.
O imperador, ao saber
De Sebastião estar vivo,
Sentenciou incisivo
Do alto de seu poder,
Que matassem aquele ser
Nefasto ao imperador.
E com cão farejador
Atrás da sua pegada,
Ele foi morto à paulada,
Enquanto pregava o amor.
Na Praia da Armação,
Os devotos fazem a festa
Com um tronco da floresta,
Um mastro, por tradição
Em honra a São Sebastião,
Sob um grande festival,
Expressão tradicional
De festejos a esse santo,
Com versos livres de canto
Ao tambor, tal ao ritual.
Para imitar o soldado,
Os homens põem um casquete
Como um elmo que remete
A estar uniformizado.
Com mais um saiote atado
Sobre a calça o faz conforme
Peça do antigo uniforme
Que o soldado romano
Usava. E sem ser profano,
Faz-se à semelhança enorme.
Do rito, o mais importante
É o enfeite do pau
Colocado em um jirau,
Tendo flores, o bastante,
Que as mulheres, com barbante,
Atam-nas ao mastro e vão
Enfeitando com uma porção
De ramagens e de flores
Cantando versos de amores
Para São Sebastião.
E pedem fecundo amor,
Rogam luzes a dar à luz,
Com batuque que as conduz
À alegria; e ao sabor
Da consertada, um licor
Feito à base de aguardente
E gengibre. O povo crente
Com vontade que sobeja
Conduzem até a igreja
O mastro aos ombros da gente.
Assim com o mastro enfeitado,
É feita a grande puxada
Ao longo da extensa estrada
Em que o tronco é levado
Ao lugar determinado,
Sob aplausos e cantigas.
Rapazes e raparigas
Oferecem consertada,
Broa, bolacha, cocada,
Conforme às festas antigas.
E, ao MINEIRO DÔ, cantando
Chegam à igreja, no local
Para um novo ritual.
Tange o sino em toque brando
Com a cantoria, até quando
O mastro ter sido erguido
Com corda, bambu, gemido,
Grito, palma, aplauso, até
O mastro ficar em pé,
Dando ao rito outro sentido.
Vem reza, vem brincadeira,
Abraço, conversa, canto,
Salva de palmas ao santo
Até hastearem a bandeira
Que, lá no mastro, altaneira
Leva São Sebastião
Mostrando ao povo cristão
Para que de longe veja
Que haverá festa de Igreja
Na Paróquia de Armação.
Dias depois logo vem
A missa e, ao fim, um leilão
De pães de massas que são
Representações que têm
A ver com milagre a alguém.
Há pés, como pés curados,
Braços, corações... são dados
Que apontam ao órgão, à graça.
E os pães levados à praça
Da igreja são arrematados.
O adulto é o menino que ele foi até aos sete anos de idade. À época do Natal, essa constatação aflora-me a alma e inunda o meu espírito da luz dessa verdade. Verdade transposta ao ser como uma tempestade de sentimentos que oscilam em uma vibração senoidal de paz, culpa, regozijo festivo, luz do real, sonho, saudade, solidão, comemorações fraternais e até certa angústia por não poder restabelecer a infantilidade. Isso porque me assedia um certo sentimento de culpa em ter traído aquele antigo menino; ao deixá-lo abandonado ao tempo, enquanto eu percorria sozinho, um caminho anacrônico ou atemporal que me conduzia à maturidade, talvez pequei. Às vezes, sinto vontade de lançar a ele um salva-vidas, atado a uma corda a fim de resgatá-lo da imprecisão daquilo que sonho. Porém um raio de luz, na tempestade cérebro-sentimental, confunde-me e ele estiola no meu pensar a me levar ao devaneio, perdoa-me! Retorno à realidade com o sentimento do amor carente – aquele amor que do espírito emana para amar; e a razão do ser quer recebê-lo por carência afetiva, própria do adulto – a eterna criança.
Entretanto, qual é o mundo do menino que leva este adulto à “brain storm” (chuva de ideias – tempestade cerebral)? Seria o mundo do ritual natalino à época da sua infância, como o mundo dos ternos de reis – tradição portuguesa; o da confecção dos ninhos com barba-de-velho e flores, no qual o bom Velhinho depositava os presentes de Natal às crianças? A tradição dos ninhos se perdeu no tempo, entre toda a gente – um rito, já não praticado, que revive em mim ao reviver a alegria que o Natal traz-me à alma. Em casa fizemos uma réplica de um ninho de Natal, ao nosso filho Arthur, quando criança, para um agrado ao coração da família e uma lição aos dois meninos – filho e pai.
Abaixo: O ninho do Natal – receptáculo dos presentes natalinos às crianças; e um pequeno poema natalino.
Outras publicações natalinas: matéria semelhante
NATAL
Eu sou a criança, aquela
Que fui quando era menino.
Tendo tangente o divino
Na alma augusta e singela.
Em minha mente a procela
Cerebral, tira-me o tino,
Porém, o antigo ensino
Do que é Natal se revela.
E assim, eu sinto o Natal
Do infante sentimental,
Dentro da alma, unicamente,
Como o mais transcendental
Fenômeno espiritual
Que diviniza alma e mente.
EIS O ARTISTA - ÁTILA RAMOS
Átila Ramos junto a pintura de sua autoria.
Este espaço está no momento a guinar em direção à cultura da Ilha d’ídílios, por oportunidade dos ventos favoráveis a tantos interesses nos resgates da nossa rica História. Referi-me ao Rodrigo de Haro e ora, irei me referir a outro grande artista de nossa terra, o engenheiro e historiador ilhéu Átila Alcides Ramos, meu amigo fraterno que, além do mais, é pintor. Átila estuda quatro vertentes específicas da história da Ilha de Santa Catarina – Carnaval, cinema, saneamento básico e sobre a vida marinheira dos habitantes.
No livro CINEMA DE FLORIANÓPOLIS, Átila narra que no dia 28 de dezembro 1895, no Salon des Indiens do Grand Café, no Boulevard des Capucines, em Paris, acontecia a primeira apresentação pública oficial do cinematógrafo. E na Ilha de Santa Catarina, em 21 de julho de 1900, houve a primeira apresentação dessa arte (da internet à caravela há distância...) e, em 1908 é inaugurado o primeiro cine com exibição de Figarot da ópera de Rossini, O Barbeiro de Sevilha. Depois disso, o cinematógrafo tornou-se familiar na Capital Catarinense.
Ora, decorreremos sobre vocação marítima da Ilha e o seu desenvolvimento pela navegação, pois “quem puxa aos seus não degenera” – dizia minha mãe que “nasceu analfabeta” e se alfabetizou. Assim, a ilha dos silvícolas marinheiros que ganhou o reforço dos marujos portugueses não poderia ter destino mais glorioso do que o mar e portos de grandes e famosos navegadores antigos.
Ao empreendedorismo moderno, recebemos o sangue alemão de Brandemburgo, na pessoa de Carl Franz Albert Hoepcke que chegou a Blumenau 1863, e evoluindo comercial e economicamente, estabeleceu-se em Florianópolis onde constituiu um império terrestre e marítimo. Quando o mundo começou a usar a máquina a vapor, nossa ilha também a usava nos navios do senhor Hoepcke que armou uma extraordinária frota de navios mercantes e de passageiros.
Átila reproduziu essas embarcações em acrílico sobre tela e os descreve com maestria, cujas fotografias das obras que os representam, aqui postamos para ilustrar o quanto esta ilha sempre foi pujante.
E para não afastarmos o lado literário, fica também um pequeno poema:
MAR D’IDÍLIOS
Tu que nasceste no mar,
Ó ilha, és marinheira.
Mas lembra: estás à beira
Do continente, o teu lar.
A terra foi teu lugar
De construção – na carreira
Do estaleiro, à maneira
Destinada a navegar.
E sendo de almas iguais
Teus povos; com ideais
Afins à navegação,
Silvícolas e portugueses
Fizeram o mar, muitas vezes,
De pátria, pois dele são.
Acesso: https://silolirico.blogspot.com/2019/11/atila-alcides-ramos-o-artista.html#comment-form
ÁTILA RAMOS - NAVIO MAX - EM LAGUNA / SANTA CATARINA
Imagem internet
PROVA DE VIDA
Recebo uma pequena importância numerária da previdência social pública, tendo ela por lei, descontado de meus salários quando em atividade numa empresa pública que me contratou como engenheiro logo que me formei - não cabendo a ela recolher menos que certo percentual sobre o valor de vinte salários mínimos vigentes à época. O tempo passou, as coisas mudaram e recebo muitíssimo menos do que a promessa com base em vinte salários. Mas no segundo ano decorrido de minha aposentadoria houve uns meses que não me pagaram. Procurei saber o porquê e fui informado que eu não havia feito a PROVA DE VIDA e, portanto, me cortaram. Pensei: deram-me por morto. Preenchi formulário, dois meses depois vieram os atrasados e aprendi a lição: todos os anos tenho que dar prova de estar vivo. E para não deixar passar o prazo, recomendaram-me que o fizesse no mês de meu aniversário.
Como sou leonino, acabei de chegar da instituição financeira que me paga, após provar que estou vivo. Lembrei: tenho um poema sobre o incerto, a incerteza, a inexorabilidade do tempo ou o fim da corrente de um rio que ante o mar se apavora. Vou postar isso na minha página e o faço, pois:
VELHICE
Autor: Laerte Tavares
Lembro que um dia alguém disse,
Sendo eu ainda menino
Ingênuo e com pouco tino,
Que era uma “eme”, a velhice.
Hoje, eu velho, a rabugice
Faz-me ver bem ao contrário.
Velhice é o sedentário
Estágio do rio corrente
Que somos e quando, à frente,
Forma um grande estuário.
O mar para o rio é a morte,
Mas o estuário é a largura
Maior de sua estrutura
A dar-lhe um enorme porte
Espraiado, intenso e forte,
No estágio em que teme o mar.
E assim, dá de comparar
O rio com a vida da gente:
Estuamos de repente
Vendo o fim se aproximar.
Então, o homem maduro
Torna-se equilibrado
Por ter um enorme passado,
Um presente mais seguro
E um insondável futuro
Que dá medo do porvir,
Fazendo-o refletir
Diante de um fim incerto
Comparado ao mar aberto
Prenunciando o engolir.
Sou velho, mas bem vivido
E preso a profundos laços.
Eu me extravaso em abraços
Dando à vida mais sentido
A mim e ao ente querido
Que eu abrace com calor
Por qualquer razão que for.
Isso faz a criatura
Sentir na alma mais ternura
E no coração mais amor.
Quando eu for lançado ao mar,
Daí sim: será a “eme”!
Não sei se ainda terei leme,
Bússola, sonda ou sonar;
Âncora para ancorar;
Nem se sextante e timão
Em minhas mãos estarão
Ou singrarei à deriva
Em embarcação primitiva
Sem remo e sem guarnição.
Ao mar? Só depois de morto.
Onde eu me farei às velas?
Em águas calmas, procelas?
Singrarei em rumo torto?
Chegarei em algum porto?
Encontrarei a concórdia
Ou abalroarei à mixórdia?
Só sei que o cais de atracada
Será um cais onde há o nada
Ou o cais da misericórdia!
Na vida há rumo, há um norte!
Porém, eu depois de morto
Não saberei em que porto
A minha nau de transporte
Levar-me-á pós a morte.
Por isso, em vida eu bem vivo.
Velho, mas tenho motivo
Para viver bem feliz:
Achei o amor que me quis
E o amor é o meu lenitivo.
Quase finda a safra da tainha do corrente ano no litoral de Santa Catarina, a cobiçada ova desse peixe, em que a escassez elevou o preço aos mais altos níveis do patamar costumeiro, dá os últimos estertores de ocorrência. Nosso caviar brasileiro é apreciadíssimo, sobretudo em forma de botarga – processo quando a ova é tratada. Instante em que se retira o sangue para então salgá-la e desidratá-la em estufa e assim ser levada ao sol por até um mês, ficando própria ao consumo. Depois de pronta, é iguaria sem-par aos paladares refinados, principalmente na Itália, país de grande demanda importadora do nosso produto.
A técnica de preparo de ovas secas tem origem no Egito, há mais de três mil e quinhentos anos. Partindo de pescadores artesanais, a ova é consumida preferencialmente frita acompanhada da farinha de mandioca. Como petisco, costuma-se degustá-la apenas frita, bebendo uma “loira gelada” (cerveja) ou vinho.
Na cidade de Florianópolis foi fundada em 1857, pelo Imperador Dom Pedro II, a Escola de Aprendizes-Marinheiros de Santa Catarina, na qual preparam jovens, em regime de internato, para o serviço à nação.
Em certa época, seu João um grande marinheiro, depois de aposentado, optou pela profissão de motorista de taxi. Na função, após conhecer o mundo viajando em navios nos quais serviu à Marinha do Brasil, queria conhecer melhor sua cidade natal, externava ele. Era um homem falante e contador das histórias vivenciadas. Cativante na fala mansa, pausada e comedida de um velho marujo cauteloso que não embarcaria em escaler furado.
Como engenheiro fiscal da Agência Caixa Econômica Federal, tive a oportunidade de ter os serviços de seu João a serviço de minha função, por ocasião em que a Caixa o contratou para traslados em minhas vistorias de imóveis sob hipoteca daquela entidade financeira... Ouvi muitas histórias, mas uma, a da ova de tainha, eu deixo aos “experts da área” para que avaliem a veracidade. Reforço que João não foi pescador, e sim marinheiro.
Contou-me ele, que seu navio atracou em porto determinado onde a safra da tainha estava no auge da fartura. Houve um convite aos oficiais do comando da nave para a festa local em que a ova de tainha com cerveja não tinha restrição à demanda gratuita. João juntou-se aos convidados a serviço de um oficial, mas com direito apenas a comida, degustando algumas ovas e postas de tainhas fritas e o peixe na brasa. Os festejos estenderam-se das onze da manhã até ao cair da tarde, com ele sóbrio e a maioria levemente alterada pelo trago etílico.
Segundo João, ficou na memória o maior dos fatos que aconteceu com um jovem tenente de origem nordestina do Brasil, que se encantou pela ova frita. Não parava de repetir o acepipe saboroso. A ova oleosa, embora se pareça seca à deglutição... Ao fim da tarde, observaram no traseiro da farda branca do tenente, conforme suas idas e vindas ao banheiro para descarregar a destilação do líquido, uma enorme mancha amarela oriunda do óleo de peixe escorrido do intestino do eufórico glutão, sem que ele notasse o escapamento espontâneo. Os colegas tiveram de arranjar uma calça limpa ao desavisado e obrigá-lo a forçar a evacuação da excedente matéria, ao que confessou a vítima, após o procedimento, ter sido o produto resultante – puro óleo.
FUNDAÇÃO CATARINENSE DE CULTURA:
Entrega de medalhas de comenda do Ex-governador Antônio Carlos Konder Reis à diretora do Museu Cruz e Souza, representada por sua diretora Zilene Cardoso e a primeira dama do Estado de Santa Catarina Késia Martins da Silva. A entrega foi efetivada por Laerte Sílvio Tavares representando a Academia Catarinense de Letras da qual o Ex-governador era membro e por Alexandre Fleischmann, primo do Ex-governador.
A FCC deu a seguinte nota:
“MHSC RECEBE OBJETOS HISTÓRICOS DE EX-GOVERNADOR CATARINENSE
Publicado: 02 Agosto 2019
O Museu Histórico de Santa Catarina (MHSC), sediado no Plácio Cruz e Sousa, recebeu na tarde desta sexta-feira, 02, um acervo pertencente ao ex-governador do Estado, Antônio Carlos Konder Reis. São aproximadamente 40 peças, entre medalhas, diplomas e fotografias.
O governador Konder Reis foi o idealizador da criação de um museu para salvaguardar a memória catarinense há 40 anos, ação que deu origem ao MHSC.
Durante a entrega dos materiais estiverem presentes a primeira-dama do Estado, Késia Martins da Silva, e familiares do ex-governador, além de representante da Academia Catarinense de Letras e servidores do MHSC.
Conforme a administração do museu, ainda em 2019 será aberta uma exposição sobre a história de Santa Catarina, que colocará em evidência o material recebido nesta tarde.”
http://cultura.sc.gov.br/noticias/1421-noticias-museu-historico-de-sc/21985-mhsc-recebe-objetos-historicos-de-ex-governador-catarinense
Homenagem, em especial, às famílias Moreschi, Marafon, Grison, Bonatto, Lazzaretti, Martini, Garbin, Moser e outras tantas que desbravaram este misterioso e amado território para construir Pátria nova, que nasceu sob a Cruz de Cristo - Terra de Santa Cruz – Brasil de todas as irmandades.
IMAGEM - PÁGINA MORESCHI'S CLUB
Moreschi's Club
Grupo Público
653 membros
Dia 21 de fevereiro, comemoração ao "Dia do Imigrante Italiano"
SAGA DO IMIGRANTE
Europa, mil e oitocentos...
Com seus países em crises
Enormes e com matizes
Trevosos nos firmamentos,
Países, em passos lentos,
Caminhavam para um fundo
De abismo imenso e profundo!
E a Itália viu o seu povo
Clamar pelo mundo novo
Ao rumo do Novo Mundo!
Antecipou-se Verona
De gente audaz e aguerrida
Para buscar nova vida
Sob o amparo de Madona
Mãe de Deus, na virgem zona
Da América. E Portugal
Oferecia um local,
De habitante carente,
O Brasil, a essa gente
Que buscava isso, afinal!
Assim, fez-se um contingente
De famílias veronesas
Como a MORESCHI, de acesas
Almas, razão, fé e mente
Que, de início, já se sente
Apta para enfrentar
Os mistérios do além-mar
Descritos em brutais sagas,
Para ganhar novas plagas
Nesse sonhado lugar!
A América! E ela fez-se em porto
Na manhã de céu azul,
Já no Rio Grande do Sul.
Do mar, ainda absorto,
O povo teve o conforto
Da paz, mas logo inicia
Uma nova romaria
Sob cantares de aves
Exóticas e, em Alfredo Chaves,
Funda a sua freguesia!
Quase há um século e meio...
Hoje a família se enlaça,
E unida agradece a graça
Alcançada por quem veio
Não com a vida a passeio,
E sim ao serviço duro
Sonhando um melhor futuro
No esperado porvir
Aos descendentes a vir;
E brinda o amor terno e puro!
Ora, em Fagundes Varela
(Certo poeta andarilho
Que deu nome, sem ser filho,
À Alfredo Chaves), tão bela
Cidade a qual chancela
Festa a um clã italiano
Que atravessou o oceano,
Lutou e formou um povo
A dar para o “Mundo Novo”
Novo brilho ao ser humano!
*Poema narrativo: Laerte Tavares
*imagens Uerj (públ.)
*Trecho do poema de Laerte Tavares
Há cento e quarenta e três anos os primeiros italianos se espalhavam pelo Brasil. Pessoas com ideais de encontrar na América melhores condições para se viver. Embarcavam, na terceira classe, em navios a vela para singrar o Atlântico, percurso que levava até sessenta dias a se completar. Mais tarde, com os navios a vapor o tempo foi reduzido quase pela metade, o que não tornara a saga menos cruel.
Aos poucos, muitos filhos da Itália a deixavam para trás, principalmente, pela crise de trabalho. Alcançar a terra de promessas e oportunidades, chamada Brasil, era o propósito. Em mesmo fluxo, pelo porto de Gênova, cidade de grandes navegadores e de seu filho Cristóvão Colombo, hoje capital europeia da cultura, no ano de 1888 seguiram ao mesmo destino as famílias Moreschi. Adultos e crianças esperançosos, rumo ao desconhecido... Após incansáveis trajetos percorridos, alcançam lugarejo e se instalam, iniciando “vida nova”, adaptando-se aos espaços, mantendo e cultivando seus costumes e cultura, movendo-se conforme as oportunidades e necessidades.
E, meio aos laços que aos poucos se interligam por entre diferentes lugares, descobre-se histórias que nos remete às lembranças. Não qualquer lembrança! mas lembranças de seres especiais, resultado do que nos foi proporcionado por eles a ser dado continuidade.
**Alfredo Chaves Veranópolis - https://silolirico.blogspot.com/2018/11/a-saga-do-imigrante-ao-brasil-do-sec-xix.html
Vapor que transportou os italianos a cantar "América" - um ramalhete de flores