Orientações para a escrita de um artigo
Prof. Me. Luiz Antônio Lopes Mesquita
17/08/2018
Prof. Me. Luiz Antônio Lopes Mesquita
17/08/2018
O ato da escrita de um artigo envolve uma comunicação do autor para outras pessoas com o propósito de alimentar o conhecimento delas. Quando um leitor entra em contato com seu artigo, há uma grande chance do mesmo desistir da sua leitura após algumas linhas ou parágrafos. Podemos considerar que seu texto precisa ser atraente e manter o leitor interessado a cada mudança de frase, parágrafo, seção ou capítulo. Mas como?
Imagine-se na posição de um leitor. Suponha que ele não te conhece, que ele tenha pouco tempo, que ele não tenha necessidade de se alimentar do seu artigo e, até mesmo, que ele tenha muitas outras opções além do seu artigo! Se ele chegou a iniciar a leitura do seu texto, considere-se um "sortudo"! Agora é sua vez de não deixar esse leitor escapar. Mas o que faria um leitor perder o apetite de continuar lendo seu artigo?
Imagine que você entrou em um recinto qualquer para se alimentar, escolheu algo para comer e, ao levar à boca, percebe um fio de cabelo. Independente da sua fome ou do quão saboroso seria comer aquilo, você larga imediatamente aquela comida e vai embora daquele lugar. Pois um bom leitor faz o mesmo ao se deparar, por exemplo, com um erro ortográfico ou de pontuação. Não importa o qual apetitoso seja seu texto, o leitor sente uma vontade enorme de parar imediatamente de ler. Alguns são perseverantes e deixam pra lá os erros. Mas será que continuarão até o final?
Sim, um leitor continua até o final quando o autor acredita mesmo naquilo que está dizendo, primeiramente. Você pode escrever um artigo sobre qualquer assunto no mundo, basta pesquisar e compilar as informações como um jornalista faria. Porém, seu texto seria mais um dentre outros tantos naquele assunto. Então agora é hora de se perguntar: existe algo que eu possa escrever melhor do que ninguém? Sim, sempre existe!
Certa vez um pescador me contou que no vilarejo dele, lá pela década de 1960, começaram a aparecer os primeiros turistas. Os moradores então tentaram agradar os visitantes fazendo os pratos mais "requintados" que eles sabiam: galinha. Sim, a galinha ali naquela região litorânea era rara. Mas como eram os primeiros visitantes do vilarejo, os nativos de lá não pouparam esforços para sacrificar algumas das poucas que tinham. Os turistas então, após comerem, agradeceram e perguntaram: "amanhã gostaríamos de comer algo especial. Vocês teriam peixe?"
Se você é um pescador, fale sobre peixe! Observe em você, no seu cotidiano, no quê é óbvio ao seu redor! Será que não tem ali algo para servir de bandeja que, para o leitor, não seria especial? Será que muitos viram a mesma coisa, mas não colocaram um olhar como o seu? Ou sequer escreveram sobre? Pois bem, sempre existe algo que você pode dizer com propriedade. No meu caso, sou pesquisador e oriento projetos de pesquisa...
Com certa propriedade posso dizer então que, orientando projetos há dez anos no ensino superior, pude observar a grande barreira sendo transposta por vários alunos: eles passavam de "consumidores" para "produtores" de conhecimento. A primeira grande questão era: "o que vou pesquisar?" Essa dúvida nasce naturalmente da condição de um aluno em busca da aprovação e conclusão de um curso, tendo o trabalho como condição para isso. Mas seria só isso: ser aprovado?
A inabilidade em produzir textos e, ainda mais, científicos, causam uma estranheza e insegurança em quase todos alunos. A situação ainda é agravada pela imposição do tempo, que pode chegar a ser somente um semestre letivo. Dentre várias técnicas de orientação, compartilho algumas:
Chega o momento final de apresentar a escrita. Voltamos então a nos colocar na posição do leitor. Para isso deixo algumas observações recorrentes que fiz ao comentar dezenas de trabalhos durante minhas orientações. Espero que eu contribua no conhecimento de produzir conhecimento. E obrigado por relevar os possíveis erros aqui presentes e ter chegado até esse ponto da sua leitura.
Introdução - Uma introdução deve trazer o leitor de um espaço e tempo amplo para um espaço e tempo específico relativo estritamente à sua pesquisa. Use técnicas como a espacial ou a temporal. Na espacial você faz menções a ambientes muito mais amplos e vai fazendo um recorte até o seu ambiente de pesquisa (ex.: fale do mundo, depois do país, do estado, da cidade, do bairro até chegar ao local específico). No tempo você pode adotar uma linha histórica de como era antes até chegar ao momento da sua pesquisa (ex.: fale da primeira vez a X anos atrás e venha falando posteriormente a isso até chegar ao ano atual). Evite introduções que usem lugares comuns de opiniões ou seus próprios pensamentos exclusivamente. Fatos, dados, informações objetivas são muito mais atraentes para o leitor continuar lendo seu texto do que divagações. As divagações devem ser movidas para a conclusão. Sua introdução deve caminhar para a próxima seção, a justificativa, ou conter a mesma claramente.
Justificativa - Uma justificativa deve convencer o leitor da importância da sua pesquisa. Imagine que você e outros pesquisadores vão concorrer a uma verba de pesquisa. Quais os motivos você acredita que um avaliador iria dar importância para escolher a sua pesquisa? Onde sua pesquisa seria importante? Para quem? Quando? Se alguém falasse que ela é "irrelevante", como você justificaria o contrário?
Objetivos - Aqui de fato começa o corpo da sua pesquisa. Seus objetivos devem estar ligados diretamente e fortemente com as análises de resultados ao final do seu trabalho, onde você apresentará como os objetivos foram atingidos, que respostas encontrou. Caso não tenha encontrado respostas, apresente os fatores que impediram isso e quais as possíveis formas de uma nova pesquisa conseguir atingir os resultados. O objetivo principal deve estar ligado diretamente ao seu problema de pesquisa. Os objetivos secundários devem responder perguntas que ajudam a responder sua perguntar principal, ou então os objetivos secundários devem ser possíveis de serem respondidos com os mesmos dados que coletados para responder a pergunta principal.
Referencial Teórico - Pense que para atender aos seus objetivos você não está sozinho no mundo, ou seja, que tem outras pessoas pesquisando na mesma área. O que elas já falaram a respeito? Eleja cada um dos conhecimentos principais da sua pesquisa e apresente o que outros autores, como você, já falaram a respeito. O referencial teórico é importante para que o leitor saiba exatamente o significado de cada temática que pertence aos alicerces da sua pesquisa. Pense que você e o leitor podem saber sobre um mesmo tema, mas cada um de vocês usa um significado (entendimento) diferente. Logo é importante que você deixe claro quais as definições você está usando para cada tema que você está tratando. Divida em grandes áreas (2 a 5) e em cada dela fale de coisas/conceitos específicos (definições, tecnologias, ferramentas). Mesmo ao seguir adiante na análise de resultados ao final do trabalho, você pode perceber que precisa saber melhor sobre um tema que não tinha escrito aqui ainda. Vale então adicionar assim mesmo voltando à escrita do referencial teórico.
Metodologia - Sua pesquisa deve apresentar claramente como você chegou aos seus resultados. Pense que outro pesquisador queira repetir o mesmo que você fez para ver se vai encontrar os mesmos resultados, ou então para ver quais resultados ele irá encontrar coletando outros dados. Apresente os detalhes suficientes para um pesquisador que é conhecedor do que você apresentou no referencial teórico. Não apresente conceitos ou definições teóricas aqui. Apresente como foi o processo para a coleta e análise para se chegar aos resultados. Imagine que um leitor conteste seus resultados! Imagine que ele tenha um grande interesse que um determinado resultado tenha sido pior ou melhor! Logo sua metodologia deve ser clara o suficiente para que seus resultados sejam justificados. Cada escolha deve ser justificada, pois elas influenciam nos resultados obtidos!
Resultados - Os resultados devem ser apresentados detalhadamente. O que foi maior, menor, melhor, pior, a maioria, a minoria, a média, a mediana (procure a diferença da média)? Quais os principais fatores influenciaram em cada um dos principais resultados? Que resultados eram esperados e aconteceram? Que resultados inesperados aconteceram? Se for possível, tente sintetizar em elementos não somente textuais os seus resultados (como gráficos, tabelas, infográficos). Ao apresentar tabelas e gráficos, apresente (anteriormente ou posteriormente) um texto explicando as principais informações que eles possuem. Evite apresentar um gráfico/tabela seguido do outro sem uma explicação, intercale textos e objetos não exclusivamente textuais.
Conclusões - Apresente novamente quais foram os objetivos da sua pesquisa e as conclusões que foram possíveis chegar (pense que alguns leitores podem ler somente esta parte da sua pesquisa, logo não se preocupe em ser repetitivo mostrando os objetivos novamente). Agora sim, apresente as suas reflexões, o quê você acha, suas divagações, o que poderia ter sido diferente, o que poderá ser diferente no caso de outras pesquisas com base nessa serem feitas, que trabalhos futuros você espera!
Bibliografia - Muitos leitores podem ir direto para a sua bibliografia para saber que tipo de pesquisa é a sua. Se sua pesquisa for publicada, alguns sistemas eletrônicos irão conectar automaticamente a sua pesquisa com as fontes que você colocou na bibliografia. Logo é muito importante que ela esteja de acordo com as normas da ABNT (no caso do Brasil), pois assim esses sistemas conseguirão fazer essas conexões da sua pesquisa com outras de forma automática. Isso facilita muito que outros pesquisadores consigam achar sua pesquisa em mecanismos de busca e ela não fique perdida sem que ninguém/nada a leia nunca mais! Quanto mais fontes conhecidas sua pesquisa usar, mais fortemente ela poderá estar conectada com futuras pesquisas.
Pronomes - Evite usar "eu acho" ou "nós achamos". Use estruturas do tipo "essa pesquisa considera".
Tempo Verbal - Usar no passado quando se tratar de pesquisa já concluída. Usar no futuro quando se tratar de ações a serem ainda realizadas (sobretudo em projetos de pesquisa). Quando começar a escrever os resultados, revise todo o texto e mude do futuro para o passado/presente.
Pontuação - Não use vírgula separando sujeito do verbo.
Precisão - Evite usar "vários", "alguns", "de vez em quando", "muitos", "poucos"; quando no lugar dessas expressões podem haver dados ou informações mais precisas. O leitor pode entender que você não pesquisou o suficiente para apresentar valores que comprovem o que você está falando.
Extremos - Use "sempre", "nunca", "todo", "nenhum" quando for inquestionável ou quando você estiver se referindo a uma informação para a qual você possui uma fonte que está citando. Apresente expressões que ao menos demonstrem uma escala: "a quase totalidade" (90% a 99%), "a maioria" (acima de 50%), "uma parte significante", "uma quantidade expressiva", "uma parte pouco significante", "uma quantidade pouco expressiva".
Ortografia - Não confie somente no Word! Ele não sabe diferenciar analise de análise, esta de está, tráfego de trafego. Sua pesquisa pode ser muitíssimo interessante, mas quando o leitor percebe um erro básico de português, seu texto perde credibilidade como um todo. Alguns leitores irão imaginar que você não tem capacidade de dizer algo importante para eles pois nem mesmo sabe escrever as letras e acentos corretos.
Gramática - As concordâncias verbais são erros também muito notados pelos leitores. "Nós vai" e "a gente vamos" são clássicos para exemplificar como concordâncias muito pesadas. Mas pense que existem outros erros de concordâncias que para você possa parecer leve, mas que para outro leitor possa parecer pesada também. Logo, peça outra pessoa mais atenta para ler seu texto e dizer se achou erros.
Coesão - O leitor não vai ler letras e números somente, ele vai ler ideias. Enquanto ele lê, irão aparecer na cabeça dele perguntas. Tente se colocar no lugar de uma pessoa que não sabe o que você sabe sobre seu texto. Você gostaria de estar lendo sobre uma ideia curiosa e ela subitamente terminar, sem concluir, e já pular pra outra menos interessante? Você não se sentiria esperto se ao pular para um próximo parágrafo já soubesse do que ela iria falar? Então pense que pode ser mais interessante para o leitor que sempre ao mudar de parágrafo e sua ideia principal dele tenha concluído. Pense que você manterá a atenção dele se você, antes de terminar o parágrafo, já der uma dica do assunto do próximo parágrafo.
Coerência - A escrita de um texto leva muitíssimo mais tempo que a leitura. Quando escrevemos em momentos muito diferentes, até mesmo com poucas horas ou minutos de diferença, já não temos na memória tudo aquilo que dissemos. Algumas vezes escrevemos sobre coisas que ainda não amadurecemos a ideia ou conhecimento adquirido. É muito comum os seguintes erros de coerência: apresentamos no início uma expectativa que iremos apresentar uma ideia mais adiante e por fim não apresentamos; escrevemos uma ideia em uma parte que cria uma contradição com outra ideia em outra parte; apresentamos uma ideia que exige um conhecimento prévio que não escrevemos antes e está somente na cabeça da gente.
Citação - Um texto de pesquisa deve estar conectado com outras fontes. Essas fontes podem ser artigos científicos, livros, sites, etc. É de suma importância que todas as fontes citadas apareçam na bibliografia, pois assim o leitor poderá localizá-la, caso queira se aprofundar mais na ideia que você citou dessa fonte. O leitor deve ter claro que uma determinada ideia não pertence à sua pesquisa, mas sim a uma determinada fonte. O leitor não precisa de detalhes do nome completo do livro ou do artigo ou de todos os autores enquanto ele está lendo. Ele pode buscar isso ao final do texto, na bibliografia, quando ele quiser. Deixe o leitor concentrar na ideia que você está falando, não nos detalhes bibliográficos. As citações literais (aquelas que são retiradas integralmente da fonte sem mudar nenhuma palavra) devem vir delimitadas por aspas. Elas são importantes quando se trata de uma ideia que, se você apresentar com outras palavras, podem gerar questionamentos de que você não interpretou corretamente o que sua fonte escreveu, ou que você queira apresentar sua interpretação em relação a ela. Use sempre, seja na citação literal ou não, o identificador da referência, por exemplo: "Mesquita (2014) afirma que" ou "Recordar é viver (MESQUITA, 2014). Note que há uma diferença entre Mesquita e MESQUITA (caixa alta). Existem muito mais regras além dessa, como o uso do et al, do apud, etc.
Propriedade intelectual - Caso sua pesquisa apresente uma ideia de outra fonte, e não mencione isso, o leitor pode entender que a ideia é sua. Já pensou se esse leitor é o próprio autor da ideia? Por outro lado, você gostaria se alguém escrevesse uma ideia sua como se fosse dele? Se isso ocorrer, legalmente, você pode acusá-lo de plágio. Por outro lado, novamente, você gostaria de ser acusado disso? Se você ficar inseguro se seu texto pode ter equivalências, por coincidência, com outros textos, você pode recorrer a softwares para detecção automática de plágio.