Uma defesa da historiografia inferencialista da Filosofia: comprometimentos, incompatibilidades e direitos
Gabriel Ferreira
Mesmo se negarmos qualquer tipo de excepcionalismo à filosofia como empreendimento intelectual - como é o caso paradigmático de Timothy Williamson (2007) -, parece fácil conceder que, ao menos no que diz respeito às relações para com sua própria história, a filosofia é diferente de outros campos do saber - veja-se o mesmo Williamson (2018). No entanto, questões relativas ao escopo, papel e validade da história da filosofia para a atividade filosófica são tão antigas quanto a própria filosofia. Sob um ponto de vista mais recente, tal conjunto de problemas foi parte integrante do assim chamado "parting of ways" (FRIEDMAN 2000) entre as correntes Analítica e Hermenêutico-fenomenológica durante o século XX. Contudo, é possível dizer que, ao menos desde a segunda metade do século passado temos visto uma importante inflexão acerca do lugar e da importância da história da filosofia na filosofia contemporânea. Primeiramente, mesmo a filosofia analítica passou por um "historical turn" (RECK, 2013), enfatizando a relevância filosófica do entendimento tanto de sua própria história, quanto das possíveis conexões com a história da filosofia amplamente compreendida, tendo nas obras de Strawson (1966), Sellars (1975) e, mais recentemente Robert Brandom (2002; 2019) bons exemplos de tal movimento. Ao mesmo tempo, o interesse recentemente renovado por questões de metafilosofia trouxeram à superfície, uma vez mais, os debates acerca de como devemos nos aproximar da história da filosofia de um modo que seja filosoficamente relevante. Exemplo desse segundo movimento é o debate entre os assim chamados apropriacionistas e os contextualistas (veja-se, por exemplo, MERCER 2019). É nesse contexto que se justifica a proposta de uma abordagem inferencialista da história da filosofia, baseada no trabalho de Robert Brandom, que seja simultaneamente aberta a certo contextualismo, assim como estabelece parâmetros para reconstruções racionais. Este trabalho tem como objetivo apresentar os elementos essenciais dessa perspectiva, bem como defendê-la de certas objeções.