O trabalho desta UC propôs a criação de textos jornalísticos experimentais, com um texto biográfico e uma narração em primeira pessoa, trazendo uma visão sobre a possibilidade de uma escrita criativa e leve, ao mesmo tempo que transborda o que é um dos recortes da realidade. Leia algumas produções:
Por Iris Aguiar
Ana Clara Parreiras
Jovem de 21 anos, irradia uma alegria contagiante, que ilumina a vida de todos ao redor
Não há quem resista ao seu encanto, e sua mãe, com um orgulho indescritível, descreve Ana como uma pessoa tão especial que é impossível não desejar ser sua amiga. Seu espírito vibrante e positivo é fonte de inspiração para todos que a conhecem.
Desde tenra idade, Ana demonstrou um brilho interior cativante, que se manifesta no sorriso constante e na atitude acolhedora. Geraldina, ou Gê, como gosta de ser chamada, conta que sua filha tem muito amor pelo que faz, além de se mostrar extremamente interessada, objetiva e disciplinada. “Ela ama a arte, escrever e conhecer. E adora ler, ir ao cinema, ver filmes e séries”, conta Gê.
Sua energia positiva é capaz de transformar qualquer ambiente em um espaço repleto de felicidade e harmonia. Ela encontra alegria nas pequenas coisas da vida e transmite essa alegria aos outros com um carisma genuíno. Geraldina diz que sua filha é única, pelo caráter generoso e pelo senso de justiça.
A relação em família é excepcional, e Gê descreve a conexão dela com a filha como “sincera”.
“Aqui, todos conversamos: eu, Ana, o pai dela e o irmão. Temos uma relação muito boa de diálogo, correção, troca de ideias. E de contar sobre o dia a dia”, conta.
Além de seu magnetismo natural, Ana conta com personalidade calorosa e acolhedora. Ela se preocupa profundamente com as pessoas ao seu redor, sempre pronta a ajudar. Sua empatia é uma de suas maiores virtudes.
“Somos muito envolvidos nos movimentos da juventude da igreja e trabalhamos na Sociedade São Vicente de Paulo. A intenção é envolver o mundo em uma única rede de caridade. A Ana é muito envolvida, pois sempre participa com os idosos e acho que isso transforma nosso mundo em um lugar melhor”, diz Gê.
Ana é uma verdadeira cultivadora de amizades. Sua habilidade de nutrir relacionamentos genuínos é um testemunho de sua autenticidade e da dedicação às pessoas que ama. Sua generosidade não conhece limites, e ela está sempre disposta a ajudar, apoiar e encorajar os amigos a perseguir seus sonhos mais ousados.
Sua mãe conta que Ana tem, tatuada, a palavra coragem, que está ligada a uma outra ideia: “isso vai passar”. Esse é um dos ensinamentos que Geraldina cita como um dos mais importantes na vida da filha.
“A Cacá me explicou que a frase significa que quando ela estiver passando por algum momento difícil, não é preciso perder as esperanças, pois vai passar. Já em momentos muito bons, também é preciso saber que vai passar. Então, é necessário aproveitar e curtir”.
Com personalidade magnética e alma radiante, Ana é uma verdadeira inspiração para todos que cruzam seu caminho. Por admirar o que a filha se tornou, a mãe descreve Ana como uma jovem mulher com muitos sonhos e uma jornada agitada no dia a dia, o que, apesar de desafiador, é também um privilégio.
“Nosso maior orgulho é vê-la trabalhar no Estado de Minas e gravar vídeos para a agenda. Ela faz dois estágios, deram essa oportunidade, e Ana tem coragem para viver tudo isso”.
Ana é uma presença que traz felicidade, e sua amizade é um presente que todos desejam receber. Geraldina complementa, ao dizer que a filha vive com intensidade, e absoluta certeza, o que quer ser na vida: jornalista.
Eis a história de Ana, jovem cativante, repleta de alegria e bondade, cujo brilho a torna alguém que todos aspiram a conhecer e ter como amiga.
Para aqueles que querem saber mais sobre que assunto puxar para uma conversa com a Ana, sua mãe destacou as cinco primeiras coisas de que se lembra ao pensar na filha:
Livros (siga o insta @cacaleitura e aproveita e já conheça mais sobre a Ana)
Batata Frita
Fé em Deus
Happy hour
Shein
Fragmentos cotidianos a partir das janelas dos ônibus
Por Iris Aguiar
Belo Horizonte, a vibrante capital do estado de Minas Gerais, conhecida por sua rica cultura e pelas belas paisagens em contraste à selva de concreto. A constante movimentação constante da cidade e a correria cotidiana fazem passar despercebida a diversidade da cidade, assim como as pessoas que, diariamente, cruzam nosso caminho , e todo o restante que nos cerca.
Ao pensar em como a rotina pode ser interessante, relatos de ônibus feitos por jovens que trabalham e estudam são capazes de revelar as experiências cotidianas de quem precisa conciliar rotina acadêmica e demandas do mercado de trabalho, em meio aos desafios do transporte público da metrópole.
Antes de sair de casa, começo a planejar o dia, a pensar na viagem até o trabalho. A estação de ônibus é agitada, o ar vibrante e movimentado ecoa entre passageiros ansiosos.
Encontro pessoas de diferentes idades, a trajar uma variedade de roupas e a expressar uma mistura de emoções. Elas se agrupam sob a cobertura da plataforma. O som contínuo de anunciantes eletrônicos e motores de ônibus em marcha cria uma sinfonia peculiar.
Desço a rampa da estação quase correndo. São 5h48. Ainda está escuro. Pouca gente no caminho. A maioria já desce lá dentro, pois desembarca do ônibus anterior.
Chego à primeira catraca. “Ufa, a recarga da passagem caiu”. Passo apressada e atravesso a primeira plataforma. Consigo ver que a fila do meu ônibus está grande. Olho para a esquerda, não vem nenhum ônibus, então, atravesso a próxima plataforma.
Passo pela segunda catraca e, numa corrida imaginária, porém mais real que a São Silvestre, tento me apressar para chegar antes daquelas pessoas que também pegarão o mesmo ônibus que eu.
Entro na segunda fila para meu ônibus. São 05h51. O veículo sai em 1 minuto. Todos embarcam. Enquanto o tempo passa, olhares impacientes miram os relógios, e os pensamentos se misturam ao som dos passos apressados, que ecoam pelo chão de concreto.
À medida que os ônibus chegam e partem, uma sensação de expectativa e antecipação paira no ar, enquanto os passageiros se mantêm alerta, prontos para embarcar e seguir em direção aos seus destinos, unidos, momentaneamente, pelo propósito comum de uma jornada de ônibus.
Penso no tempo que tenho para chegar: “Tudo bem, a primeira fila vai sair às 5h56, a minha às 6h. Vai dar tempo de chegar. Estou em um lugar bom, perto do poste com a listra amarela”.
Ela é minha marca. Entretanto, há um saber coletivo dos passageiros da Linha 30: se perto da listra é possível ir sentada, mais distante significa que terá que ir em pé.
Às vezes, a espera pelo próximo ônibus simplesmente não se revela uma opção viável. Quando há tempo escasso e compromissos urgentes, é preciso enfrentar a dura realidade de viajar em pé. A sensação de frustração é iminente, pois cada minuto parece uma eternidade, tentando encontrar um ponto de apoio em meio ao balanço constante do veículo. Sempre observo o olhar atento de quem não se sentou, à espera, ansiosa, pelo passageiro que vai se levantar e descer.
A próxima fila embarca. As pessoas pegam o ônibus verde, que não tem ar-condicionado. Fico esperta, passo para o lado. Esse é o ritual da linha: fazer três filas para esperar e passar à próxima quando os passageiros embarcam. Todos já sabem o que fazer, mas sempre tem aquele que quer ser mais esperto e pula à frente. Por isso, quando a primeira fila começa a embarcar, os olhares são apenas para ela.
O ônibus sai, olho pra trás umas duas vezes, à espera de o ônibus aparecer. Este horário na estação é silencioso, apesar de todo o barulho. As pessoas não conversam, imersas no próprio planejamento para o dia de trabalho, ou com sono demais para socializar. Na fila, reconheço pessoas que sempre estão lá.
Há a menina que estuda no Cefet e espera, na fila, com a mãe. Elas pegam o ônibus depois de mim. Ainda vejo a moça loira, baixinha, com quem embarco quando me atraso. A garota com cabelo vermelho e cacheado também espera, e conversa, às vezes, com a loira.
Reconheço a menina que é jovem aprendiz, sempre com o uniforme da Asprom, e seu All Star azul. Ela, normalmente, pega o ônibus às 6h12. O rapaz de uniforme do Materdei, às vezes, pega o ônibus antes do meu. Rotineiramente, eu o observo na fila.
O ônibus chega. Ele é azul, com ar-condicionado. A fila anda e, quando chego mais perto, vejo que ainda tem lugar lá dentro.
Entro e hoje é um dia de sorte, pois tem lugar no canto desocupado. Sento-me e espero para ver quem virá ao meu lado. Dessa vez, uma senhora que está no celular. Ela não pediu licença. A maioria pede.
As pessoas chegam, se sentam e fecham os olhos para encarar outra viagem. Paramos em quase todos os pontos para embarque de passageiros, até chegar à rotatória da David Sarnoff. Depois, paramos em quase todos os pontos para as pessoas descerem.
São 6 horas, e as portas se fecham. O ônibus arranca e vira à esquerda. A estação fica para trás.
Rumo ao Centro, 6h.
No meio de uma cidade movimentada, uma sensação de resignação e cansaço paira no ar. A agitação usual foi substituída pelo ar de silêncio e abandono. Ao percorrer as ruas, é possível avistar casas invadidas, com sinais da comunidade que luta pelo direito de viver.
Enquanto isso, no muro próximo, a arte urbana revela a pixação do grupo Vingadores, ícones que relembram uma época em que a esperança parecia mais palpável: nossa infância. No entanto, a memória se mistura à realidade, pois um cachorro preto brinca, despreocupadamente, com uma sacola plástica, talvez de lixo, em meio à paisagem desolada.
À medida que o dia nasce, observo as lojas fechadas, já com suas luzes acesas, numa atmosfera melancólica e solitária, em um dia que ainda não clareou.
Enquanto os carros passam pelas ruas, é possível notar passageiros entretidos com seus celulares, mergulhados em seus próprios mundos virtuais. Um sinal de trânsito se fecha e um grupo de pessoas atravessa apressadamente. Parecem estar a caminho do trabalho, na luta contra as adversidades da vida diária. Ao mesmo tempo, em sentido oposto, o homem com uma latinha de cerveja na mão, vestindo camisa branca, bermuda e chinelo, atravessa sem pressa. Parece desapegado das convenções sociais, e imerso nos pensamentos borrados pelo álcool.
Ao adentrarmos o bairro, uma cena comum: certo homem caminha com seu cachorro preto, tranquilamente, enquanto o animal fareja, curioso, um poste. Me pego a refletir sobre qual seria o trabalho do rapaz, já que tem tempo de passear com seu bichinho pela manhã. Meu pensamento, porém, logo se esvai ao olhar para frente.
Vejo a correria de outro homem, em direção ao ônibus que se aproxima do ponto, e, com uma dose de sorte, consegue embarcar a tempo.
Seguimos nosso caminho, e noto uma casa, que, apesar de estar ali todos os dias, nunca de fato havia sido enxergada por mim. Alguém ali comercializa bandejas de salgadinhos. A casa é facilmente identificada pelo colorido toldo amarelo, azul e laranja que a cobre.
Enquanto isso, no ônibus, entram outros cinco passageiros. Conforme avançamos, caminhamos para a lotação do veículo, que já sai da estação sem lugar livre para sentar.
Em meio à paisagem urbana, uma pichação, com a inscrição "Somaisum", me chamou a atenção. Eu já a vi em tantos lugares, mas não sei o que é. Penso nas possibilidades: “Será essa a última? Ela se refere à morte de alguém invisibilizado?"
Voltamos à avenida, e mais oito ou nove pessoas entram a bordo, contribuindo para a agitação dentro do veículo. Muitas pessoas são forçadas a se agarrar aos corrimãos e a se equilibrar da melhor forma possível, enquanto o ônibus acelera e faz curvas bruscas. Os corpos se chocam uns contra os outros, as mãos se apertam nos corrimãos com firmeza, os pés tentam encontrar uma base estável no chão que balança.
No meio dessa movimentação, alguém pede ao motorista: "Libera, por favor”, para que a roleta seja destravada. Outro passageiro, simplesmente, pula a roleta, e, no meio das pessoas, passa despercebido.
Tais acontecimentos singulares nos proporcionam uma visão vívida da vida cotidiana observada por meio da linha 30. Lá fora, pessoas caminham repletas de bolsas, rumo ao trabalho; outras fazem caminhada. Consigo ver o 30 que faz o caminho de volta (mas, para muitos, de ida). Ele está cheio, algo incomum para o horário.
Ao observar o caminho como nunca antes, percebo lugares nas quais minha vista nunca se fixou: um ferro velho, que se parece bastante com aqueles dos filmes, se chama “Mineirão peças”. Logo à frente, um topa-tudo. Há muito tempo, não via um.
Pelo horário, tudo ainda está fechado. Na porta do INSS, pessoas esperam. Agora, quando as pessoas entram, já não consigo contar. Está muito cheio, mas estamos perto da rotatória, o ponto de mudança. A partir desse momento do caminho, os passageiros começam a descer.
Antes da rotatória, numa paisagem industrial, vejo as três abelhinhas a voar no muro de concreto. A única cor na paisagem cinza. Homens atravessam correndo, arriscam a própria vida para chegar do outro lado.
Já o ônibus não para, não tem medo. Entra na rotatória e enfrenta os carros que nela estão. No próximo ponto, as pessoas começam a descer. Debaixo do viaduto, há carros estacionados. Parado, ao lado de um dos carros, um homem segura uma bolsa em cima do porta-malas.
Agora, já na avenida Amazonas, onde o trânsito pesado domina a cena, com caminhões, ônibus e uma infinidade de carros a ocupar as pistas, avisto o Ceresp, presença imponente, que me faz pensar em quem está detido no local.
No percurso, vê-se, aberta, a Igreja Deus é Amor, convidando para que os fiéis adentrem suas portas. De repente, o despertador de alguém começa a tocar. São 06h31. A essa altura, estamos próximos do Cefet II.
O ônibus para, brevemente, enquanto uma pessoa desce, mas o alarme continua a tocar, e preenche o ambiente com seu som incômodo. Escuto uma buzina, e especulo se foi uma resposta a algum fechamento de trânsito. O alarme persiste, causando um desconforto silencioso entre os passageiros. Alguém sussurra algo, inaudível.
O ônibus 2104 passa ao nosso lado. Essa linha sempre cruza com o 30 de manhã. Novamente, o veículo para, outra pessoa desce, e já estamos perto do Colégio Tiradentes. O relógio marca 6h35. No trânsito, observo um carro com adesivo da loja Roma, e lembro que um amigo já trabalhou lá. O alarme continua a tocar, mas seu som já não faz mais sentido, tornando-se apenas uma parte indesejada da paisagem sonora.
A visão do Expominas e do Circo em Portugal preenche meus pensamentos e desperta curiosidade sobre o tempo em que a trupe ainda ficará aqui. Sempre me esqueço de olhar. Enquanto isso, outro ônibus da linha 30 retorna, desta vez, vazio.
Finalmente, o alarme para. São 6h38, e me pergunto se ele foi desligado ou simplesmente parou depois de um tempo.
Outro ônibus da linha 30 volta, também vazio. Passamos pela Funed e pela linha de trem, e avistamos a Tereza Cristina e o rio Arrudas, lá embaixo.
Perto do Cefet novamente, paramos, e outras pessoas descem aqui. Tem um hotel em frente ao campus, algo que descobri recentemente, pois nunca havia nele reparado, apesar de morar na cidade durante a minha vida inteira.
Alunos atravessam a rua, suas expressões não são de felicidade, mas não poderia afirmar com certeza, já que adolescentes são sempre uma incógnita. O Sol está do lado oposto, vindo em minha direção, mas gosto desse contraste, e dos raios no meu rosto, especialmente num dia frio como hoje.
O veículo já tem lugares vazios. Avisto a loja Barroca Interiores, e, após uma subida, será minha última descida. No topo da subida, posso ver a faixa “Silk em geral” e a imagem de uma abelha na fachada. O relógio marca 6h46, e percebo que o trajeto demora um pouco mais hoje.
Começo a pensar na descida e entendo que, nessa hora, minha mente já pensa no trabalho. Toda a distração e as paisagens do caminho ficam para trás, e o cérebro começa a funcionar.
Já vi o rosto da águia, o que significa que, em breve, avistaremos a faculdade vermelha, cujo nome não me recordo no momento, mas vou verificar. “Unincor”, esta é a instituição onde um porteiro está do lado de fora. A descida está chegando ao fim. Paramos novamente, e outras pessoas descem.
Logo será o meu ponto, e me preparo para levantar, pois estamos prestes a atravessar a Francisco Sá. Ali, também desce muita gente. Quando o ônibus para no sinal da Avenida do Contorno, já tem muita gente em pé para descer.
Não preciso dar o sinal, porque alguém já o fez. São 6h51, estou na porta e vejo que a menina que estuda na UFMG está ao meu lado. Desço. São 6h52.
Neste complexo cenário urbano, os elementos se misturam, e revelam um retrato fragmentado de uma comunidade em transição, e em movimento, através da janela da linha 30. Pessoas apressadas ou descompromissadas, pichação nos muros, cachorro a brincar com lixo, lojas fechadas, passageiros absorvidos em seus celulares.
Eis a paisagem urbana, tão rica de contrastes e histórias não contadas.