No segundo semestre de 2023, um grupo de Gestores(as) e de Ex-Gestores(as) Negros(as) se reuniu para refletir, brevemente, sobre a trajetória de pessoas negras que têm atuação no movimento negro e nos espaços de Gestão Pública no Espírito Santo. Esta reunião aconteceu de maneira híbrida (presencial e remota) no dia 23 de agosto daquele ano, na sala de reuniões da Pró-reitoria de Políticas Afirmativas e Assistência Estudantil da Universidade Federal do Espírito Santo (Propaes/Ufes).
Ao longo desta reunião, a reflexão estabeleceu contornos mais amplos do que tão somente em torno das trajetórias e condições de trabalho dos Gestores Negros. As pessoas presentes também refletiram a trajetória de negros e negras militantes do movimento negro do Espírito Santo, no exercício de cargos e funções de assessores/as, coordenadores/as ou técnicas/os em espaços governamentais que tratam das agendas de interesse do povo negro.
Quanto ao objeto refletido, “a pessoa negra na gestão pública”, é possível afirmar que a presença de pessoas negras com proximidade ou com relação orgânica com o Movimento Negro na Gestão pública no Espírito Santo está em curso desde o início dos anos 1990, pelo menos. Neste recorte temporal, há registros da presença de pessoas negras comprometidas com o combate ao racismo e até mesmo com militância no movimento negro ocupando espaços institucionais na gestão pública, como, por exemplo, na Secretaria de Estado da Educação do Espírito Santo, nos anos 1994 e 1995, e na Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos da Prefeitura de Vitória, no período de 1996 a 2004.
A partir dos anos 2000, foram várias as pessoas negras comprometidas com o combate ao racismo e/ou militantes orgânicas do movimento negro que estiveram e estão exercendo cargos ou funções na Gestão Pública. Apenas no recorte político-territorial do município de Vitória (capital do ES), dentre outras instâncias, podemos citar:
i. Secretaria Municipal de Educação de Vitória;
ii. Gerência de Raça da Secretaria Municipal de Cidadania e Direitos Humanos de Vitória;
iii. Coordenação de Estudos Afro-brasileiros da Secretaria Municipal de Educação de Vitória;
iv. Coordenação do Museu Capixaba do Negro;
v. Gerência de Promoção da Igualdade Racial da Secretaria Estadual de Direitos Humanos do Estado do Espírito Santo;
vi. Gerência de Educação Étnico-Racial e de Educação Escolar Quilombola da Secretaria de Educação do Estado do Espírito Santo;
vii. Diretoria de Direitos Humanos e Cidadania da Ufes;
viii. Assessoria de Gabinete da Reitoria da Ufes; e
ix. Pró-Reitoria de Políticas Afirmativas e Assistência Estudantil da Universidade Federal do Espírito Santo.
Após essas três décadas (1990 até 2020) e mais de uma dezena de instâncias governamentais ocupadas por pessoas negras militantes orgânicas do movimento negro e/ou comprometidas com o combate ao racismo, refletimos que já dispomos de substancial acúmulo de experiências que merecem ser refletidas e amadurecidas coletivamente, assim como se fazem necessários o estreitamento e o fortalecimento de diálogos e trocas de experiências entre os(as) Gestores(as) mais velhos (ou que vieram antes!) e os(as) que estão na Gestão Pública mais recentemente.
Como visto, apenas no âmbito do município de Vitória dispomos de várias pessoas e de várias experiências (individuais e coletivas) caracterizadas por uma práxis de combate ao racismo pela via institucional, ou, como também podemos dizer, uma práxis de combate ao racismo “desde dentro” da Gestão. O quantitativo de pessoas e de experiências, quando consideramos os 78 municípios do Espírito Santo, sem dúvida alguma nos mostrará a capilaridade da presença e da práxis negra já existente no Estado do Espírito Santo.
Trata de práxis protagonizadas por negros e negras no âmbito das Instituições Públicas, nas esferas Federal, Estadual e Municipais. Sobretudo, trata de uma presença e práxis negra outsider e, deste modo, podemos considerá-las não apenas “não-instituídas” mas, sobretudo, tratam de pessoas e práxis “contra hegemônicas” face à tradição da branquitude como “lócus” hegemônico nos modos de existir, de fazer e de pensar na Gestão das instituições públicas brasileiras.
Se por um lado somos muitas pessoas, por outro lado destacamos que ainda são poucos os atores protagonistas das práxis negra na Gestão Pública que já tiveram oportunidade de estar juntos e juntas para se conhecer e trocar experiências ou construir cooperações institucionais para organizar um corpus negro coletivo na perspectiva de fortalecimento, tanto individual quanto coletivo, desses atores e dessas práxis negra em Gestão Pública, no intuito de avançar mais e melhor na implantação e implementação de políticas públicas em benefício da população negra.
No escopo acima, encontramos os contornos que delimitam e definem o tema central da proposta deste 1º Encontro Estadual de Gestores(as), Técnicos(as) e Coordenadores(as) Negros(as) do Espírito Santo, a saber: a pessoa negra e a gestão pública: conhecer, organizar e avançar!.
Com esta breve historicidade e contextualização, identificamos a necessidade de nós, Gestores(as), Coordenadores(as) e Técnicos(as) Negros(as) com atuação nos diversos municípios e nas variadas áreas da Gestão pública no Estado do Espírito Santo, nos encontrarmos para nos conhecermos e nos organizarmos, com objetivo de avançarmos mais e melhor no que tange à implantação e implementação de políticas públicas de interesse da população negra urbana e rural no bojo das múltiplas Instituições Públicas que prestam serviços e/ou desenvolvem políticas públicas no Espírito Santo.
Organizado por um conjunto amplo e diverso de gestores, técnicos e coordenadores negros e negras em atuação nas mais variadas instituições públicas no Estado do Espírito Santo, com a coordenação da Secretaria de Ações Afirmativas e Diversidade da Universidade Federal do Espírito Santo (SAAD/Ufes), o Encontro será realizado no mês de dezembro de 2024, na sequência das programações do mês de novembro de 2024 - alusivas ao Dia da Consciência Negra e à memória de Zumbi dos Palmares, quando celebraremos o primeiro Feriado Nacional em celebração à luta do povo negro no Brasil.