Auxílio transporte da UnB fica defasado com aumento de passagem


Estudantes se queixam que valor de R$300 oferecido pela universidade tem sido insuficiente para custear despesa com deslocamento

Por Diogo Albuquerque

Estudantes da UnB que moram no Entorno precisam desembolsar, em média, R$147 além do auxílio transporte

Foto: Diogo Albuquerque | Arte: Ana Carolina Alves

Com dois reajustes de passagem em menos de seis meses, os estudantes da Universidade de Brasília (UnB) que moram no entorno do Distrito Federal têm precisado gastar mais para se deslocar. Mesmo para os que recebem o auxílio transporte no valor de R$300 oferecido pela universidade, a reclamação é de que o valor está defasado e, no fim do mês, é preciso desembolsar, em média, cerca de R$147 para continuar indo às aulas.


Moradora da Cidade Ocidental, a aluna de Farmácia da UnB Adalgisa Lopes Batista, 24 anos, gasta R$7,75 em uma passagem até a rodoviária do Plano Piloto. Por dia, a despesa de Adalgisa é de R$15,50 e, ao mês, em média R$341, quando considerados 22 dias úteis.

Para arcar com a despesa, Adalgisa recebe o auxílio transporte há quase um ano 

Arte: Ana Carolina Alves

Para conseguir arcar com os custos do deslocamento diário, Adalgisa recebe o auxílio, mas lamenta que o valor do auxílio não consegue cobrir totalmente os gastos após os aumentos na tarifa. "Eu recebo o auxílio transporte há um ano, e quando a passagem era seis reais, supria as minhas necessidades. Nesse semestre, eu tenho ido à UnB quatro vezes por semana porque o auxílio não está mais sendo suficiente", relata Adalgisa.

Adalgisa diminuiu a quantidade de matérias de sua grade para evitar despesa com transporte | 

Foto: Acervo pessoal 

O Programa Auxílio Transporte (PAT) consiste em um repasse financeiro no valor de R$300 mensais a estudantes de baixa renda que residem no entorno do DF, em cidades do Goiás que integram a Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno (RIDE-DF).

A cada 600 estudantes, 1 recebe o auxílio transporte da UnB

Arte: Ana Carolina Alves

Reajustes de tarifa ao longo de 2023

Em um período de cinco meses, as passagens de ônibus do Entorno tiveram dois aumentos: 12% em março e mais 15% em agosto. Ambos foram autorizados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que assumiu a gestão das mais de 400 linhas que operam no entorno.

Se considerado a passagem de Planaltina como exemplo, um estudante que mora no município precisará arcar com mais R$4,60 todos os dias. Ao fim de um mês com 22 dias úteis, o gasto total é de R$446,60. A ANTT alega que a rota semiurbana não é subsidiada pelo governo e que os recursos para manutenção do serviço vêm integralmente das tarifas pagas pelos usuários.


A possibilidade de um novo aumento, previsto pela ANTT para fevereiro de 2024, também preocupa os estudantes. Adalgisa se sente revoltada e aponta que a qualidade do serviço não tem acompanhando o preço da passagem.


De acordo com dados da UnB, atualmente 100 estudantes recebem o auxílio transporte. Em nota ao Campus Multiplataforma, a universidade afirma que os valores da assistência estudantil estão condicionados à limitação dos recursos aprovados na Lei Orçamentária Anual (LOA) pelo Congresso Nacional, que é definido no ano anterior ao exercício efetivo. Dessa forma, os valores totais do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES) são definidos pelo governo junto ao Congresso Nacional. 


“Há quatro anos, estes recursos sofrem sucessivos cortes e/ou contingenciamentos. E, no governo anterior, as universidades deixaram de ser consultadas sobre a proposta de recursos de acordo com suas necessidades. Por isso, nenhum auxílio da assistência recebeu ou pode receber aumento neste exercício, por falta de previsão ou destinação aprovada”, diz a nota.

Gastos altos e rotina exaustiva

Para Daniel Bittencourt, 23 anos, estudante de engenharia civil da UnB, a rotina para chegar até a universidade também não é fácil. Por morar em Luziânia, município de Goiás localizado a 68 quilômetros da universidade, ele conta que precisa acordar às 4h da madrugada. “Dependendo do dia, chego a passar pelo menos duas horas dentro do ônibus”, afirma.

Daniel mora a 68km da UnB. A rotina do estudante começa cedo, às 4h da madrugada 

 Foto: Diogo Albuquerque | Arte: Ana Carolina Alves

Daniel precisa desembolsar, em média, R$450 com passagem para se deslocar de casa até o campus Darcy Ribeiro. “As vezes eu tenho que pegar mais de dois ônibus por causa do horário. Normalmente, eu pego um do centro de Luziânia até a rodoviária do Plano Piloto e outro da rodoviária até a UnB”, explica.


O aluno conta que já tentou se inscrever para receber o auxílio transporte oferecido pela UnB, mas que não foi contemplado. “Eu me enquadro nos requisitos do edital, então nesse semestre eu vou tentar de novo”, destaca.


A estudante de ciências biológicas (licenciatura) Stefane Soares, 26, mora em Águas Lindas e também relata o drama com o aumento no valor das passagens. Em sua segunda graduação, ela afirma que tentou solicitar o auxílio transporte todos os semestres, mas sem sucesso. “Não recebia nenhuma justificativa para o indeferimento. Então tentei pedir o passe livre estudantil. Na época, tive que usar o comprovante de endereço de uma tia minha que mora no DF porque eles não davam o passe para quem é do entorno”, conta.

Mesmo em sua segunda graduação, Stefane não conseguiu o acesso ao auxílio transporte

 Foto: Acervo pessoal 

Junto ao passe livre, Stefane conseguiu também um estágio como educadora social, o que a ajudou a continuar indo para as aulas na UnB. “Uma estratégia que eu faço é pegar o ônibus mais barato daqui de Águas Lindas até o DF e, depois, usar o passe até a UnB. Se não fosse esse estágio, eu não conseguiria pagar as passagens”, observa.


Passe livre é prioridade para governo de Goiás

A secretária de Estado do Distrito Federal (SEDF), Maria Caroline Fleury, reforça que a pasta trabalha para que o reajuste de tarifa, previsto pela ANTT para fevereiro de 2023, seja incluído no Orçamento Anual de 2024 e o governo consiga fazer o aporte necessário. "Além de trabalharmos para que não haja aumento, estamos trabalhando firme para que tenhamos o barateamento das passagens, para sabermos qual é o valor ideal a ser cobrado e quanto custa essa diferença. Além do orçamento, uma das nossas propostas é o consórcio interfederativo, onde Goiás, Brasília e União entrariam com um terço cada para baratear o todo." 


Fleury afirma ainda que a implementação do passe livre estudantil é uma prioridade do governo de Goiás. "Nós entendemos a necessidade do passe livre. Não é justo com o morador do entorno, principalmente porque Goiânia e Brasília têm o passe. Estudos necessários estão sendo feitos, juntamente com a secretaria geral e a secretaria de economia, para tornar isso viável, porque o governador [Ronaldo Caiado] pediu que a gente avance com essa pauta", disse.