Sobre a objeção de Johann G. Maass à filosofia kantiana de espaço e de tempo: alguns apontamentos acerca da primeira recepção da Crítica da Razão Pura
Marco Antonio Chabbouh Junior
Durante o século XIX, após quase um século da recepção da Crítica da Razão Pura, a objeção de Adolf Trendelenburg à filosofia de espaço e de tempo de Kant foi vastamente difundida na academia alemã. No início do século XX, por meio do A Commentary to Kant’s Critique of Pure Reason de Norman Kemp Smith, a crítica feita pelo filósofo berlinense tomou também os ambientes anglófonos de estudo de Kant. Não era mais possível, na ilha ou no continente, discutir a filosofia de espaço e de tempo de Kant sem levar em consideração o tratamento que Trendelenburg deu para a questão em suas Logische Untersuchungen e em seus Historische Beiträge zur Philosophie. No entanto, Kemp Smith não meramente explicou ou subscreveu a objeção de Trenedelenburg, mas deu uma nova estrutura para ela. Enquanto o filósofo de Berlim objetava por meio do levantamento da possibilidade de o espaço e o tempo serem, concomitantemente, formas dos aparecimentos e estruturas intrínsecas às coisas em si, Kemp Smith passou a questionar se seria sequer legítimo afirmar a não espaço-temporalidade das coisas. A nova estrutura dada por Kemp Smith para a objeção de Trendelenburg não é criação do estudioso escocês. Essa crítica já podia ser encontrada no primeiro volume da famosa Philosophisches Magazin editada por Johann August Eberhard: era no artigo “Über die transzendentale Ästhetik” (1788) que o psicólogo Johann G. Maass construía sua objeção contra a doutrina da “Estética Transcendental”. No presente trabalho, meu objetivo será duplo. Em primeiro lugar, buscarei explicitar a peculiaridade do ataque de Maass à filosofia de Kant mostrando em que ela se diferencia das demais objeções à filosofia de espaço e tempo do prussiano. Em segundo lugar, caracterizarei a crítica de Maass como um tipo de objeção costumeiramente feita ao filósofo prussiano pelos autores frequentes da Philosophisches Magazin. Para atingir meu objetivo, eu irei (i) explicitar o conteúdo da objeção de Adolf Trendelenburg ao prussiano. (ii) Em seguida, eu irei expor alguns traços fundamentais das críticas feitas contra Kant pelos correligionários de Eberhard. (iii) Logo após, mostrarei em que consiste a contraposição de Maass à filosofia de espaço e tempo de Kant. (iv) Por fim, concluirei que para compreender Maass – e, também, Trendelenburg – é preciso efetuar a distinção entre as duas críticas situando-as em seu contexto: a crítica de Maass possui diversas características que a ligam à filosofia popular alemã do século XVIII, enquanto o ataque de Trendelenburg propõe uma retomada da relação positiva com a ciência contra o idealismo absoluto hegeliano.