A importância da drenagem linfática manual ao relacioná-la com a anatomofisiologia do sistema linfático;
A conhecer os princípios básicos da drenagem linfática manual, indicações e contraindicações da drenagem linfática manual;
A conhecer as principais manobras e a direção correta que a linfa deve ser guiada através delas;
A compreender como é realizada a execução da drenagem linfática manual.
Com inúmeros benefícios comprovados tanto no campo estético quanto no terapêutico, a drenagem linfática constitui uma técnica de massagem indicada para a prevenção e o tratamento de uma série de condições clínicas.
Anteriormente à execução de atendimentos com a utilização da técnica de drenagem linfática, é necessário conhecer os seus fundamentos e como é seu mecanismo de ação, bem como entender suas particularidades quanto à pressão, velocidade, ritmos e manobras. Neste texto, você vai revisar o sistema linfático, identificar quais são as características da drenagem linfática manual, seus fundamentos, indicações e contraindicações, além de conhecer as principais manobras e a direção correta que a linfa deve ser guiada através das manobras.
Os registros indicam que o sistema linfático já era conhecido e estudado na antiga Grécia pelo anatomista Herófilo e por Hipócrates, que chamou a linfa de sangue branco. No século XVII, o pesquisador Jean Pecquet descobriu a cisterna de Pecquet, depois denominada pela nomenclatura anatômica internacional de cisterna do quilo, denominação utilizada nos dias atuais.
Na década de 1930, o casal dinamarquês Dr. Emil e Estrid Vodder desenvolveu os primeiros trabalhos com drenagem linfática manual, tratando pacientes com infecções crônicas nas vias aéreas superiores. Após observarem que o problema normalmente era acompanhado pela presença de linfonodos da região cervical e submandibular inchados, desenvolveram a habilidade de drenar essa congestão com manobras manuais que ajudavam o líquido a fluir dentro do vaso linfático.
A principal característica das manobras era a suavidade e a leveza dos movimentos. Sempre muito lentos, monótonos, harmônicos e rítmicos. Vodder dizia que o punho deveria estar sempre flexível e relaxado. Os movimentos deveriam seguir uma direção específica e caminhar em sentido a uma região chamada de terminus, que é o ângulo venoso, onde desemboca a circulação linfática. Após 30 anos, a técnica foi oficialmente reconhecida pela Associação de Medicina em Linfologia.
Em 1960, foi fundado o primeiro centro Vodder de drenagem linfática e surgiu a primeira lista de indicações para tratamento com a técnica. Em seguida, escolas do método Vodder se difundiram pelo mundo.
Outros pesquisadores também merecem destaque, como o Dr. Michael Foldi, que na década de 1960 iniciou seus estudos sobre as vias linfáticas da cabeça, sua relação com o líquido cefalorraquidiano e fundou uma clínica especializada na técnica de drenagem linfática manual no tratamento de seus pacientes. Na Bélgica, o fisioterapeuta Dr. Albert Leduc fundou o Grupo Europeu de Linfologia e criou o método Leduc de drenagem linfática manual, também bastante difundido em todo o mundo. Na Austrália, Dr. Robert e Dra. Judith Casley Smith associam a técnica da drenagem linfática manual a bandagens compressivas no tratamento do linfedema. O Prof. Alain Ganancia desenvolveu uma técnica diferenciada, que drena o tecido em diferentes fases e trabalha regiões com cicatrizes, fibroses e aderências.
No Brasil, nos anos 1990, o médico angiologista Dr. José Maria Godoy desenvolveu com sua esposa, a Dra. Maria de Fátima Godoy, a técnica Godoy de drenagem linfática manual, que segue os princípios da técnica do Dr. Vodder.
O sistema linfático é um conjunto de órgãos, tecidos, vasos e canais que se distribuem pelo corpo para ajudar a filtrar e remover o excesso de líquidos e impurezas do organismo. Este sistema coleta fluidos, por difusão, através dos capilares linfáticos e os conduz para dentro do sistema linfático. Uma vez dentro do sistema, o fluido é chamado de linfa.
A linfa se movimenta através de uma pressão baixa e lenta (3l em 24h) através de vasos próprios. Os capilares do sistema linfático possuem permeabilidade alta, permitindo captação de proteínas, eletrólitos e água. A circulação linfática se inicia na circulação sanguínea e o material coletado retorna à ela. Como esse sistema não possui bomba central, a circulação da linfa circula por força das contrações musculares, gravidade, movimentos das extremidades, massagem, peristaltismo visceral e movimentos respiratórios.
No decorrer dos vasos linfáticos existem válvulas unidirecionais que impedem o refluxo e inúmeros gânglios linfáticos, que são conglomerados celulares nos quais se concentram, principalmente, os linfócitos de defesa.
Considera-se que o sistema linfático realiza três funções interdependentes: a remoção do de excesso de fluidos dos tecidos corporais, absorção e transporte dos ácidos graxos para o sistema circulatório e a produção de células de defesa do sistema imunitário.
Devido ao fato dos capilares possuírem pequeno calibre, as obstruções podem ocorrer facilmente. Nesse caso, o sistema linfático não cumpre adequadamente a função de drenar o excesso de líquido celular. O líquido em excesso é chamado de edema. A presença de edema pode se tornar crônica com aspecto endurecido e frio na região. Esse quadro é denominado linfedema. É mais comum nos membros inferiores ou superiores, porém pode ocorrer em qualquer local do corpo.
A mastectomia (retirada da mama) é uma das causas comuns de obstrução linfática porque em grande parte das cirurgias o tecido linfático das axilas também é removido, fato que poderá causar obstrução linfática e edema no membro. Outras causas de obstrução linfática, além de cirurgias, podem ser linfedemas primários (nasce com problema), traumas, tumores, radiações, infecções da pele, entre outras. A obstrução linfática crônica geralmente necessita de tratamento para edema por toda a vida e provoca comprometimento funcional maior, como perda da mobilidade, fraqueza, dor e diminuição da participação social.
Em associação aos demais órgãos linfáticos, o sistema linfático é responsável por eliminar resíduos metabólicos das células. A linfa pode conter microrganismos que, ao passar pelos filtros dos linfonodos e baço, são eliminados. Por isso, durante certas infecções pode-se sentir dor e inchaço nos gânglios linfáticos da região cervical, axilar ou inguinal, conhecidos popularmente como "íngua". Os gânglios linfáticos, além de outros órgãos do sistema imunológico, produzem linfócitos que migram para circulação principalmente através dos vasos linfáticos. Logo, se o sistema não está apresentando circulação adequada compromete a capacidade de o organismo de lutar contra uma infecção.
A drenagem linfática manual (DLM) é uma massagem realizada com manobras suaves que ajudam no escoamento do excesso de líquidos. Os movimentos da DLM imitam nosso sistema linfático fisiológico.
A DLM está baseada em manobras de evacuação que permitem que haja um aumento no fluxo linfático e um direcionamento da linfa para os linfonodos, principalmente em região proximal. Também são fundamentais as manobras de captação, que simulam um bombeamento de pressão tissular leve, fazendo com que os restos metabólicos sejam direcionados para os capilares linfáticos. Quanto maior for a aderência das mãos do profissional na pele do cliente, melhor será o resultado do direcionamento da linfa, e isso potencializará a fisiologia linfática local.
As técnicas de DLM podem ser realizadas isoladamente ou envolvendo a chamada Fisioterapia complexa de drenagem (FCD). Na FCD, a drenagem é associada a cuidados com a pele, bandagem de compressão e exercícios terapêuticos. Abordaremos aqui somente a DLM, mas lembre-se: isoladamente, os efeitos da drenagem linfática manual são menores quando comparado com a FCD.
São conhecidas várias manobras diferentes para a aplicação da técnica de drenagem linfática manual. Abordaremos aqui as duas principais técnicas: Vodder e Leduc.
Na DLM pelo Método Vodder, a pressão aplicada deve ser suave, lenta e repetitiva, não ocorrendo o deslizamento sobre o tecido, mas, sim, o empurrar e o relaxar do tecido subcutâneo. Na técnica de Vodder, a drenagem inicia sempre distalmente ao segmento. Por exemplo: se a região drenada for a coxa, depois de realizada a estimulação na região inguinal, a técnica se inicia na região próxima dos côndilos femorais.
A técnica de Vodder possui dois procedimentos básicos: (1) Captação, que visa direcionar linfa do interstício para os capilares linfáticos; (2) Evacuação que consiste em eliminar a linfa que está dentro dos vasos linfáticos no sentido do fluxo linfático.
Existem quatro manobras básicas da massagem de drenagem linfática pelo Método Vodder:
Com a mão espalmada sobre a pele, os dedos realizam movimentos circulares, promovendo um estiramento do tecido, efetuando uma pressão/descompressão. São realizados de 5 a 7 vezes no mesmo local.
As mãos são posicionadas no tecido a ser drenado e realizam movimentos ondulatórios, com pressões que iniciam na palma da mão e se dirigem aos dedos diminuindo gradativamente. A pressão é realizada de maneira intermitente (comprime e descomprime) de 5 a 7 movimentos. O sentido e direção da manobra são determinados pela localização das vias.
Com as mãos perpendiculares ao trajeto da drenagem, realiza-se manobra de arraste iniciando com a borda medial da mão na no local da drenagem, depois prona o antebraço e abdução do braço. A mão contralateral mantém polegar em extensão e executa um movimento de arraste com a borda lateral, associado à supinação do antebraço e à adução do braço. O movimento é repetido na região imediatamente próxima à região manipulada.
Empregado em superfícies planas. Com braço em leve abdução, antebraço em pronação. A face palmar toca a superfície realizando desvio ulnar na direção da drenagem e simultaneamente faz supinação e adução. A outra mão faz a mesma sequência com cuidado para que os movimentos sejam sequenciais e rítmicos, alternando-se as mãos para a região imediatamente próxima.
Compreende dois movimentos básicos, (1) Captação, movimento que levará a linfa contida nos vasos para os linfonodos distantes ao edema, promovendo, assim, a evacuação e (2) Reabsorção, que possibilita que os vasos livres recebam a linfa proveniente do interstício.
Diferentemente do Método Vodder, o Método Leduc consiste de manobras que se iniciam na região proximal do membro. Utilizando o mesmo exemplo, se a região drenada for a coxa, depois de realizada toda a estimulação na região inguinal, a técnica se inicia na região próxima à pelve. As manobras específicas do Método Leduc são:
Feita com o contato direto dos dedos indicador e médio colocados sobre os nodos e vasos linfáticos, fazendo uma linha perpendicular. A pressão é leve e rítmica (como todas as manobras devem ser). O objetivo é evacuar a linfa e é obrigatória sobre as regiões dos gânglios. Podem ser feitos movimentos de bomba (pressiona e solta) ou circulares no local. Dependendo do local, pode ser feita com todos os dedos juntos ou com os dedos de uma mão sobre a outra.
São realizados movimentos circulares usando todos os dedos unidos (exceto polegar). Objetiva captar a linfa e é realizada no sentido ou em direção às vias linfáticas. A pele é deslocada sob os dedos, ou seja, os dedos não deslizam sobre a pele. Os círculos devem ser leves, rítmicos e obedecer a uma pressão intermitente na área edemaciada no sentido do fluxo. Recomenda-se executar de 5 a 7 movimentos no mesmo local.
Realizada da mesma maneira que a anterior, só que apenas com o polegar.
É a manobra de círculos com os dedos não excluindo o polegar.
Mais utilizada em edemas de grandes áreas. Pode ser feita com uma ou as duas mãos e consiste em pressão em bracelete que visa ao aumento do fluxo linfático em direção aos linfonodos da região. As pressões são intermitentes (pressiona e solta sucessivas vezes). A fase de pressão leva cerca de dois segundos e o relaxamento com a mesma duração.
Aspectos fundamentais que devem ser considerados na execução das manobras de drenagem para garantir os efeitos fisiológicos em ambos os métodos:
A linfa deve ser encaminhada em direção aos linfonodos e obedecer ao trajeto dos vasos linfáticos. Preferencialmente, devemos optar por não tratar apenas uma região do corpo e sim o corpo todo, pois o sistema linfático deve ser estimulado em sua totalidade.
Deve ser muito suave e superficial, pois a maioria das estruturas linfáticas são superficiais. Não deve causar hiperemia na pele, pois esse é um sinal de aumento do aporte sanguíneo, que resulta em maior filtração. Portanto, aumento da quantidade de líquido no tecido. Essa situação que muitas vezes buscamos na massagem, mas na drenagem é o oposto do que queremos. Além disso, devemos considerar a resistência ao fluxo, pois quanto menor o vaso maior a resistência. Manobras muito firmes podem lesar os filamentos de ancoragem e muito leves não produzem o efeito desejado. Não existe uma descrição “ideal de pressão”, ela deverá ser adaptada dependendo da situação.
Deve ser lento, pois a linfa se desloca muito devagar. Assim, deve-se considerar um ritmo de um segundo por manobra. Trabalhar de forma rápida não faz sentido com a fisiologia dos vasos linfáticos, onde a linfa caminha lentamente.
O tratamento sempre começa com um pré-tratamento proximal. Com ele, cria-se um espaço proximal para o líquido do edema situado em local mais distal. No decorrer do tratamento, o líquido pode então fluir do tecido edemaciado para a região previamente preparada e de lá pode ser transportado. Por exemplo, para tratar um edema na região do pé, inicialmente deve ser tratada a região inguinal e os vasos linfáticos da coxa e somente depois começar com o tratamento da região realmente congestionada.
O aumento da atividade circulatória persiste durante um determinado período após a aplicação da DLM; consequentemente, após um tratamento sempre deve existir a possibilidade de um repouso, de preferência em uma posição que favoreça o fluxo.
A DLM tem alguns efeitos distintos em nosso organismo:
Efeito defensivo: melhora a resposta imunitária.
Efeito neural: estimula o sistema nervoso autônomo, funciona como sedativo e atua diminuindo a dor na região manipulada.
Efeito muscular: o toque leve nas fibras musculares esqueléticas tem efeito relaxante, e sobre a musculatura lisa potencializa o funcionamento.
Efeito drenante: drena toxinas e excesso de líquido intersticial.
A DLM gera efeitos fisiológicos importantes. O fisioterapeuta deve conhecê-los para optar pela indicação ou não da técnica. Dentre os efeitos, podemos citar o aumento do fluxo linfático e a velocidade de filtração da linfa, pela estimulação dos capilares linfáticos. Consequentemente, temos a produção e a renovação das células de defesa, beneficiando a imunidade. A pressão exercida no tecido atua também na circulação sanguínea, aumentando a filtração e a absorção no sistema sanguíneo. Por ser lenta e suave produz relaxamento. Há também a melhora da nutrição celular e da oxigenação dos tecidos, assim como o aumento da quantidade de líquido filtrado é excretado e ocorre a eliminação do ácido láctico.
A função principal da DLM é estimular o sistema linfático na eliminação de líquidos e resíduos metabólicos. Dessa forma, é indicada em todas as condições em que ocorre estase capilar e formação de edema. As principais indicações são: edemas e linfedemas, celulite, pós-operatório de cirurgia plástica, insuficiência venosa crônica, obesidade, mastodinia (tensão mamária sentida pela mulher durante a fase de ovulação e menstruação), tratamentos de redução de medidas, tratamentos de acne, tratamentos de acompanhamento gestacional.
São apresentadas contraindicações absolutas e relativas. As contraindicações absolutas são aquelas que colocam em risco a saúde e a vida do paciente e que, por esse motivo, não devem ser ignoradas. Na presença de uma insuficiência cardíaca descompensada, a DLM está absolutamente contraindicada. Isso significa que um edema cardíaco nunca deve ser tratado com DLM ou enfaixamento. Inflamações agudas, provocadas por microrganismos (bactérias, fungos, vírus) também são contraindicações absolutas. Eles podem ser disseminados com a DLM, desencadeando uma sepse. Pelo risco de causar descolamento de trombo, a trombose venosa profunda aguda também tem contraindicação absoluta. Por outro lado, os linfedemas malignos, provocados por um câncer ativo, são contraindicações relativas. Outras contraindicações relativas são aquelas situações em que a aplicação da técnica traz benefícios maiores que os riscos para a saúde do paciente, mas devem ser analisadas com cautela caso a caso. São elas: neoplasias tratadas, cardiopatias em geral, diabetes descompensada, hipertensão arterial descompensada, hipo ou hipertireoidismo compensado por medicamento, hipotensão arterial (pressão baixa), mulheres em período menstrual com fluxo intenso, pele com lesões (irritações, pequenos ferimentos), asma e bronquite e inflamação crônica.
FÖLDI, M.; STRÖSSENREUTHER, R.H.K. Princípios de Drenagem Linfática. 4. ed. Editora Manole, 2012.
OLIVEIRA, R.F.D. Drenagem linfática. 1. ed. Porto Alegre : SAGAH, 2018.
SIMÃO, D., et al. Massoterapia. 1. ed. Porto Alegre : SAGAH, 2018.
VASCONCELOS, M.G.D. Princípios de Drenagem Linfática. 1, ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2015
VERSAGI, C.M. Protocolos Terapêuticos de Massoterapia: Técnicas Passo a Passo para Diversas Condições Clínicas. 1. ed. Barueri: Editora Manole, 2015.
Coordenação e Revisão Pedagógica: Claudiane Ramos Furtado
Design Instrucional: Gabriela Rossa
Diagramação: Vinicius Ferreira
Ilustrações: Rogério Lopes
Revisão ortográfica: Ane Arduim