Teorias da conspiração, falsas acusações e discursos infundados são algumas das justificativas que emergiram junto à pandemia do novo coronavírus detectado inicialmente na China e circulante ainda potencialmente no cenário atual.
Tudo isso, advém de uma reação primária que perpassa desde governos a indivíduos que preferem ignorar a presença do vírus em vez de aceitar a realidade, para a partir daí, buscar soluções que visem a normalidade.
O primeiro indício desse negacionismo surgiu no país em que o novo coronavírus encontrou condições favoráveis para se disseminar: a China. Acusada por muitos países de ter efetuado uma divulgação tardia sobre o surgimento do novo vírus. Isso se dá não só pelo regime opressivo de liberdade de imprensa, como também pela negação da potencialidade da doença em um primeiro momento.
No entanto, pensar de forma isolada nos leva à transferência de responsabilidade, além de gerar polarizações e ataques xenofóbicos como vem ocorrendo com o Estado Chinês.
Pensar no negacionismo da Covid-19 como um todo, requer assumi-lo como um evento imprevisível que poderá alterar o curso da vida das pessoas sem que possamos controlá-lo sozinhos.
É o caso de países como Belarus, país da Europa com único campeonato de futebol ativo, no qual o presidente afirma não vê o vírus no ar e por isso não aplica medidas de combate à doença. Em contrapartida, Belarus apresenta um grande índice de crescimento de infectados.
Outro exemplo é o caso do Turcomenistão, país de regime autoritário considerado um dos Estados com menor liberdade de expressão. O governo além de buscar erradicar informações sobre o coronavírus trabalha para a proibição da circulação do nome da doença, que deve ser referida como “enfermidade ou doença respiratória”, segundo a Rádio Free Europe.
Tal atitude escancara o descrédito na ciência, na pesquisa e no jornalismo, áreas com profissionais que trabalham arduamente para o registro de fatos e informações mais próximas possíveis da realidade.
Caracterizações como “gripezinha, histeria e resfriadinho” revelam não só a subestimação do saber científico como também retira as particularidades da doença e seu poder de mortalidade em massa. Nesse sentido, podemos traçar o negacionismo como um atributo de discursos autoritários, que podem ser notados desde o Oriente ao Ocidente, como é o caso dos Estados Unidos, em que o presidente, Donald Trump, chegou a afirmar que o vírus se compararia a uma “gripe comum” que desapareceria com o “calor da primavera”.
Decretada como pandemia pela OMS, a doença provocada pelo novo coronavírus, levou diversos países a aplicarem medidas de contenção visando reduzir o contágio entre pessoas. Nesse sentido, ações como isolamento e distanciamento social, uso de máscaras e limitação da circulação de pessoas, passaram a ser comuns em grande parte dos países do globo.
De acordo com o Mapa de isolamento Social, São Paulo, epicentro da doença no Brasil, apresentou na quarta-feira (01) de Julho, taxa de isolamento de 38,3%, enquanto a taxa recomendada pelas autoridades sanitárias é de 70%. Uma das causas desse baixo índice reside também na negação do cumprimento das políticas públicas e recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS). Aglomerações, realização de eventos isolados, praias cheias, são exemplos de como uma grande parcela da população brasileira despreza a gravidade da pandemia de Sars-Cov2.
Salienta-se ainda que grande parte desses descumprimentos se constrói sob a perspectiva da pós-verdade, a qual leva pessoas a criarem uma realidade paralela e distorcida, que muitas vezes é produzida ou sustentada pelo próprio governo.
Esse comportamento encontra respaldo não só cultural como também religioso e ideológico. Uma vez que nos encontramos imersos em um momento de ataques às instituições de produção de conhecimento, além de investidas contra veículos de comunicação.
Tendo em vista as análises apresentadas que buscam contextualizar o negacionismo do macro ao micro, cabe apresentar como a China, que foi citada pela OMS como país exemplar em medidas de combate ao coronavírus, teve que lidar com essa mudança de mentalidade na administração do surto sendo possuidora da maior população mundial.
Apesar da divulgação tardia e o crescimento exponencial da doença, as ações desenvolvidas pela China, país mais populoso do mundo, passaram por um amplo processo de reconhecimento situacional em nível local e mundial. Todas as medidas e todos os esforços desenvolvidos por ela até então, evidenciam que um Estado que trabalha aliado à ciência, é capaz de fortalecer suas estruturas, conscientizar a população acerca da melhor forma de lidar com a crise e, principalmente, transformar sua realidade.
Sob essa perspectiva, cabe enfatizar que o sucesso das respostas à pandemia é mais próximo quanto mais rápido ocorrer a aceitação dos fatos, os quais só poderão ser solucionados mediante um planejamento amplo e organizado do aparelho Estatal. Ademais, verifica-se também a interdependência entre as esferas estatal e civil, que devem agir conjuntamente para que os efeitos surtidos sejam visíveis em maiores dimensões. Só assim, o negacionismo deixará de ser mais um obstáculo em tempos de pandemia.
Suzan Vitória R. Souza é discente de Relações Internacionais pela Universidade Federal de Goiás, membro do projeto Política em um mundo em transformação, e possui interesse de estudo na área de Meio ambiente e Sociedade.