Embora a doutrina sobre o castigo vindouro que aniquilará o pecado definitivamente(a) seja bíblica, ela foi desvirtuada por filosofias humanas e posteriormente associada à palavra "inferno", que por sua vez não deveria ter sido utilizada nas traduções bíblicas. A palavra "inferno" é originada do latim "infernum", e alude a um fictício lugar nas profundezas da Terra, onde "almas"(b) perdidas são encaminhadas e submetidas aos infindáveis castigos de demônios. Tanto o vocábulo "infernum" quanto o ensino que ele transmite são totalmente desconhecidos nos textos originais que compõem as Escrituras Sagradas.
Haverá uma punição final destinada aos pecadores que não se arrependeram de suas atitudes maléficas, porém, não há semelhança alguma com as ideias pagãs representadas pela palavra "inferno", que infelizmente tem sido usada para substituir as palavras "sheol", "hades", "geenna" e "tartaroo" presentes nas fontes bíblicas originais (escritas em hebraico, aramaico e grego). Estas substituições vêm proporcionando gravíssimos erros doutrinários.
Sheol
A palavra hebraica "sheol", significa: sepultura, cova, túmulo, morada dos mortos (pó da terra), profundeza, escuridão, morte; figurativamente representa a extinção total. Enquanto algumas versões bíblicas utilizam indevidamente a palavra latina "inferno" no lugar de "sheol", outras, como a Nova Versão Internacional (NVI), mantêm a tradução vinculada diretamente ao texto original:
Hades
Deixando à margem os mitos pagãos que são relacionados à palavra grega "hades" e centralizando no seu significado etimológico, ela, à semelhança de "sheol", refere-se a: sepulcro, cova, sepultura, escuridão, região escura, morte. E, assim como ocorreu com "sheol", a palavra "hades" foi substituída por "inferno" em diversas traduções bíblicas. Entretanto, outras, como a NVI, mantiveram-na conforme os manuscritos originais:
Geenna
![]() A palavra grega "geenna" está diretamente vinculada ao hebraico "ge-hinnom", que por sua vez significa "vale de Hinom". Este vale, situado a sudoeste de Jerusalém, era utilizado pelos canaanitas para oferecer sacrifícios humanos, especialmente crianças, ao deus Moloque. O local específico do vale de Hinom onde eram realizados esses ritos macabros chamava-se Tofete (Levítico 20:1-5; II Reis 23:10; Jeremias 32:35).
Posteriormente, a antiga Jerusalém utilizou esse local como incinerador de lixo, cadáveres de animais, indigentes e criminosos. E por causa deste propósito o fogo era mantido constantemente aceso com o auxílio de enxofre. Todavia, em alguns casos, os corpos eram arremessados em locais desprovido de fogo e os vermes os utilizavam como alimento. E o profeta Isaías ao concluir o seu livro, mencionou as cenas de Hinom: "Sairão e verão os cadáveres dos que se rebelaram contra Mim; o verme destes não morrerá, e o seu fogo não se apagará, e causarão repugnância a toda a humanidade." (Isaías 66:24 NVI).
Com o passar do tempo, o vale de Hinom tornou-se um símbolo de maldição e terror entre os judeus. E Jesus narrou para eles o destino dos ímpios utilizando o terrível cenário deste vale:
O cenário de "geenna" foi usado por Jesus para representar o "lago de fogo e enxofre" do juízo final, onde serão lançados aqueles que tiveram seus nomes eliminados do livro da Vida (Apocalipse 20:15 cf. Apocalipse 19:20). E em Marcos 9:47-48 observa-se o emprego de figura de linguagem, pois não existe verme imortal e fogo que não se apaga. O verme e o fogo de "geenna" que foram citados por Jesus, dependiam de fatores externos para existirem, e estes fatores eram o lixo, os cadáveres e o enxofre lançados no vale de Hinom ou Geena. Ao findar (esgotar) as condições que os mantinham, consequentemente, eles deixaram de existir. O "fogo" de Sodoma e Gomorra auxilia a esclarecer esta questão:
![]() Estes versos esclarecem que os habitantes das referidas cidades receberam como punição, a completa ruína; eles foram reduzidos às cinzas por causa de seus pecados e se tornaram exemplo do que ocorrerá no "lago de fogo e enxofre" descrito no livro de Apocalipse. As populações dessas cidades não estão sofrendo neste exato momento sob um "fogo contínuo" ("fogo inextinguível") pois elas deixaram de existir, entretanto, as consequências do fogo permanecem pela eternidade. O fogo perdurou enquanto aquilo que o mantinha ativo existia. Embora o fogo de Sodoma e Gomorra tenha findado, permanece o resultado de sua atuação - a perdição (destruição) eterna para aqueles que foram submetidos a ele. Este é o sentido da figura de linguagem de "fogo eterno".
Portanto, nota-se que não há nenhuma relação entre as palavras "infernum" e "geenna". O vocábulo latino "inferno" está associado à fábula de um lugar conhecido como o "submundo", e que estaria envolto por chamas infernais com o intuito de promover sofrimento insuportável aos ímpios pela eternidade. A palavra "inferno" representa ideias pagãs e não possui vínculo algum com os textos originais que formam a Bíblia, ela diverge por completo do significado de "geenna". E os versos bíblicos onde a palavra "geenna" foi trocada por "inferno", na maioria das traduções, são: Mateus 5:22, 29 e 30; Mateus 10:28; Mateus 18:9; Mateus 23:15 e 33; Marcos 9:43, 45 e 47; Lucas 12:5; Tiago 3:6.
Tartaroo
A palavra grega "tartaroo", significa: "posição sombria"; "região tenebrosa"; "situação de trevas". Embora "tartoroo" não tenha vínculo com as palavras "sheol" e "hades", ela pode ser associada com "geenna" em relação aos acontecimentos futuros que estão reservados, também, aos anjos caídos. A palavra "tartaroo" é utilizada unicamente em II Pedro 2:4 e, assim como ocorreu nos casos anteriores, ela foi erroneamente substituída pela palavra "inferno". Porém, algumas traduções, como por exemplo a Bíblia de Jerusalém (BJ), optaram pela permanência do original:
Pedro não relacionou a palavra "tartaroo" com as ideias pagãs que os gregos(c) mantinham e, tampouco, com o conceito popular dos judeus(d). Ele também não associou "tartaroo" com a existência de lugares especiais no submundo onde os anjos malignos estão presos. A palavra "tartaroo" foi usada para descrever a condição em que os anjos caídos se encontram enquanto aguardam o juízo de Deus (Apocalipse 20:10 cf. I Coríntios 6:3). O verso de Judas 1:6 auxilia a compreender esta questão:
Os anjos caídos estão presos por circunstâncias espirituais. Eles não possuem mais a presença de Deus em suas vidas, estão para sempre afastados da condição espiritual que desfrutavam no Céu antes de se rebelarem contra o Criador. Eles encontram-se envolvidos em "abismos espirituais" (profundas "trevas espirituais") e habitam entre a humanidade; porém, em uma dimensão espiritual (atmosfera espiritual, Efésios 6:12; Lucas 11:24-26). Tais criaturas vagueiam pela Terra atormentando e subjugando os homens (Mateus 8:28-34; Lucas 4:33-37; Efésios 6:11-12) sob a liderança de Satanás (Jó 1:1-12; Zacarias 3:1-2; Mateus 4:1-10).
Os anjos malignos aguardam a punição descrita em Mateus 25:41 (cf. Apocalipse 20:10). Eles não estão, como alguns ensinam fundamentados no conceito pagão de inferno, isolados e acorrentados sob infindáveis castigos, ou, torturando os ímpios numa região infernal. As "correntes" que os prendem não são literais, mas simbolizam a condição espiritual que os cercam e as restrições impostas a eles (I Pedro 1:3-5 cf. Efésios 6:10-12, II Pedro 2:11), e tampouco poderiam ser eternas, pois aproxima-se o dia em que eles serão exterminados e tais "correntes" perderão o seu propósito e a qualidade de "eternas".
a. Acesse: Inferno: Tormento Eterno?
b. Acesse: Mortalidade da Alma
c. Segundo a mitologia grega, Tártaro é um local situado abaixo da região do Inferno (infernum); é considerado o local mais profundo do submundo onde os deuses mitológicos prendem e torturam seus inimigos em calabouços. Ainda de acordo com o mito grego, Tártaro seria o oposto de um paraíso chamado Elysium.
d. A concepção que os judeus tinham de Tártaro originava-se do livro de Enoque (literatura apócrifa). Nele, Tártaro é apresentado como uma região no submundo onde Azazel e seus anjos estão presos aguardando o julgamento final. E, um arcanjo chamado Uriel seria o responsável em supervisioná-los (I Enoque 10; I Enoque 20).
Outros estudos:
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