3.2.4

 3.2.4 Trajetórias formativas da amostra

 

Um momento seguinte de análise dos dados constituídos se concretizou no último encontro do curso, que possibilitou identificar algumas das trajetórias formativas dos professores participantes, mediante questões que eram levantadas coletivamente, mas respondidas por escrito individualmente, sem identificação nominal, embora ocorressem oralmente comentários eventuais durante o tempo que lhes era concedido para escrever. A única identificação do sujeito nas respostas dadas aos questionários, constituiu-se na idade, tempo de experiência como professor(a), série(s) que leciona atualmente, e o curso de formação (graduação). Esta solicitação de identificação, embora tenha sido também efetuada no primeiro encontro, indicou sensíveis diferenças nos dados pessoais da amostra entre o primeiro e último encontro, uma vez que houve desistências, ingressos posteriores de membros, e faltas ao longo do curso. Porém, conforme já comentado nos parágrafos anteriores, isto não provocou alterações significativas quanto à caracterização geral da amostra, conforme mostra o quadro comparativo abaixo, não afetando sensivelmente os resultados da análise, seja sob o aspecto quantitativo ou qualitativo.

Tabela 16 – Tabela comparativa da amostra nos momentos inicial e final do curso.

As questões apresentadas à amostra na ocasião do último encontro foram elaboradas norteando-se na fundamentação, já discutida no capítulo inicial, sobre as trajetórias formativas docentes e seus processos de formação, tal como descrita em Pacheco (1995), Tardif (2004), Huberman (2000), Garcia (1999) e Silva (2000). Acreditamos que tais elementos possam lançar luz a respeito de detalhes formativos da amostra, que não transpareceram durante os encontros e as transcrições das filmagens. Estas questões, que utilizamos para o levantamento das características formativas da amostra, são apresentadas no apêndice 05, clicando aqui.

Passemos a considerar uma análise geral das respostas e como estas podem vir a se constituir em uma fonte essencial de informações para a compreensão das trajetórias formativas docentes em que os professores da amostra se encontravam durante os encontros, e das quais já vivenciaram, inclusive com momentos marcantes e influenciadores em sua prática profissional atual.

Todos os professores da amostra expressaram apreciar o trabalho docente, com seis ressalvas remetidas a situações cotidianas, mediante a utilização de inflexões discursivas subseqüentes às afirmações positivas à esta pergunta, tais como: “mas”, “ainda que” e “apesar de”, seguidas de lamentos como: “são muitos motivos para desanimarmos”, “não consigo desenvolver minhas aulas”, “políticas públicas desanimam”, “hoje, não consigo ser professora”, “fico muito triste”, “aprendi a gostar de ser professora”, “atuais condições desanimam”, “angústias do dia a dia”, “atualmente está difícil”, “inúmeras situações que dificultam”, “deixando de fazer o nosso papel para ser tantas outras coisas”. Acompanhando a positividade nas respostas, excertos explicativos apontam para o comprometimento com a atividade docente: “uma das melhores coisas da minha vida e amo esta profissão”, “verbo ensinar é o melhor de todos”, “muito gratificante”, “é um bonito ofício”, “caso tivesse de recomeçar, seria novamente professora”, “satisfação e prazer no que faço”, “ensinar algo a alguém é uma idéia enriquecedora”, “realizo minhas aspirações”, “sirvo como um exemplo para meus alunos”, “gosto”, “aprecio o conhecimento e trabalhar com ele”.

Baseando-se em Huberman (2000), os professores puderam optar por uma ou mais situações que mais se identificassem de maneira sincera em sua trajetória profissional docente (através da segunda questão, conforme apêndice 05, clicando aqui). Conforme já demonstrado em capítulos anteriores, as trajetórias docentes estão ligadas com fases formativas que podem ocorrer simultaneamente, de modo que não parecem ser tão bem definidas e seqüenciais, como parecem sugerir alguns autores estudados por Pacheco (1995), Garcia (1999), e Huberman (2000). A tabela 01, apresentada anteriormente, sobre as aproximações possíveis das diferentes trajetórias formativas docentes, e suas principais fases, segundo mencionadas por alguns autores da área, estabelece relações entre elas e os anos de experiência docente, e/ou o tempo de vida do professor.

Observando esta tabela, as trajetórias docentes, identificadas por Huberman (2000) e Pacheco (1995), seguem uma seqüência lógica, que segundo os autores, depende do tempo de experiência na profissão, formando um ciclo de vida profissional, iniciando-se com a entrada na carreira (quando o professor está descobrindo e explorando para a sobrevivência), sendo este um período crítico, ou “fase crítica”, conforme Tardif (2004), incluindo o “choque da dura realidade” (que pode durar até três ou sete anos de carreira). Nesta etapa formativa, o professor iniciante possui idealismos e sonhos para mudar situações (PACHECO, 1995), quando, então, vai ocorrendo, aos poucos, uma estabilização (HUBERMAN, 2000). A seguir, os próximos “estados da alma” do professor, segundo Huberman (2000), ocorreriam na seguinte seqüência cronológica e dependente do tempo de profissão: diversificação e questionamento (quando o professor toma consciência das dificuldades reais da escola e procura diversificar métodos e materiais de ensino); lamentações e queixas (aprendendo a aceitar o fracasso, podendo socializar ou não os seus problemas), serenidade e distanciamento afetivo. Por último, o desinvestimento com relação à carreira.

Esta seqüência foi representada através dos itens de a) a j) desta segunda questão do levantamento, porém, sem seguir a mesma ordem, propositalmente, a fim de não induzir consciente ou inconscientemente as escolhas, de modo que a ordem que obedeceria a seqüência apresentada pelos autores citados seria, numa primeira etapa formativa, a) d) e), seguida por b) f) g), depois por i) c) h), finalizando por j), segundo as suas descrições. Assim, seria de esperar que um cruzamento entre as etapas formativas que os professores acreditam estar passando, e seus respectivos tempos de experiência, resultaria suma seqüência similar. Na tabela 17, representamos os professores em ordem crescente de anos na profissão e a quantidade de respostas assinaladas para a trajetória docente correspondente (referente à segunda questão, conforme apresentada no apêndice 05, clicando aqui).

Conforme indicam os dados quantitativos, as trajetórias de vida profissional h) e j) não foram escolhidas por nenhum sujeito da amostra, o que é confirmado pela fundamentação teórica desta pesquisa. Opções tais como c), g) e i) esperaríamos encontrar apenas em professores que estivessem mais avançados em seu tempo de carreira, e a), d) e e) em docentes com pouca experiência. Os itens b), f) e g) estariam em uma posição intermediária.

Tabela 17 – Tabela comparativa entre idades, tempo de experiência e situações formativas.

No entanto, em nossa amostra, o item a) foi assinalado até mesmo por professores com mais de dez anos de carreira, ao passo que docentes no início de carreira optaram pelo item c), g) e i), indicando um atraso no amadurecimento do trajeto profissional, através das expressões “monotonia”, “fracasso” e “queixas”, que deveriam ocorrer apenas em etapas formativas posteriores, segundo apresentado pelos autores de nossa fundamentação. Assim, todas as respostas indicam uma consciência dos problemas existentes na escola e um grau de idealismo, tentando diversificar materiais e métodos de ensino. Outra situação mais freqüente entre as respostas foi o questionamento sobre o seu próprio trabalho, alegando monotonia das aulas, com constantes reclamações sobre seus alunos e da política educacional. Nenhum dos professores parece sentir serenidade e distanciamento afetivo, com a perda de ambição e aceitar a realidade, sem o interesse de investir em sua carreira. A escassez de escolhas para o item e) indica que os professores não se sentem emancipados e independentes, voltados para um trabalho com autonomia.

Caso uma amostra de professores considerados novatos fosse submetida a esta questão, o resultado aguardado seria, segundo os autores utilizados para esta fundamentação, uma ordem decrescente de quantidade de respostas para os itens da questão 2, conforme já comentado: adebfgichj, pois docentes com pouca experiência optariam mais por itens tais como a), d) e), e menos por itens tais como h) e j). O inverso seria verdadeiro para uma amostra com maior tempo de experiência (analisar a tabela 01 com as aproximações das trajetórias formativas docentes, conforme os principais autores da área). A nossa amostra, apesar de ser composta de sujeitos com tempo de serviço variando desde três anos até 20 anos, parece ter se comportado como uma de pouca experiência docente, pois uma rápida análise nos totais da tabela anterior, resultaria na seguinte ordem dos itens assinalados: abfgicdehj (do maior número de respostas para o menor). Note-se que a seqüência é muito semelhante a anterior, a não ser pelo fato de que o conjunto formado pelos itens d) e e) posicionam-se próximo da extremidade final da seqüência, como se estivessem deslocados, visto que seu lugar adequado à fundamentação teórica deveria se localizar antes do item b).

 

 

Assim, o previsto, a(de)bfgichj, foi sensivelmente diferente do encontrado, abfgic(de)hj, indicando um adiantamento de “estados da alma” (HUBERMAN, 2000), ou etapas formativas, que mostram uma tomada de consciência das dificuldades reais da escola, diversificação de métodos e materiais de ensino, e o questionamento sobre a importância do seu trabalho, desencantando-se devido à monotonia das aulas. Podemos inferir que estas etapas antecedem ao esperado, talvez devido a alguma relação com a situação em que diferencia o professor brasileiro no contexto nacional com os pesquisados pelos autores considerados, uma vez que os problemas e dificuldades da escola e das políticas públicas atrasam a sua autonomia. Também há de se levar em conta o perfil do indivíduo que faz uma leitura subjetiva das questões, nem sempre as interpretando da maneira como foram idealizadas pelo pesquisador, o que poderia influenciar nos resultados. Por exemplo, os termos “descobrir e explorar para a sobrevivência” poderiam ser interpretados como ações constantes do educador comprometido com seu contínuo aprendizado, e esta seria uma trajetória ativamente presente em toda a história do indivíduo, independendo de seu tempo de carreira, embora Huberman (2000) as tenham identificado apenas com a fase da “entrada na carreira”.

Em suma, nossos professores possuem o perfil de precocemente apresentarem suas lamentações e queixas, precedendo a uma estabilização na carreira e emancipação por meio da autonomia docente, contrariando as seqüências apresentadas pelos resultados de Huberman (2000) e Garcia (1999), por exemplo, onde o professor “experiente lamentador” se enquadraria apenas nos últimos anos da carreira. Talvez, a analogia que Lacey, em Pacheco (1995), apresenta como seqüência resumida de trajetórias seja a mais plausível para a nossa amostra: lua de mel, crise e adaptação, significando que, no início, o professor inexperiente possui idealismos e sonhos para mudar situações; depois de alguns anos, vai tomando consciência das dificuldades reais da escola, e por fim aprende a aceitar o fracasso, podendo socializar ou não os seus problemas, ou seja, apresentar suas insatisfações. As queixas e o desencanto, no caso de nossa amostra, parecem acompanhar o inteiro “casamento” entre o profissional e a profissão, e não se encontrariam apenas na etapa de “crise pós-lua-de-mel”.

Ampliando esta analogia: assim como futuros cônjuges a serem unidos pelo matrimônio, a profissão docente às vezes parece escolher o futuro profissional, e outras vezes, a pessoa é quem escolhe a carreira de professor. Por outro lado, há situações na história de vida do sujeito em que não há como efetuar escolhas, e o trabalho docente lhe é imposto, como um casamento “forçado e sem amor”. Sob este aspecto, o fator da afetividade com relação à profissão está bastante presente nas enunciações da amostra, como já demonstrado e analisado nos parágrafos anteriores. De fato, a opção em atuar no ofício de professor pode partir de trajetórias de vida localizadas na própria infância do indivíduo, quando certos momentos e pessoas podem ser determinantes em escolhas desta natureza, conforme mostram Silva (2000), Pacheco (1995), Tardif (2004) e Garcia (1999). Isto pode ser interpretado por alguns profissionais da educação como um fator intrínseco quando questionados sobre a razão da escolha da carreira docente, como se sempre estivesse presente em seu íntimo.

É o que parece transparecer algumas das respostas da amostra: “desde muito pequena já brincava de escolinha”, “ser professora já era talvez um fator intrínseco”, “minha brincadeira favorita era brincar de ser professora e me encaixei bem sendo educadora”, “tinha sempre pessoas dizendo que eu teria jeito pra lidar com crianças”, “eu via a minha professora, admirava-a e queria ser igual a ela”, “quando criança, brincava de escolinha e dava aula para alunos imaginários”, “desde criança eu ajudava as filhas dos vizinhos a fazer tarefas”, “por brincar de escolinha quando criança”, e “eu sonhava em alfabetizar a minha avó”, “via uma magia na profissão”. Porém, outras situações vivenciadas pelos professores da amostra mostram que a escolha foi realizada sob um contexto bem distinto: "minha familia me incentivou", “no início, acho que não gostava, mas aprendi a gostar daquilo que faço ao longo dos anos”, “fiz magistério por falta de opção”, “por questões financeiras era o curso mais acessível”, “apesar de não desejar primeiramente ser pedagoga, sempre considerei a possibilidade”, “eu morava em uma cidade pequena e a única formação oferecida era o magistério”, “por morar em uma cidade onde não tinha muita escolha“, “gostaria de ter sido dentista, mas não tinha condições financeiras”, "minha família só desencorajou, devido ao salário“, "como toda menina, aceitei a idéia de fazer o magistério”, e “quando me decidi por essa carreira, a situação era outra”.

Estes recortes exemplificam os diferentes rumos que as trajetórias docentes podem tomar, bem como suas distintas origens. No entanto, estas etapas pessoais contribuíram para formar um conjunto de características individuais bastante influentes em seu modo de trabalhar com os alunos, pois, segundo Silva (2000), tudo o que acontece com o professor (ou bem antes de se decidir ingressar nesta carreira), com suas experiências idiossincráticas, se tornam o pano de fundo de seus pensamentos e ações profissionais, contribuindo para as suas crenças adquirirem significados ao longo dessas experiências, de modo que acabará acreditando que a sua atuação é o melhor modo de fazê-lo.

De modo similar, e concordando com Tardif (2004) e Pacheco (1995), há a influência que os professores de infância podem ter exercido enquanto os sujeitos da amostra eram ainda alunos em trajetórias formativas anteriores à sua opção pela carreira docente. Duas das perguntas apresentadas aos professores da amostra (apêndice 05, clique aqui) abrangem esta incorporação de características de determinados professores de sua infância ou juventude. Primeiro, a pergunta: “enquanto aluno(a), qual professor mais marcou você? Por que?” visou levantar apenas marcas deixadas por algum profissional da educação durante a trajetória de vida pessoal dos indivíduos da amostra. Após o término de suas respostas por escrito, a segunda questão foi lançada, objetivando estabelecer algumas possíveis relações com o destaque mencionado para o professor “marcante” da questão anterior. A segunda pergunta era: “diante da diversidade de professores e inúmeros estilos de ensinar pelos quais você passou enquanto aluno(a), identifique, se houver, alguma característica que você “incorporou” de um determinado professor seu, e que agora faz parte do seu modo de ensinar.”

Respostas a esta pergunta mostraram a estreita ligação entre os professores marcantes e as atitudes e práticas de ensino atuais dos docentes da amostra, apesar de apenas uma das respostas enfatizar não ter incorporado nenhuma característica de seus professores. Podemos classificar esta produção textual, sob à luz da análise do discurso, como um esquecimento de primeira ordem (ORLANDI, 2002), quando o sujeito ilusoriamente denota ser a fonte de sua enunciação, uma vez que ele pode ter, de fato, incorporado características de seus educadores do passado, porém, sem se dar conta disso. Por outro lado, a resposta de outro sujeito da amostra apontou para um dizer localizado em outra extremidade discursiva, ao mencionar que incorporou “todas as características” de seu professor marcante.

Um dos sujeitos identificou uma professora de história, enquanto ainda cursava a 5ª. até a 8ª. série, pois ela desafiava os alunos a aprender, construindo o conhecimento, embora a maioria dos alunos não gostasse deste método e de sua exigência, com cobranças constantes pelo interesse. Ficou marcado para este professor de nossa amostra um fato ocorrido durante a sua 6ª. série, quando esta professora exigiu a leitura de um livro (o professor citou o nome completo do livro) e o seu resumo, com a lembrança de que o mesmo era enorme. Sua resposta à segunda pergunta mostra que tal sujeito, atualmente, também se considera exigente para com seus alunos, identificando todos os professores que lhe marcaram como sendo exigentes.

Outro relato é sobre a primeira professora de matemática no curso de Magistério de um dos indivíduos da amostra, justificando que ela foi fundamental em sua aprendizagem, pois havia tirado uma nota indesejável em uma primeira prova. Esta professora chamou-o individualmente e lhe questionou sobre algum problema em específico, passando, em seguida, uma lista de exercícios, ensinando todo o conteúdo. Isto foi tão marcante, que hoje ele se considera com a característica de ser flexível, neste sentido, com a forte tendência de dar uma segunda chance para seus alunos, embora isto não o tenha levado a gostar de matemática.

Um dos sujeitos da amostra relata que o seu professor de história atribuía-lhe uma atenção especial, (transcrevendo sua resposta: “eu era paparicada”), e como conseqüência, estudava com mais dedicação, resultando em boas notas (“só tirava 10”), e por fim, optou pelo curso de Licenciatura em História. Isto demonstra a forte influência de atores escolares vivenciados pelos que escolherão a carreira docente, conforme Tardif (2004). Apesar deste mesmo componente da amostra não estabelecer uma relação direta com o seu professor marcante, classifica o seu próprio trabalho atual como lúdico, e com uma “forma leve de ensinar”, tentando “deixar os alunos à vontade”.

Além destas, alistamos, a seguir, outras características influenciáveis e marcantes que foram encontradas nas respostas dos professores da amostra: exigência, dinamismo, flexibilidade, paciência, calma, tranqüilidade, bom humor, carisma, rigidez, cobrança, autenticidade, rigor, organização, amor, respeito, bom caráter, aparência física, domínio de conteúdo, didática na explicação.

Determinados momentos podem ser significativos durante a trajetória formativa docente, provocando sutis ou profundas alterações na prática de sala de aula do profissional, conforme mostraram os autores comentados na fundamentação dos capítulos iniciais deste estudo. Embora metade da amostra não tenha identificado um episódio de sua vida que tenha influenciado, ou modificado, o seu modo de ensinar, alguns recortes discursivos da amostra apontam para este fato, dentre os quais destacamos uma professora que elevou seus níveis de estresse com uma primeira série do ensino fundamental no ano anterior, “sugando suas energias”, segundo ela. Isto causou uma mudança de reação devido a esta atitude, em que tenta, atualmente, manter a calma, além de “não exigir além de suas possibilidades”. Outro relato vem de uma professora que, ao se casar com um militar, incorporou suas atitudes e personalidade, de modo que ela era requisitada com freqüência, na escola, para resolver ocorrências que envolviam alunos com problemas disciplinares (ela declara o seu apelido no local de trabalho: “sargentão da escola”). Estas etapas vivenciadas com anos ou décadas de antecedência ao seu trabalho docente constituem-se como um pano de fundo. Segundo Silva (2000), o professor é um individuo que constrói, na sua vida e na sua formação, a sua própria visão de mundo, não podendo ser visto como um robô que executa e processa informações. É uma pessoa com crenças que se constituem em um pano de fundo para o seu pensamento ao tomar decisões, como exemplificaram os recortes desta amostra.

Outras situações profissionalmente influenciadoras localizam-se nas trajetórias formativas docentes que podem ser provenientes de sua formação inicial. Para quase toda a amostra, os momentos vividos em um curso de graduação parecem ter influenciado significativamente a sua prática, como é o caso de uma das professoras que relata a interferência total em sua atuação docente após o ingresso na faculdade. Para outros, esta trajetória contribuiu apenas para exercitar técnicas de observação, de reflexão e de auto-avaliação, alterando sensivelmente a prática e a didática. Para alguns, o curso que fizeram não oportunizou orientações sobre procedimentos em sala de aula, permanecendo no embasamento teórico que facilita pouco a prática, concordando com o que Tardif (2004) expõe com relação aos profissionais de etapas inicias da formação de professores: muitos docentes universitários que ensinam os futuros professores nunca estiveram em uma sala de aula do tipo que trabalharão. Um dos professores relata que “quem está lecionando na faculdade está muito distante da sala de aula”. Outros trechos interdiscursivos revelam suas concepções acerca da dialética teoria/prática: "a teoria é muito bonita, mas a prática é totalmente diferente, pois os nossos professores têm o costume de florear muito a didática em sala de aula", "há uma grande distância entre a teoria e a prática", "entrei na faculdade cheia de ilusões, sonhos, depois fui descobrir que a realidade é bem diferente na sala de aula", “na teoria, a prática é outra”, “a formação nos passa muita teoria, mas a prática é bem diferente” e “a teoria é uma coisa e a prática é outra”. Um descompasso entre a instituição formadora e o ambiente do futuro trabalhador poderá colaborar com o surgimento de dificuldades no princípio da atuação docente, ocorrendo o "choque" com a "crua e dura realidade da vida cotidiana da aula”, termos cunhados por Veeman, conforme Pacheco (1995).

Os relatos dos professores da amostra reúnem alguns exemplos destas dificuldades que o professor iniciante vivencia. Uma professora, enquanto estagiária, era requisitada com freqüência para efetuar cópias de provas e trabalhos na máquina fotocopiadora ou no mimeógrafo, e para prestar ajudas de escritório para a secretária e a diretora da escola. Ao faltar os professores efetivos das oito séries do ensino fundamental, ela era chamada, sem antecedência, para substituí-los sem o mínimo de preparação, o que ocorria, segundo ela, quase todos os dias. Um episódio marcante na trajetória formativa desta professora da amostra, que no relato, era ainda iniciante, foi o momento de substituir uma professora de matemática que havia deixado algumas atividades para ser resolvidas, sendo que a professora novata não dominava os saberes disciplinares deste conteúdo, encabulando-se na presença de todos os alunos da sala. Outro relato é um episódio em que a professora da amostra confessa o seu apavoramento em dar a sua primeira aula, juntamente com a pressão psicológica exercida pela diretoria da escola. Alguns professores da amostra também comentaram sobre a resistência dos professores efetivos em receber, em suas salas de aula, estagiários a fim de desenvolver atividades de observação.

Por fim, as dificuldades do professor iniciante, que foram mais relatadas nesta amostra, fazem referência à indisciplina e problemas de comportamento em sala de aula, que parecem tomar o tempo e desviar a atenção do professor com relação à importância de se trabalhar o conteúdo, principalmente quando ocorrem substituições de professores ausentes. Segundo alguns relatos, os alunos “pulavam uns sobre os outros”, “ninguém ouviu a música que a professora se propôs a cantar”, “eles queriam bagunçar”, “só conversavam o tempo todo”, os “alunos acreditam que o substituto é aula vaga”, resultando em insegurança, dificuldade em despertar o interesse, pavor e desespero, conforme seus comentários.

Apesar das dificuldades e do choque inicial, a sala de aula é um importante locus de aprendizagem profissional, quebrando o paradigma da dicotomia teoria/prática, como se a teoria fosse produzida nas universidades e a prática ocorresse nas escolas, como se o professor tivesse de aplicar, durante a sua prática, as teorias produzidas e aprendidas em curso de formação inicial (ZEICHNER, 1993). De fato, há uma parte da aprendizagem da profissão docente que só ocorre e só se inicia em exercício, quando se consolida o processo de tornar-se professor (GARCIA, 1999; GUARNIERI, 2000), mas o conhecer e o fazer, quando tratados de forma dissociada no âmbito da formação profissional, ocasionam limitações e não dá conta dos saberes docentes (BORGES, 2004). Assim, procurando identificar algumas habilidades e competências construídas com a prática do seu próprio trabalho, mas que não foram ensinadas durante um curso de formação, os professores da amostra apontaram como destacáveis: as relações interpessoais (“não podem ser ensinadas, só se aprende com a experiência”), o gerenciamento da diversidade existente em sala de aula, domínio da classe, autoridade, percepção dos alunos e suas necessidades, didática, comunicação.

Ao que indicam estes trechos discursivos, determinadas habilidades e competências, como as exemplificadas acima, somente foram construídas com a prática (e não durante sua formação inicial), enquanto o professor agia de modo autônomo. O documento oficial Referenciais para Formação de Professores concorda com esta premissa ao afirmar que “tudo isso se aprende a fazer, fazendo” (BRASIL, 2002a). Este “aprender fazendo”, segundo Maldaner (2000), remete-se simplificadamente ao practicum reflexivo de Schön (1983 e 1987), e mostra a importância da prática para a formação profissional docente. Isto é um fato que os professores da amostra parecem reconhecer: “cada um constrói a sua própria competência e habilidade através dos anos de experiência”, “tive muitos conhecimentos, mas a prática fui construindo com os anos de trabalho”, “nós vamos construindo essa prática nas experiências do dia a dia”, “saí da faculdade somente com o conteúdo teórico; a prática, aprendi fazendo”. Por outro lado, duas professoras da amostra apresentam uma hipérbole discursiva ao enunciar que todas as habilidades foram construídas por conta própria, subestimando a contribuição teórica da graduação, algo, porém, que outros reconhecem: “não descarto as teorias aprendidas”, “vários episódios e conteúdos me fizeram refletir a maneira de agir e planejar”.

Tais aspectos poderiam ser supridos durante a trajetória formativa inicial, mas alguns trechos discursivos demonstram o papel de uma formação inicial docente deficiente e suas conseqüências, pois “muitos conteúdos que são trabalhados em nosso cotidiano não são abordados pela universidade” e “a formação não nos prepara para a realidade da sala de aula: falta de motivação de alguns alunos, dificuldades de aprendizagem e indisciplina”. Por outro lado, não se pode esperar que poucos anos de graduação possam entregar um profissional completo e pronto para exercer a sua profissão docente, pois a sua formação sempre ocorrerá em serviço, conforme discutido neste trabalho. Um curso de formação inicial constitui-se, portanto, apenas em uma breve etapa formativa, e nunca será completo em si mesmo. Além disso, há o fator da complexidade da sala de aula, a qual impede a antecipação de previsão de todas as situações possíveis que poderiam ser estudadas em um curso inicial, uma vez que o trabalho educacional é singular e contextual, isto é, ocorre sempre em situações específicas (GAUTHIER et al, 1998; PERRENOUD et al, 2001; CONTRERAS, 2002). Isto é exemplificado pelo excerto de um dos professores da amostra: “descobri que não existe receita pronta; cada sala é diferente, cada aula é diferente”, reconhecendo a complexidade que teve de descobrir por conta própria, pois não lhe fora ensinada no âmbito da formação inicial.

Assim, o ato de aprender a ser professor depende, em grande parte, da prática no ofício, algo que poucos anos de formação inicial não garantem (BRASIL, 2002a; TARDIF, 2004; GARCIA, 1999; GUARNIERI, 2000), conforme confirmado pelos seguintes trechos da amostra, ao serem questionados como se deve aprender a ser um professor: “sendo; exercendo a função”, “vivenciando, repensando, reavaliando, replanejando, mudando sempre”, “sendo participativo, cooperador, paciente e procurando entender o aluno”, “quando você vivencia a situação, você aprende a se virar, resolver problemas e analisar o que faz”, “aprende-se na prática”, “é errando e acertando que se aprende”, “aprende-se com as experiências diárias, com os alunos”, “através da prática”, “só se aprende a fazer algo, fazendo”, “só sendo professor, mas com ajuda”, “observando e sendo professor, mas com orientação”. Estes dois últimos recortes, em especial, exemplificam a importância de uma tutoria ou orientação a partir de um mediador especialista ou do professor de graduação, no sentido de acompanhar o trabalho de um professor em início de carreira, refletindo sobre a sua própria prática, conforme indicam, dentre outros, Tardif (2004), Pérez Gómez (1997), Pacheco (1995), Garcia (1999) e Zeichner (1993), comentados na fundamentação teórica.

Este acompanhamento se daria no intuito de ajudar o professorando a exercer sua profissionalidade na prática do ensino, e não com intenções meramente acadêmicas de avaliação, para atribuir-lhe notas. Isto envolveria mais do que uma orientação simplesmente burocrática como a entrega de relatórios ou o preenchimento de formulários de estágios, mas incluiria a discussão em grupo de suas atividades desenvolvidas, bem como suas reações e decisões tomadas em sala de aula diante de determinadas situações, o que contemplaria uma auto-avaliação e reflexão sobre a sua própria prática, com implicações de continuidade desta metodologia.

Esta fase inicial de adaptação ao meio profissional pode levar anos, conforme indicam Pacheco (1995), Garcia (1999) e Huberman (2000), citados no quadro comparativo da tabela 01, o que se comprovou com as afirmações dos professores de nossa amostra, ao serem indagados sobre o tempo de duração para que se sentissem mais seguras em seu trabalho, contando a partir do início de suas carreiras, conforme apresentadas na tabela 18.

É possível estabelecer algumas relações entre o momento em que os docentes se sentem seguros em sua atividade profissional e os seus anos de experiência, pois suas respostas, conforme alistadas na tabela 18, parecem seguir uma ordem crescente ao mesmo tempo em que o tempo de profissão é ordenado também em ordem crescente. Os dados apontam para o indício de que o tempo de profissão afeta a sua própria visão de segurança docente. Ao passo que os dados pessoais dos professores da amostra são ordenados em ordem crescente de tempo de profissão (segunda coluna da tabela), é possível fundamentar algumas considerações, que detalharemos a seguir.

Tabela 18 – Tabela comparativa que aponta para possíveis relações do tempo da segurança pedagógica com a idade, tempo de profissão e curso de formação dos professores da amostra.

 

As idades seguem uma ordem aproximadamente crescente em concordância com a ordem do tempo de experiência, pois quanto maior este último, naturalmente implica em uma idade maior, apesar de haver algumas exceções, tal como o sujeito com 49 anos de idade e 10 anos de experiência, e o sujeito de 45 anos com 13 anos de experiência profissional. Atentando-se às suas formações, nota-se que os sujeitos até cerca de 40 anos de idade possuem apenas um curso de formação inicial, e a partir desta idade, surgem indivíduos que optaram por cursar outra graduação. Não se nota nenhuma relação entre a quantidade de cursos realizados com o tempo que atribuem para se sentirem seguros no trabalho que desenvolvem.

Porém, conforme indica o quadro comparativo, há certa relação entre este tempo e seus anos de experiência. Professores que ainda não completaram cinco anos de trabalho docente afirmaram que não se sentem seguros em sua atividade profissional, ao passo que indivíduos entre 5 e 13 anos de tempo de carreira afirmam ter sentido maior segurança no seu próprio trabalho, somente após um, dois ou três anos. Todas as respostas dos professores com este tempo de experiência foram abaixo de cinco anos, e relacionam-se com os indivíduos com as maiores idades (entre 45 e 49 anos). Entretanto, professores com mais de 15 anos de experiência responderam que precisaram de, no mínimo, cinco anos para adquirir maior confiança e segurança no desenvolvimento das atividades em sala de aula (incluímos na contagem o sujeito de 45 anos de idade e 16 anos de experiência, cuja resposta indica um tempo de mais de dois anos). Resumindo, temos:

Assim, quanto maior o tempo de serviço, maior é o tempo atribuído para se adquirir experiência e, segundo as respostas dos professores da amostra, há um marco aparentemente bem estabelecido de cinco anos. Isto parece concordar com o chamado “período crítico”, ou “fase crítica”, conforme Tardif (2004), incluindo o “choque da dura realidade” (GARCIA, 1992). Esta fase, que pode durar até sete anos de carreira, segundo Huberman (2000) e Pacheco (1995), ou até cinco anos, conforme Tardif (2004), gradualmente atinge uma estabilização (HUBERMAN, 2000). Embora o tempo de estabilização na carreira docente encontrado em nossa amostra concorde com os cinco anos mencionados pelos referidos autores, é notável a relação existente entre a ilusão que os professores possuem quanto à demora em se atingir sua própria segurança profissional, com o seu tempo de experiência. Indivíduos com menos tempo de atividade aparentemente acham que atingem a estabilidade em menos de cinco anos, mas à medida que atingem maiores patamares de tempo na carreira, percebem que começaram a se sentir realmente seguros somente após cinco anos, no mínimo.

Poderíamos denominar este fato de ilusão do tempo de segurança docente, em que o professor aparentemente se sente pedagogicamente seguro em seu trabalho, mas com o passar do tempo, parece se convencer de que ainda não está totalmente estável em sua segurança profissional.

À medida que esta trajetória formativa turbulenta vai sendo sentida pelo professor, ele continuamente acrescenta em seu repertório pessoal as experiências vivenciadas, construindo saberes que lhe serão úteis ao tomar decisões em etapas formativas futuras, ou em situações de sala de aula. Após esta fase de cinco anos (ou durante), o docente pode experimentar sentimentos de angústia, desilusão e desencanto pela carreira (TARDIF, 2004; GARCIA, 1999). De fato, ao serem questionados se já haviam pensado em desistir da carreira docente, cerca de 50% das repostas foram positivas. Estaria este desencanto pela carreira, de algum modo, relacionado com o tempo de serviço? Comparando suas respostas (afirmativas ou negativas) com a idade ou tempo de profissão, não conseguimos estabelecer uma relação específica, talvez indicando que o fato de o professor pensar em parar com as aulas não é afetado com a quantidade de anos de carreira (ao menos em nossa amostra), conforme mostra a tabela 19.

 

Tabela 19 – Desencanto pela carreira docente

 

Assim, o que estaria causando o desencanto por sua profissão? Algumas das possíveis causas pelo desencanto são indicadas por suas respostas, que podem ser classificadas segundo à sua origem:

a) interna, quando obstáculos da própria sala de aula impedem o desenvolvimento de atividades docentes significativas, conforme os seguintes discursos: “entro na sala de aula e os alunos não ligam e nem escutam o que falo, e sinto-me inútil”; “não consegui fazer com que os alunos se interessassem pela escola ou quando a indisciplina é demais; houve momentos que me senti impotente”;

b) externa, quando fatores alheios à sala de aula e vindos “de cima” impõe-se contra o professor e sua profissão: “a graça da profissão acabou, pois não somos valorizadas nem profissionalmente, nem na remuneração”; “tenho uma outra profissão”; “pensei em desistir quando dava aulas em outra cidade e percebi que pagava para trabalhar”; “as políticas públicas só nos desanimam, a impressão que dá é que ninguém valoriza os professores”; “somos cada vez mais massacrados pelas políticas publicas, mas tento desligar isso quando adentro na sala de aula, afinal, meus alunos também são massacrados pela ausência de apoio político, sofrem por omissão e precisam de mim”.

Demonstrando o reconhecimento de um constante aprendizado nesta carreira profissional, a maioria dos sujeitos da amostra apresentou respostas que indicam a necessidade de uma formação continuada: “tenho certeza que não estou como entrei, mas não é por isso que estou acabada ou pronta, por isso, tenho muito a crescer e conhecer”; “temos que estar sempre atualizando e procurando cada vez mais crescer”; “com certeza estou bem melhor que antes, no entanto, tenho muito que aprender, pois sou uma profissional responsável e comprometida, buscando sempre aprender mais e melhorar a prática, favorecendo meus alunos”; “preciso melhorar mais, aliás, temos que estar sempre renovando, reciclando, aprimorando, como, por exemplo, a oportunidade deste curso”; “minha experiência atual ainda está em andamento, pois preciso estudar mais sobre o meu trabalho”.

Outro fator que merece relevância é que se identificou em suas respostas uma forte dimensão afetiva pela profissão, a qual exerce um papel de importância motivadora. Interpretando seus excertos, esta afetividade parece ser o pilar mestre onde se fundamenta o ofício de professor, sobre o qual se constrói o ato de ensinar com suas complexidades de sala de aula, e levando o profissional da educação a uma provável autonomia. Alguns recortes discursivos indicam estas interpretações: “colocando-se no lugar dos alunos (empatia)”; “gostando do que faz”; “vendo, em todas as situações com uma boa dose de afeto”; “boa vontade e bom senso é fundamental”; “a pessoa deve gostar de ensinar”.

Duas professoras da amostra apresentaram, em seu texto escrito, indicações de que entendem a formação continuada como sinônimo de progressão continuada, confundindo estes termos. Outros relatos apontam para algumas concepções que os sujeitos da amostra construíram sobre a formação continuada de professores: “suprir as necessidades que ficaram abertas na formação”; “deve ser uma formação continua feita pelos professores e com a participação de pesquisadores e deve acontecer em universidades e órgãos credenciados e pesquisadores dedicados no processo de ensino-aprendizagem”; “significa novos caminhos e atualizações”; “ocorre com todos nós, nas avaliações que fazemos do nosso trabalho, nos cursos e os responsáveis somos nós e os mediadores”; “são todos os cursos que fazemos para nossa atualização e aperfeiçoamento”; “a formação continuada ocorre nas universidades, nos cursos de pós e nos cursos promovidos pela Secretaria da Educação”; “é o aprender sempre”; “é aquele profissional que está sempre buscando e que quer se aprimorar a cada dia”; “ocorre em cursos, seminários, oficinas, estudos, são responsáveis pela formação o próprio profissional e os órgãos responsáveis através de suas secretarias que oferecem as oportunidades”; “é o momento para estudo, ampliação e atualização de conteúdos”; “pode ocorrer via internet, por meio de universidades e locais diversos”; “pode ocorrer em diversos lugares (própria escola, espaços disponibilizados pelo órgão maior, prefeitura, estado)”; “deveria ser uma constante atualização dos professores, mas quando há, não é oferecido a todos”; “a formação continuada são os cursos que são dados para atualizar os professores em escolas publicas”.

Como indica a análise acima, há diferentes formas de os docentes entenderem o seu desenvolvimento profissional, e consequentemente com diferentes graus de comprometimento com a profissão, devido a posicionamentos distintos na trajetória formativa de cada um. Isto ficou evidente durante os encontros do curso, quando notamos interesses variados da parte dos indivíduos em se envolver e colaborar com as atividades propostas. Identificamos alguns que se dispunham em discutir o tema proposto, outros que ficavam neutros e sem ações e atitudes em colaborar, e uma professora que não se envolvia efetivamente (cochilava durante alguns momentos, não desenvolvendo diversas atividades).

Portanto, o levantamento inicial das necessidades dos participantes de um curso de formação continuada e a caracterização destes professores, pode criar subsídios para o desenvolvimento de programas de educação continuada voltados também para a pesquisa, numa abordagem que já denominamos de metodologia para o ensino e pesquisa em programas de formação continuada (MEPPFOCO). Por isso, é preciso pensar antecipadamente no professor participante como pessoa, sob uma abordagem humanista, com dimensões além das profissionais, como mostraram os resultados do levantamento das trajetórias formativas dos sujeitos desta amostra, quando procuramos caracterizá-la sob diferentes critérios, levando em conta aspectos pessoais, formativos, emocionais, profissionais, motivacionais, conceituais, de compromisso, interesse, e de saberes docentes.

 

 

Este texto é parte integrante da tese de doutoramento:

LANGHI, R. Astronomia nos anos iniciais do ensino fundamental: repensando a formação de professores. 2009. 370 f. Tese (Doutorado em Educação para a Ciência). Faculdade de Ciências, UNESP, Bauru, 2009.